Fanfics Brasil - Capítulo 2 I still walk

Fanfic: I still walk | Tema: The Walking Dead


Capítulo: Capítulo 2

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Ao sair do quarto e caminhar, me sentir leve. HÁ quanto tempo eu não me sentia limpa e leve? Esse vestido me fazia sentir que estava em casa, de alguma forma ainda estava na fazenda esperando mamãe me chamar para jantar. Eu sabia que isso não ia acontecer, nunca mais a veria, nem ela nem o papai, nunca mais teria minha vida antiga de volta.


Quando você para de fugir começa a pensar nas coisas, e de alguma forma aquele aperto no peito crescia a cada momento que eu relaxava. Isso me fazia querer dar o fora, aquilo era insuportável,  porque mesmo que não tivesse minha família de volta eu deveria estar feliz, mas agora que eu deveria me sentir segura e calma , meu coração não permitia.


Chegando a escada eu conseguia ouvir Michonne e Rick brincando com a Judith. Talvez eu tivesse sorte e Daryl já tivesse ido dormir, então eu não precisaria olhar para ele, não me entendam mal, eu queria vê-lo mais que tudo, mas eu não sabia se conseguiria fazer isso sem derramar um litro de lágrimas. Eu queria preservar minha imagem por mais um tempo ou pelo menos fazer isso somente com nos dois.


A escada era curta então logo eu conseguia ver a sala e uma passagem que daria a cozinha eu imaginava. Fiquei um momento parada no inicio da escada, não que fosse uma escolha minha, eu congelei praticamente. Não sabia o que fazer, o que falar. Porque a Maggie tinha que me deixar aqui? Não acredito que depois de saber que eu estava viva, ela simplesmente não se incomodou de ir embora. Mas eu já deveria imaginar, as pessoas seguem suas vidas, mesmo antes e ainda mais agora. Então foi isso que todos fizeram, seguiram suas vidas, e esqueceram a Beth, como eu havia esquecido as pessoas que passaram por nos .


Como se ouvisse meus pensamentos Carl saiu da passagem do tamanho de uma porta e veio ate mim. – Você esta bem diferente.


— Eu ? Olha só para você!


Nos sorrimos e era engraçado. Agora ele era mais alto que eu e seus cabelos estavam na altura dos ombros, seu rosto estava mais madura e ele já havia perdido toda a gordura infantil. Agora era um adolescente e isso era engraçado, nos conhecíamos a um bom tempo agora, nos tornamos uma família.


Carl me levou ate a cozinha e antes de chegar eu podia sentir o cheiro de comida. Quando ficou visível eu consegui ver que era uma cozinha nos tons amarelo e branco. Tinha um balcão com cadeiras e uma mesa de 4 lugares quadrada no canto, próxima a uma janela grande entreaberta sem cortinas. Tinha uma porta que provavelmente levava ate a parte de traz da casa e tinha até uma porta para cachorro.


Tinha uma parede repleta de armários embutidos de madeira na cor branca a frente de uma parede com azulejos brancos com pequenas flores amarelas. Tudo era muito limpo e combinava com a casa. Mamãe adoraria cozinhar naquele lugar.


Michonne estava no fogão fazendo alguma coisa em uma frigideira, Rick estava na mesa sentado ao lado de Daryl comendo o que parecia ser uma omelete e tomando uma limonada em um copo grande de vidro. Na mesa havia dois outros pratos com omeletes meio comidos, imaginei que fossem da Michonne e do Carl. Judith estava no chão brincando um quebra cabeça que eu ainda não conseguia ver qual desenho iria se formar, mas tinha o que parecia um céu com nuvens brancas.


Quando entrei Rick e Michonne olharam para mim e eu conseguia sentir o sorriso e a recepção deles, menos Daryl que me olhou por um segundo e logo voltou à atenção para sua refeição.


— Venha, sente aqui. Deve estar faminta.


Segui o conselho de Michonne e me sentei na bancada em uma cadeira alta de frente para quem sentava na mesa e de costas para o fogão. Como uma habilidade típica dela, logo apareceu uma omelete grande no meu prato. Aparentemente, tinha cebola e tomates vermelhos, tinha um tom dourado e parecia bastante saboroso, em quanto ela enchia um copo de limonada para mim eu agradeci com um “obrigada” que quase não era audível e ela voltou para seu lugar.


Agora todos da mesa comiam e o único barulho era Judith que emitia alguns sons de desaprovação por não conseguir juntar algumas pesas. Peguei um garfo e meio que não sabia o que fazer. O que tinha de errado comigo? Havia esquecido como se comia? Minha garganta ia se fechando e meus olhos já estavam quase cheios de lágrimas, prontos para transbordar.


— Alguma coisa errada Beth?


Levantei meu olhar e vi que a atenção estava em mim, Rick esperava uma resposta e é claro que Daryl não se importou em olhar.


— Eu estou bem...


— Não gosta de omelete? – Michonne perguntou com um tom de preocupação. Ela parecia tão diferente agora, quase como uma mãe. Nunca tinha parado para pensar nisso, mas será que ela tinha família? Filhos? Qual era sua profissão? Eu não tinha o costume de pensar na vida dos meus amigos antes disso tudo. Tinha o costume de pensar na minha e isso mostrava o quanto eu era egoísta.


— Eu gosto, meu pai costumava fazer pra gente todo domingo antes da missa...- então eu entendi o porque minha garganta se fechava...papai. Eu não tive tempo para pensar nele, e da forma como ele morreu.


Eu fiquei parada encarando eles e vendo o clima mudar na cozinha. Incrível, menos de 30 minutos com eles e eu já tinha acabado com o jantar. Esse era o meu dom, até mesmo em um apocalipse de mortos vivos.


Dei uma garfada e coloquei um pedaço na boca, era macio e tinha um gosto forte de tomate. Mastiguei algumas vezes, menos do que o suficiente e dei um gole grande da limonada, que logo notei que não tinha açúcar, mas que os limões estavam bem doces, então não era extremamente azedos.


— Não sabia que sabia cozinhar Michonne.


— Bem ... eu não sei. Sei o básico.


— O que você fazia antes? Antes de tudo isso? – peguei ela de surpresa e Rick deu um leve sorriso , talvez de uma piada interna. Fiquei feliz em amenizar o clima desconfortável que eu havia criado.


— Eu era dona de uma galeria de artes.


— O que? Não... você esta brincando.


— o que achou que eu fazia?


— Eu não sei... Achei que você fosse uma ninja.


Todos caíram na gargalhada e eu percebi que ate mesmo o Daryl deu um leve sorriso, mesmo de cabeça baixa.


— O que você fazia?


— Eu estava me preparando para ir para a faculdade, fui aceita em Juilliart.


— O meu Deus Beth, Isso é impressionante.


— O que você ia estudar lá?- Carl me perguntou, claro que ele era muito novo eu imagino para saber o que era a Julliart , talvez estivesse sendo educado.


— Eu ia estudar composição clássica, piano.


— Você toca piano? Que legal. Podíamos achar um para você tocar para nos.


— Não acho que vocês iam gostar. E eu estou um pouco enferrujada, a ultima vez que eu toquei foi...- Então aqueles olhos verdes me olhavam, me encaravam por trás daquela franja que quase os tampavam. Como uma cortina antes de abrir para o espetáculo. Eram tão raros aqueles momentos. Me lembro de perceber que seus olhos eram verdes somente quando ficamos sozinhos na cabana. Enquanto conversávamos, e a chuva caia lá fora. Estávamos bêbados e melancólicos. Mas a única coisa que me coloca no chão eram aqueles olhos verdes escuros. Me lembro de falar com tanta convicção de que ele sentiria minha falta. Será que ele sentiu? Ele continuava me olhando e eu perdi completamente a noção do tempo e de quem me olhava. Queria que existissem somente nos dois ali, para que eu pudesse entender o que estava acontecendo na cabeça dele e no meu coração.- ...Foi a muito tempo.- terminei dizendo.


Abaixei meus olhos antes que ele o fizesse e continuei comendo. O silencio se estendeu por mais alguns minutos ate que Carl se levantou e disse que ia dormir e logo Rick e Michonne se levantaram. Rick pegou Judith e se despediram, mas eu me levantei e fui até eles.


— Boa noite Princesa. – ela obviamente não me reconhecia, porque se encolheu no colo do pai.


— Logo ela se acostuma com você. – Rick me consolou.


— Sim... Logo nos voltamos a ser amigas.


Então fiquei feliz em ver um pequeno sorriso no rosto da pequenina. Mas me fez lembrar de que eu fiquei muito tempo fora.


Eles foram e eu fiquei em pé no meio da cozinha, até que Daryl levantou abruptamente e foi até a pia e começou a lavar seu prato e copo. Era uma visão desconexa. Esperei ele lavar a louça e colocar o prato e o copo ao lado da pia para secar. Percebi que ele ficou parado em frente a pia de costas para mim por mais tempo que o necessário. Então ele se vira e me encara por um segundo, ele começa a andar com passos fortes na minha direção, mas passa por mim e diz “Boa Noite”, bem baixo, quase me pergunto se ele disse outra coisa.


Mas antes que ele passasse totalmente por mim eu segurei seu braço, mas obviamente a força dele era maior que a minha o que fez com que eu girasse ao encontro dele. Daryl virou e me encarou. Sua respiração era pesada assim como a minha, mas ao contrario do meu medo, estar tão próxima a ele, não me fez chorar.


— Olha ...Daryl... eu sei , tá! Eu sei que eu arrisquei nossas vidas e que ....- Daryl parou meu raciocínio pegando meu pulso  que segurava o dele. Me trouxe alguns centímetros para perto dele  em um solavanco e mesmo sendo mais alto que eu, pude ver seus olhos e eles estavam focados em mim. – Daryl... eu me enganei ,  não é? Você não sentiu minha falta.


E por um segundo eu vi aquela armadura dele se desfazer e seus olhos ficaram gentis. Mas eu sabia que ali ele via uma menina desesperadas por atenção e isso me deixava louca de raiva.


— Beth...


— Não ... não faça isso.


— Beth...


— Daryl, eu sobrevivi a muita coisa e eu sei do que sou capaz. Não sou mais aquela menina que você teve que cuidar. Não sou mais essa menina.


Ele me encarava e aquilo era tortura, ele sentia pena de mim eu podia ver, e aquela rejeição era como brasa queimando em meus olhos. Eu já podia sentir as lágrimas vindo, que idiota que eu era, e claro que ele me achava patética.


— Eu senti sua falta. – Seu aperto ficou mais forte e tão devagar que eu quase não percebi que estava acontecendo,  me trouxe para mais perto e seus olhos estavam grudados nos meus. Ele sentia minha falta? O que isso queria dizer? Eu estava tão confusa.


Então dê repente ouvi uma batida na porta e como se tivesse arrancado de seu transe Daryl fechou os olhos e respirou fundo, soltou meu braço e deu um paço para trás. Isso fez com que eu fizesse o mesmo e logo ele caminhava para a sala, fui atrás dele, mas não me aproximei, fiquei na passagem entre os dois cômodos.


Ele chegou ate a porta e abriu, atrás dela uma mulher loira e muito bonita estava esperando. Ela estava molhada e sua camiseta branca ficou transparente mostrando sua lingerie.


— Oi Daryl, Boa noite. Desculpe incomodar, e que por causa da chuva um galho de arvore caiu em cima da caixa de luz. Você poderia me ajudar a desligar e tirar ? Ele e meio grande e eu não consigo sozinha.


— Claro. – então ele passou pela porta e foi. Eu fiquei ali naquele lugar, sozinha e novamente o frio passou pelos meus ossos. Quem era ela? Ela veio pedir ajuda diretamente para o Daryl?


Eu me virei e voltei para a cozinha, lavei os pratos e os copos que estavam na mesa e os meus, mas não antes de terminar de comer e tomar minha limonada. Logo eu estava no meu novo quarto e eu não me sentia à vontade. Como passar a noite na casa de uma amiga da escola, e isso me fez lembrar que eu nunca dormi na casa de uma amiga ou fiz uma festa do pijama.


Sentei na cama e fiquei pensando no que poderia ter acontecido se aquela mulher não tivesse batido na porta. Ele teria me beijado e falado que sentia o mesmo que eu? Mas o que eu sentia mesmo? O que eu queria? Ou ela teria me trazido mais para perto e falado “ Garota tola, você é uma criança para mim”. O que teria acontecido?.


Me levantei e decidi fechar as cortinas , mas ao chegar lá vi que tinham duas pessoas próximas a lateral de uma casa branca e aparentemente muito parecida com a que eu estava, então percebi que eu reconhecia uma delas, eu o teria reconhecido em qualquer lugar. Era o Daryl , e aquela mulher eu imaginei, eles estavam chegando próximo a o que parecia que fosse a caixa de força da casa e estavam retirando o galho de arvore . Que para ser sincera não achei que fosse muito grande.


Aparentemente conseguiram tirar o galho com facilidade e logo à luz da casa voltou, ela virou para ele e eu imaginei que iriam se despedir. Daryl estava virado de costas para mim e eu quase perdi a mulher de vista por causa da altura dele, mas ela se aproximou e tocou seu rosto e mesmo que eu não quisesse ver, mesmo que na minha cabeça eu falasse: “ Feche os olhos, feche as cortinas, faça alguma coisa mas não olhe”, eu não conseguia e fiquei ali parada olhando sobre a luz fraca da lua e das janelas da casa em frente , e a mulher loira se aproximar e beijar o Daryl.


Não podia acreditar no que meus olhos me mostravam, não conseguia processar. Não conseguir conter as lágrimas, mas só as notei quando meu peito doía quase como se alguém tivesse arrancado meu coração. Meu peito sentia solavancos e batidas fortes, como se alguém estivesse batendo nas minhas costas. Eu queria gritar e bater em alguém.


Parte da minha mente queria rir e pensar que aquilo não me afetava, afinal eu nem gostava realmente dele, só que não é verdade. Agora eu podia ter certeza dos meus escondidos e confusos sentimentos, que agora estavam em pequenos fragmentos espalhados pelo chão frio.


Ela disse alguma coisa e logo ele estava voltando para a casa, ela fechou a caixa de energia e se dirigiu para a porta dos fundos da casa, que imagino ser da cozinha. Aos poucos as lagrimas frias me trouxeram para a realidade e eu consegui abaixar meus olhar para minha mão direita que agarrava com força a fina cortina aberta. Minhas unhas tinham apertado tanto o tecido que era possível ver a mancha vermelha se expandindo pelo tecido claro. Eu havia cortado a palma da minha mão e manchado o tecido. Com algum esforço abri minha mão e encarei os pequenos cortes na minha palma branca, logo uma pequena poça de sangue se formou ali.


Ouvi a porta da sala bater, e o som me fez sobressaltar e perceber o quanto minha respiração estava alta. Meus lábios tremiam, mesmo que eu não estivesse com frio. Meu corpo estava submersos naquela névoa de solidão. Eu realmente era patética. Rastreando ele da forma como fiz, e correndo contra o tempo pensando que ele estivesse sofrendo. Mas ele estava em um outro mundo. Provavelmente não foi ele quem me encontrou.


Ouvi passos subindo as escadas e isso me fez entrar em desespero, ele não poderia me ver assim. Juntei toda a força que eu poderia juntar em minhas pernas e corri para a porta fechando-a , porem ainda consegui ver Daryl se aproximar por alguns segundos. Fechei a porta e tranquei com a chave de ferro que estava na fechadura antiga de bronze.


Não consegui me mover, apenas fiquei ali parada com uma mão sobre a porta e a mão machucada na chave, minha respiração era forte e provavelmente se ele estivesse atrás da porta a ouviria, mas minhas forças já estavam nas ultimas e eu não conseguia parar.


Conseguia ver agora a sombra de uma pessoa se aproximando da porta, era ele. Quando a primeira batida veio, eu quase gritei, não estava esperando. E logo uma segunda batida, dessa vez dupla , impaciente . Eu não podia abrir . Gotas de sangue caiam no chão próximo aos meus pés e agora eu conseguia ouvir uma segunda respiração pesada.


— Beth?


Prendi a respiração e me aproximei da porta encostando minha testa na madeira fria, apertando com força a chave e ignorando a dor aguda que a chave causava na minha mão ferida. Eu só conseguia pensar: “ Caia fora, de o fora daqui”.


— Beth, eu não sei o que dizer.


Então éramos dois, pois eu não conseguia dizer uma única palavra e o choro que mesmo silencioso parecia que enchia o quarto inteiro. Então a sobra e o barulho da respiração se foram e logo ouvi outro barulho, mas dessa vez bem baixo de porta se fechando. Minhas pernas desabaram e eu estava sentada sobre os meus tornozelos com a cabeça baixa e as duas mãos na porta.


O que eu podia fazer? Como poderia agir? Eu fui tão tola em achar que ele sentia o mesmo. Antes eu poderia fingir , antes eu poderia mentir e dizer que não sabia o que sentia e se a situação piorasse eu poderia dizer não gostava dele, mas e agora? Não posso mais fingir que o que sinto não existe mais. Essa dor que invade minha alma e que era pior do que estar a fora sozinha.


Aos poucos eu fui perdendo a noção do tempo e de como fui parar deitada no chão frio e adormeci ali mesmo. Não sei por quanto tempo, poderia ser por 5 horas ou 5 minutos, no final das contas eu nem queria saber, eu não ligava.


Aos poucos eu fui acordando naquela manha e o sol mal tinha nascido dava para ver, mas eu conseguia ouvir que a casa já tinha começado sua rotina pelos barulhos de passos. Meu rosto estava sobre o piso gelado e por causa da janela aberta a temperatura do quarto estava bem baixa.


Foi difícil erguer minha cabeça e olhar para a janela os raios de sol recém nascidos entrar e repousar sobre a cama vazia. Aos poucos me levantei e fui ate a janela, e logo notei que todos já estavam saindo e começando seus afazeres eu imaginei.


A dor no meu peito ainda estava ali e como se o frio do quarto tivesse entrado no meu corpo e substituído meu coração eu conseguia sentir o vazio se instalando dentro de mim.


Peguei a bolsa de higiene pessoal e fui até o banheiro, logo eu estava descendo as escadas e ouvi a família na sala conversando em um tom alegre.


— Provavelmente eu e o Daryl devemos sair em dois dias para buscar mais suplementos, então ele não vai sair para recrutamento. – Ouvi Rick falar.


— Acho que é melhor assim, por um tempo. – Era a voz de Daryl agora.


—  Não quer sair por muito tempo?


— Não só isso. Acho que não é uma boa hora para trazer desconhecidos .


Ao descer as escadas todos me encaravam, e isso fez todos os pelos do meu corpo se levantarem.


— Bom dia Beth, dormiu bem? – A voz de Michonne veio da entrada da cozinha e ela vinha com uma maça na mão.


— Claro, Bom dia .


— Gostaria de tomar café?


— Não, estou bem .


— Você precisa comer, esta tão magra. Tome, pelo menos essa maça. – Ergui a mão e peguei a fruta que estava com algumas partes vermelhas e outras verde.  Dava para ver que era uma fruta orgânica do pé e não como aquelas vermelhas enormes que mamãe comprava no mercado.


— O que aconteceu com sua mão?


A pergunta me pegou desprevenida e a olhei confusa para minha mão. Dava para ver os três cortes mais profundos e doloridos agora em vermelho escuro por causa do sangue coagulado e um pequeno corte rosa claro causado pelo meu dedo menor .


— Sou descuidada, só isso.


— Não quer ir até a enfermaria e dar uma olhada? Pode infeccionar.


— Eu estou bem.


Ouvi uma batida na porta e Rick a abriu , tentei olhar rápido para a porta sem parar o olhar no Daryl. Não poderia encara-lo agora.


Rick abriu a porta e tinha um rapaz alto esperando. Rick o deixou entrar então eu o reconheci.


— Bom dia a todos. Que bom que você já levantou, vim a sua procura Beth. – ele falava diretamente a mim e se aproximou. Estava com uma camiseta azul marinho, calças jeans e botas pretas.


— Eu ?


— É , minha mãe precisa fazer algumas coisas hoje, então ela pediu para que eu buscasse você para vocês conversarem lá em casa.


— Pediu, ou você se ofereceu? – Daryl usou um tom baixo porem assustador. Algo que não era típico dele. Normalmente era apenas quieto, não assustador.


Todos olharam para ele e eu não pude deixar de olhar também. Como na noite passada ele estava próximo à janela e não olhava para mim, apenas olhava para fora. Talvez ele ficasse ali esperando sua “namorada” loira aparecer.


— Bem, eu me ofereci. Achei que poderia te mostrar o galpão depois caso você quisesse trocar alguma coisa... – O garoto estava obviamente constrangido. O que o Daryl tinha com isso?


— Obrigado Spencer, seria ótimo.


  Daryl abaixou o rosto e deu um sorriso, não pude acreditar. Era um sorriso sínico e de deboche, qual era o problema dele?


— Não tem problema. Já tomou café?


Levantei a maçã e me dirigi próximo a ele.


— Estou pronta.


Sai pela porta e ele me acompanhou, logo pegou a minha frente e eu estava ao seu lado o seguindo pela rua abaixo. Não conversamos por algum tempo, e foi confortável. Spencer parecia ser o tipo de cara que não forçava conversas desnecessárias e isso me alegrou.  


O ar frio da noite passada ainda pairava pelo lugar e tudo estava molhado por causa da tempestade. O lugar parecia ter saído de um catalogo ou de um livro de romance. Apesar das pessoas que já estavam saindo de “suas” casas , o lugar tinha um ar de sossego e calmaria que eu nem me lembrava que poderia existir novamente.


— Como foi à noite?


— Fria.


— Precisa de mais uma coberta? Podemos ir ao galpão.


— Não é necessário. Mas tenho que ir até o galpão, trocar as roupas.


— Algum problema?


— Ficarão meio grandes.


— Imaginei que ficariam mesmo. Te levo lá depois. Não vai ser problema.


— Vai ser meu guia particular ou meu guarda costa? – Não acho que estava sendo grossa e tenho certeza que minha expressão era praticamente de duvida eu tinha certeza. Mas esse garoto por algum motivo esta interessado em mim e eu precisava saber o porquê.


— Na verdade pretendia ser seu amigo.


— Precisa mais do que uma excursão para ser meu amigo. - Agora estávamos parados em frente a uma casa branca. Maior e mais bonita que as outras. Com as vogas mais grossas e aparentemente de uma madeira mais cara. Tinham flores roxas em potes marrons em toda a varanda. A casa tinha uma ar de primavera por toda parte.


— Que bom que temos tempo.


Quando entramos na casa, percebi logo que ela era muito mais pessoal do que a casa onde eu estava . Tinha fotos de Spencer e de sua mãe com homem alto de cabelos castanhos. Ele usava  uma blusa branca,  seus rostos estavam corados , com palmeiras atrás deles. Uma típica imagem de férias de família. Uma família feliz eu diria. Não as de comercial de margarina, mas sim essas de condomínio, e isso só serviu para solidificar minha teoria de que esse era o tipo de rapaz que o Spencer era, um garoto de condomínio caro.


Entramos na casa e sua mãe me esperava com uma xicara de chá inglês na mesa da cozinha , que tinha azulejos que tinham tons de azul e rosa claro. Sua mãe usava roupas de jardinagem e isso explicava as luvas com terra na pia da cozinha.


Nos sentamos e tomamos o chá de capim santo sem açúcar , mas isso eu já esperava. Conversamos primeiro sobre o que eu tinha passado ultimamente, e eu não pude evitar de ser meio monossilábica nas minhas respostas. Algo dentro de mim me impedia de ser completamente aberta com essa estranha e o pensamento de ter o Rick aqui me veio à mente muitas vezes.


Talvez fosse o fato de que eu não conseguisse me concentrar por mais de um minuto nas perguntas, ou talvez  eu pensar na minha vida amorosa, ou melhor, na inexistência dela, mais do que nas respostas simples como: “ o que você gosta de fazer?”. Do que eu gosto? Eu nem sei mais, mas me limitei a dizer “ muitas coisas” ou “ não tenho certeza”. O que eu tinha certeza era que eu parecia uma menina perdida e confusa.


Depois de um tempo acho que a entediei, porque ela logo pediu que seu filho que esperava na sala, me levasse até o galpão.


— Então, esperamos você amanha cedo no galpão. Tenho certeza que você vai ser bem útil lá.


— Obrigado.


Segui Spencer ate o jardim e descemos a rua em direção à casa de Rick. Eu não podia fazer ideia da hora, mas o sol logo estaria no pico, então imaginei que estava próximo do meio dia, talvez as dez da manha.


— Então... o que você faz aqui?


Obviamente ele não esperava que eu puxasse assunto, mas eu precisava tirar minha mente daquele luar húmido e frio que ela  ainda estava escondida atrás de alguma porta no final de um corredor escuro.


— Bem... eu busco suplementos e as vezes ajudo a recrutar .


—  Recrutar?


— É ... Trazer pessoas.


— E porque vocês fariam isso?


— Para que as pessoas do mundo possam me conhecer.


Parei nossa caminhada em frente ao jardim da casa de Rick e não pude evitar de rir um pouco, essa eu não esperava.


— Olha só, ela sabe rir.


— Isso foi um espasmo .


— Claro.


Esse garoto era engraçado, mas todos eles não eram? Com o tempo percebi que somente as coisas boas ficaram na minha lembrança. Ate mesmo as coisas ruins do antigo mundo, eu via coisas boas. Existia poluição. Sim, mas existiam pessoas para poluir. Como esse garoto. Existiam vários dele no meu mundo antigo, e todos eram arrogantes e irritantemente bonitos, mas isso fazia com que Spencer se destacasse aqui nesse mundo fudido. Sua arrogância era charme e sua beleza era refrescante em meio aos cadáveres.  


Em quanto ainda tentava disfarçar meu sorriso que me traia, me virei e virei e me dirigi ate a porta, mas minha visão parou em uma cena que vi a alguns metros, aproximadamente na casa ao lado.


Daryl estava próximo a porta lateral, quase em frente à porta e ao painel de energia que o tinha visto na noite passada. Mas dessa vez ele estava ao lado da grande arvore. Nela havia uma escada branca de madeira. Suas madeiras eram desiguais e sua pintura parecia superficial o que me fez pensar que foi feita por uma pessoa que não tinha muitos conhecimentos de carpintaria.


Ao seu lado aquela mulher loira estava em pé, vestia um vestido vermelho sem mangas. As alças finas percorriam seu pescoço fino e delicado, deixavam seu busto bonito. Era rodado e ela usava sandálias de dedos brancas ou beges, com a claridade eu não conseguia ver muito bem. Seu cabelo loiro estava amarrado em um coque despojado e meio solto. Em suas mãos um copo de vidro com agua.


Daryl pegou o copo e bebeu a agua, algumas gotas caíram em sua camiseta branca aparentemente , pois sem jeito ele passou a mão pelo seu peito e logo colocou a mão no bolso traseiro para pegar um lenço vermelho que estava lá e passou na testa. Eu nunca o tinha visto de branco.


A loira reparou em nós ali ao lado olhando para eles e acenou com um sorriso de Miss .Daryl nos olhou e ficamos assim. Os quatro nos encarando. Eu sabia que Spencer não vazia ideia do que estava acontecendo, mas eu podia postar que ela sabia. Provavelmente Daryl deve ter contado sobre mim. Contado o que ? O que tinha para contar? Nada foi dito. Mas por algum motivo a raiva subiu para minhas bochechas, e como eu queria ter visão de raio laser nesse momento, para acabar com esse sorriso de Barbie Malibu.


Virei o rosto, dramaticamente de mais e fui andando com passos fortes até a porta de madeira branca da casa. Não olhei para saber se o Spencer estava me acompanhando, mas como a porta não bateu quando passei por ela imaginei que ele a tivesse parado e entrado logo atrás de mim. Comecei a subir as escadas cuspindo as palavras para quem estivesse ouvindo.


— Já volto.


Fui ate meu quarto e peguei a sacola com as roupas e me olhei por um instante no espelho. Meu reflexo era bobo, de uma garota boba. Olhos grandes, boca tensa e bochechas vermelhas. Respirei algumas vezes e abaixei meu olhar para meus pés. Eu não podia agir assim. Preciso me acalmar e pensar com calma.


— Tube bem. Tudo vai ficar bem. Você vai ficar bem.


Uma ultima puxada de ar fresco e fui ate a sala onde Spencer estava me esperando próximo à porta. Ele me olhava com curiosidade e um sorriso provocador .


— Você é bipolar?


— O que?


— Você é bipolar?


— Não.


— Tudo bem então. 


Spencer levantou os ombros e levantou as sobrancelhas com uma expressão de quem diz : “tanto faz”.


— Desculpe.


— Pelo que? – Ale tinha uma expressão confusa mas ao mesmo tempo divertida.


— E difícil explicar.


— Tudo bem. Um dia você me conta.


— Você é sempre tão compreensivo?


— Só quanto tento impressionar alguém.  


— É sincero?


— Aprendi que não temos tempo para mentiras e indecisões.


Então ele me roubou uma reação que eu não tinha há muito tempo. Um sorriso sincero.


— Boa resposta garoto.


Saímos da casa e mesmo que eu não quisesse ver o Daryl e a Miss juntos eu tinha que me acostumar a simplesmente ignorar e viver minha vida, ou ao menos o que tinha restado dela.


Demos alguns passos pelo jardim e os dois tinham desaparecidos, e eu tive de me esforçar para não pensar em onde eles estavam ou o que estavam fazendo, mas logo uma pessoa entrou no meu campo de visão e me fez esquecer disso.


— Maggie!


— Finalmente te encontrei.


Nos abraçamos e como eu não havia sentido falta da minha irmã todo esse tempo? Não é como se eu não tivesse pensado nela, havia pensado em todos, mas o meu único pensamento fixo e objetivo era encontrar o Daryl e isso de alguma forma me manteve na linha da sanidade. Me fez ter um objetivo e alguma coisa com o que trabalhar.


— Onde vocês vão? – Maggie me perguntou com um sorriso engraçado no rosto.


— Vou levar a Beth ao galpão para ela trocar algumas roupas.


— Se importa se eu fizer isso?


— Claro que não. Depois eu arrumo um tempo para rouba-la de alguém!


Spenser me deu uma piscadela com um sorriso de menino e foi embora , voltando pelo caminho onde tínhamos vindo mais cedo.


Era estranho andar com a Maggie. Ela não tinha aquela sensação prazerosa de silencio que o Spenser tinha. Com a Maggie sempre foi difícil somente caminha, sempre existia a necessidade de conversar e o que eu esperava que tivesse sumido mas nunca sumiu. Aquela  sensação de necessidade da aprovação dela.


— Então? – Eu não sabia como começar essa conversa. Mas achei que a melhor saída era fazer ela começar. Assim ela me daria um parâmetro pelo o que ela gostaria de falar.


— Eu estou tão feliz que você esteja aqui!


— Eu também.


— Quando Deryl veio com você nos braços foi assustador.


— Imagino.


Andamos mais um pouco, e quanto mais nos aproximávamos do galpão que era a construção mais próxima do portão , eu percebia que era como conversar com uma estranha.


— Eu estou gravida.


— O que?


— Eu estou gravida Beth.- Paramos em frente ao galpão e eu não conseguia compreender as palavras que saiam da boca dela.


— Eu não sabia na prisão.  Descobri depois. Eu fui atrás do Glenn. Fiz placas na esperança de que ele achasse o mesmo caminho que eu. E com sorte ele achou. Você tinha que ver como ele ficou quando soube. Ainda não contei para muitas pessoas, mas tenho certeza que vai dar tudo certo.


— Papai morreu.


— O que? – Ela me olhava como se eu estivesse falando outra língua ou tivesse perdido a cabeça.


— Você não falou sobre isso.


— É. Ele morreu.


—Você fez placas para o Glenn? Não pensou em fazer para mim também?


— Eu... Beth...


— Você nem chegou a pensar em mim?


Nada. Nenhuma resposta.


— Você me procurou quando o achou?


— Bath... eu estou gravida...


— Eu sei eu ouvi.- Não queria ter gritado, mas gritei. Não conseguia mais aguentar. – Eu fiz uma pergunta. Você cogitou a possibilidade de que eu ainda estaria viva?


Então ela só me olhava. E eu não precisava da resposta. Eu sabia que não teria uma em voz alta.


— Você esqueceu de mim.


— Quando o Daryl apareceu e falou que você tinha ido embora, que ele havia perdido você...


— Vocês não se importam não é?


—Beth...


— Foi mais fácil ?


— Do que você tá falando?


— Eu simplesmente desaparecer. Foi mais fácil eu tenho certeza. Desculpe arruinar sua vida perfeita. Desculpe atrapalhar a vida de todos vocês.


Não pensei. Só deixei ela lá falando sozinha e corri. Corri em direção a casa . No começo eu não sabia mas a decisão já estava tomada. Eu só queria sumir. No que eu estava pensando? O que eu achei que ia acontecer ? Que ela estaria me esperando? Que ela teria ido atrás de mim? Que ele me amaria?


Quando eu cheguei até a casa sumi as escadas o mais rápido possível e antes que eu pudesse perceber estava com as calças jeans e a blusa regata preta. Mesmo que eu não quisesse coloquei o cinto o mais apertado que podia e calcei as botas. Peguei minha besta e as adagas e encaixei nas botas grandes e pesadas. Pequei minha mochila e sem olhar para trás com medo de ver meu reflexo sai correndo dali.


Não pude deixar de notas que Meggie não havia me seguido e aquilo doeu como um inferno. Apressei o paço e amarrei meu cabelo em um rabo de cavalo alto. Eu só queria dar o fora dali. Consegui chegar ao portão sem muito esforço. Só parei quando o portão enorme estava na minha frente.


— Vou sair.


— Epá... calma ai garota.


Um homem alto e ruivo desceu da guarita que antes o Glenn estava. A mesma menina de boné e cabelo preso estava lá de novo, mas dessa vez sem o boné.


— Eu estou saindo. – Repeti nervosa, eu só queria dar o fora dali.


— Você não acabou de chegar?


— Sim, só passei para dizer um oi.


— Sua irmã sabe que você esta saindo?


— Claro.


Obviamente ele não estava acreditando em mim. Comecei a bolar um plano de como convencer ele ou passar por cima, mas seu olhar mudou e me fez olhar para trás.  E logo que meu olhar focou me arrependi. Não fui rápida o suficiente e entendi o motivo de minha irmã não vir atrás de mim. Ela me conhecia. Me conhecia bem.


Rick, Michonne , Daryl, Maggie , Glann e é claro para melhorar meu humor a loira sorridente também estava com eles. Eles estavam se aproximando e cada um deles estava com uma expressão de nervosismo no rosto.


— O que esta acontecendo aqui?- Rick veio a frente com o Daryl.


— A garota quer ir embora. – Respondeu o ruivo enorme.


— Beth o que esta acontecendo? Rick não parecia nada feliz.


— Só estou saindo para dar uma volta.


— Com suas coisas? – Glenn segurava a mão da Maggie com força e ela obviamente havia chorado.


— Sou precavida. – Eu não queria falar, queria dar o fora.


— Olha...vamos conversar. Vamos voltar para casa.- Disse Michonne.


— Casa? – Eles estavam falando serio?


— Eu sei que tudo é estranho e as coisas podem não ser o que parecem.-  Eu podia sentir a aflição e preocupação do Rick em sua voz, mas eu não queria sentar e ser racional. Ainda mais vendo Daryl e a loira na minha frente.


— Vocês não podem me manter aqui!


Logo atrás deles eu conseguia ver Carl, Spenser e sua mãe que logo tomou a frente junto com Rick e Daryl.


— O que esta acontecendo?


— Eu agradeço a hospitalidade e tudo mais, Seu condomínio e lindo, mas estou indo.


— O que? – Spenser não ficou feliz e veio até mim. Pude ver que Daryl também deu um passo, mas logo voltou atrás. – O que aconteceu? A um minuto atrás você estava bem.


— Estou me sentindo claustrofóbica.


Olhei para ele e pensei por um segundo se deveria ir mesmo. Ele era a parte boa desse lugar, a parte boa do que restou do mundo. Mas cometi o erro de olhar para o Daryl e ver que agora ele estava o mais longe possível de mim.


— Eu estou indo. Abram o portão.


Me virei e fiquei aguardando.


— não podemos mantê-la aqui sem sua vontade. – Ouvi Deanna falar.


Logo o portão estava se abrindo e eu me apressei. Uma mão segurou meu braço e eu nem me dei ao trabalho de virar para ver quem era. Apenas continue andando e logo estava livre.


Andei mais alguns metros e me deparei com meu primeiro Walker, e eu mal o reparei. Apenas peguei minha adaga e a enterrei na cabeça dele.  Quando estava quase com o pé na floresta de onde ontem eu havia saído, ouvi o portão se fechando e senti novamente uma mão no meu braço e me virei pronta acabar com o que fosse. Mas a pessoa segurou minha mão.


— O que você esta pensando?


Daryl segurava meu pulso com tanta força que eu podia sentir a dor por de baixo da camada de adrenalina que percorria meu corpo.


— O que você pensa que esta fazendo?- Seus olhos estavam vidrados nos meus e eu não conseguia ouvir mais nada. A única coisa que eu podia ver era ele. Meu mundo era ele.


Logo encontrei minha voz e ela estava tão tremula que eu mal a reconheci.


— O que você esta fazendo? Me deixe ir .


— Você poderia para de ser estúpida por um segundo e pensar?


— E você poderia parar de ser mandão? Cai fora Deryl.


— Eu não vou deixar você ir embora.


— Porquê? Como se fizesse diferença para você.  Me deixa ir.


— Qual o seu problema? Quer provar que sabe se cuidar? OK, você já fez isso. Agora vamos voltar.


— Você pode voltar para sua casinha com agua quente e SUA loira oxigenada. – Quis dar muita ênfase na SUA.


— Do que você esta falando? Sobre o que é tudo isso?


— Sobre você é que não é.


— O que aconteceu?


— Nada. Eu só quero ir embora. Só passei para dizer oi, já que vocês não se deram ao trabalho.


Seus olhos verdes tinham ficado escuros e sombrios e sua boca virou uma linha reprimida e sem cor.


— Você não sabe do que esta falando. – Ele falou essas palavras como tanta intensidade e de uma forma tão pausada que me fez duvidar de toda minha atitude. E acho que ele havia percebido a duvida em meu olhar, porque sua intimidação aumentou. – Vamos voltar.


Ele virou para o portão e me arrastou por dois passos.


— Me larga você não é o meu pai.


Ele virou e eu estava tão próxima dele. Seu punho forte ainda segurava com força meu pulso ao lado do seu corpo. Eu tinha que olhar para cima para ver seu rosto.


— Não. Eu não sou seu pai. Nem seu irmão mais velho. Nem seu tio.


— Quem você quer ser? – As palavras saíram da minha boca sem eu perceber.


Daryl ergueu a mão livre e passou pelo meu rosto e pegou uma lag rima que fugiu dos meus olhos sem que eu percebesse. Nossas vozes abaixaram e começamos a cochichar com medo de que as arvores nos ouvissem.


— Não posso te dizer.


— Porque não?


— Porque não seria justo.


— Com quem?


Antes que eu pudesse ouvir uma resposta, ouvi passos e logo o Daryl já estava longe de mim.


— Bath...por favor... sua irmã não esta bem. Ela precisa de você.


Gann tinha uma expressão de tristeza no rosto e todas as minhas forças para discutir haviam sumido. Como ele conseguia me desarmar dessa forma? O que ele queria dizer?


— Onde ela esta?


E antes que o portão fechasse novamente eu já estava novamente dentro de Alexandria.


Corri. E foi isso. Pela primeira vez em muito tempo não tinha eu e meu medo do mundo, ou Daryl e nosso inexistente relacionamento ou nossa amizade que eu nem sequer sabia que um dia chegou a aparecer na superfície desse drama todo.


Eu só queria ver minha irmã, porque por um segundo que durou séculos eu pensei em alguém que não fosse eu. Percebi que mesmo que falasse dela o tempo todo, o verdadeiro motivo era a necessidade de não me sentir abandonada e sozinha. Eu a acusei de não pensar em mim, mas e se eu fosse pior e tivesse pensado nela para um bem muito mais egoísta.


Meggie precisava do Glenn, assim como eu precisava do Daryl essa era a verdade. Como pude colocar meus sentimentos acima dos dela? Como pude achar que os meus valiam mais, quando o meu só feria o meu coração e o dela feria três.


Essa era a verdadeira Beth? Egoísta e mimada? A mesma Beth que tentou tirar a vida por achar que não daria conta de lutar por ela?


Agora eu quase estava próxima do Glenn, nos dois corríamos e eu o seguia, lutando para não ultrapassar ele. Chegamos até uma casa menor, como uma casa de carpinteiro, atrás das casas maiores e próximo ao mini lago, ela tinha a pintura nova amarela clara e as telhas do telhado brancas. E logo eu soube que era a casa do Glenn e da Meggie, deis de pequena ela sempre sonhou em uma casa amarela e telhado branco, mas a proporção era diferente. Maggie era do tipo que pensava grande, casa grande e família grande.


Glann abriu a porta e Meggie estava deitada no sofá cinza de dois lugares , com os pés sobre duas almofadas amarelas e um pano bege sobre sua testa. Seus olhos estavam fechados  o que me deu calafrios. Ela estava tão pálida e parecia muito frágil, mas como sempre linda, mesmo naquele cenário.


Michonne estava ao seu lado e falava alguma coisa baixa. Rick esta com Judith no colo e cantarolava em seu ouvido próximo ao sofá .


— Meggie! – Eu gritei da porta e corri para minha irmã na esperança de poder abraça-la sem falar alguma coisa que a machucasse.


— Beth!- Sua voz era baixa e fraca, mas urgente o que me fez ficar com o coração ainda mais apertado.


A abracei com tanta força que tive medo de parti-la ao meio. Pude sentir sua pele fina e seus osso duros com concreto, mas podia ver que sua pele também tinha um tom translucido e fria. Então seu concreto era frágil o que me deixou apavorada.


Ao me ver suas bochechas ganhavam um pouco de cor e meu corpo quente pela corrida a aquecia, o que me deixava um pouco menos culpada.


—Desculpe...Desculpe...


— Não posso te perder de novo Beth, prometi ao papai que cuidaria de você.


— Você não vai me perder, desculpe.


— Eu realmente preciso de você ...


— É...de jeito nenhum você sabe se virar com uma criança...


— Voltou dos mortos para ser babá....


Nos duas rimos e por um momento, olhar nos olhos da minha irmã mais velha e ouvir sua risada aveludada foi como estar em casa de novo.  Na fazenda, quando ela voltava da faculdade para passar o feriado com a gente e contava sobre seu novo namorado . Eu sempre ria e estava disposta a ouvir sobre duas aventuras. Eu ficava contente em fazer parte pelo menos como ouvinte.


Eventualmente ela me perguntava alguma coisa como: “ você sabe como são os homens “ ou “ Você não odeia quando eles dizem que vão ligar?”. Aqueles olhos poderiam me fazer confessar qualquer crime, naquela época eu faria qualquer coisa para fazer parte da vida dela ou para fazer com que ela me aprovasse.  Então eu fazia o que qualquer garota tola na minha situação fazia, eu mentia.  Mas tudo bem, eu mentia e ela acreditava então nos acabávamos rindo e fingindo que éramos melhores amigas. Melhores amigas pelos próximos 3 dias, então ela esqueceria de mim pelo resto do semestre.


Então eu respondia “ Totalmente” ou “ Eu sei”, qualquer coisa que eu achasse que seria a resposta dela, mas eu não sabia. Como eu poderia saber? Meu primeiro namorado só foi acontecer depois que me juntei ao grupo do Rick, e isso porque eu estava com medo de morrer sem dar meu primeiro beijo.  


Sem sentimentos. Só uma experiência estranha foi o que aconteceu. Apesar disso era uma experiência limitada, eu no tinha interesse em aprofundar isso com alguém que eu não sentisse alguma coisa real. Não que eu pudesse ter alguma privacidade na prisão. Foram só um ou dois beijos roubados, e foi isso. Minha experiência romântica só aconteceu basicamente porque um apocalipse rolou então os meninos do mundo não tinham muita escolha.


Era triste pensar que sempre foi assim com a Meggie e obviamente com a mamãe. Sabiam pouco sobre mim. Pouco sobre minha vida. Pouco sobre o quanto eu era infeliz e deslocada na vida.  Mas de certa forma eu apreciava o fato de elas acreditarem que eu era muito mais feliz do que realmente era. A felicidade delas a cegava sobre a real situação do mundo. Eu e meu deslocamento, papai e sua bebida. Éramos iguais em nossas deslocações e mamãe e Maggie iguais em suas perfeições.


Aquela sala era pequena e bem iluminada agora, cheia de pessoas que realmente importavam na minha vida. Em uma vida onde não tinha necessidade de mentiras ou fingimentos sociais. Então eu só tinha vontade de ser a Beth que sempre fui, quebrada e sozinha.


Olhei nos olhos da minha irmã e vi o que esperei ver a vida toda. Uma felicidade real. Ela estava feliz, mesmo no meio de todo esse caos e destruição.


— Não quis te machucar irmã.... eu só...


— E de mais para você?


— Para ser sincera sim, não estava preparada para nada disso. Não sabia se os veria de novo. Eu estava tão cega pela busca que esqueci de sonhar com o que poderia acontecer.  Não quis ser dramática nem mimada. Você obviamente tem muita coisa com o que se preocupar agora. Não posso culpar nenhum de vocês pelo o que eu passei. Estou realmente feliz que vocês estão seguros e felizes. Que encontraram um novo começo.  


Meggie me abraçou e foi doloroso pensar que eu poderia ter estraga tudo e feito ela e meu sobrinho correr risco. Mas por mais que eu quisesse dizer que tudo isso foi por causa da minha irmã eu sabia que em parte tinha haver com o Daryl e com o beijo.


Quando estávamos naquela casa depois do ataque a prisão, eu realmente achei que ele estava admitindo que gostava de mim. E por muito tempo quando eu estava no hospital essa foi minha única lembrança feliz, mesmo que ele não tenha dito, eu podia sentir.  Quando o vi na troca de reféns do hospital meu coração se encheu de alegria e esperança. Mas agora eu podia ver que todos tinham seguido em frente. Ninguém esperaria por um cadáver.


— Tenho certeza que você passou por muita coisa. – Disse Meggie.


— Você não faz ideia. – Respondi com a voz rouca.


— Tudo bem, vamos com calma agora. Vamos dar uma pausa para Beth se adaptar. Tudo foi só um mal entendido.- Me virei e vi Diana sorrindo para mim.


Com o tempo o silencio não existia mais e varias conversas começaram a acontecer, na maior parte como esse mundo maluco podia nos deixar doidos. Fiquei ali calada a maior parte do tempo ouvindo todos contarem historias de como foi a experiência de cada um. Volta e meia eu desviava meu olhar de quem falava e observava o Daryl próximo a porta observando o movimento na sala. Mas seus olhos nunca se encontrarão com os meus. Nem uma vez.


O tempo passou e já era final de tarde, o sol estava indo embora quando Daryl saiu pela porta e logo algumas outras pessoas o acompanharão. Logo alguém me avisou que hoje era dia da fogueira. Aparentemente eles faziam uma fogueira perto da guarita para conversar e tomar chá de ervas que cresciam ao redor de Alexandria sem açúcar.


Quase fomos os últimos a sair, mas por fim eu decidi acompanhar Michonne e Rick para a casa deles. Pensei se o certo não seria ficar com minha irmã, mas lembrei que ela estava “recém” casada e gravida. Portanto seria meio estranho dormir no seu sofá, levando em consideração que a casa não tinha um segundo andar e de onde eu estava podia ver o banheiro e cozinha , então presumi que era melhor ir para a outra casa.


Assim que chegamos Rick e Michonne foram liberam o Carl de sua função de babá. Mas antes que eu pudesse começar a subir os degraus alguém bateu na porta.


Assim que a abri uma garota da minha altura de cabelos longos e castanhos de olhos azuis estava parada na minha frente e me entregou algumas roupas dobradas com um par de botas marrons por cima.


— O que..?


— Alguém me disse que suas roupas não serviram... não esquece de devolver elas. Pode ficar com essas.


— Há... Obrigado... Você é?


— Enid... você é Beth!


— Sim... como você?


— Um amigo me falou... te vejo na fogueira, até lá.


Então ela foi embora me deixando completamente sem jeito e confusa. Quando me virei um par de olhos me encaravam do pé da escada. Não era um olhar de raiva ou incomodo, somente curiosidade e um pouco de diversão.


Eu sei que não deveria ficar com raiva, afinal ele não estava fazendo nada. Mas essa pose que ele fazia quando estava comigo me deixava louca. Eu não havia engolido o beijo e muito menos o fato dele não ter falado nem uma vez normalmente comigo. Então as opções eram ignorar ele ou bater. E eu definitivamente estava afim de uma briga.


— O que?


Daryl desceu o ultimo degrau e foi ate a cozinha. E u não ia deixar ele escapar tão fácil, então os segui e o observei pegar um copo e beber um pouco de agua da torneira de costas para mim.


— Não vai mais falar comigo?


Seu cabelo estava escuro por cauda da umidade e dessa vez ele usava uma blusa de mangas curtas preta, e definitivamente ele estava  muito sexy de preto com o cabelo caindo sobre os olhos.  Essa imagem combinava com ele, apesar de sempre achar que Daryl era a pessoa mais capaz de conseguir sobreviver lá fora.  Mas agora limpo e de roupas novas ele me parecia mais jovem de alguma forma.


Não que passasse a imagem de sofisticação ou etiqueta. Se você não o observasse de perto ia achar que ele era mais um cara encrenqueiro do subúrbio do sul. Sem nada de especial. Mas eu sempre percebi algo a mais nele. No inicio eu pensava como ele era um cara decentes quando não descansou até achar aquela menina Sophia que estava desaparecida. E depois como se importava com as pessoas que realmente precisava. Daryl era muito mais profundo e puro do que queria aparentar.


Ele virou para meu encontro e encostou na pia, mas tive coragem de me aproximas, seu olhar pela primeira vez me intimidou.


— O que quer que eu diga?


— EU não sei...- Eu disse abaixando o olhar e olhando para o par de botas em cima das peças de roupas dobradas sobre meus braços – Qualquer coisa que não seja uma briga.


— Não sabia que estávamos brigados.


— Não... brigados não...mas parece que você pegou o costume de me ignorar até a morte.


Daryl colocou o copo na pia e se aproximou, me olhando com o melhor olhar de cara mal que ele podia fazer. Isso não me assustava mais. Eu tinha medo da não reação dele. Quando ele me ignorava completamente e fingia que eu não era importante. Era disso que eu tinha medo. Do seu silencio.


— Você não sabe do que estava falando. Talvez devesse procurar seu namorado.


Eu tenho certeza que fiquei vermelha na hora. Eu não esperava por essa.


— O que... do que você...? – Não pude evitar de ficar com a voz em frangalhos.


— O que? Achei que você e o senhor mãos de fada estavam se entendendo. Sabemos que não é difícil para você achar um namorado. Os dois últimos foram bem fáceis.


— Qual o seu problema? Porque é tão mal?- Daryl me olhos por cima, de uma forma que seria melhor se me desse um tapa.


— Não sou mal. Sou adulto.


Então ele saiu e me deixou sozinha com o que de suas palavras rodando a cozinha que estava em silencio. Eu não conseguia me mexer. Queria gritar com todas as minhas forças. Mas não podia mover nenhum músculo. As lágrimas caíram sem que eu pudesse evitar e suas palavras ecoarão na minha cabeça com força.


Ele pronunciava  cada palavra sem emoções, como se estivesse explicando uma coisa para uma criança pela milésima vez. E foi assim que eu descobri que ele possuía a capacidade de fazer o que aqueles cadáveres lá fora não foram. Me matar por  dentro. Se eu ao menos pudesse chorar. Mas nem minhas inimigas lágrimas estavam comigo agora. Eu estava Sozinha.


Depois de um tempo consegui sentir meu corpo novamente e subi para o quarto. Deixei minha mochila com as facas e minha besta de mão na cama. Não queria pensar então me mantive em movimento fui até o banheiro e tomei um banho, depois até o quarto e me arrumei.


As roupas que a menina havia me entregado, eram duas blusas de maga iguais, dessas que você compra em loja de departamento e leva uma de cada cor, essas eram preta e cinza, um calça jeans , que graças aos seus, parecia que eram do meu tamanho, um vestido rodado de alças grossas, verde escuro e as botas com um par de meias dentro.


Optei pela blusa cinza e a calça jeans, coloquei as meias e as botas. Quase parecia eu novamente. Esse era o tipo de roupa que eu usava e era estranho, porque percebi que eu era uma pessoa muito fácil de prever . Bem previsível .


Meu reflexo não parecia ter mudado tanto nesses últimos três anos . Quase a mesma. Nunca fui do tipo de usar muita maquiagem ou acessórios, na maior parte do tempo eu interpretava bem a filha mais nova do veterinário da cidade do interior. Agora eu podia notar algumas marcas que antes não estavam ali, graças a Deus ainda nenhuma marca de sol, mas eu sabia que logo elas surgiriam. Não era fácil encontrar um protetor solar hoje em dia.  Mas acima de tudo eu podia ver meus olhos mudarem todos os dias. Dizem que os olhos nunca envelhecem, mas eu podia ver que os meus envelheceram muitos anos. Eu não tinha mais os lindos olhos verdes e enormes, carentes e ingênuos. Eu era mais, muito mais. Voltar dos mortos faz isso com você. Te muda em um grau que ninguém pode entender.


Então eu me dei conta. Eu não tinha mais 16 anos. Agora eu tinha 18.  Não sabia que época do ano era, mas dava para sentir o clima mudar eu fazia aniversário no inicio do outono e agora dava para sentir o inverno chegando. Eu avia passado o aniversário sozinha . Eu me lembro de perambular sozinha pela floresta quando as arvores deixavam o chão coberto por suas folhas.


E agora eu não sabia se um dia eu chegaria a comemorar meu aniversário novamente. Eu não tinha pensado nisso nos últimos 3 anos. Acho que isso é totalmente irrelevante quando os mortos levantam e correm atrás das pessoas que você ama.


Mas isso me deixava triste, eu adorava aniversários. Não por causa dos presentes e a bajulação, isso não me interessava. Mas papai me fazia panquecas e nos tomávamos café juntos do lado de fora, observando as arvores mudarem de cor e os pássaros cantarem sua ultimas canções antes de se esconderem da neve.


Era disso que eu precisava. Panquecas de mestillo com mel do papai e o chocolate quente da mamãe. Sentar na varanda e ouvir os pássaros cantarem e ouvir meu coração responder em percussão. Mas eu não teria isso nunca mais.


Quando cheguei ate o portão eu vi uma enorme mesa de madeira com tigelas coloridas e bules de metal que reluziam na luz do fim de tarde.


A fogueira estava vibrante com um tom bonito e azul, o tipo de fogo que só pode ser feito com madeira salgada. O cheiro de maçã torradas e pão fresco  me abraçaram e me senti em uma das feiras da igreja. Tive a sensação de que de alguma forma o locutor da feira ia narrar com sua voz grave e bonita sobre as próximas atrações da feira.


Os bules tinham fitas com a descrição dos conteúdos de caneta azul. Chá de morango, chá de laranja e chá de hortelã. Eu ainda não tinha visitado as plantações ou qualquer outra parte importante para a sobrevivência de Alexandria.


Do lado várias xícaras, algumas lascadas e outras novas. Algumas simples e outras que pareciam de porcelana inglesa com suas flores douradas bordadas a mão.  Peguei uma xícara grande e vermelha e escolhi o chá de morango. Dei um gole e nem me importei em queimar minha língua, o sabor era forte e o chá bem aromatizado. Fiquei grata por não ter açúcar e o liquido quente me aqueceu por dentro.


— Melhor do que vodka clandestina?


Dei um salto com o susto que algumas gotas do chá caíram na minha mão. Olhei para o dono da voz esperando que estivesse com minha expressão de raiva mais ameaçadora , mas fui desarmada com o que vi.  Daryl me olhava com um sorriso e um olhar de curiosidade esperando minha resposta. Ele também tinha uma caneca em sua mão, mas branca, uma cena de tirar o fôlego.


— Depois eu sou a bipolar.- disse para mim mesma em quanto abaixava o rosto.


— O que?


— Nada.


Me virei e fiquei de costa para a mesa e de frente para a fogueira. Tive coragem de olhar para cima e ver que Deryl continuava de costas para a fogueira, mas  olhava para mim e seu lado direito do rosto era iluminado pela luz azul da fogueira.  Podia ver a cor verde do deu olho e seu sorriso transformava tudo .


— Bela fogueira.-  Eu disse apontando para a fogueira, Daryl olhou para minha mão e sua expressão mudou. Ficou serio. Ele se virou e tocou na minha xícara.


— Você se queimou.


Ele estava certo. Minha mão estava com três manchas vermelhas, duas grandes e uma menor.


— E uma pena que não é vodka clandestina.


— Deveria dar uma olhada nisso.


— Não é nada.- Eu disse com desdém .


— Precisa dar uma olhada nisso. – Ele insistiu.


— Você é mandão assim com sua namorada?


Eu sabia que estava passando por uma linha agora, mas eu estava cansada dele poder falar o que quisesse e me ignorar quando eu fazia alguma pergunta.


— O que?- Ele me olhou como se eu estivesse falando grego. Revirou os olhos e se virou para a mesa e pegou mais um pouco de chá de hortelã. Ele não ia me ignorar de novo.


— O que? Era segredo?


Ele continuava me ignorando e agora pegava um pedaço de pão.


— Imagino que ela não queira expor vocês. Mas é difícil guardar segredo quando fazem as coisas na frente de todo mundo.


— Não faço ideia do que esta falando.


— Eu vi Daryl. – Meus olhos se encheram de lágrimas, e foi muito pior falar para ele do que eu imaginei. A intenção era quem sabe fazer com que ele ficasse constrangido. Mas eu e que estava prestes a enfiar minha cabeça na brasa quente. - Eu vi você e sua namorada naquele dia na arvore. Vocês dois se beijando.


Não sei o que eu esperava, mas não era o que eu tive. Daryl ficou só ali me olhando , me avaliando. Talvez até esperando eu chorar.


De alguma forma que esperava que ele negasse ou simplesmente ficasse um pouco vermelho ou quem sabe surpreso, mas ele simplesmente disse “hum”. Um simples grunhido, do tipo que falamos quando alguma coisa que já sabemos e informada e não estamos prestando atenção.


Daryl me deixou sozinha e foi ao encontro de Rick, Michonne, Carl e Judith que estavam sentados próximo a fogueira conversando. Ele se sentou ao lado em um banco de madeira e observou todos conversarem.


Como hoje mais cedo meu corpo não me obedeceu. Porque agora eu só queria correr para o meu quarto e chorar, qualquer coisa que me fizesse desaparecer, mas agora meu corpo estava afim de briga então eu comecei a marchar em direção a ele.


Eu estava cega. Só o que eu via era o meu alvo. Se eu ia chegar lá e gritar com ele, jogar o chá quente no rosto dele ou chorar eu não sabia, mas a cada passo eu estava mais perto de descobrir. Ate que eu ouvi.


— Beth!


E então tão de repente quanto o grito alguém me abraçou. Um abraço de irmão, daqueles que te deixam sem fôlego.


— Beth, eu não acredito. – A voz falava abafada. – Não acreditei quando me falaram.


Então eu reconheci aquela voz.  O garoto era quase do meu tamanho e tinha olhos e cabelos castanhos escuros. Ele usava uma blusa de frio bege.


— Noah.



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Autor(a): baby1532

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— Noah!.. Mal conseguia ouvir minha voz abafada pelo ombro do meu velho amigo.  O abracei forte e foi acolhedor. Seu cheiro era estranho, não como o de todos por aqui. Todos tinham o cheiro de sol e sujeira. Noah cheirava a biblioteca e livros antigos. Isso me deixava curiosa. — O que? .... Noha. - Agora minha voz era alta e clara , praticamente gr ...


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