Fanfic: Bruto e Indecente | Tema: vondy
Exatamente como eu havia imaginado — enquanto dirigia para o “Paraíso” —, minha mãe foi a primeira pessoa que me viu chegando, vestindo apenas a camisa daquele projeto de caubói idiota.
Ela estava sentada na cadeira de balanço marrom, que ficava no quintal da casa. E da maneira como olhava para frente, parecia que estava ali de tocaia, esperando-me chegar só para ter o prazer de pronunciar um de seus comentários maldosos, recheados de ironia.
Como eu não estava com muita paciência para isso, nem lhe dei a chance de começar a falar. Passei por ela e limitei-me a um simples “bom dia, mãe”, enquanto seguia em passos bem apressados para dentro de casa.
Já no meu quarto, finalmente tive o prazer de arrancar aquela camisa xadrez nojenta. Atirei a peça de roupa no chão e, como uma menininha de cinco anos de idade fazendo birra, pisei em cima enquanto me lembrava da expressão de superioridade daquele cretino ao me emprestá-la.
Nunca havia sido tão humilhada.
E por um idiota que nem sabia falar direito.
“Se quiser, vai usar a camisa xadrez ridícula que tanto desprezou”. Ele havia me dito com aquele sotaque de roceiro, junto com um sorrisinho desprezível.
Depois dessa minha dose diária de infantilidade, fui para o banheiro terminar de me purificar. Necessitava, urgentemente, me sentir limpa outra vez e isso não aconteceria até que me lavasse, esfregando a minha pele com a
esponja mais grossa que os meus pais tinham.
A simples sensação da água quente caindo sobre minhas costas fez com que voltasse a me sentir como eu mesma: uma mulher decidida e forte. A água levou com ela todo o constrangimento que tinha passado pela manhã e praticamente toda a raiva que ainda estava sentindo.
Não queria tornar a me lembrar daquela festa idiota e, principalmente, do caubói com quem havia tido o desprazer de acordar, mas ainda existia uma pessoa que me devia explicações — explicações muito boas por sinal.
Enquanto eu me ensaboava, pensava exatamente nas palavras que usaria com Maite — a culpada por quase toda a confusão em que eu havia me metido. Ela praticamente me obrigou a ir àquela festa estúpida e depois me deixou lá sozinha, à mercê de homens tão nojentos e ridículos quanto aquele que havia conhecido há algumas horas.
Ao me trocar — e, dessa vez, colocando outras coisas além de uma camisa e roupa intima —, decorei várias frases agressivas como forma de argumento, perfeitas para aquela determinada ocasião.
No caminho para a sala, mais especificamente onde o telefone ficava, agi como se estivesse prestes a entrar em um tribunal, atuando como promotora de um caso qualquer, que precisava derrubar todos os argumentos da defesa.
No entanto, no instante em que a minha amiga atendeu a ligação, notei que a sua voz estava um pouco estranha, transmitindo cansaço — de uma forma bem diferente de quem havia acabado de acordar de ressaca. Então, em vez de começar a despejar sobre ela todo aquele ódio que havia planejado, optei por perguntar onde ela estava.
— Ainda estamos no hospital… Eles querem mantê-la em observação
por mais algumas horas — respondeu-me Maite , como se eu soubesse do que ela estava falando. E como se já não tivesse me deixado confusa o suficiente, ela continuou dando um nó na minha mente: — William descobriu que eu não estava na sua casa por causa do cheiro de álcool nas minhas roupas e agora está me ignorando e agindo como se eu fosse a pior mãe do mundo.
Eu senti que ela continuaria falando — Maite tinha mesmo esse defeito de ser tagarela — e como eu não estava compreendendo uma só palavra de toda aquela conversa, resolvi interrompê-la e começar a questionar a parte que julguei ser a mais séria.
— Espere um pouco, o que você está fazendo em um hospital?
Ela ficou em silêncio por alguns segundos, como se eu também a tivesse deixado confusa.
— Beatriz. A minha filha. Uma crise de convulsão... Lembrou agora? — ela disse pausadamente, como se isso fosse facilitar a minha compreensão. Como se estivesse lendo os meus pensamentos, Maite prosseguiu, dando- me o que eu precisava para acompanhar toda aquela história: — Comentei com você ontem, antes de deixar a festa… Eu também te enviei umas vinte mensagens.
Eu não me lembrava de nada disso e o meu celular estava sem bateria, criando uma situação perfeita para o surgimento de mais um problema. Nesse momento, eu agradeci mentalmente por não ter gritado com ela ao telefone, antes de saber exatamente o que havia acontecido. Já bastava minha acusação sem fundamento pela manhã, quando sugeri que o caubói teria se aproveitado da minha embriaguez.
— Eu não me lembro de praticamente nada do que aconteceu ontem —
disse, odiando a mim mesma por ter bebido tanto.
Então, eu me dei conta de que havia acabado de saber que a filha dela estava internada e questionei o óbvio: — mas e a Beatriz, como ela está?
— Já está melhor... Às vezes, ela tem essas crises e precisamos correr para o hospital — explicou, despreocupando-me e fazendo com que me sentisse menos culpada por pensar em um discurso ridículo antes de ligar. — Ela ainda ficará em observação, mas acho que vão dar alta ainda hoje.
— Fico feliz em saber... Precisando de alguma coisa, é só me ligar — disse finalizando a conversa e, em seguida, sentindo-me a pior pessoa do mundo, encerrei a ligação.
A primeira coisa que fiz, depois de engolir toda a razão que pensava possuir e aceitar que não existia mais ninguém para transferir a culpa além de mim mesma, foi colocar a porcaria do meu celular para carregar. Eu queria ver as mensagens que Maite havia-me enviado, para conferir se não havia mais algum detalhe que eu precisava saber.
Após fazer isso, eu fui para a cozinha pegar uma xícara de café, pois precisava desesperadamente despertar e a cafeína podia me ajudar com isso. Chegando lá, eu descobri que a minha mãe já não estava mais lá fora encarando o horizonte com o seu olhar julgador, agora ela estava acampada na mesa, provavelmente esperando eu aparecer por ali para dar início a sua segunda tentativa de comentar sobre o quanto eu estava sendo irresponsável e imatura por dormir fora de casa sem avisá-los.
Ela notou minha presença e, instantaneamente, os seus lábios começaram a se mexer: — Você já tem mais de trinta anos, mas continua agindo como se tivesse quinze… — Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela continuou com o sermão pronto: — Você quer matar o seu pai de
preocupação, Dulce ?
A princípio, eu teria dito: “como você mesma disse, eu já estou velha demais pra ouvir toda essa baboseira, mãe!”, mas eu sabia que isso apenas complicaria mais as coisas entre nós duas. E, por mais que fosse extremamente irritante admitir, eu também sabia que a minha mãe estava certa em tudo o que havia me dito. Virar a noite fora de casa sem avisá-los era um comportamento muito adolescente.
— Eu realmente deveria ter avisado vocês… Desculpe mesmo, eu não queria preocupar vocês dois — respondi de forma tranquila, surpreendendo tanto ela quanto a mim mesma. — Prometo que não vou deixar isso acontecer de novo.
Ela ficou tão grogue com o meu pedido de desculpa — algo que realmente não era fácil de acontecer — que perdeu até o restante do sermão, que também devia ter passado horas planejando.
Depois de quase um minuto em silêncio, apenas bebericando da sua xícara de café, dona Blanca voltou o seu olhar em minha direção e sorriu.
— É bom finalmente ter você por aqui — comentou ela, antes de se retirar da cozinha.
Essa frase era aquele “bem-vinda de volta, filha” que eu tanto esperei no momento em que a vi, quando cheguei ao sítio. E, ainda que ela estivesse um pouquinho atrasada, foi ótimo ouvi-la.
Autor(a): babyuckermann
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
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