Fanfics Brasil - Capítulo Único. The Prince

Fanfic: The Prince | Tema: Horror, Gore, Terror, Lovecraft, Cthulhu, Deuses antigos


Capítulo: Capítulo Único.

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  "Shiiiu...!" Sussurrei pondo meu dedo magro em frente aos lábios, pedindo silêncio.  


  Minha irmãzinha, que acabava de passar a perna esquerda pela janela baixa do nosso casebre me olhou com grandes olhos assustados, ficou estática como um gato empertigado esperando por algum barulho em resposta ao estrondo de vidro quebrado que tinha causado.  


  Ela havia acabado de derrubar, do lado de dentro da casa, a lamparina que havia dado a ela para levar em nosso passeio.  


  — Desculpe... - Disse em um fio de voz, podia ver lágrimas se formando nos redondos olhos infantis.  


  Bati com a mão em minha testa e suspirei. Coloquei minha própria lamparina encostada em uma pedra e fui ajudar suas perninhas curtas, cobertas pela camisola branca, a tocarem no chão barrento gramado.  


  Era noite, estávamos descalças e havia chovido a pouco, papai devia estar cansado demais depois de um dia cheio na alfaiataria para acordar com aquele barulho.  


  Estiquei a mão para Pat que agarrou com seus diminutos dedos gorduchos. — Está pronta?! - Perguntei baixinho. 


  Suas bochechas pareciam ainda mais vermelhas, pela vergonha que havia acabado de passar, quando balançou a cabeça de um lado para o outro em negativa.  


  — A... Pat, vamos lá! - Exclamei perto de seu ouvido, baixo o suficiente para que só ela escutasse. — Você não quer ganhar o presente? Tudo bem... Eu posso dar pra outra pessoa... Quem sabe, talvez Isabel goste mais, a filha da costureira. 


  — Não! - Bateu o pé. — Eu vou! É que... - Deu uma olhada na trilha que se seguia a nossa frente, na escuridão e barulho de animais que surgia do meio das árvores. Ela se pôs um pouco mais atrás de mim e se agarrou em minha camisola.  


  Abaixei até ficar na sua altura e sussurrei em sua orelha gelada. — Eu estou aqui. É só me dar a mão... - Segurei as suas mãos entre as minhas. — Que nada de ruim vai acontecer.  


  Capturei seus olhos medrosos com os meus, tentando lhe passar confiança, recebi um aceno de cabeça tímido como resposta.  


  Sorri para ela. — Então vamos!  


  A puxei pelo braço floresta a dentro, tendo a certeza de que ela me seguia pelo barulho ritmado que seus pés faziam na terra encharcada ao correr atrás de mim.  


  Passamos alguns minutos correndo juntas, até que comecei a reconhecer as árvores que havia feito um pequeno talho, no começo da semana, marcando o caminho.  


  Diminuí o ritmo dos meus passos, fazendo com que a minha irmãzinha se chocasse contra as minhas costas. Amparei ela antes que fosse com os rosto de encontro ao chão.  


  — Pat! Presta atenção! - Dei uma bronca nela em tom irritado, como sempre fazia. Já sem medo de que a minha voz fosse escutada por outra pessoa, estando longe o suficiente da aldeia para saber que não teria ninguém por perto àquela hora.  


  Ela se equilibrou e firmou os pés no chão, antes que eu a soltasse, me pedindo desculpas com um tom choroso.  


  — Não, não, não. Tudo bem! - Disse segurando seu rosto entre minhas mãos, para lhe passar confiança e evitar que ela chorasse. — Está tudo bem! Não me machucou. Eu que tenho que pedir desculpas, parei de repente. É que, Pat... O que vou te mostrar é um segredo! - Falei a última frase baixinho e continuei. — Um segredo de irmãs! E só vou te mostrar por que hoje você está fazendo sete anos é já é grande e esperta o suficiente para ver! 


  Toda a sua feição se iluminou. — Grande que nem você?! - Perguntou com admiração.   


  — Grande que nem eu! - Respondi, dando um grande sorriso, mostrando as duas janelinhas de dentes faltando, com toda a confiança que os meus dez anos me conferiam.  


  Segurei sua mão e continuamos caminhando mata a dentro, nosso caminho sendo iluminado apenas pela luz tremula da minha lamparina e alguns poucos raios da lua que conseguiam passar por entre as folhas das árvores de copas altas.  


  — Mana... - Pat começou. — E o que é que é? Essa coisa que a gente vai ver?  


  — É a coisa mais linda que você já viu na vida. - Respondi, sem tirar os olhos dos símbolos que eu havia gravado, que agora pareciam reluzir a luz da lua.  


  Garotinha mordeu os lábios e arriscou um palpite: — Mais lindo que um príncipe?! - A última palavra saiu completamente embolada, a pouca idade e experiência com palavras complicadas faziam com que algumas saíssem de uma forma peculiar e engraçada.  


  Ri com a sua esperteza e passei a mão pelos seus cabelos. — Exatamente isso! O príncipe mais lindo do universo! E ele está esperando por nós! - Disse animada, enquanto passávamos pela última árvore marcada.  


  Minha irmã se animou com a ideia também e se pôs mais a frente, me puxando dessa vez. — Então vamos! Quero encontrar ele logo e pedir uma coroa de aniversário, e... Que nós sejamos felizes para sempre!  


  Sorri e concordei. — Já estamos quase lá.  


  Andamos por mais alguns metros, passando por raízes traiçoeiras de árvores e alguns cipós que caíam ao nosso entorno. Ao longe conseguia ouvir o barulho de água corrente e o cheiro da chuva que se formava novamente.  


  A floresta se abriu em uma pequena clareira rochosa mais a frente, e eu nos guiei até lá, vendo o símbolo complexo riscado em giz em uma grande pedra.  


  — Chegamos. - Anunciei alto, lançando meu olhar por de trás das rochas. Limpei minhas mãos suadas no comprimento da minha camisola.  


  Pat me observou e esticou o pescoço para tentar enxergar na direção em que eu espiava.  


  Não tive nenhuma resposta.  


  Minha irmãzinha animada, colocou as duas mãos em cone na frente da boca, e também tentou. — Estamos aqui, senhor príncipe! - Sua voz infantil e estridente reverberou pela floresta.  


  Longos segundos de silêncio se passaram...  


  ... Até que tivemos resposta.  


  Uma voz grave, mas ao mesmo tempo doce surgiu da escuridão. — Você voltou... E trouxe ela com você. 


  Minha irmã virou para mim animada, seus lábios formaram uma pergunta sem som: "É ele?", acenei com a cabeça para cima e para baixo.  


  Ela sorriu e fez menção de se aproximar das pedras, eu a encorajei com um pequeno aceno.  


  — Viola... - A voz chamou por mim. — Você demorou. Mas valeu a pena a espera, ela é adorável.  


  Pat reconheceu que a voz falava dela e balançou a sua camisola branca com as mãos, envergonhada. Sua figura rechonchuda estava com as faces rosadas à luz da lua — Obrigada! - Minhas mãos continuavam a suar pelo nervosismo, enquanto eu observava minha irmã começar uma conversa. — Mas e você?! A mana falou que você é um belo príncipe.  


  — De fato eu sou. - Riu. — E ela me contou que está fazendo aniversário hoje. É verdade?  


  — É!  A mana não mente! - Pat gargalhou. 


  — Quantos anos? - A pergunta veio grave.  


  — Seis! - Respondeu, mostrando cinco dedos de uma mão e um dedo da outra para as rochas.  


  — Sete. - Corrigi, mordendo a parte interna das bochechas.  


  — Sete! - Ela confirmou, estendendo mais um dedo.  


  — Ela realmente não mente. - Concluiu a voz masculina. O brilho nas runas marcadas na pedra se intensificava, mas Pat parecia não notar isso, entretida demais com a conversa para perceber.  


  — E você, Sr.Voz? Já é um príncipe crescido? Um príncipe grande? Quantos anos tem? - disparou as perguntas curiosa, perto o suficiente das pedras para tocá-las, inclinando o corpo para frente para tentar enxergar de onde vinham as palavras.  


  — Eu tenho tantos anos que não consigo me lembrar de todos eles. Já sou grande o suficiente e crescido o bastante para ser maior do que qualquer um que já tenha imaginado. - Um cheiro de mirra e incenso começou a irritar o meu nariz, a voz continuou. — Ouvi um segredo. A senhorita tem um desejo, e eu pergunto: O que deseja de mim?  


  Me ajoelhei na grama quando a pergunta veio e estendi minhas mãos em reverência.  


  Pat ainda encarava confusa a escuridão, tentando entender o que a voz queria dizer com aquilo. — E-eu quero uma coroa de princesa...  


  A interrompi antes que pudesse terminar a frase, cortando-a com minhas palavras venenosas. — Eu desejo e ofereço esse sacrifício ao Deus que tudo vê, para que meu pai tenha descanso do fardo de ter que cuidar da minha irmã mais nova... - Pat se virou para mim, estática e com os olhos cheios de lágrimas.  


  — Para Viola, não tem graça! Vou contar pro papai. - Gritou com a vozinha chorosa.  


  — ... E que nunca mais falte comida em nossa mesa por sua causa, nem que eu tenha que repartir nada com ela... - Pedi ao vento, com as mãos unidas sobre o peito.  


  — Mana! Para com isso! - Esperneou, batendo os pés no chão e tremendo de medo ao encarar minha expressão devota.  


  — ...Que ela queime do inferno por ter matado a mamãe. Faça com que a minha mamãe volte. - Declarei, tirando o peso dos desejos que tinham se instalado por anos em meu coração. Minha irmãzinha tentou ir até mim, mas caiu de joelhos logo nos primeiros passos ao tropeçar em uma grossa raiz de arvore.  


  A terra em meus pés começou a vibrar, lançando uma sensação de tremor para todo o meu corpo, enquanto as rochas pesadas estalavam e abriam grossas estrias de dentro dela.  


  De lá o ser mais perfeito que eu já havia visto surgiu. Eu nem poderia tentar descrever o que meus olhos captavam de sua imagem, pois eram muitas informações para serem percebidas de uma só vez. Acredito que mesmo se passasse uma eternidade o admirando ainda assim não conseguiria vê-lo por completo.  


  Uma infinidade de olhos envoltos por uma massa arroxeada, do que seria o seu corpo, estavam envolvendo o grande olho amarelo vidrado que não piscava um só segundo, ele pairava por entre as pedras sem encostar no chão e sem emitir som nenhum ao se deslocar.  


  — Que assim seja. - Me respondeu, meu príncipe lindo. Ele realizaria meus desejos e tiraria aquela coisinha egoísta da minha vida, que havia levado a vida da minha mãe quando nasceu. — Agora vá. Vá e poderá viver a vida que merece. - Disse ele. Um líquido grosso e amarelado, do que eu imaginei ser uma lágrima, reluziu em seu grande olho. Ele pairou até ficar em cima de Pat, catatônica no chão, e deixou que a grande lágrima escorresse em cima dela.  


  Pat estava em uma espécie de transe. Bolhas grandes e inchadas começaram a se espalhar por seu corpo, sua própria camisola branca se desfez em pedaços me dando visão de sua pele arroxeada e retorcida pelo líquido, pequenos olhos começavam a brotar de todos os lugares, até que toda a extensão seu corpo fosse um amontoado de globos oculares envolvidos por carne roxa que olhavam compulsivamente para todas as direções.  


  Dei um grito pelo horror da cena, me arrependendo e tapando minha boca logo em seguida, dando passos para trás.  


  Todos os olhos da coisa que antes era a minha irmãzinha olharam em direção do barulho e se vidraram em mim.  


  — Vá. - O grande príncipe falou. — Antes que sua irmã possa fazer um desejo também.  


  Não precisei de mais do que isso para martelar meus pés no chão com toda a força que tinha em meu corpo, me afastando dos dois e correndo em direção a minha casa.  


  Minha casa. Não mais minha e dela.  


  Papai sofreria no começo, mas logo se esqueceria daquela ratinha que roubava comida de nossa mesa e que havia tirado mamãe de nós.  


  Ele teria mais tempo para ficar comigo e tudo voltaria a ser o que era antes. Não precisaria acabar seus dias na alfaiataria para atender a gula e os caprichos dela.  


  E mamãe... Ela estaria conosco de novo. Eu poderia finalmente abraçá-la e beijá-la novamente. 


  Impulsionei meu corpo para frente, não conseguia tirar o sorriso de meu rosto enquanto desviava das árvores e arbustos no caminho, será que ela já estava em casa me esperando?! 


  Não fazia ideia de quanto tempo demoraria para que ele a trouxesse de volta, mas desejei com todo o coração para que ela já estivesse lá quando eu chegasse, com os braços abertos na varanda pronta para me dar um primeiro abraço de muitos. 


  Meu coração martelava contra o peito à medida que me aproximava da casa. Estava eufórica sem me importar com as pedras que feriam meus pés e os galhos de árvores que deixavam vergões em meus braços, quase não notei o rastro de fumaça que se desprendia ao longe.  


  Quase...  


  Meus passos foram diminuindo à medida que o grande incêndio podia ser percebido entre as poucas árvores que agora separavam o início da floresta até a trilha até minha casa.  


  Em chamas... Minha casa estava ardendo em chamas. A estrutura de pedra estava incandescente, as poucas vigas de madeira crepitavam e desabavam umas sobre as outras, levantando uma nuvem de fagulhas de palha carbonizada.  


  — Papai! - Gritei, pensando em meu pai que dormia em sono profundo quando nós duas havíamos deixado a casa. Corri com todas as minhas forças até o mais próximo do incêndio que conseguia, tapando o rosto com o antebraço por conta do calor intenso. Soltei mais um berro que poderia ter levado meus pulmões junto. — Papai!  


  Olhei para casa, tentando reconhecer algum cômodo consumido ou a sua figura por entre as chamas. Gritei novamente, na esperança que ele me respondesse.  


  Até que vi uma silhueta, saindo de um lugar por entre as chamas, sem que elas lhe tocassem.  


  — Mamãe... - Sussurrei com a realização da imagem de minha mãe saindo por entre o fogo... Ou o que havia sobrado dela.  


  Os grandes cabelos ruivos haviam crescido até encostar no chão e se confundiam com as chamas vermelhas que consumiam tudo ao seu redor, sua pele descorada e putrefata estava manchada. Vários buracos haviam sido feitos no vestido que ela usava, o mesmo que ela havia sido enterrada, e de lá vermes gordos escapavam andando livremente, agarrados a sua pele. Subi o olhar até seu rosto descarnado e não contive meu horror ao olhar para os buracos vazios e fundos de onde deveriam estar os seus olhos.  


  Dei alguns passos para trás tentando ir para longe da coisa que um dia foi a minha mãe, minhas pernas falharam e caí de bunda no chão, algo molhava a minha camisola, não consegui chegar ao raciocínio que aquilo era a minha própria urina.  


  — O que foi querida?! - Perguntou a coisa, sua mandíbula deslocou e ficou suspensa após a frase, a arcada dentária apodrecida balançava quando a coisa tentava falar as palavras guturais. — Vem dar um abraço na mamãe!  


  Esticou os dois braços para mim, me chamando.  


  — Querida, não seja tímida. Assim você magoa a mamãe. - Disse em tom de desaprovação. — Sua irmãzinha fez um bom trabalho ao derrubar a lamparina. O papai nem sentiu tanto quando o fogo embalou seus sonhos, ele já está esperando a gente na nossa nova casa. Agora... Onde está a minha pequena Pat, que eu não pude conhecer ainda? E por que você e sua irmã estavam brincando até tarde na floresta?  


  Perguntou saindo do fogo e se aproximando. O cheiro de carne podre queimada fez com que refluxo inundasse a minha boca.  


  — Oh... Viola, você é a irmã mais velha. Se algo acontecer com a sua irmã a responsabilidade vai ser sua. - Ela chegou tão perto que encostou sua mão em meu rosto, transferindo um verme gosmento para a minha bochecha. Do buraco negro que pendia sua mandíbula saiu uma voz que me fez desmaiar. — Viola... Onde está a minha garotinha...? 


 


 



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Autor(a): laresssa

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