Fanfic: O destino nos espera | Tema: The Witcher, The Witcher Netflix, Geralt de Rívia, Jaskier, Fluffy, Sentimentos, Perdão, Drama peque
Jaskier se daria um soco se pudesse.
Ele sempre foi um rapaz muito distraído, de fato, mas sempre se certificou de pegar as coisas das quais necessitava para todas as aventuras que ia, desde suplementos de sobrevivência, como comida, poções e agasalhos, até seus próprios pertences, como suas roupas e seu alaúde, guardando tudo em sacolas e amarrando-os categoricamente na Roach. Jaskier até que era organizado, se lhe permitissem dizer. Entretanto essa organização se foi pelos ares quando, em um misto de decepção, tristeza e vergonha, Jaskier agarrou suas próprias mágoas agravadas pelas palavras de Geralt, e desceu a montanha. Ele apenas queria sair dali o mais rápido possível, dando a tão desejada benção ao bruto Bruxo. Não pensou em comida, nem agasalhos, nem em seu precioso alaúde. Foi apenas depois de um tempo, enquanto seguia seu caminho até o sopé, que ele finalmente sentira falta de sua bagagem.
— Ótimo, Jaskier! – exclamava a si mesmo, chutando fervorosamente algumas pedrinhas pelo caminho – Parabéns por deixar absolutamente todas suas coisas para trás e simplesmente sair correndo como uma criancinha! Seu imbecil! – bateu em sua testa com a palma da mão repetidas vezes, impressionado com sua estupidez.
Observando a vista à sua frente, Jaskier não conseguia frear seus pensamentos sobre seu futuro. Ele foi deixado – ou melhor dizendo, levou a si mesmo – à deriva desse imenso mundo, sem seu alaúde para tocar e compor suas músicas e conseguir dinheiro, sem comida, sem um saco-de-dormir, sem suas sofisticadas roupas, sem perfumes, sem... Geralt. Era estranho, para o bardo, pensar que estaria sozinho dali em diante, depois de tantos anos. Ele se lembrava bem do dia em que avistou o bruxo naquele canto escuro da taverna em Posada, da maneira como a aura misteriosa e indiferente ao local o atraiu. Ele sabia com quem estava se metendo, contudo em nenhum momento hesitou ao pedir para acompanhá-lo em suas caçadas, tornando-o tema principal em suas canções. Não demorou até que Jaskier percebesse que queria Geralt por perto ainda mais, lhe dando a sensação de finalmente importar para alguém.
Seu coração doeu com as lembranças ao pensar no grito enfurecido que Geralt jogou em sua direção, de como ele parecia furioso e convicto de que a culpa para todas as coisas ruins que aconteceram na vida dos dois eram de Jaskier. Não era justo, depois de tanto tempo, de tantas aventuras gloriosas, tantas feridas enfaixadas, tantos alimentos e acampamentos compartilhados, tantos cuidados reconfortantes que significavam imensamente. O bardo chegou a acreditar que o Bruxo já tinha superado a fase “eu não preciso de ninguém”, e então eles poderiam ser considerados, finalmente, amigos. Contudo, respirando rápido, com os punhos cerrados e mandíbula travada, Geralt disse em alto e bom tom: “Se a vida pudesse me dar uma benção...”.
— ... Seria tirar você do meu caminho... – Jaskier sussurrou, peito apertado com a angústia – Bruxo idiota...
Suspirando cansado, ele deixou suas memórias de lado por um pouco, desejando acalmar seus sentimentos. Só então, Jaskier notou o quanto suas pernas doíam e sua cabeça latejava. Ele estava andando sozinho por entre aquelas enormes pedras por horas agora, não sabia exatamente quantas, e ansiava por chegar à estalagem mais próxima logo e finalmente poder descansar, tomar um banho e lavar junto com a sujeira sua tristeza. Jaskier desejou que isso fosse possível. Ele se contentaria em apenas esfregar a sujeira de seu rosto e corpo, no entanto. Conseguir novas roupas, e de preferência um par de botas mais resistentes. Escalar e descer aquela montanha acabaram com o que um dia foram botas em perfeito estado.
Após mais um bom tempo de caminhada, o bardo resolveu que suas pernas não aguentavam mais o peso do seu próprio corpo, parando sua jornada por certo tempo para, pelo menos, recuperar o fôlego e acalmar a dor irritante em seus pés. Ele sentou-se próximo a uma das grandes árvores logo ao lado do caminho, encostando suas costas no tronco e permitindo-se fechar os olhos por um momento. Ele se deixou relaxar, ouvindo o canto dos pássaros e sentindo os ventos lavarem seu rosto, mexendo levemente seu cabelo. O silêncio poderia ser barulhento para sua mente entristecida, mas Jaskier estava cansado demais para pensar em qualquer coisa agora. Ele se contentou em apenas deitar-se ali na calmaria, deixando seu futuro para depois.
Segundos, minutos ou talvez horas tenham se passado, quando Jaskier ouviu o barulho do que parecia ser um galho se quebrando um pouco longe de onde se encontrava. Ele abriu os olhos imediatamente assim que o som chegou aos seus ouvidos, levantando-se em um salto para apoiar-se na árvore atrás dele. Ele não avistou nada em sua volta a princípio, apenas algumas folhas se mexendo com o vento. Poderia muito bem não ser nada, talvez apenas um coelho ou algo do tipo, mas também poderia ser algum monstro, uma fera perigosa e faminta, que estaria na espreita pronta para atacar o primeiro humano que visse pela frente. Obviamente, Jaskier não tardou em pensar no pior, sentindo seu corpo tremer em horror com a possibilidade de seu fim ser ali e agora, sozinho. E ele teria feito o que qualquer humano faria no lugar dele – fugido –, se a próxima coisa que ele visse não fosse um homem forte e corpulento, com suas usuais vestes pretas e cabelos prateados, do lado de sua fiel amiga, Roach, que tinha sacolas e mais sacolas amarradas à sua sela.
— Geralt? – Jaskier disse, confuso e surpreso.
Ele não esperava ver o Bruxo tão cedo, não depois do que aconteceu. Não parecia que Geralt estava apenas passando pelo local, Jaskier constatou, caso contrário não teria desviado do caminho de descida da montanha para ir até a árvore onde Jaskier dormia calmamente. Ele estava simplesmente parado ali, como se esperasse que o bardo despertasse de seu sono, seus olhos âmbar focados na imensidão azul do outro e o silêncio pairando sobre eles. Nenhuma mísera palavra foi pronunciada pelo que pareceram horas, e isso só acabou quando o Bruxo finalmente falou.
— Você deixou suas coisas na Roach – sua voz grave deixando arrepios por onde passou em Jaskier, que sentiu seu estômago revirar. Ele sentiu-se ligeiramente envergonhado.
— Sim, bem... Deixei – Jaskier disse simples, com medo de embolar-se nas palavras.
— E não voltou para buscá-las – Geralt continuou. Jaskier achou que ele só podia estar brincando.
— Veja bem, o plano não era realmente voltar para lá, sabe? – ele riu, um leve gosto amargo em sua voz – Toda aquela história de sair do seu caminho e tudo mais, Geralt. Você foi bem claro quando disse isso a mim.
O bardo notou quando o corpo de Geralt enrijeceu em desconforto, e talvez... arrependimento?
— Você deixou seu alaúde, Jaskier – o bruxo voltou a dizer, e só então nesse momento, Jaskier percebeu que Geralt tinha seu querido instrumento em sua mão, segurando firmemente pelo braço cheio de cordas – Você não sai de lugar algum sem ele.
O bardo não entendeu. Ele podia jurar que suas coisas estariam completamente perdidas, afinal o que impedia Geralt de simplesmente ter jogado a bagagem toda montanha abaixo, talvez até ter pegado a madeira do alaúde para fazer uma fogueira com ela, e, enfim, ter seguido com o seu rumo, esquecendo que Jaskier algum dia, de fato, existiu em sua vida? Não era isso que Geralt sempre quis? Ele ficando longe de seu caminho, fora de suas mãos? Por que ir à sua procura para devolver alguns pertences idiotas, então? Jaskier gostaria de poder entender o que Geralt queria dele. Jaskier precisava de respostas.
— Geralt – o bardo tentou, com um sussurro, tendo a certeza de que o outro realmente o ouviria com sua audição aprimorada de bruxo – Por quê?
Ele viu quando os ombros sempre tão eretos de Geralt se curvaram em derrota brevemente, um leve suspiro saindo de seus lábios e olhos viajando no cenário em que se encontravam, receosos ao voltar seu foco no olhar suplicante de Jaskier. O bardo merecia uma explicação, mas mais do que isso, ele merecia desculpas.
O bruxo percebeu a grande estupidez que havia feito no mesmo instante em que disse aquelas palavras cruéis ao outro. Ele não tinha dedos o suficiente em suas mãos para contar as vezes em que Jaskier cuidou de suas feridas, costurando-as e enfaixando-as com tamanho cuidado que era louvável, além das vezes que conseguiu mais dinheiro para uma estalagem, e todos os serviços que podia oferecer, quando os contratos de Geralt estavam escassos. Jaskier era bom com as pessoas quando Geralt não sabia como, perspicaz quando Geralt era apenas tradicional, animado quando Geralt era rotineiro, gentil quando Geralt era bruto. Opostos, que no final, se completavam. E ao olhar as coisas tão bem organizadas nas costas de Roach, tão diferentes do modo caótico como colocava suas próprias sacolas na égua, Geralt sabia que ele havia ido, mas esperou que Jaskier voltasse para buscá-las. Algum tempo depois, após muita espera, não houve nenhum sinal dele no lugar. Ele havia partido e deixado todos seus pertences para trás, inclusive seu alaúde, Geralt reparou. E isso não deveria doer tanto quanto doeu. Geralt, no entanto, decidiu que não ia deixar que sua raiva e impulsividade o afastasse de Jaskier. Não mais.
— Não parecia certo – Geralt começou, determinado ao olhar novamente aos olhos de Jaskier – Você não estando lá, não era certo. Eu achei que você voltaria, buscaria suas coisas e simplesmente... ficaria, porque a descida era muito difícil e você estaria cansado demais para tentar mais uma vez. E no dia seguinte, você continuaria ficando, porque seria cômodo para você simplesmente descermos juntos e seguirmos pelo mesmo caminho. E então esqueceríamos sobre a montanha e tudo voltaria como antes. Mas você não voltou. E não pegou suas coisas nem seu alaúde.
Jaskier ouvia com atenção, observando em silêncio o quanto Geralt parecia nervoso. Ele tinha certeza de que não se recordava do Bruxo falando tanto em tantos anos de viagens juntos.
— Não podia deixar que ficasse sem eles – Geralt continuou, aproximando-se lentamente do outro – Seus perfumes e vestes sempre foram importantes para você. E isso – ergueu a mão com o instrumento –, Jaskier, você não pode tocar e ganhar suas moedas sem ele. Um bardo sem alaúde é o mesmo que um Bruxo sem seu medalhão – Geralt estava perto o bastante para notar as linhas de expressões que o tempo deixou no belo rosto do homem a frente.
E então Jaskier finalmente entendeu. Nunca foi sobre as bagagens nem sobre o alaúde, sempre foi sobre ele. Geralt não desceu o tortuoso caminho da montanha com seus pertences porque queria se livrar deles. Ele desceu a montanha com eles porque Jaskier precisava deles. Porque eram suas roupas, seus perfumes, seu alaúde, que ele havia conseguido depois de anos de muito esforço. Mas mais do que isso, Jaskier percebeu o que de fato era: um singelo pedido de desculpas. Desculpas por tudo o que lhe foi feito, por tudo o que lhe foi dito.
Jaskier sentiu a mão de Geralt puxar gentilmente a sua, até que ela estivesse no braço do instrumento, a fim de entregar-lhe. Quando Geralt tentou se afastar, porém, o bardo estendeu sua mão e a colocou por cima da do outro envolta da luva, exatamente no lugar em que estava, dando um leve aperto.
— Geralt... – Jaskier o chamou, vislumbrando a esperança por entre os olhos quase dourados do outro – Obrigado.
— Jaskier – ele suspirou, sentindo-se vulnerável – Eu não… Eu nunca quis-
— Ei – o bardo o chamou, sorrindo reconfortante, já mais leve com toda a mágoa e tristeza indo embora para muito longe, afinal agora ele entendia que o bruxo nunca quis realmente machucá-lo. Sempre foram os traumas e inseguranças falando por ele – Está tudo bem. Eu te perdoo.
Jaskier nunca achou que poderia ver o alívio no olhar de alguém como viu naquele momento no bruxo. Ele notou que ele mesmo também estava aliviado com tudo aquilo, não apenas por ter suas coisas de volta, mas por ter Geralt perto de si novamente. A felicidade batia em seu peito com tanto fervor, que Jaskier não pensou quando puxou o bruxo para um abraço forte e aconchegante, passando seus dois braços envolta do pescoço do outro e deixando a Geralt a tarefa de segurar o alaúde no lugar.
Quando finalmente notou o que havia feito, Jaskier tentou se afastar, porém foi impedido por um único braço forte que envolvia sua cintura, deixando-o sem escolha a não ser permanecer naquele abraço incrível que nunca achou que ganharia.
— Não achei que alguém dia desaprovaria você finalmente fazendo o que eu disse para fazer – Geralt confessou, apertando forte e confortador o outro mais perto de si. Jaskier sorriu.
— Não se preocupe, querido amigo Bruxo. Não farei nada do que me disser para fazer de agora em diante – brincou.
— Hm... – resmungou divertido – Eu não disse isso.
— Tudo bem, tudo bem – riu, afastando-se suavemente – Eu agradeço de novo, Geralt. Sabe… por trazer tudo e… pelas desculpas. Fico muito feliz, de verdade – o bardo lançou um singelo olhar a ele, sorrindo carinhoso – Mas então – Jaskier continuou, suas bochechas ligeiramente coradas numa alegria genuína, já pendurando seu precioso instrumento nos ombros – Para onde vamos agora? Eu esperava que nós pudéssemos dar uma paradinha na próxima vila, preciso de um par de botas novas – apontou para os pés, vendo o bruxo rir e assentir.
— Podemos arranjar isso – Geralt concordou.
Juntos, eles caminharam até Roach. O bardo fez um breve carinho em sua crina, ouvindo um relinche contente chegar até si.
— Há tropas de Nilfgaard por todo o continente agora, estão atrás de alguém em especial – Geralt informou, arrumando as rédeas da égua e verificando se as fivelas da sela estavam bem presas – Temos que achar a Criança Surpresa.
— Uau – Jaskier exclamou, já se colocando para caminhar com Geralt e Roach ao seu lado – O destino nos espera, então.
— Sim – o bruxo concordou, olhando ao outro e sorrindo brevemente – O destino nos espera.
Autor(a): estherazzb
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