Fanfic: A Princesa da Escócia | Tema: Reign
Mary tentava entender o que aconteceu com Charlotte.
Ela e Charlotte eram unidas dês do nascimento da mais nova. O reino celebrou tanto o nascimento de Charlotte que o pai teve problemas para encerrar com as festas, já que o povo Escocês não entendia limites. Mary sempre protegia sua espoleta irmã de olhos azuis, olhos que herdara de sua egocêntrica mãe.
Apesar da decepção de não vir o herdeiro varão tão esperado, logo foi superado esse fato quando a Stuart mais nova passou a conquistar todos do castelo. Charlotte poderia ter nascido menina, mas seu coração era valente como o de um garoto, era o que os soldados costumavam dizer. A princesa sempre era vista frequentando o estábulo, ou observando o treino dos guardas, na maioria das vezes estava fugindo das aulas de etiqueta que a mãe obrigara ter. Mary nunca entendia como alguém tão pequeno era tão habilidoso a quebrar regras e fazer o que queria. Charlotte era uma verdadeira escocesa: feroz e de sangue quente.
Aos seis anos Mary foi praticamente vendida pela mãe para a França, tendo que ir embora da Escócia num momento em que o país foi inundado pela guerra contra a Inglaterra. Nunca foi o desejo de Mary abandonar Charlotte, pediu a mãe mil vezes para deixar Charlotte acompanhá-la. Mas a mãe, sempre colocando tudo à frente da família, lhe dizia que Charlotte era o futuro da Escócia caso Mary morresse. Não seria sábio manter as únicas herdeiras do trono juntas, era a desculpa recorrente da mãe das garotas.
No dia da partida de Mary, Charlotte chorou como nunca, a princesa não chorava mesmo quando se machucava em suas aventuras. Mary, como uma boa irmã mais velha, secou suas lagrimas e acalentou a irmã, prometendo que não a esqueceria e que tornariam a ficar juntas novamente.
A última visão que teve da irmã foi ao vê-la pela vidraça da sua carruagem de cabelo castanho como o dela, olhos azuis como gelo, e os lábios formando um "Adeus, Mary".
A garota que chegou da Inglaterra hoje não se parece nada com a irmã que teve que deixar.
–Eu esperava que a princesa foi mais receptiva – Comentou Lola com a rainha e as outras damas de companhia.
Todas estavam no salão principal, conversando sobre o assunto de fofoca de toda a corte francesa.
–Como ela conseguia respirar com aquele vestido? – Perguntou Kenna em um tom de deboche.–Juro que a vi perder a cor antes de deixar a todos daquela maneira.
–Sempre escutei que Charlotte Stuart era a princesa mais querida da Escócia – Disse Greer olhando para Mary. – Ela sempre foi tão séria?
–Não! – Respondeu a rainha tão surpresa quanto suas damas companhias. – Charlotte era muito divertida, receptiva, carinhosa, principalmente comigo. A forma como me tratou foi como...
–Se não fosse sua irmã. – Kenna completou.
–Kenna! – Lola e Greer exclamaram.
–Ela está certa – Admitiu Mary. – Preciso conversar com ela em particular.
Mary saiu do salão decidida resgatar a Charlotte escocesa e apagar a marca que a Inglaterra deixou em sua irmã.
(...)
Um horror. Um tremendo horror.
Os criados da corte terminavam de guardar os itens de Charlotte sob a inspeção da princesa e cada mala desarrumada Charlotte deixava escapar um suspiro desolado.
Os piores vestidos de sua vida tinham sido escolhidos. Percebendo que a corte francesa era ainda mais exigente que os ingleses sabia que seria motivo de chacota ali. Sem contar que morreria de calor. A Inglaterra não era tão quente e seus vestidos eram de mangas até o punho.
–Precisará de vestidos novos, princesa –disse uma criada lhe dando um sorriso triste.
Charlotte foi obrigada a concordar.
Lembrou então de suas vestes mais importante, daquilo que definitivamente não pode ter esquecido na Inglaterra. Procurou sua mala marrom, os criados a encarando com estranheza, mas sem intervir. Só atuavam com a autorização dela.
E de forma alguma ela queria que encontrassem aquilo.
Ser uma princesa requer educação, gentileza, etiqueta e inteligência. Ela acreditava ter essas coisas, mas há um defeito que nunca conseguiu abdicar.
Desde que se lembra sempre foi muito levada. Fugia das aulas de etiqueta para cavalgar com seu irmão bastardo, em lugares bem longe do castelo, adorava ver os guardas do pai treinarem e era reconhecida por muitos deles, assim como os lordes escoceses.
Sua mãe a reprimia, chamando-a de "problema". Comparava-a com Mary, dizendo com orgulho de como a sua irmã mais velha era educada, cortês, tão cheia de honra...
No dia que foi levada do castelo assistiu sua mãe aceitar tudo sem consternação. Era esperado que uma rainha lutasse por sua filha, a segunda da linha de sucessão. Mas Marie de Guisé apenas deixou um beijo em sua testa e virou as costas diante dos gritos da filha.
Sem ordens para agir, os guardas, os membros do palácio ficaram atônicos. Com lagrimas nos olhos assistiram a princesa ser arrastada dali.
E Charlotte cresceu com aquela imagem, com o sentimento de impotência e muito humilhada e mal tratada na Inglaterra.
Queria ser forte como os guerreiros que costumava observar na infância. Então quando foi estabelecida na casa de Elizabeth e viu que a prima mais velha tomou-a sob sua tutela convenceu Lizzie de que precisava treinar. Manejar uma espada como ninguém.
E ainda estava em treinamento. Por isso precisava de sua mala, com as vestes, as botas e a espada que ganhou de Lizzie em seu último aniversário.
Suspirou aliviada ao encontrar a mala quase escondida debaixo da cama.
– Ainda bem! – Soltou em voz alta.
– Ainda bem o que? – Perguntou Mary em sua porta.
Charlotte ergueu a cabeça com os olhos arregalados. Não esperava que Mary fosse procura-la de novo naquele dia, ainda mais pelo jeito frio que a tratou.
–Ainda bem que a cama é macia –Charlotte deu alguns tapinhas. –Não sabia se me colocariam no estabulo.
–Você é irmã da rainha da França –Mary respondeu adentrando no cômodo. –O melhor tratamento está reservado a você.
Charlotte se ergueu e devolveu um sorriso encabulado. Tinha que reconhecer que o quarto que Mary preparou era ainda melhor do que tinha na Inglaterra e tudo era do mais fino bom gosto.
Não merecia toda atenção da irmã.
–Obrigada –Agradeceu com sinceridade. –Eu adorei meu quarto.
–Fico aliviada em saber disso –Mary sorriu com carinho. –Nos deixem sozinhas, por favor.
As criadas saíram em silêncio e Mary se dirigiu ao acento perto da janela.
–Imaginei que queria conversar – Mary sentou confortavelmente. – Ficamos tantos anos sem nos ver, temos muito que pôr em dia.
–Se quisesse saber sobre mim bastava me enviar uma carta –Charlotte cruzou os braços. Se tornar próxima de Mary era a última coisa que Elizabeth queria que Charlotte fizesse.
Precisava se manter firme em sua promessa. Mesmo quando a irmã era gentil demais.
–Poderiam te fazer mentir –Mary rebateu. –Ou não entregar minha correspondência a você.
–Ainda sim seria mais educado do que me arrastar pra cá sem saber se eu queria vir –Naquele instante esqueceu que sua irmã era também sua rainha.
–Charlotte, o que fizeram a você? – Mary perguntou seriamente.
–Não sei o que quer dizer.
–Está não é a minha irmã, parece-me mais uma cópia de Elizabeth Tudor do que a Charlotte que eu amo.
–Então só porque não sou mais a garotinha que ficava mordendo a barra de seu vestido você não me ama? – Cuspiu sentindo seu sangue esquentar.
Elizabeth estava certa, Mary se tornou uma rainha muito prepotente, Charlotte pensou com amargura.
–Claro que não! – Exclamou a rainha parecendo ofendida. – Só que o que eu lembro de você...
–O que lembra de mim, Mary? – Sentiu as lagrimas invadirem seus olhos. – Apague tudo porque essa Charlotte morreu!
–Quem a matou? Maria Tudor ou Elizabeth? – Mary parecia nervosa, proferindo o nome de Elizabeth como se fosse uma maldição.
–A mamãe! – Respondeu Charlotte, deixando Mary surpresa. – No momento que ela me deu a Maria Tudor sem ao menos lutar eu prometi que não seria mais aquela garota idiota que um dia você conheceu.
–Charly, ela não tinha escolha...
–NÃO ME CHAME POR ESSE APELIDO! – Perdeu a cabeça e gritou tão alto que seus pulmões pareciam explodir. – Ela teve uma escolha! E ela sempre escolheu proteger você! Enquanto a mim, oh, quem liga para Charlotte Stuart quando se tem Mary, a rainha da Escócia!
–Eu ligo! – Mary aproximou-se um passo da irmã.
–Não liga! – Negou chorando. – Você quer tirar tudo de Elizabeth! Quer tirar o reino, a coroa, a mim! Só que digo a você, Mary da Escócia, eu não vou permitir que me coloque contra minha prima!
Os olhos castanhos de Mary transbordam em lagrimas, e retirou-se do quarto sem dizer mais uma palavra.
(...)
Bash nunca pode agradecer ao pai por tê-lo nomeado Lorde da cavalaria.
Uma confusão sem tamanho. O pai, enlouquecido com a possibilidade de perder o trono inglês e com receio de Bash ainda lutar por amor de Mary, o forçou a se casar com Kenna e encerrar o assunto entre ele e a Rainha Escocesa de uma vez. Quando Lady Kenna protestou, pois seu amante prometeu-lhe alguém com títulos, O Rei lhe deu um título imaginário, que não teria valor algum e era motivo de chacota por todo reino.
Ainda sim Bash prestou seu serviço com louvor e os cavalos do castelo nunca foram tão bem cuidados.
Passou a gostar de cavalos e nunca deixou a responsabilidade mesmo quando Francis o colocou como um conselheiro, lhe deu terras e títulos e livrou Kenna e Bash daquele casamento terrível.
E geralmente o bastardo gostava de cuidar dos cavalos. Mas aquele cavalo negro que trouxe a irmã de Mary, era extremamente temperamental.
–Ande, sua criatura estupida! –Bash tentou novamente empurrá-lo pra dentro do estabulo. –Já estamos há uma hora nesse jogo e não há nada pra você aqui fora.
O cavalo não saiu do lugar e ainda relinchou. Bash insistiu mais uma vez e estava quase desistindo quando um grito feminino chamou sua atenção.
E virando-se na direção do grito viu Charlotte Stuart andando até ele.
A princesa parecia mais um soldado marchando até o inimigo. Se tivesse uma espada em mãos com certeza atravessaria nele quando a oportunidade surgisse.
– O que está fazendo? –Os olhos azuis da garota o fuzilaram.
Chegou até o cavalo e acariciou sua crina, os olhos refletindo uma preocupação que pouco era vista em alguém da nobreza.
O bastardo a olhou aborrecido, pelo suor em seu rosto ele estava a algum tempo tentando acalmar o cavalo.
–Essa besta não quer entrar no estabulo de jeito nenhum – Respondeu Bash passando a mão pelo cabelo, tentando arrumá-lo.
–Ele está nervoso –Charlotte explicou.
–Isso posso notar –respondeu irônico.
–Converse com ele.
–Conversar com o cavalo? –Bash fez careta.
–O nome dele é Faísca –O olhar aborrecido que Charlotte lhe deu fez o homem entender que ela não aceitaria que seu Faísca não fosse tratado com respeito –E ele não gosta de receber ordens de um estranho. Se coloque no lugar dele, imagine o quão terrível seria ir a um país que não conhece, não ter sequer um amigo e então um estranho é rude com você. Ficaria calmo nesta situação?
–Nunca pensei que cavalos pudessem ter tantos sentimentos.
–Então não reparou neles –A princesa petulante revirou os olhos.
E ele gostou disso. Gostou que ela se importasse com a vida do animal. Gostou ainda mais que parecesse disposta a soca-lo se ele voltasse a tratar seu cavalo de modo rude.
–Corrigirei meu erro –Bash olhou para o cavalo e fez uma mesura perfeita –Me desculpe, Faísca.
–Não precisa se preocupar com ele. Até que ele se acostume, fico responsável por acomodá-lo no estabulo -Charlotte tomou as rédeas da mão de Bash.
–E irá deixar suas obrigações reais para dar atenção a um cavalo?
–É meu tutor agora? Vai ditar o que posso ou não fazer? –A princesa apertou os olhos em sua direção.
–Desculpe, não fui nomeado para isso –Bash retomou as rédeas –Mas fui nomeado para lorde da cavalaria, portanto este trabalho é meu e eu não abro mão.
–Lorde da cavalaria? Isso sequer existe –Charlotte riu.
–Aqui existe e está no meu território, princesa, portanto não tem poder de tirar a responsabilidade que o rei delegou a mim.
O rei. A menção a Francis fez a princesa entender que não poderia questionar a palavra do rei.
–Está bem, seja gentil –Ela odiou dar-se por vencida.
–Lembrarei disso.
–Posso me despedir dele?
–Claro.
–Não tive tempo para confortá-lo, mas não esqueci de você – Charlotte acariciava seu dorso e sua voz carinhosa realmente transformou a besta teimosa em um potro inofensivo. –Amanhã conheceremos este lugar e prometo lhe trazer muitas maças. – Charlotte levantou os olhos a Bash e a doçura dissipou-se. –E se esse Lorde da Cavalaria não for gentil com você, diga-me, que ele sofrerá as consequências.
–E de que forma ele vai te dizer? –Ele segurou sua risada.
–Não é da sua conta, milorde –Charlotte usou o título como xingamento.
–Bash. Me chame de Bash.
–Por que faria isso? Não somos amigos.
–Mas podemos ser –Ofereceu gostando do jeito tempestivo da princesa –Posso te mostrar o lugar amanhã. Sou um ótimo guia.
–É lorde disso também? –Charlotte não segurou a língua.
–Infelizmente ainda não fui reconhecido por minhas habilidades nisso –Bash coçou a cabeça.
Aquela princesinha não era um doce ou recatada como as outras. E isso mexia um pouco com seus nervos.
Fora que ela era muito bonita. Aqueles olhos verdes e o sorriso travesso...
–Então creio que não seja tão bom –Charlotte mordeu o lábio inferior, escondendo seu sorriso.
–Venha amanhã e descobrira –Em vez de responder a provocação preferiu insistir em seu pedido.
–Certo, nove horas –Ela deixou um último beijo na face de Faísca e depois apontou para o rapaz. –Não me faça esperar. Sei que franceses tem a fama de serem preguiçosos.
–E escoceses de serem bárbaros, mas espero que se comporte bem.
Aquilo arrancou uma risada alta da princesa. E Bash ficou surpreso em se pegar sorrindo também.
–Adeus, Lorde Bash –Charlotte fez uma mesura rápida.
–Adeus, princesa Charlotte –Ele tomou a mão dela e depositou um beijo longo entre seus dedos.
Ela correu antes que Bash percebesse o tom rosado de suas bochechas. Ela tinha decidido em sua chegada que ficaria longe dele. Mas se queria seu cavalo bem cuidado teria que falar com o Lorde da Cavalaria.
E seria bom ter um amigo na França. Não importa que fosse lindo de morrer e seus olhos eram azuis demais pro seu próprio bem.
Charlotte nunca foi de ter amigos além de Elizabeth. Seria bom saber como era conversar com alguém que não fosse da família.
Faria de Bash seu amigo na França. E apenas isso.
Autor(a): blacksweetheart
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