Fanfic: Felicidade - Vondy | Tema: Dulce, Christopher, Romance, novela

Podia se lembrar do entusiasmo com que certa manhã ela dissera que um beija-flor havia pousado na janela. E então, como se fosse importante, acrescentou: "Oh, seu companheiro também veio! Graças a Deus... o senhor conhece o ditado, não é, que fala dos beija-flores?" `Sozinho, imensa tristeza, com o parceiro, tamanha alegria` ... Já deve ter ouvido, não é?

Ele não comentara nada, não sabia direito o que dizer. Já tinha esquecido de como era falar de coisas simples como pássaros no jardim. Contudo, houvera uma época em sua vida quando...

Não, não podia olhar para trás! Havia disciplina em sua vida agora, uma disciplina sem a qual não poderia existir. Em seus movimentos, sua rotina, haviam limitações impostas pelas circunstâncias. Mas isso era fácil de superar. O que realmente levara tempo e exigira enorme força de vontade fora o treino da mente, a capacidade para limitar suas emoções. Mas conseguira. Sua mente agora percorria somente caminhos conhecidos, nos quais não existia espaço para sentimentalismo.

Dulce Maria era sensível e intuitiva, pudera perceber isso pela maneira como havia encerrado a entrevista, quase como se fosse capaz de ler seus pensamentos. Entretanto, no princípio, não percebera como ela era romântica. Não tinha percebido que naquela casa ela seria como uma lufada de ar fresco, bom de se respirar, impossível de ficar impassível diante dele...

E hoje ele não havia ficado impassível, sentira uma necessidade incrível de se aproximar de Dulce. Mas não aconteceria outra vez.

Não podia acontecer outra vez! Era muito perigoso, demais. Não correria o risco de reviver emoções e pensamentos contra os quais lutara durante cinco anos até obter êxito e afastá-los completamente. Não, não podia se permitir beber daquela fonte suave e refrescante que era Dulce Maria.

— E então? — Dulce olhou o irmão com um ar de expectativa. — O que acha do conde, pelo que lhe contei?

Alan estava esvaziando seu cachimbo no cinzeiro, surpreso com a intensidade da voz da irmã. Ele deu de ombros.

— Bem, é diferente da imagem mental que eu tinha de Jason Jordan. Mas deve ser bom trabalhar para um novelista tão conhecido, não é? Gosto muito dos romances que escreve.

O desapontamento de Dulce foi mais consigo mesma do que com Alan. Tinha a esperança que ele compreendesse a razão de ela estar tão intrigada, mas devia saber que isto não aconteceria. Claro que não havia contado todas as suas impressões sobre o conde, só o bastante para que Alan pudesse formar uma opinião.

A reação dele ao saber da outra identidade do conde foi bastante diferente da de Dulce. Alan havia se impressionado ao saber que sua irmã estava trabalhando para Jason Jordan, mas não pareceu dar muita importância ao fato de Jason Jordan ser também Uckermann, o pintor que poderia ter continuado dando tanto prazer às pessoas se... Mas Alan era assim mesmo.

— Por que se calou de repente? — ele perguntou. — Só faz uma hora que está falando sobre o conde... não vá parar agora!

Dulce sorriu. Fazia mesmo uma hora que falava sobre aquele assunto? Alan já devia estar entediado.

— Sinto muito, Alan. Acho que vou começar a preparar o jantar. Vai demorar um pouco. Quando as crianças voltarão da festa?

— Não se preocupe com eles, pois acho que não terão fome depois de passar a tarde inteira comendo bolo e sorvete! Mas continue, Dulce. O que ia me perguntar? Quero dizer, o que espera que eu comente a respeito de Jason Jordan?

Não havia sentido em continuar aquela conversa. Ela desejara saber a opinião de Alan sobre o conde, suas impressões a respeito dos elementos contraditórios que formavam aquela estranha personalidade.

— Oh, não é nada. Queria só saber se concorda comigo que ele é um homem solitário.

— Me atrevo a dizer que sim — Alan replicou, mais uma vez ocupado com o cachimbo. — Como você mesma disse, ele prefere viver longe das pessoas, não receber visitas e essas coisas. Mas por que está tão interessada? Você não está apaixonada por ele, está?

Para alguém que desejava parar com aquela conversa, Dulce reagiu com surpreendente veemência.

— Não seja ridículo! Ele é um homem casado. Além do mais, não acho que uma pessoa como o conde fosse se interessar por uma mulher como eu.

— Não sei por que diz isso. Aliás, por que você sempre se desvaloriza quando falamos sobre seu poder de atração, sua feminilidade?

— Ora, Alan, você é meu irmão, portanto, espero honestidade de sua parte. Temos de encarar os fatos, não sou exatamente uma mulher bonita, não é?

— Mas o conde não sabe disso.

— Alan...

— Não quis ser rude, Dulce. Tudo que quero dizer é que nem sempre os homens se sentem atraídos pelas mulheres por causa de seus atributos físicos. E você sabe disso tão bem quanto eu. E quanto à sua personalidade encantadora? E quanto à sua sinceridade, sua inteligência, sua paciência?

Paciência! Era justamente o que ela começava a perder agora.

— Você é meu irmão e por isso diz essas coisas.

— Tolice! Por ser seu irmão é que posso ser mais objetivo, pois a conheço melhor! Enquanto ainda estamos no assunto, vou lhe dizer algo. Quem falou que não é uma mulher atraente? Está certo que ultimamente andou engordando um pouco, mas também não se preocupa em cuidar de si mesma, não é? Isto é, se fizesse alguma coisa com o cabelo, se usasse um pouco de maquilagem, tenho certeza de que atrairia muitos homens que...

— ...que mais tarde descobririam que pessoa encantadora eu sou!

— Não era isso que eu pretendia dizer.

— Sei... seria de novo aquela história de "você já tem quase vinte e quatro anos e já está na hora de se casar". — Dulce se levantou e pegou um cigarro. Aquela conversa estava começando a irritá-la demais, coisa que Alan parecia não perceber, ocupado só com seu cachimbo.

— Ah, sim... — ele disse afinal, depois de uma longa pausa. — Agora me lembro do que li... Christopher Uckermann não é casado. Ele se divorciou há algum tempo...

— Tem certeza?

— Ora, você sabe que tenho ótima memória! Tenho certeza de que li isto! Humm... isso mesmo... Uckermann era casado com Françoise alguma coisa, mas ela foi embora com outro homem, alguém envolvido com cinema... Pela foto que vi, ela parecia uma mulher muito bonita.

Dulce olhava fixamente o isqueiro, sem conseguir acender o cigarro que segurava, perturbada demais por aquela notícia. Quando fitou Alan, viu que o irmão a observava com olhar de desaprovação.

— Dulce... você está se apaixonando por esse homem, não é?

— Alan, se tornar a dizer isso eu vou embora e terá de preparar seu jantar sozinho!

— É que faz muito tempo que não a vejo tão... tão excitada. Bem, se quer meu conselho, acho que é melhor acabar com isso enquanto ainda está no princípio. Seria melhor abandonar este serviço imediatamente...

— Com os diabos! Do que está falando? — Ela estava mais perturbada do que nunca. Abandonar o Solar Serena? Como poderia fazer isso, mesmo que quisesse... Contudo, o que ainda lhe restava de calma e paciência foi afinal destruído pelo comentário seguinte de Alan.

— Você não quer se envolver com um homem cego, não é?

— O quê? O que é que uma coisa tem a ver com a outra? — A tranquila Dulce Maria agora explodia de repente.

Alan nem mesmo pareceu envergonhado. Colocou o cachimbo na boca e falou como se fosse um velho experiente, conversando com uma criança de dez anos.

— Agora é você quem está sendo tola, pois sabe a resposta para essa pergunta tão bem quanto eu! Que tipo de vida teria junto de um homem que não pode enxergar? Quero dizer, por que logo ele? Por que se interessar por alguém que...

— Pare com isso! — Ela esmagou o cigarro ainda apagado no cinzeiro. — Vou fazer o jantar. Sinto muito, Alan, mas não desejo mais discutir esse assunto, agora ou nunca. Você não sabe o que está dizendo. — Ela já estava na porta, mais ainda virou-se e fitou o irmão. — Seus comentários sobre Emite são muito desagradáveis. Eles me amedrontam, pois fico me perguntando que valores você usa para julgar um homem!

Ainda estava zangada quando Alan foi até a cozinha, algum tempo depois. Entretanto, sorriu para ele pois era seu irmão e o amava. Eram próximos, muito próximos um do outro, sempre tinha sido assim, mas Dulce sabia que eram diferentes. Havia coisas sobre a natureza humana que Alan jamais compreenderia. Ele colocou o braço sobre seu ombro.

— Sinto muito, Dulce. Acho que não consigo esquecer o meu papel de irmão mais velho.

— Está tudo bem, não se preocupe. — Irmão mais velho? Geralmente era ela quem se sentia muito mais experiente que Alan.

— Ei, você ainda não ouviu a notícia... sobre a empregada!

Dulce se sentiu imediatamente culpada. Desde que chegara tinha tido tanto para falar, que até se esquecera daquele assunto.

— E então, achou alguém!

— Não em definitivo, mas já recebi cinco telefonemas. Há uma senhora que me agradou bastante. É escocesa e disse que viria até aqui na próxima semana. Claro que terei de pagar as despesas de viagem, mas ela pareceu tão simpática ao telefone. O senhor para o qual trabalhava faleceu, mas ela disse que poderia tomar referências com a filha dele.

— Você disse que a casa não é muito grande, mas há duas crianças que precisarão de cuidados?

— Claro que sim.

Sim, era natural. Alan devia ter explicado tudo com detalhes. O bom Alan... o sensível Alan... Era uma pessoa doce à sua própria maneira, mas havia ocasiões em que podia ser muito insensível também. Dulce foi para casa na tarde do dia seguinte, pois precisava pegar mais algumas roupas. Então, num impulso, decidiu visitar Shirley antes de voltar para o Solar Serena. Ainda desejava obter algum outro ponto de vista sobre o conde e dava muito valor à opinião da amiga. Quando atendeu à campainha, Shirley usava luvas de borracha e um grande avental sobre o vestido. Ficou contente em rever Dulce.