Fanfics Brasil - Capítulo 3 - Do Outro Lado do Rio Chaves Revolution

Fanfic: Chaves Revolution | Tema: Chaves


Capítulo: Capítulo 3 - Do Outro Lado do Rio

227 visualizações Denunciar



— Eu passei por um grupo de revolucionários quando estava vindo pra cá — disse Seu Madruga. — Se eles ainda estiverem lá, nós podemos pedir pra nos acompanharem até o outro lado do rio. Vamos pegar o Quico de surpresa, mas isso não quer dizer que ele tenha menos homens ou menos armas.


Chiquinha concordou. Era uma ótima opção. Ela tinha pensado em passar no galpão conseguir mais alguns revolucionários, mas se, como seu pai havia dito, alguns deles estivessem no caminho que tomariam, tudo seria bem mais rápido e a surpresa seria mais efetiva. Esperava que ainda os encontrassem lá.


— Marmota! — Chiquinha gritou para o rapaz que recolhia os corpos. — Quando chegar ao galpão, avise que Chaves estará a caminho em breve.


Marmota sorriu e abanou a cabeça concordando feliz.


— Então vamos! — Ela comandou.


Os três iniciaram a caminhada a passos rápidos na direção que Seu Madruga esperava encontrar o grupo. Disse que provavelmente aquelas pessoas iriam ao galpão, então não deveriam estar longe de onde os três se encontravam agora.


Chaves reparou que Seu Madruga não parecia tão velho quanto ele imaginava que estaria. O velhote estava firme e usava roupas leves que mostravam que, apesar do corpo magro, mantinha-se bem mais saudável do que quando era mais jovem. Entre todas as pessoas que já tinha visto desde que acordara, Seu Madruga era o que menos usava equipamentos de proteção. Usava somente uma camisa de algodão abotoada até metade do peito sobreposta por um colete de couro aberto onde carregava vários objetos presos nas dezenas de bolsos e tiras costurados. A luva e as botas compridas, assim como o capacete, era o que mostrava que pelo menos se preocupava o mínimo com a própria segurança. Levava apenas uma arma: uma pistola dourada e arredondada presa em um coldre amarrado num cinto de couro que atravessava seu peito.


E tinha o braço. O braço mecânico, que misturava peças velhas de cores já desbotadas com peças novas e brilhantes, que Chaves tinha ouvido falar na conversa entre os dois uns minutos antes.


— Esse braço ficou muito legal no senhor! — Disse Chiquinha alisando o braço mecânico de Seu Madruga.


— Senhor é uma ova! — Ele respondeu enquanto acendia um cachimbo que tinha acabado de colocar na boca.


Chaves percebeu que aquilo que Seu Madruga tinha usado para acender o cachimbo era muito parecido com um objeto que ele encontrou no bolso da sua calça enquanto caminhavam pelas ruas ainda próximo ao hospital. Um objeto em formato de um ovo de galinha, dourado como a pistola de seu madruga e com ZAP inscrito em alto-relevo em sua lateral. Quando Seu Madruga apontou a extremidade mais estreita para o cachimbo, Chaves viu uma luz ou fogo azul em formato de lâmina que surgiu e não se apagou com o forte vento que passava por eles. Chegou a se perguntar se ele mesmo fumava, uma vez que tinha um igual aquele.


— Esse braço era do Quico? — Chaves perguntou.


Seu Madruga olhou para ele com desconfiança. Tinha esquecido da falta de memória do rapaz.


— Eu ouvi vocês conversando enquanto brigavam — ele se justificou.


— Eu peguei do Quico sim… — Seu Madruga começou a contar. — Você não lembra mesmo? Não faz muito tempo. Foi quando começaram os sequestros. Eu fui o primeiro a ser sequestrado. Eles estão tentando reaver a área aos poucos. Estão tentando pegar pelas bordas, lá próximo a ponte, áreas que nunca utilizamos. Acreditamos que queiram formar uma base lá em breve. Ficarão bem mais próximos de nós, sem o rio para atrapalhar qualquer movimentação.


Ele puxou a fumaça do cachimbo profundamente, tragou e soltou em um único sopro.


— Eles pediam como resgate uma parte dessa área…


Chiquinha interrompeu:


— E é claro que não entregamos. Pelo menos de início. Meu pai saberia sobreviver até que conseguíssemos resgatá-lo, nós sabíamos. Mas conforme os dias foram passando a preocupação foi aumentando, até o dia que mandaram uma prova de vida.


Ela encarava Chaves nos olhos, pensando que talvez ele se lembrasse desse momento, mas não viu nenhum reconhecimento em seu rosto.


— Eles mandaram em uma mala de viagem o braço do meu pai. Eu e você abrimos juntos e ficamos chocados quando vimos aquele sangue todo ainda fresco. Quase desmaiamos pensando na dor que ele devia ter passado.


Chaves olhou espantado para Seu Madruga.


— Doeu pra caralho! — Contou o velho. — O desgraçado do Quico me torturou psicologicamente enquanto eu estava amarrado todo esticado sobre uma parede. Ele nunca esqueceu do dia que lancei um foguete contra o grupo dele e a explosão acabou atingindo seu braço, tendo que amputá-lo. Sempre colocou a culpa em mim, mas ele que foi burro o suficiente de duvidar que aquele lança-foguetes funcionaria. Depois, cortou meu braço com uma serra. Sinceramente quando terminou o corte eu senti alívio, pois não doía tanto quanto na hora que estava serrando o osso. Talvez também por eu já estar quase desmaiando quando ele terminou — deu mais uma forte e apressada tragada em seu cachimbo. — Quando acordei, eles já tinham cuidado bem do ferimento. Fiquei até impressionado. Acho que sentiram pena, ou até medo da retaliação que poderia vir. Ou, talvez, foram pela primeira vez um pouco humanos. Não sei…


Chiquinha continuou o relato que Chaves não lembrava:


— Nós ficamos desesperados e acabamos concordando em passar uma parte daquela região para eles. Nem a usávamos mesmo e ainda fica longe da ponte, tornando impossível que cheguem até lá sem passar por nossa área antes que construam uma nova ponte. E também é só um pedaço de papel que pode ser rasgado. Valeria a pena. A gente foi lá e assinou os papéis na frente do Quico e então eles soltaram meu pai.


Seu Madruga riu.


— Foi a melhor sensação do mundo. Acho que eu ainda estava sob efeito de alguns remédios e a euforia de estar livre me fez sair correndo e pular em cima do Quico. Não sei de onde eu tirei tanta força naquela hora, mas pisando no tronco dele e usando meu único braço eu consegui arrancar essa belezinha aqui — bateu com a mão normal em seu braço mecânico. — Claro que eu preferia o meu antigo braço, mas eu não poderia deixar quieto — ele olhou para Chiquinha. — E se aquele desgraçado conseguia colocar um braço desses no próprio corpo, por que eu não conseguiria?


Chiquinha abriu um grande sorriso e levantou a mão em um clássico high five.


— Hahahaha. Você é incrível papi! Queria ver a cara dele quando percebeu o próprio braço no inimigo.


Seu madruga bateu na mão da filha.


— Foi impagável. Mas eu também fiquei surpreso quando vi que ele já tinha outro braço no lugar. E um braço muito mais foda do que era esse.


O sorriso de Chiquinha se desfez.


— Mas não vai durar por muito tempo…


Os três continuaram caminhando rapidamente em silêncio por um tempo. Somente o vento e a poeira daquele deserto batendo em seus óculos pareciam fazer algum barulho ali. Chiquinha que não conseguia ficar quieta quebrou o silêncio:


— Pai, ali onde estávamos não era caminho pra você passar se estivesse indo de casa ao galpão. Bom, você estava com a serra, então suponho que tenha vindo de casa. Mas então como o senhor encontrou a gente ali?


Seu Madruga pensou por alguns segundos.


— Não sei. Eu senti que tinha algo errado ali. Me deu uma vontade súbita, como se algo tivesse me chamado para aquele lugar. Quando vi, já estava no meio da poeira e vendo Quico com aquele braço inacreditável apontando pra cabeça do Chaves.


Chaves estava se lembrando da cena. Lembrou-se do sonho que teve.


— Eu tive um apagão naquela hora — Ele disse.


Os dois o olharam inquisidores. Ele continuou:


— Na verdade não foi bem um apagão. Eu tive uma visão… Um sonho naquela hora. Sonhei que pedi para que Jaiminho chamasse o senhor pra me ajudar a bater no Quico.


Os dois ficam encarando Chaves em dúvida. Seu Madruga perguntou:


— Quem é Jaiminho?


Chaves iria começar a falar sobre o carteiro, mas então percebeu que o olhar de Chiquinha e, posteriormente, também o de Seu Madruga focados no horizonte. Ele também olhou. Lá estava um grupo de pouco mais de dez pessoas, caminhando no meio da poeira com suas armas, quase na sua direção. De longe parecia muito com o grupo de Paty, mas assim que se aproximaram Chaves percebeu que aquele grupo conseguia ter uma imagem mais deprimente. Suas roupas eram quase farrapos e as armas que carregavam eram uma anarquia de remendos, além de grandes. Seu Madruga levantou seu braço normal em saudação.


— Salve! — Disse gritando em meio ao barulho que o vento fazia. — Madruga aqui!


Mesmo a distância Chaves percebeu que o corpo das pessoas que vinham se retesou assim que ouviram a menção ao nome do Seu Madruga. Então eles correram em sua direção e o que seguia na frente chegou dizendo:


— Senhor Madruga! Que honra encontrar o senhor! Estamos indo ao galpão para a assembleia! Não imaginávamos encontrá-lo.


Apesar do vocabulário polido, Chaves percebeu que o grupo pertencia a algum lugar distante, como uma vila afastada que vivia com suas próprias regras e com escassez de mantimentos e, talvez, até de recursos naturais. Não só pelo vestuário, mas pela forma que se comportavam, pela magreza de seus corpos e pelo cheiro que sentiu quando chegaram bem próximos.


— Precisamos fazer um desvio por algumas horas — disse Seu Madruga. — Precisamos aproveitar a oportunidade e encurralar o inimigo enquanto temos tempo. Vocês nos apoiam nessa?


— Mas e o encontro no galpão? — Disse o que parecia ser o líder do grupo.


— Ele pode esperar. Não podemos perder a oportunidade que temos agora. E o encontro só vai começar quando Chaves chegar. — Seu Madruga apontou o polegar despretensiosamente para Chaves ao seu lado. — E ele vai pra batalha conosco!


Eles olharam atordoados para Chaves. O líder do grupo se ajoelhou no chão e foi seguido pelos outros.


— Sim, senhor! Iremos para a batalha com o senhor!


Chaves ficou sem graça diante daquela atitude. Por que tinham se ajoelhado à sua frente daquela forma? Achou totalmente desnecessário e, então, fez um leve  e envergonhado gesto com a mão pedindo para que se levantassem. Foi um gesto tão breve que ninguém nem o percebeu.


— Então vamos! — Disse Seu Madruga já caminhando e passando por entre os ajoelhados. — Precisamos nos apressar ou Paty pode não aguentar segurá-los.


Andaram por alguns quilômetros até que os ventos começaram a diminuir. Ao longe era possível ver um grupo de árvores baixas com seus galhos se entrelaçando a ponto de formar uma parede. Tinha um motivo para aquelas árvores ainda estarem vivas no meio daquele deserto: elas ficavam ao lado do rio. Eles chegaram até esta pequena mata e usaram seus galhos emaranhados para atravessar a correnteza, se pendurando e passando com agilidade por um caminho que Seu Madruga já conhecia. Ao chegarem do outro lado do rio, Seu Madruga e Chiquinha arrumaram o mato e os galhos para que ninguém pudesse ver por onde tinham passado. Aquele era um atalho que eles não queriam que os inimigos descobrissem.


Caminharam algum tempo por entre aquela floresta e em breve chegaram a uma paisagem em comum ao lado do rio de que tinham vindo: uma imensidão de terra vazia. Mas pelo menos ali não parecia que ela era tão desolada quanto a que tinham saído. Seu Madruga olhou para o céu e então viu que horas eram em um grande relógio de bolso que carregava dentro do seu colete.


— Espero que uma daquelas geringonças que chamam de carro tenha enguiçado no caminho, ou senão poderemos chegar muito tarde.


Ele disse isso e apressou ainda mais o passo. Todos aumentaram o ritmo.


Chaves percebeu que Chiquinha estava olhando para ele com um de seus revólveres na mão.


— Você ainda lembra como usa isso? — Ela perguntou.


Chaves pegou o grande revólver da mão dela e observou por algum tempo. O tambor era bem maior do que os que lembrava de ter visto na TV, em revistas ou no cinema. Tão grande que precisava de uma estrutura maior para suportá-lo sobre a mesma base de um revólver como conhecia. Essa estrutura fazia com que o cano fosse bem curto a sua frente. Ele passou a mão pela ponta onde deveria sair a bala. Chiquinha lhe disse:


— É bem curto, o que não é bom na precisão. Mas pelo menos as balas são explosivas.


— Acho que posso atirar com ele, sim. — Sentia-se incrivelmente excitado. Não lembrava de ter atirado alguma vez na vida, mas pelo que Chiquinha disse, ele já o havia feito. 


Ela pegou algumas balas que retirou de um bolso preso ao seu cinto e entregou a Chaves.


— Não desperdice! — Ela disse e então deu um risinho.


Caminhando com pressa, ele conseguiu entender a estrutura do revólver e colocar as balas com facilidade, como se já tivesse feito isso muitas e muitas vezes. Assim que fechou o tambor ouviu Chiquinha dizendo:


— Se alguma das balas sair sem pressão e cair logo a sua frente, se jogue no chão por precaução. Isso não tem acontecido com frequência depois que meu pai adaptou o cão, mas nunca é demais contar tudo que pode acontecer…


Agora ele reparava que o cão tinha uma adaptação que ligava diretamente ao cano da arma, improvisadamente amarrado com uma tira de borracha. Não sabia o que aquilo ajudava, mas não entendia muito sobre estruturas de armas. Levantou a cabeça e viu prédios à frente. Não eram muito diferentes dos que tinha visto perto do hospital. Talvez tivessem um ou dois andares a mais e nem todos tinham a aparência de abandonados. Chaves foi sugado de seus pensamentos quando Seu Madruga falou:


— Estão prontos? Vamos correr assim que chegarmos na rua. O bunker do Quico fica a umas quatro quadras daqui, então não podemos correr o risco de que os avisem antes de chegarmos, ok? Corram como se tivessem dois pulmões!


Chaves dá um riso.


— Haha, todos temos dois pulmões!


Seu Madruga bateu as cinzas do seu cachimbo e o guardou em um dos bolsos do colete soltando a última tragada antes de começar a corrida.


— Eu não!


 


Eles correram por entre os prédios baixos, casas e construções inacabadas e não viram uma pessoa nas ruas. Apesar de essa região não ter sido brutalmente arrasada como a região do hospital em que Chaves acordou, as pessoas ainda ficavam reclusas em seus imóveis, evitando sair às ruas por medo ou receio.


Chaves já não estava mais aguentando correr quando começou a ouvir tiros. Estavam vindo de longe, mas percebia que se aproximavam. E eram muitos.


Ao dobrarem uma esquina eles encontraram os guardas de Quico abaixados atrás dos seus carros, de costas para eles. Estavam concentrados nos inimigos que atiravam pelo outro lado e isso alegrou Seu Madruga que pôde se acalmar sabendo que o grupo de Paty tinha chegado a tempo e que eles também.


— Tudo bem — ele disse se abaixando e encostando sobre um muro. — Cuidem com o fogo que pode vir pelo outro lado. O melhor é nos mantermos pelas bordas da rua e assim que eu der o primeiro tiro vocês podem começar.


Todos concordaram com um meneio de cabeça. Seu madruga fez sinal para que alguns atravessassem a rua e então avançou para a retaguarda do grupo de Quico.


Ele deu um tiro com sua pistola dourada e o que saiu dela não pareceu uma bala, mas sim um rastro de fumaça quase sem som que atingiu um dos homens de Quico pelas costas e o fez arquear. Chaves percebeu que o uniforme do guarda começou a derreter e que os cabelos que apareciam em sua nuca começaram a se encolher como se estivessem queimando. O homem gritou, mas Chaves não pôde ouvi-lo por muito tempo, pois na mesma hora o barulho ensurdecedor de vários disparos iniciou-se ao seu lado. Ele levantou o revólver que Chiquinha lhe dera e atirou. Viu uma cabeça que acabava de virar em sua direção explodir. Não soube dizer se foi do tiro que veio da sua arma ou se foi de outra pessoa.


— Meu Deus! — Disse Chaves impressionado. — Balas explosivas…


Então descarregou seu revólver. Os outros cinco tiros foram aleatórios enquanto ele gritava. Viu que um deles acertou o peito de um homem que já atirava contra eles e o fez voar alguns metros batendo forte com suas costas sobre um dos carros. Logo o homem se levantou e saiu rastejando para ficar entre dois carros, com a mão no peito. Chaves não viu sangue, então achava que eles deviam usar uma armadura por debaixo daquele uniforme ridículo. Seus outros tiros acertaram a lataria dos carros e ele viu que suas balas deixavam grandes marcas de queimado onde acertavam.


— Bela pontaria! — Ele ouviu Chiquinha gritar.


A porta de um dos carros se abriu e Quico começou a atirar por ela com seu braço-metralhadora. Não estavam esperando por isso e alguns dos farrapos foram atingidos por seus tiros. Outros escaparam se jogando no chão. Chaves ficou parado como uma estátua.


Não sabia mais o que fazer, estava sem balas. Lembrou que tinha mais algumas no bolso e quando tentou recarregar o revólver ouviu um som estridente, quase como um alarme de emergência. Já tinha ouvido aquilo antes, mas não lembrava o que era. Então olhou para cima, onde tinha percebido uma movimentação estranha e viu um telão no topo do prédio em frente onde estava o grupo de Paty. Provavelmente fosse o bunker de Quico, pois quem aparecia no telão era a velha coroca da mãe dele, agora bem mais velha. E o alarme que ele ouvia não era nada mais do que o próprio grito de Dona Florinda.


— CHEGAAAAA! — Ela gritava e aquele som era amplificado de alguma forma que Chaves não conseguia compreender. Provavelmente tinham muitos alto falantes em volta, pois todos tentavam tapar seus ouvidos diante daquele som estridente e desumano. Assim que o alarme “CHEGA” acabou, ela continuou:


— PAREM COM ESSA BAGUNÇA NA MINHA ÁREA!


Chaves ouviu um barulho diferente agora que os tiros cessaram e que a voz de Dona Florinda se desfazia no ar. Pareciam batidas ritmadas. Então surgiram por detrás do telão três helicópteros.


Eles eram formados por uma espécie de tanque de ferro, com a ponta ovalada e a traseira feitas de madeira. As hélices eram sobrepostas umas às outras e giravam em uma velocidade vertiginosa que quase era impossível vê-las. Assim que essas máquinas passaram por cima de suas cabeças, objetos foram lançados sobre eles.


— Se protejam! — Gritou Seu Madruga se lançando de peito sobre o chão.


Os objetos explodiram. Chaves percebeu que eram apenas de fumaça, provavelmente para assustá-los e para não machucar o filho que estava no meio daquele fogo cruzado. Assim que a fumaça se levantou os gritos de Dona Florinda voltaram a irritar os ouvidos de todos:


— VÃO EMBORA! VOCÊS NÃO DEVERIAM TER VINDO ATÉ AQUI! ESSA É A ÚLTIMA CHANCE QUE EU DOU PARA VOCÊS!


A fumaça começava a se dissipar devido às hélices logo acima, empurrando ar para baixo. Seu Madruga estava se levantando do chão e então gritou em direção ao telão onde estava Dona Florinda.


— Pois se o seu filho mimado não for complicar nossa vida, nós não iremos retrucar, está bem?


Seu Madruga ainda mantinha o braço normal esticado em direção ao telão quando um dos helicópteros desceu do céu e o atingiu com seu bico de madeira. Seu Madruga voou alguns metros e caiu de costas no chão, se apoiando sobre seus braços. O helicóptero ficou flutuando a um metro dele, levantando a poeira com as hélices que agora Chaves podia avaliar melhor. Não eram várias sobrepostas, mas sim uma única hélice em formato de parafuso com quatro ou cinco níveis. Mas o que chamou ainda mais sua atenção foi quando viu dentro do helicóptero. Quem o pilotava era a própria velha carcomida, como eles costumavam chamá-la.


— VÃO EMBORA! E NÃO RETORNEM MAIS, OU ACABAREI COM ESSA GENTALHA!


Seu Madruga acenou com a cabeça concordando e então o helicóptero se afastou da rua. A porta do carro onde estava Quico se abriu e ele, junto com seus guardas, caminharam tranquilamente em direção ao prédio onde deveria estar seu bunker. O grupo de Paty abriu um pequeno espaço apertado para que ele passasse, o que ele fez com todo seu orgulho em tom de provocação. Apesar da vontade de meter uma bala na cabeça do inimigo, todos se seguraram. Sabiam que irritar Dona Florinda seria a pior decisão possível naquele momento.


— VÃO! — Dona Florinda deu seu último grito assim que o último guarda de Quico entrou no prédio fechando a porta atrás de si. Então os helicópteros foram embora e o telão se apagou.


Chiquinha correu até seu pai que se apoiava com o braço mecânico no chão e o normal sobre a barriga, demonstrando em seu rosto uma forte dor.


— Papai!


— Estou bem. Não se preocupe. Já estou acostumado…


Ele queria passar tranquilidade, mas Chaves percebeu a ira nos olhos do homem quando ele olhou na direção onde se foram os helicópteros.


Seu Madruga se levantou com um pouco de dificuldade — talvez pela dor que ainda sentia do impacto com o helicóptero e também por não ter mais um corpo jovem — limpou suas roupas da poeira, batendo com as mãos nelas e se virou ao grupo de revolucionários moribundos que agora se reunia com o grupo de Paty no meio da destruição causada pela batalha.


— Uma assembleia nos espera! Sobre isso — ele aponta com a cabeça em direção ao prédio onde Quico entrou — vamos resolver em um momento mais oportuno.


Todos menearam com a cabeça e então Seu Madruga começou a caminhar rapidamente para fora dali. Mancava um pouco.


Chaves olhou para os corpos estirados no chão. O sem cabeça, que ele mesmo tinha arrancado, e mais dois jaziam ali sem movimento. Curioso perguntou:


— Ele foi embora e nem recolheu os seus mortos?


Chiquinha respondeu:


— Para ver como ele é um grande egoísta filho da puta.


Chaves se encolheu levemente imaginando que Dona Florinda voltaria a gritar no telão caso ouvisse essa última frase de Chiquinha. “NÃO SOU PUTAAAAAA!!!” ela gritaria. Mas nada veio além do silêncio.


— E dos nossos? Alguém morreu? — Perguntou ele.


— Cinco feridos — quem respondeu foi Paty. — Um deles em estado grave — ela apontou com a cabeça a um homem deitado ao chão com uma mulher sobre ele fazendo uma bandagem. — Provavelmente vão ficar um pouco para trás. Não podemos mais atrasar essa assembleia.


Chaves olhou para os dois. Eram dois dos que tinham encontrado pelo caminho e se ajoelhado a sua frente. A mulher o encarou e concordou com a cabeça, dizendo estar de acordo com o que Paty falara.


— Obrigado! — Disse ele para a mulher.


Pensou em como aquele mundo era tão diferente do qual ele lembrava, do qual tinha vivido. Talvez, pensou ele, o mundo era mais inocente quando visto dos olhos de uma criança, e ele não percebia todas aquelas mazelas. Mas alguma coisa lhe dizia que nem sempre o mundo foi assim, e que ele estava mudado. E que deveria encarar essa nova realidade.


Seguindo atrás de todos os cabisbaixos, que já tinham seguido Seu Madruga, ele também se encaminhou para fora daquela vila deixando os dois revolucionários para trás.



Compartilhe este capítulo:

Autor(a): domramone

Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).

Prévia do próximo capítulo

  A caminhada até o galpão foi por ruas principais que desembocavam na ponte. As ruas continuavam desertas e, por vez ou outra, encontravam algumas pessoas que se escondiam assim que os viam. Tiveram alguns encontros com guardas armados de Quico, que utilizavam o traje de marinheiro, e eles cuspiam quando os viam passando. Os revolucionários esta ...


  |  

Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 8



Para comentar, você deve estar logado no site.

  • maryannie Postado em 01/03/2021 - 02:07:49

    Estou amando. Acompanhando ansiosa.

  • maryannie Postado em 21/02/2021 - 15:57:55

    Hoje é domingo e eu preciso de capítulo novo. Kkkk

    • maryannie Postado em 23/02/2021 - 14:23:52

      Ah, feliz que tem capítulo novo! Valeu, vou procurar nas redes sociais.

    • domramone Postado em 23/02/2021 - 14:11:34

      Hey Maryannie, não me mate, mas tive que atrasar um pouco o lançamento desse capítulo em algumas das páginas onde estou publicando. Trabalho e viagens tomam um tempo precioso e eu gosto de conferir se está tudo certinho antes das postagens. Farei o possível para não atrasar mais nenhuminha vez issu issu issu. Se quiser acompanhar a gente nas redes sociais, pode procurar no Instagram ou Facebook por Chaves Revolution. Lá são os primeiros lugares que eu acabo postando. Mas prometo que domingo tem o capítulo novo aqui ;)

  • chander Postado em 20/02/2021 - 07:30:42

    Olá, ramone. Mano! Muito, mas muito top! Esse capítulo ( APESAR DE ENORME), foi muito melhor que o primeiro e sério! Tá dando muita pena do Chavez nesse mundo pós-apocaliptico, onde a infância e a realidade atual se chocam com ferocidade. Acho que o mais maneiro é encaixar uma fala típica do seriado aqui e acolá, demonstrando que os personagens mudaram, sim, mas ainda podemos reconhecê-los facilmente. E mano, no segundo capítulo já esfregar uma beijão gay. NOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOSSSAAAA! A popis nunca me enganou, mas a Paty foi uma surpresa. Só, por favor, eu sei que a proposta é uma coisa mais adulta, mas não sei se tenho psicológico para uma cena de sexo entre chaves e chiquinha. Juro pra você que vou falar disso na terapia por um mês O.O' No mais, já, já, estou de volta. Eu demoro, mas não falho.

    • domramone Postado em 23/02/2021 - 14:14:29

      Ahhh, que bom que gostou. Depois de um primeiro capítulo meio parado as coisas tem que desenvolver né? Os capítulos realmente estão grandes e talvez fosse melhor que eu os tivesse dividido em mais partes. Bom, foi a primeira experiência lançando algo por aqui e agora já sei o que devo fazer nos próximos ;) Obrigado pelo acompanhamento e pelas dicas. Prometo que não irá sair tão traumatizado dessa história. A não ser que você já esteja pensando nessas cenas. Como diria o Jay do Big Mouth "Você imaginou e nós descrevemos" =P

  • maryannie Postado em 02/02/2021 - 00:39:00

    Estou amando! Posta mais!

    • domramone Postado em 02/02/2021 - 09:24:14

      Logo logo... Vou postar capítulo novo todo domingo =D


- Links Patrocinados -

Nossas redes sociais