Fanfics Brasil - Capítulo 9 - O Poder Calvillo Chaves Revolution

Fanfic: Chaves Revolution | Tema: Chaves


Capítulo: Capítulo 9 - O Poder Calvillo

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Girafales já não parecia uma pessoa feliz. Depois de receber a notícia de que o amor da sua vida estava morta, o que ainda poderia representar algum sinal de felicidade em seu rosto se perdeu no meio das suas rugas e olhos cansados.




— Bom... — Começou a dizer o professor. — Todos temos escolhas, né? Infelizmente não tivemos tempo de unirmos nossos ideais de novo...




Chaves achou incrível a forma com que o professor reagiu àquela notícia. Lembrava dos dois enamorados quando ele era apenas um moleque e não conseguia imaginar que eles estivessem separados. Não soube como foi que cada um foi parar de um lado daquela guerra, mas pôde ver na expressão dele que sentia muito e que ainda a amava. De toda a forma, o velho se conteve e voltou aos assuntos que importavam a todos ali.




— Deve ser por esse motivo que o Calvillo está se reunindo com Quico. Percebeu que os maiores exércitos da região foram derrotados ou enfraquecidos após a morte do Senhor Barriga e agora da Dona Florinda. Ele quer aproveitar o momento de fraqueza para dominar a região. E provavelmente o próximo passo será um avanço para cima de nós.




Paty se levantou da cadeira e bateu com o punho fechado sobre a mesa.




— Mas a gente não tem um minuto de paz nessa merda!




Girafales sorriu da atitude enérgica e inesperada de Paty. Ele se abaixou levemente sobre a mesa e abriu uma grande gaveta escondida por baixo dela. De lá retirou um livro encouraçado com o título "O Equilíbrio do Mundo". Colocou-o sobre a mesa e começou a folheá-lo.




— Eu já li esse livro algumas vezes. Tem coisas interessantes e algumas que não entendo. Eu estava lendo nesses últimos dias e comecei a compreender um dos pontos que tinha deixado passar várias vezes. E acho que tem muito a ver com o que você acabou de dizer agora, Paty.




Ela se mostrou confusa. Como assim tinha alguma coisa a ver com aquela reclamação que ela havia feito?




— É um ponto que fala sobre a neutralidade das ações — continuou falando o professor enquanto virava algumas páginas daquele livro, molhando o dedo em sua boca quando uma página insistia em não desgrudar da próxima. — Para tudo existe um elemento neutro, que cria o equilíbrio. Só a partir da destruição desse elemento neutro é que um dos lados consegue se sobrepor ao outro.




Todos olhavam-no tentando compreender o que o professor havia dito.




— Não tô entendendo. — Disse Chiquinha com as mãos apoiando o rosto sobre a mesa. — Como assim?




— Bom, vejam bem. Um caso bem clássico de neutralidade é o sistema capitalista. Os trabalhadores produzem para os patrões. Se eles não produzem, os patrões não podem pagá-los. E nem os patrões podem sobreviver, pois dependem da mão de obra dos trabalhadores. Existe um vínculo que os liga, impedindo que um deles deixe de depender do outro. O que seria esse vínculo?




— Dinheiro? — Seu Madruga arriscou.




O professor balança a cabeça em negativa.




— Trabalho? — Perguntou Chiquinha.




Mais uma vez o professor negou a alternativa.




— A fome! — Disse Chaves com firmeza.




— Exato! — Girafales abriu um sorriso orgulhoso para seu antigo aluno. — A fome obriga os dois grupos e dependerem um do outro. Separados, os dois grupos podem até brigar um pouco contra a fome, mas sabem que é muito mais fácil quando estão juntos. A fome é o efeito neutralizador nesse caso. Se não existisse, provavelmente os trabalhadores se sobressairiam sobre os patrões, pois não dependeriam das ordens deles e tomariam suas próprias ações sem pensar no que comeriam no dia seguinte, pois não seria necessário.




O professor vê que todos mantém uma expressão de dúvida. Mesmo Chaves, que tinha dado a resposta certa, parecia não entender completamente o que Girafales dizia.




— E esses elementos neutros estão em todos os lugares, em quase todas as situações. É claro que não podemos acabar com a fome, mas existem elementos que nós podemos destruir. Na última leitura que fiz desse livro, comecei a acreditar que entre os revolucionários e o pessoal do outro lado do rio há um elemento neutralizador. É isso que justifica a frase que Paty disse revoltada agora a pouco: não importa quantos inimigos derrotemos, pois sempre aparecerá mais um.




Todos olhavam para o professor. Aquilo não justificava muita coisa, e vê-lo acreditar tão piamente em algo assim fazia os líderes da revolução ali reunidos duvidarem da sanidade do velho mestre.




— E o que você diria que seja o nosso elemento neutralizador? — Perguntou seu Madruga. — O que nós devemos combater antes de ter certeza de que vamos nos sobressair sobre os inimigos? É a especulação imobiliária?




O professor aponta o dedo indicador para Madruga, concordando com o que tinha acabado de dizer.




— Isso é uma ótima teoria. Mas isso não é algo que poderemos lutar contra. Ou não sabemos ainda como fazer isso. Tal qual com a fome. Eu tenho a crença de que é algo mais próximo. Algo que está de baixo dos nossos narizes e tão infiltrado em nosso dia a dia que não conseguimos enxergar. Mas se conseguirmos identificá-lo, talvez podemos mudar tudo isso.




Os três esperavam que Girafales continuasse apresentando suas ideias a fim de entenderem melhor aonde ele queria chegar.




— Vejam só: por que nós dificilmente matamos o inimigo? Com exceção do último encontro com o Senhor Barriga, por várias e várias vezes estivemos cara a cara com o líder dos inimigos e não os matamos. Poderíamos ter poupado várias vidas e muito sofrimento se tivéssemos acabado com eles nas oportunidades que surgiram. Mas não o fazemos, e por quê? E isso desde os tempos que a vila ainda existia. Lembra-se, Seu Madruga, que você nunca revidava um dos tapas que Dona Florinda lhe dava?




— Veja bem, professor. Eu não bateria em uma mulher nem com uma flor.




— Acredito que não é bem assim. Aposto que se tivessem mulheres nos exércitos inimigos, assim como é o nosso, você as atacaria com a mesma voracidade que ataca os homens. Por que nunca o fez com Dona Florinda? Ou com Quico? Ou até recentemente com o senhor Barriga? — Ele olha nos olhos de cada um que está em torno da mesa. — Existe uma moral aí. Algo que nos impede. E devemos descobrir que elemento é esse, ou do contrário nunca deixaremos de lutar essa guerra.




Todos se mantiveram calados. Eram absurdos completamente abstratos que o professor havia falado. Voltavam a se questionar internamente sobre a sanidade do velho, mas ao mesmo tempo lembravam-se (com exceção de Chaves) das vezes que Girafales também tinha dito algo completamente absurdo, mas que no final tinha se mostrado verdadeiro. Até que ponto poderiam acreditar que ele ainda mantinha pensamentos coerentes?




Passaram algum tempo quietos, pensando em o que poderia ser o elemento neutralizador que se colocava entre eles e os seus inimigos do outro lado do rio. Com o tempo, e as respostas não aparecendo, todos começaram a dispersar seus pensamentos e logo estavam conversando sobre outras coisas, eventualmente até rindo. Contaram com detalhes para o professor os últimos acontecimentos desde o acidente com Chaves. Girafales ficou particularmente interessado nos sonhos que Chaves vinha tendo desde então, e as ligações que os acontecimentos que ele via em sua cabeça tinham com os do mundo fora dela.




— Noite passada eu sonhei com a Dona Clotilde. No sonho ela apareceu como uma bruxa. Eu fiquei intrigado, pois perguntei para a Chiquinha sobre o paradeiro dela e a Chiquinha me disse que ela morreu faz muitos anos. Eu não lembro disso. Pareço ter mais memórias dela do que os poucos dias que a Chiquinha disse que ela esteve viva na vila.




— Sim, eu lembro da Dona Clotilde — disse o professor. — Eu realmente não lembro como ela morreu, ou quando... Mas foi ali quando estourou a revolução, não?




Aquela discrepância de tempo entre as datas que Chiquinha e o professor Girafales lembravam não fazia sentido. Era uma diferença de mais de dez anos.




— Essa não era a mulher que morava no 71? — Perguntou Paty.




— Isso! — Chiquinha concordou. — Ali entre a minha casa e a da Dona Florinda.




— Pois eu nunca vi quem morava ali. Lembro que a gente dizia que tinha uma bruxa naquela casa. Mas pareceu sempre estar vazia.




A discussão foi se acalorando. Cada um tinha uma percepção diferente sobre aquela mulher. Em meio a tudo isso o professor apenas observava o vazio, em pensamento. Quando as pessoas já estavam ficando com raiva umas das outras, ele falou:




— E se a Dona Clotilde for o elemento neutralizador?




Todos o olharam curiosos. Isso não fazia sentido.




— Vejam bem... — ele continua. — Ela morava entre as casas dos maiores inimigos da vila. Lembro de várias vezes ela interferindo nas discussões de Seu Madruga e Dona Florinda. Sempre apoiava a mãe do Quico quando era algum assunto feminista. E sempre apoiava Seu Madruga em outros assuntos porque demonstrava amar o senhor.




— Me amar? — Perguntou Seu Madruga incrédulo. — Olha mestre, acho que eu não lembro disso...




— Como não? Ela vivia se atirando para cima do senhor, fazendo várias mesuras de amor para conquistá-lo.




— Desculpe, mas eu lembro muito pouco dela. Realmente não lembro dela ter morado na vila por mais do que alguns dias.




Chaves entrou na conversa.




— Eu também lembro dela cantando o Seu Madruga. Várias vezes.




Seu Madruga e Chiquinha se mostraram confusos. Eles não lembravam mesmo daquilo.




— Vocês não acham que tem algo diferente nela? — Perguntou Girafales. — Vocês não pensam que ela pode ser o elemento neutralizador?




— Pfff — seu Madruga quase ri da cara do professor. — Que história é essa? Ela nem está mais aqui, não importa se morreu quando Chaves chegou na vila ou quando a revolução começou. Ela já não existe mais.




— E por acaso alguém viu ou sabe como ela morreu?




A pergunta do professor deixou todos pensativos e em silêncio. Não, ninguém sabia.




— Alguém viu ela morta, ou lembram do velório, de liberarem a casa? Alguém lembra dela indo embora, qualquer coisa?




Mais silêncio. Aos poucos, um a um, todos começaram a balançar a cabeça em negativa. Ninguém tinha nenhuma memória acerca disso.




— Pois bem, eu posso estar sendo enganado pela minha empolgação, mas acredito que ela é responsável por ainda não termos terminado a revolução. Por mais estranho que isso seja na minha cabeça, pois lembro do rosto dela, lembro de como ela se movia, tudo, eu acho que ela nunca foi uma pessoa. Ela talvez fosse apenas uma energia com uma representação humana, para que conseguíssemos ver. Ou nosso cérebro criou seu formato físico para que conseguíssemos interagir com ela.




O silêncio continuou. Ninguém estava acreditando naquela teoria, mas ao mesmo tempo não conseguiam desacreditá-la completamente. O que o professor os dizia fazia bastante sentido em certa parte.




— Chaves — chamou o professor empolgado. — Será que você não conseguiria mais informações nos seus sonhos? Digo, você que trouxe esse assunto agora, pois seu sonho a viu. Mas e se conseguir buscar isso mais profundamente? — Parou e pensou por um breve momento. — Você consegue controlar seus sonhos?




Chaves balançou a cabeça.




— Mas eu quase consegui controlar um dos últimos sonhos. Na verdade, quando achei que estava no comando, percebi que em pouco tempo o sonho me dominou novamente.




— É. Os sonhos são traiçoeiros mesmo. Eu tenho algumas técnicas para sonhos lúcidos. Acredito que podem te ajudar a desenvolver essa forma, já que você parece ter uma predisposição. O que acha de tentar?




Mesmo desconfiando que aquilo não levaria a nada, Chaves aceitou a proposta. Também não perderia muita coisa, além de um pouco de tempo.




— Perfeito! Vou buscar uns livros e materiais e logo volto.




Girafales levantou da mesa quase se arrastando. Chaves pôde ver pela janela que lá fora já tinha anoitecido e ele nem tinha se dado conta de ver o tempo passando tão rápido.




Chaves, Chiquinha e Quico rondavam a casa 71 da vila. Tanto seu Madruga quanto Dona Florinda não foram encontrados em casa por seus filhos e eles, agora preocupados, colocavam a culpa daquela falta na Bruxa do 71. Tentavam olhar pela janela em busca de alguma pista dos desaparecidos, mas era tudo muito escuro lá dentro. Colocaram seus ouvidos sobre a porta para tentar ouvir alguma coisa que se passasse lá dentro, mas ouviam apenas alguns sons e ruídos aleatórios e indistinguíveis. Era ao mesmo tempo assustador e indicava falta de movimentação.




— Acho que vamos ter que entrar. — Disse Quico.




Chaves anuiu. Olhou para Chiquinha e a viu concordando, mesmo que demonstrasse todo seu medo na forma com a qual roía as unhas. Ele, por fim, tomou a iniciativa e agarrou a maçaneta.




A girou.




E ela abriu facilmente.




Foi uma surpresa para os três. Chaves começava a se arrepender de ter aberto aquela porta. Em sua cabeça ela não se abriria, estaria trancada e seria um grande alívio para ele poder dizer "pelo menos eu tentei". Mas agora, para seu desespero, aquela tentativa os levava a um local totalmente desconhecido e assustador.




Assim que abriu totalmente a porta, os três puderam ouvir um zumbido baixo. Era quase como o som que cria a atmosfera de filmes de terror antes de acontecer um ataque surpresa. Viram apenas uma escada que levava ao subterrâneo. Chaves fez o sinal da cruz algumas vezes e depois avançou degrau a degrau.




Dois pontos de luz brilhantes surgiram lá embaixo. Eram como dois olhos. Isso os fez parar por um momento, mas voltaram a avançar quando não perceberam movimento naquilo. Não compensava mais voltar atrás.




Os olhos começaram a se acostumar com aquela escuridão e eles podiam ver pequenas silhuetas de objetos e móveis alguns degraus abaixo onde a escada encontrava o piso. Os dois pontos luminosos se moveram e desapareceram ao lado. Chaves dominado por sua curiosidade, após um momento de hesitação, avançou o restante dos degraus que faltava, podendo em seguida ver uma grande sala mal iluminada naquele subsolo.




— Você tem visitas — Diz uma voz grave que pareceu ter vindo da direção da figura preta de quatro patas que deveria ser a dona daqueles olhos brilhantes que tinham visto na escuridão.




— Obrigado, Satanás! — Disse a bruxa que se encontrava no meio da sala mexendo ininterruptamente seu caldeirão.




Chaves ficou paralisado enquanto via a bruxa contornando o caldeirão e vindo em sua direção. Não sabia dizer se ela caminhava ou flutuava, mas enquanto pensava nisso, viu o braço da velha ser apontado em sua direção e sentiu seu corpo inteiro formigar. A velha chegou mais perto e o agarrou com apenas uma mão. Os dedos magros e frios da bruxa contornaram seu corpo inteiro e o levantaram do chão. Ela o colocou dentro de uma gaiola e fechou a portinha. A velha parecia muito maior agora. Enquanto ela ria, seu gato, o Satanás, ria no mesmo ritmo entrando em uníssono. Ao fundo, Chaves conseguiu discernir uma outra gaiola, esta com um boneco dentro. Um boneco igual o Jaiminho.




Ele tentou virar seu pescoço para baixo para ver seu próprio corpo, mas não conseguiu. Então era isso: ele agora era um boneco.




— Chaves, acorda!




Chaves acordou desesperado e agradecendo seu subconsciente por colocar aquela ordem em sua cabeça em um momento desesperador como aquele.




— O que aconteceu? Foi um sonho?




Ele viu Chiquinha em frente a sua cama perguntando aquilo. Ela carregava a mochila com sua motosserra nas costas e dois rifles amarrados com correias de couro sobre os ombros. Não foi seu subconsciente que o tinha acordado. Tinha sido ela.




— Não — respondeu Chaves com a lentidão de quem acabou de acordar e está se situando. — Quer dizer... Não sei... — Viu a urgência com que ela mexia em caixas e gavetas atrás de armas. — O que está acontecendo?




— Quico! — Ela disse juntando as roupas de Chaves que estavam em um dos cantos do quarto e depois lançando-as sobre a cama. — Atravessou a ponte e está lhe chamando acompanhado de um exército do Calvillo. Disse que a cada cinco minutos que você demorar para chegar lá, ele vai matar alguém.




— Mas que filho da puta! — Chaves quase gritou enquanto se levantava da cama em um pulo. — O que ele quer?




— Não sei. Foram as informações que chegaram dos guardas da fronteira. Mas parece que ele está descontrolado.




Chaves colocou suas roupas com a maior rapidez que conseguiu. Já estava se acostumando a colocá-las e tirá-las, então não foi tão difícil. Pegou seu barril e alguns outros itens que Chiquinha tinha lhe entregado e saíram para fora.




Um grande grupo já se encontrava no meio do galpão, e mais se uniam a ele a cada segundo. Chiquinha já tinha pedido para reunir todas as tropas que conseguissem enquanto corria para acordar Chaves. Este estava impressionado com a prontidão e disponibilidade que os revolucionários tinham.




— Cadê a Paty? — Chaves perguntou.




— Já pedi para irem chamá-la. Ela foi dormir no hospital com a Popis ontem, lembra?




Agora se lembrava. Na noite anterior ficaram até tarde conversando com Girafales na biblioteca. Quando Paty percebeu que não estava fazendo diferença ali, disse que iria para o hospital passar a noite lá. Chaves continuou na biblioteca treinando seu inconsciente para que assumisse o controle de seus sonhos quando precisasse. Lembrando-se daquele último sonho, concluiu que o treinamento não tinha lhe servido de nada até aquela noite.




— Eu vou na frente com quem já conseguimos reunir — disse Chaves. — Quando Paty chegar você leva quem mais se reuniu por aqui. Por fim, vai Paty com quem chegar atrasado.




Chiquinha se mostrou impressionada e depois sorriu. Pareceu que agora estava voltando a reconhecer o Chaves líder daquela revolução.




— Tudo bem! Boa sorte!




Ela lhe deu um beijo e se afastou em seguida lhe dando uma piscada apaixonada. Chaves sentia que realmente a amava.




— Muito bem revolucionários! Vamos chutar a bunda gorda daquele maldito buldogue!




Os gritos explodiram entre aqueles homens, mulheres, jovens e até crianças. Todos estavam felizes por serem guiados por seu líder, e com as armas ao alto eles se encaminharam em direção à ponte.




Por ter acabado de acordar, ou por seu cérebro ter selecionado aquela informação como estupidamente inacreditável, Chaves não lembrava da primeira coisa que tinha ouvido de Chiquinha naquele dia. Mas assim que chegou próximo a ponte ele pôde ver que a ameaça que Quico havia feito estava sendo cumprida. Alguns passos atrás dele, entre Quico e o exército que trouxe, havia uma fila de dezenas de homens e mulheres, todos amarrados mãos a mãos e tornozelos com tornozelos com cordas ou grilhões de ferro. Logo ao lado de Quico duas pilhas de corpos. Também eram dezenas, empilhados e mortos. Então a loucura dele chegava a esse ponto: matar um inocente a cada cinco minutos em que seu pedido não era atendido. Era mesmo um moleque mimado.




Chaves percebeu que já havia um bom número de revolucionários armados encarando o enorme exército à frente, mas mesmo assim não chegava nem próximo ao número de homens que Quico havia trazido.




Uma das revolucionárias vem em sua direção. Traz na mão uma pequena metralhadora e um rifle em sua correia a tiracolo.




— Ainda bem que você chegou. Os desgraçados sequestraram os habitantes das casas mais próximas e os trouxeram para cá. Estão matando um a cada cinco minutos.




Chaves pensou em perguntar quantos já tinham sido mortos, mas aquilo não fazia mais diferença. De qualquer forma, ela não tinha dado espaço para perguntas.




— Nós pensamos algumas vezes em atacar quando ele colocava alguém para matar, mas olhe o tamanho do grupo que ele trouxe. Eu nunca vi tanta gente assim do outro lado. Não teríamos a menor chance contra eles caso decidissem nos atacar. Achamos melhor esperar que você chegasse com reforços.




Ela olhou para trás de Chaves com olhar de desânimo. Estava esperando que ele trouxesse muito mais gente do que ela podia ver.




— O restante do exército está vindo — disse ele para amenizar a descrença da mulher. — Fizeram muito bem. Obrigado.




Chaves a olhou com mais atenção. Parecia que a conhecia de algum lugar. Bom, deveria conhecê-la, é lógico, mas tinha esquecido de quem era, provavelmente. Mas por que então ele não lembrava de nenhum dos outros que via a sua volta?




— Como é seu nome? — Ele perguntou.




Ela riu não acreditando na pergunta. Então pareceu lembrar que a memória do líder estava afetada e lhe respondeu.




— Elizabeth.




O nome também não lhe parecia estranho. Mas aquele momento não era hora de ficar pensando nisso. Ainda sem saber por quê, ele disse à mulher:




— Muito bem, Elizabeth. Uma atitude muito inteligente.




"Pfff, cale a boca Chaves!" ele pensou.




Então viu movimento na fileira do outro lado. Quico mantinha-se parado bem no meio de toda aquela horda e um homem, que havia sido retirado das amarras em um dos cantos daquele paredão de inocentes, estava sendo levado até o líder mimado. Elizabeth falou com urgência na voz.




— Ele disse que mataria uma pessoa a cada cinco minutos que você não se apresentasse bem na frente dele!




Chaves demorou dois segundos para digerir aquela sandice. Então despertou seu corpo e foi a passos largos, a meio trote, na direção de Quico. O refém já tinha sido empurrado e colocado de joelhos à frente de Quico, que portava um revólver na mão normal. Chaves chegou gritando:




— Vamos parar com essa palhaçada?




Quico demonstrou, em uma falsa atuação, que pela primeira vez tinha percebido Chaves ali.




— Palhaçada? — O sorriso sádico que Quico trazia na boca se fechou e ele começou a gritar. — Você não acha que a verdadeira palhaçada é matar a mãe dos outros e depois ainda ir no velório se pagar de santinhoooooOOO?




A cena pareceu engraçada para Chaves, se não fosse a imagem em que Quico congelou segurando o revólver para cima, demonstrando que estava armado. Chaves até tinha esquecido que o inimigo tinha uma metralhadora acoplada no braço.




— Quico, por favor. Eu não matei sua mãe... Ontem você me disse que hoje conversaríamos tranquilamente, então acho que você já está passando dos limites. Você pode soltar os reféns e então trocamos uma ideia até chegarmos a um acordo?




Quico volta a demonstrar seu sorriso sádico.




— Chaves, eu não vou soltá-los enquanto você não chegar...




— Como assim? Eu já estou aqui.




— Nããão... A regra era até você estar bem na minha frente. Atravessando essa linha.




Ainda segurando o revólver, Quico apontou para o chão onde tinha um resto de linha feito por um pé arrastado pela terra, mas que já começava a se desfazer com o vento.




— Eu não acredito que voc... — Chaves foi interrompido por Quico que acabara de olhar o relógio em seu braço normal.




— Cinco minutos!




Chaves não teve nem tempo de perceber o que Quico ia fazer quando este já havia feito. O barulho do tiro do revólver ecoou pelo espaço vazio e continuou ecoando pela cabeça de Chaves enquanto ele via o refém tombando para frente com a cabeça toda aberta. O "bang" ricocheteava em seu crânio não lhe dando espaço nem para pensar. Quando viu, já tinha largado seu barril, atravessado a linha desenhada no chão gritando a plenos pulmões e partindo para cima de Quico para lhe dar um soco.




Parou de repente. Não por vontade própria, mas porque sentiu algo frio segurando seu pescoço. Chaves tinha deixado de pensar naquele braço mecânico e na força e rapidez que ele poderia ter. A mão feita de dedos metálicos apertava sua garganta e o erguia no ar.




— Parece que você não entende quais são as regras do jogo, não é? — Disse Quico encarando Chaves nos olhos. — Eu quero ouvir da sua própria boca que foi você que envenenou minha mãe. Ou me contar quem fez isso, quem seguiu sua ordem. E depois... Depois eu vou jogá-lo junto com aquele monte de estrume que acabei de explodir a cabeça.




O ar de Chaves quase não passava por sua traqueia, mas é claro que Quico não estava apertando muito: queria realmente que Chaves confirmasse sua teoria. Era um desgraçado orgulhoso mesmo. Por isso precisava usar pouca força em sua mão, para que pelo menos Chaves conseguisse falar. Talvez estivesse usando a mínima força que conseguia com aquele braço. Tentando abrir o aperto, com as duas mãos e com as pernas balançando no ar, Chaves falou:




— Você é um desgraçado. Não fui eu que matei a puta da sua mãe, mas quem o fez acabou por fazer um bem a ela. Você deveria ser a maior vergonha de toda a vida que ela teve.




Quico já não mais sorria, apenas segurava Chaves pendurado ali com cara de sério, pensando se esmagava agora seu pescoço ou se ainda tentava arrancar sua confissão antes de matá-lo.




— MATEM TODOS! — Quico gritou repentinamente e seus soldados começaram a avançar, atropelando e passando por cima dos reféns que ainda se mantinham acorrentados e esperando passar seu líder para então começarem a atirar.




Chaves ouviu um potente grito feminino vindo do lado revolucionário. Era a voz de Elizabeth, com certeza. Aquela mulher era muito inteligente e aparentemente muito rápida na estratégia. Chaves entendeu o que a ordem que ela deu queria causar.




— LANCEM AS BOMBAS!




Já parecia estar tudo preparado. As bombas foram lançadas ainda antes que os soldados de Quico pudessem passá-lo, e quando eles conseguiram chegar até seu líder aquelas bombas já haviam explodido e levantado uma poeira cegante no campo de batalha.




— É o fim, Chaves! — Quico disse e então lançou-o sobre o chão alguns metros à frente para puxar seus óculos de aviador e proteger seus olhos.




Chaves puxou todo o ar que os pulmões pediam, mas este veio cheio de poeira e ele tossiu engasgado. Ainda tentava organizar os pensamentos que agora só queriam saber de fazê-lo sugar ar e expelir poeira. Baixou os óculos de aviador em sua cabeça e pensou em procurar seu barril enquanto parecia que ia tossir seus pulmões garganta afora. Perdeu as esperanças de encontrar qualquer coisa no meio daquela poeira.




Mas Quico o encontrou e meteu um chute em suas costelas que o fez levantar uns trinta centímetros do chão.




— Acabou! Está ouvindo?




Os tiros pipocavam. Tiros, bombas, tudo que podia fazer barulho. Pareceu ouvir um barulho de motosserra e ficou feliz em pensar que Chiquinha tinha chegado, mas perdeu essa chispa esperançosa quando imaginou que aquele pequeno ruído poderia ser apenas fruto da sua imaginação. Levou outro chute, dessa vez na boca.




— É o fim, Chaves! Agora que juntei meus homens com o do Senhor Calvillo, nós vamos dominar esse espaço. E em breve dominaremos todo o mundo. Acabar com vocês é só o primeiro passo, e é claro que é o que eu mais sinto prazer em fazer.




Chaves conseguiu controlar sua tosse e sorriu. Seus dentes estavam macabramente vermelhos com o sangue que escorria de sua boca.




— Você acha que aquele velho vai oferecer algo de bom? Ele só está te usando, seu imbecil! Sua mãe não devia deixar ele chegar perto de você para não corromper sua mente de burro. Mas foi só ela morrer e você correu para a boca do lobo.




— JÁ CHEGA! — Quico gritou e apontou o braço metralhadora em direção a Chaves. — Você não merece falar da minha mãe! Eu vou matar você com minhas próprias mãos! — E então riu exageradamente pensando na piada que acabava de fazer.




E com dois tiros em seu flanco, Quico cambaleou para o lado. A poeira já estava começando a baixar e Chaves viu Chiquinha chegando com seu revólver em uma das mãos. Na outra trazia apenas o motor da sua arma favorita, tendo perdido a serra na batalha. Mas não pareceu ter sido em vão, pois o corpo dela estava coberto de sangue.




Chaves percebeu que assim como a poeira diante dos olhos diminuía, o som da batalha também esmaecia. Conseguia agora ver que atrás de Chiquinha alguns vultos corriam na direção da ponte, ou atacando os inimigos ou correndo desesperados em debandada. Por algum estranho milagre os revolucionários pareciam ter vencido. Ele se levantou e ela chegou ao seu lado.




— Você está bem? — Ela perguntou.




Ele concordou com a cabeça. Os dois então olharam para frente e viram Quico rastejando em direção ao seu território, deixando um rasto de sangue por onde conseguiu se locomover durante aquela pequena distração dos dois.




— Atire! — Disse Chaves com firmeza.




Chiquinha fica estagnada.




— Você tem certeza?




— Atire! — Disse ele mais enfático.




Ela levanta o revólver e mira no corpo moribundo se arrastando.




— Você realmente tem certeza? Não vai se arrepender depois?




Chaves arrancou o revólver da mão da companheira e assim que mirou no inimigo sentiu uma mão em seu braço. Olhou para o lado e encontrou seu Madruga.




— Você não precisa fazer isso, Chaves. Olhe para aquele coitado. Ele não tem mais chance. Já perdeu seu exército, perdeu o pouco de autonomia que a mãe se esforçava forçava para que ele acreditasse que tinha... Só está sendo manipulado, antes por sua mãe e o Barriga. Dessa vez por Calvillo, e agora acho que não tem nem mais forças para lutar.




Chaves abaixou o revólver devagar e o entregou ao velho.




— Eu espero nunca mais ver ele na vida. Se o vir, não vou mais hesitar...




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Autor(a): domramone

Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).

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  Quando Paty e o restante do exército chegou na área da batalha já não eram mais necessários os combatentes, mas sim uma quantidade absurda de ajuda para recolher os corpos. Dois pontos foram fundamentais para a vitória dos revolucionários naquela batalha. Os homens de Calvillo, apesar de muito melhor equipados, nunc ...


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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 8



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  • maryannie Postado em 01/03/2021 - 02:07:49

    Estou amando. Acompanhando ansiosa.

  • maryannie Postado em 21/02/2021 - 15:57:55

    Hoje é domingo e eu preciso de capítulo novo. Kkkk

    • maryannie Postado em 23/02/2021 - 14:23:52

      Ah, feliz que tem capítulo novo! Valeu, vou procurar nas redes sociais.

    • domramone Postado em 23/02/2021 - 14:11:34

      Hey Maryannie, não me mate, mas tive que atrasar um pouco o lançamento desse capítulo em algumas das páginas onde estou publicando. Trabalho e viagens tomam um tempo precioso e eu gosto de conferir se está tudo certinho antes das postagens. Farei o possível para não atrasar mais nenhuminha vez issu issu issu. Se quiser acompanhar a gente nas redes sociais, pode procurar no Instagram ou Facebook por Chaves Revolution. Lá são os primeiros lugares que eu acabo postando. Mas prometo que domingo tem o capítulo novo aqui ;)

  • chander Postado em 20/02/2021 - 07:30:42

    Olá, ramone. Mano! Muito, mas muito top! Esse capítulo ( APESAR DE ENORME), foi muito melhor que o primeiro e sério! Tá dando muita pena do Chavez nesse mundo pós-apocaliptico, onde a infância e a realidade atual se chocam com ferocidade. Acho que o mais maneiro é encaixar uma fala típica do seriado aqui e acolá, demonstrando que os personagens mudaram, sim, mas ainda podemos reconhecê-los facilmente. E mano, no segundo capítulo já esfregar uma beijão gay. NOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOSSSAAAA! A popis nunca me enganou, mas a Paty foi uma surpresa. Só, por favor, eu sei que a proposta é uma coisa mais adulta, mas não sei se tenho psicológico para uma cena de sexo entre chaves e chiquinha. Juro pra você que vou falar disso na terapia por um mês O.O' No mais, já, já, estou de volta. Eu demoro, mas não falho.

    • domramone Postado em 23/02/2021 - 14:14:29

      Ahhh, que bom que gostou. Depois de um primeiro capítulo meio parado as coisas tem que desenvolver né? Os capítulos realmente estão grandes e talvez fosse melhor que eu os tivesse dividido em mais partes. Bom, foi a primeira experiência lançando algo por aqui e agora já sei o que devo fazer nos próximos ;) Obrigado pelo acompanhamento e pelas dicas. Prometo que não irá sair tão traumatizado dessa história. A não ser que você já esteja pensando nessas cenas. Como diria o Jay do Big Mouth "Você imaginou e nós descrevemos" =P

  • maryannie Postado em 02/02/2021 - 00:39:00

    Estou amando! Posta mais!

    • domramone Postado em 02/02/2021 - 09:24:14

      Logo logo... Vou postar capítulo novo todo domingo =D


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