Fanfics Brasil - Império Perigosas Lembranças

Fanfic: Perigosas Lembranças | Tema: Amnésia


Capítulo: Império

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Letícia contemplava do vidro da janela da limusine o conjunto de prédios que formavam a matriz da Multinacional Dell Fontes. Era uma estrutura enorme e muito bem desenhada, lembrava vagamente o estilo arquitetônico de Oscar Niemeyer.


Suas pernas tremiam e o coração batia acelerado, não pela edificação, e sim por seu dono. Ricardo a convidou para que fosse ali, a fim de lhe mostrar parte de seu império e almoçassem juntos; ela não resistiu ao convite, queria estar ao lado do marido o máximo de tempo que pudesse, sentia muito sua falta nas horas em que ficavam distantes. Além disso, finalmente solicitariam nova senha de seu cartão no banco.


Era sexta-feira, fazia uma semana que estava “de namoro” com Ricardo. Não haviam ido além de beijos, abraços e carícias; Letícia não se sentia pronta a voltar a ter relações sexuais com ele. Sempre que estavam em meio a fervorosos beijos e amassos, paralisava e barrava os avanços do esposo.


Não podia controlar; era uma espécie de medo que lhe vinha de repente e interpunha-se entre eles. Frustrava-se quando ocorria, não tanto por si mesma e sim por Ricardo. Sabia que para ele era mais difícil não consumarem a relação; devia ser frustrante ter seus desejos negados, por mais que a respeitasse. Mesmo assim, ele não se aborrecia, pelo menos não o demonstrava, como se entendesse seu conflito interior.


Qual era seu problema? Ricardo era seu marido. Não um canalha qualquer que sumiria no meio da noite ao conseguir obter o prazer que queria; tampouco, ela era uma donzela do século passado que se perderia ao lhe entregar sua virgindade tão preciosa. Racionalmente sabia, mas quem é que pode controlar as reações que emergem do interior?


De qualquer jeito, estava decidida: daquele dia não passaria. Entregar-se-ia ao marido naquela mesma noite sem reservas. Na noite anterior, quase aconteceu.


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Ricardo a acompanhou até a porta do seu quarto, como de costume, depois de namorarem na salinha do andar. Sempre lhe dava um beijo mais suave de despedida. Porém, o beijo se intensificou; nenhum dos dois conseguia desgrudar os lábios.


As línguas voltaram à habitual dança luxuriosa no interior de suas bocas. As mãos do marido que alisavam seu rosto desceram pelos ombros e as curvas laterais. Estreitaram mais os corpos; as respirações aceleraram; Ricardo a encostou na porta do quarto e prensou-a; arfaram.


As mãos dele subiram na região dos seus seios e apalpou-os por cima da roupa, uma carícia mais ousada que lhe permitia todos os dias. Porém, ele ousou mais além, levantou as abas da blusa que ela vestia, enfiou as mãos e subiu-as encontrando a barreira do sutiã, mas não o suficiente para barrar o contato em sua pele. Ela suspirou alto com a carícia mais atrevida, mas não o interrompeu.


Ricardo passeou os dedos pela curvatura de seus seios ainda por cima da prenda, estimulou seus mamilos. Letícia delirava e suspirava, ele estava levando-a à loucura apenas com esses movimentos.


Quando ele enfiou as mãos por baixo de seu sutiã e houve o contato dos dedos sobre seus mamilos, interrompeu o beijo para gemer alto; Ricardo a prensou mais na porta e começou a mordiscar seu queixo enquanto as mãos trabalhavam para estimular os seios; os bicos ficaram rígidos de excitação. As mãos dela se agarravam aos ombros dele, intensificando a força pelo prazer que sentia


Ela tentava conter seus gemidos, mas não conseguia; saíam altos. E escutava deliciada os gemidos dele, as pausas entrecortadas de sua respiração ofegante e a ereção esfregar em sua cavidade.


- Você me deixa louco… - declarou ele numa voz estrangulada e sufocada de desejo sem parar o que fazia – Preciso... te tocar mais…


- Ricardo… - a voz mal saiu num sussurro, ela permaneceu com os olhos fechados


- Quero fazer amor com você, Letícia – estremeceu quando ele lhe sussurrou a proposta no ouvido e mordiscou sua orelha – E você?


- Ricardo… - tornou a dizer seu nome sem dar uma resposta direta


Ele tornou a beijá-la ardente enquanto as mãos continuavam acariciando seus seios; uma delas abandonou o seio que estimulava, traçou uma linha reta passando pelo ventre, umbigo, adentrou a saia e alcançou sua calcinha; Letícia arfou, mas ainda não conseguiu pará-lo, nem mesmo quando ele acariciou sua cavidade por cima do tecido, deixando-a molhada.


Contudo, ao sentir a mão de Ricardo adentrar a vestimenta e tocar a parte interna de sua intimidade, reagiu sem que pudesse se controlar; ela o empurrou, levemente, mas o fez. De imediato, ele retirou as mãos do corpo dela e afastou-se a poucos centímetros, encarando-a. Seu peito subia e descia num ritmo acelerado assim como o dela.


Letícia se arrependeu na mesma hora quando detectou certo desapontamento na fisionomia dele, tensa pela excitação.


- Desculpe, Ricardo… - arfou sem jeito enquanto ajeitava a roupa. Sabia que corava – Eu…


- Shhh… Tudo bem... querida – ele desanuviou a expressão e colocou uma mão sobre sua boca. A voz era doce e ofegante – Não tem... que se desculpar. Só eu que… que devo me desculpar por ter passado da medida com você.


- Não… eu… eu também queria – retirou a mão dele para falar – Eu quero… Ricardo, juro que eu também quero. Eu desejo você.


- Eu sei, meu bem... eu sei… - ele alargou o sorriso – Mas você ainda não está pronta… pelo menos não hoje.


- Eu posso estar. – insistiu e pegou no rosto dele com ambas as mãos – Eu… sei que você quer, Ricardo. Eu sou sua esposa... e quero te agradar.


- Mas não quero que me agrade se... não for o que deseja por completo, Letícia – olhou-a sério e inspirou uma golfada maior de ar para regularizar a respiração – Eu a desejo muito, você não tem ideia do quanto… e mal posso esperar para tê-la de novo nos meus braços. Mas não quero que se sinta forçada a nada, já te falei isso – pegou as mãos que seguravam o rosto dele e juntou-as, beijando uma de cada vez. Letícia estremeceu – Será quando você quiser de fato, querida. Não quando eu quiser porque eu já quero – sorriu – Vai acontecer quando você estiver segura. Tem que ser prazeroso para você em primeiro lugar.


- Ricardo… você não existe – ela o fitou sentindo um nó na garganta, contendo-se para não chorar de emoção por aquele homem tão maravilhoso – Que bom que eu tenho você na minha vida.


- Sou eu que agradeço por ter você na minha… por estar viva e aqui comigo – o olhar dele era cheio de ternura ao soltar suas mãos e segurá-la pelos ombros – Acredite em mim, minha Letícia, quando eu digo que apenas por poder beijá-la, me sinto feliz. Achei que nem isso teria oportunidade de fazer de novo


Letícia assentiu emocionada imaginando que ele o dizia pelo acidente


- Bom… acho melhor deixar minha linda esposa dormir… – pegou levemente em seu queixo – E não se preocupe em me agradar, Letícia. Vamos fazer amor no momento certo.


- 0 -


A lembrança da noite anterior arrancou suspiros de Letícia.


Ricardo era um homem maravilhoso. Como ainda podia resistir a ele?


Não mais queria fazê-lo. Estava resolvida a se entregar a seu marido, não por se forçar, mas porque desejava aprofundar a relação deles a um novo patamar. E o faria naquela noite na primeira oportunidade quando estivessem entregues a beijos e carícias. Não se afastaria e nem permitiria que Ricardo se afastasse.


Letícia fechou os olhos, cruzou as pernas ajeitadas no banco do veículo e mordeu os lábios. Foi o motorista que a tirou de sua abstração quando abriu a porta da limusine. Imediatamente, ela se endireitou.


- Chegamos, dona Letícia.


Ela desceu do carro ajudada por Pedro; Igor, o segurança que ia na frente junto com ele também desceu.


- Obrigada, Pedro – encarou-o com sincera gratidão


- Às ordens, dona Letícia. - assentiu


Ela entrou no edifício acompanhada por Igor, que a seguia a pouca distância; estava se habituando com sua presença. Nas duas primeiras vezes, estranhou, mas agora não se importava. Não o ignorava de todo, é claro; de vez em quando, até puxava conversa por educação, mas o homem apenas lhe respondia por monossílabos, como se temesse cruzar o limite estabelecido entre patroa e empregado; Letícia não insistia em se aprofundar numa conversa.


Não precisou ir até a recepção do hall de entrada, as recepcionistas assim como o porteiro lhe reconheceram e deram passe livre com toda cortesia. Entrou no elevador junto com Igor, mais sete homens e três mulheres; eram todos executivos pelas vestimentas que trajavam, dos quais seis a reconheceram e cumprimentaram-na junto com os demais, embora não fizesse a menor ideia de quem eram. Deu graças a Deus pelo segurança estar com ela, porque não se sentiu à vontade no meio daquele pessoal, ainda que estivesse completamente elegante da cabeça aos pés e fosse a esposa do presidente da empresa.


Aos poucos, os funcionários foram se dispersando em cada andar que paravam, restando apenas Igor e ela; logo chegaram ao último andar em que ficava a alta diretoria, incluindo a presidência.


Saiu a passos firmes do elevador, embora com olhar hesitante, e enxergou o andar ao seu redor; era muito bem decorado e sóbrio; havia o logotipo da empresa no centro da parede do meio. Nove mesas se encontravam enfileiradas no meio daquele amplo andar com suas respectivas ocupantes; deviam ser as secretárias dos executivos do lugar, uma delas, provavelmente do seu marido.


- Com licença, eu... – Letícia se aproximou de uma, alta e loira, trajada num conjunto azul de saia e blazer


- Dona Letícia! Como está? - cumprimentou a loira se levantando da mesa. As outras secretárias também a fitaram – Que bom que a senhora já se recuperou!


- Er… obrigada. - respondeu sem jeito por não se lembrar da moça


- Todas ficamos felizes por sua recuperação. E... soubemos de sua amnésia.


- Ahm... certo – não sabia se ficava aliviada ou envergonhada.


- Não se sinta mal por não se lembrar de nenhuma de nós – anuiu outra secretária de cabelos castanhos escuros – Entendemos sua situação


Logo todas elas se desvelaram em cumprimentos e felicitações por melhoras. Letícia apenas assentiu, meio constrangida. Queria perguntar quem era a secretária do marido para direcioná-la, mas estava sem jeito. Foi Igor que veio em seu socorro:


- Se nos derem licença, dona Letícia veio se encontrar com seu Ricardo.


- Naturalmente – a loira dirigiu um olhar reprovador ao guarda-costas num tom desdenhoso como se ele houvesse dito algo óbvio – Pode seguir adiante, dona Letícia. Ao final do corredor, a senhora encontrará a secretária de seu marido... Bianca. Avisarei a ela que a senhora está a caminho e ela vai lhe conduzir até a sala de seu Ricardo.


- Obrigada… até mais – foi tudo o que disse


Passaram por um corredor repleto de algumas salas; ao fim, encontrava-se uma escrivaninha com uma moça já de pé; alta, magra, negra, cabelos longos e crespos, muito bonita e sorridente; trajava um conjunto de blazer e saia verde oliva.



Bianca, pensou Letícia.


Lembrava-se de ter conversado com a secretária quando ligou do hospital para avisar de Ricardo de sua alta. Pelo menos, lembrava do nome dela, só não saberia recordar sua fisionomia se não fosse por indicação da outra secretária.


- Boa tarde… Bianca – Letícia estendeu a mão para cumprimentá-la.


- Boa tarde, dona Letícia! - disse ela com genuíno entusiasmo e apertou sua mão – É um prazer revê-la. Me alegro por sua recuperação.


- Obrigada…


- Sou Bianca. Conversamos por telefone quando a senhora estava no hospital.


- Sim... é... é um prazer. Me desculpe... eu... não me lembro de você.


- Não se preocupe com isso, seu Ricardo nos confidenciou para não estranharmos, caso a senhora não nos reconhecesse – afastou-se e abriu uma porta – Por favor, entre. Seu Ricardo espera pela senhora.


- Ficarei aqui, dona Letícia – anunciou Igor


- Se você quiser pode até almoçar, agora que estarei com o Ricardo.


Ele apenas assentiu em concordância.


Letícia entrou e deparou-se com um amplo escritório com uma vista colossal; dava-se para ver aos fundos boa parte de São Paulo. À direita, um sofá de três lugares; à esquerda, um armário; ao centro, uma ampla escrivaninha, diante dela, estava Ricardo, de pé com um largo sorriso. Ele se aproximou dela com os braços estendidos.


- Minha Letícia.


Sorriu e aproximou-se dele também. Adorava escutá-lo chamá-la assim: “Minha Letícia.” Causava-lhe uma sensação tão familiar e, ao mesmo tempo, transmitia segurança, ternura e amor.


Abraçaram-se com fervor. Era tão reconfortante estar em seus braços; cada vez mais se convencia de que aquele era o lugar certo para ela. Seu aconchego.


Ricardo tomou a bolsa que ela carregava, colocou-a na mesa e beijou-a. Haviam se visto pela manhã, beijaram-se antes do café e na despedida; mas parecia nunca ser o suficiente, ainda mais pelo ocorrido da noite anterior e de sua resolução para essa noite. Estremeceu só de lembrar e tomou a iniciativa de aprofundar o contato com as bocas.


As mãos de seu marido alisaram seu cabelo solto, ele parecia gostar de apreciar os fios entre os dedos e ela adorava que os tocasse; suas costas foram o próximo alvo, ele subia e descia em suaves carícias, fazendo-a se arrepiar. Em seguida, sentiu o contato das mãos em suas pernas; Letícia arfou, ele sabia como enlouquecê-la naquela parte, o modo como as envolvia, como as agarrava com firmeza e suavidade ao mesmo tempo.


Um gemido seu foi sufocado pelo beijo quando Ricardo levantou a barra de seu vestido e subiu as mãos para sua bunda; a respiração de ambos acelerou. Enquanto uma mão acariciava uma das nádegas, a outra subiu pela cintura até chegar em um dos seios, alisando-o por cima do tecido até deixar o mamilo endurecido. Os suspiros de Letícia aumentaram bem como o movimento da língua de Ricardo em sua boca; o beijo ficava mais ardente.


Súbito, Ricardo estreitou seus corpos, virou-a e sentou-a em cima da escrivaninha numa parte que estava livre de objetos ou papéis; ambos gemeram com o movimento, mas não se interromperam, ao contrário, o beijo se intensificou assim como o passeio das mãos de Ricardo em suas curvas. Ele havia aberto suas pernas sobre a cintura dele; podia sentir sua ereção; o órgão dele se esfregar em sua cavidade, o que a umedeceu.


Devia pará-lo, não mais por sua hesitação em se entregar a ele, mas pelo escritório da empresa não ser o local em que quisesse retomar sua intimidade. Contudo, não conseguia afastá-lo tão envolvida estava, Ricardo parecia ter cada vez mais um domínio sobre seu ser.


Ele abandonou sua boca e desceu os lábios por seu pescoço; arfava e gemia, talvez mais excitado do que ela e fazia-a também arfar e gemer. Segurava-o pela cabeça, as mãos entranhadas em seu cabelo. Ricardo inclinou o corpo de Letícia e desceu a língua por seu colo, na leve abertura do vão dos seios que seu discreto decote revelava; Letícia mordeu os lábios, achou que fosse delirar. Porém, quando a mão dele começou a descer a alça de seu vestido, ela recobrou o controle.


- Ricardo… Ricardo… - fez um movimento repentino para deter o movimento dele e ergueu o tronco, empurrando-o levemente. Ele ainda investiu sobre seu pescoço, mordiscando-o e com as mãos passeando por seu corpo, mas Letícia espalmou seu peito para deter seus avanços, embora relutante. Ofegava – Ricardo… pare.


- Desculpe… - ele se afastou bruscamente. Ambos arfavam ainda pela excitação. Ricardo passou a mão pela cabeça como se fosse para se recobrar e, em seguida, afrouxou o nó da gravata. Fitou-a. Os olhos destilavam luxúria. Letícia corou e abaixou os olhos – Foi mais forte do que eu.


- Eu sei… Eu também… também me deixei levar – sorriu-lhe tímida – Mas estamos no seu escritório…


- É – ele riu – Não seria o lugar ideal para… voltarmos a fazer amor… e eu quero que seja como se fosse sua primeira vez.


Ela apenas assentiu desviando os olhos. Estava acalorada por dentro, mas procurava ignorar. Não iria estimulá-lo mais, pelo menos enquanto não chegasse à noite.


- Então… vamos almoçar? - indagou ele


- Deixe-me dar uma ajeitada na minha aparência – ela limpou o canto dos lábios dele manchados com seu batom – Você deve ter me bagunçado.


- Um pouco – ele sorriu malicioso e apontou uma porta que ficava à esquerda – Ali é o banheiro. Pode se arrumar… acho que eu também vou me ajeitar depois de você.


Letícia apanhou a bolsa e dirigiu-se ao banheiro. O espaço era grande, apesar de ter somente a pia e o vaso sanitário; o que ocupava mais o local eram os espelhos de corpo inteiro e de cintura para cima. Letícia se espantou ao ver como Ricardo a havia deixado: o cabelo atrapalhado, os lábios inchados por seu beijo e borrados de batom e o vestido amassado; constrangeu-se por seu estado.


E ele disse “Um pouco”? Pois sim.


Abriu a bolsa e tirou o batom e um pente. Quando terminou de se arrumar e ajeitava a roupa, mirando-se no espelho de corpo inteiro, escutou o telefone da sala do marido tocar e o som abafado de sua voz.


- Alô? - houve uma pausa – Alô? - outra pausa – Alô? Quem está falando? - a impaciência se evidenciou na voz de Ricardo – Quem? Escute aqui… - soltou um suspiro irritado – Não estou para brincadeira. Não sei como conseguiu meu telefone, mas seja quem for, não se atreva a ligar para cá.


E desligou. Letícia saiu do banheiro e viu Ricardo de pé com as mãos apoiadas sobre a escrivaninha com uma expressão nada contente. Ele a viu, endireitou-se, mas a sombra não abandonou sua fisionomia.


- Algum problema? - indagou Letícia com expressão intrigada


- Não, eu… - ele se interrompeu. Balançou a cabeça, parecia atordoado. Desviou os olhos e direcionou-os ao aparelho telefônico da mesa. Clicou um dos botões – Só um momento. - a linha discada chamou uma vez


- Sim, seu Ricardo? - era a voz de Bianca.


- Bianca… você tem certeza de que a pessoa que ligou é mesmo a secretária do Mauro Nogueira? - o tom era ríspido, embora fosse baixo


- Sim, seu Ricardo. Ela própria me disse. Falou que ligava a mando dele para tratar de um negócio urgente. - houve uma pausa. Ricardo pressionava a mandíbula. Letícia o encarava com estranheza – Por quê, seu Ricardo? Não era ela?


- Não, não era – retrucou ele, num tom irritado, mas reprimido talvez pela presença de Letícia – Da próxima vez se certifique mesmo de quem esteja do outro lado da linha. Entendeu?


- Sim… seu Ricardo. - o tom era constrangido – Desculpe.


- Tudo bem. - suspirou – Vou sair com minha esposa para almoçar… e não tenho hora para voltar. Se ligarem, anote o recado.


- Sim, senhor. Algo mais?


- Não, apenas isso.


E desligou.


- Ricardo… o que foi? - Letícia via que ele se encontrava meio perturbado


- Uma brincadeira sem graça de uma pessoa se fazendo passar pela secretária do Mauro Nogueira… aquele empresário da festa que fomos.


- Ah... sim – assentiu ela se recordando – E não era ela?


- Não, não era… assim como certamente não era… - interrompeu-se de súbito.


- Não era quem?


- Ninguém – desconversou, balançando a cabeça e abriu um sorriso que não lhe alcançava os olhos – Espere que vou apenas usar o banheiro e depois vamos.


Letícia assentiu, mas continuou o olhando com estranheza enquanto passava por ela, na esperança de que lhe dissesse algo mais, porém, não sucedeu.


No restaurante, o almoço transcorreu silencioso e um pouco tenso. Letícia tentou puxar assunto com o marido, mas este lhe respondia por monossílabos, claramente ainda aborrecido com o telefonema de mais cedo. Em dado momento, Letícia não se conteve:


- Ricardo, fale comigo… o que está acontecendo?


- Eu… não sei do que está falando – ele desconversou


- Sabe sim… Aquele telefonema mexeu com você. O que a tal mulher te disse?


- Nada importante, Letícia. Foi… apenas um trote… uma brincadeira de mau gosto.


- Se não fosse importante, você não estaria assim. E pelo visto a pessoa te conhece para saber de suas relações de trabalho com o senhor Nogueira – fitou-o intrigada, mas ele não respondeu e desviou os olhos, o que não era habitual. Normalmente, ela quem o fazia – E acho estranho que uma pessoa se dê o trabalho de se fazer passar por outra apenas para te aborrecer.


- Não deve estranhar… é o legado que herdei do meu pai – encarou-a e emulou um sorriso amargo – Além de sua fortuna, poder e empresas, herdei também seus inimigos e todas as pessoas que o detestavam. - deu de ombros – Eu também meio que herdei o jeito implacável de meu pai em lidar com os negócios, embora não seus métodos escusos. - Letícia se surpreendeu um pouco por ele lhe informar mais a respeito de Otávio, sobre esse aspecto, embora já soubesse da má fama do velho magnata – Acredite, não é primeira vez que alguém me ataca de alguma forma pelo que o sobrenome Fontes Guerra acarreta…. e estou acostumado. Não me ofendo tão fácil assim.


- Mas parece que agora foi o suficiente para te ofender pelo modo como você está – observou ela.


- Sim, foi – admitiu com um suspiro cansado – Mas sinceramente não quero falar sobre isso.


- Certo… tudo bem – assentiu tentando aparentar entendimento, mas, na verdade, estava aborrecida. Desviou os olhos do rosto dele e fixou-os apenas na comida de seu prato.


Não queria reclamar com seu marido, muito menos, pressioná-lo, porém, não achava justo que lhe pedisse para lhe contar sobre suas recordações e sobre os sentimentos e pensamentos que tivesse sobre ele, ou mesmo acerca de outros fatos, se o próprio não era capaz de fazer o mesmo. Contudo, Ricardo pareceu ler seu pensamento quando tomou sua mão entre as dele e lhe disse:


- Letícia, olhe para mim – ela o fez, embora não quisesse deixar transparecer seu desagrado. Mirou a expressão séria, mas terna do marido – Sei que eu também deveria lhe falar sobre meus sentimentos e pensamentos, tudo o que me afeta… e também mais sobre meu passado… assim como te pedi que confidencie tudo o que te passa. Mas… tenho uma certa dificuldade em fazer o mesmo. - suspirou –Não que eu não confie em você, é só que… para mim é mais complicado e doloroso.


- Então a pessoa que telefonou mencionou alguma coisa do seu passado? - Letícia teve um estalo – Sobre… seus pais?


Era a única explicação para o aborrecimento dele, afinal, notava que falar sobre os pais era um tabu para Ricardo. Achou que o marido fosse negar ou se esquivar de responder, mas ele assentiu.


- Sim, tem a ver, mas… prefiro não comentar.


- Tudo bem, Ricardo – ela concordou mais conciliadora e apertou sua mão – Não precisa dizer nada.


- Um dia ainda vou lhe falar mais a respeito deles… eu prometo. Mas não ainda. Dê-me… mais tempo.


- Entendi… Vamos esquecer isso.


- É, vamos… Se bem que eu que fiquei com minha mente distante durante nosso almoço – ele balançou a cabeça – Mas agora vou prestar mais atenção na minha esposa. Você é que importa – abriu um largo sorriso – É o meu presente… e o meu futuro.


Suas palavras a comoveram e estremeceram, um dom que tinha sobre ela. E logo ele se pôs a conversar com mais animação.


- 0 -


Entraram na agência do banco Itaú, mas antes de cruzarem a porta que os levaria à gerência, o celular de Ricardo tocou. Ele apenas olhou o visor. Suspirou.


- Letícia, vou ter que atender lá fora… é uma ligação importante de uma empresa com que faço negócio e cujo presidente vou ter uma reunião daqui a pouco. Importa-se de me esperar?


- Não, claro que não, pode ir.


- Já volto.


Letícia assentiu. Ricardo se afastou e saiu para conversar no telefone.


Enquanto o aguardava, Letícia ficou a observar o movimento das pessoas no hall; alguns pediam senha para entrar com uma atendente, outros pediam informações ao guarda e a maioria fazia suas operações nos caixas eletrônicos.


De repente, lhe veio à mente uns números… não teve certeza, mas se deixou levar pelo ímpeto. Aproximou-se de um caixa, tirou a carteira da bolsa, apanhou o cartão e inseriu. Precisava testar. Fez a opção do saque, colocou o valor de duzentos reais e ao surgir o pedido da senha, teclou os algarismos que lhe vieram a mente. A máquina processou e entregou-lhe o dinheiro. Ela ficou em estado de assombro e lentamente apanhou as notas, ainda sem acreditar; permaneceu alguns instantes ainda diante do caixa, mas ao escutar uns murmúrios atrás, provavelmente de outras pessoas que aguardavam por sua vez, ela deu acordo de si e liberou o acesso.


Estava eufórica! Havia se lembrado de sua senha! Precisava contar a seu marido. Resolveu aguardar por ele, não queria interromper sua ligação.


Ficou andando de um lado para o outro num canto da agência. Ricardo que não terminava a ligação! A ânsia lhe corroía para lhe dividir sua alegria. Finalmente, viu ele adentrar o local e procurá-la com os olhos. Aproximou-se dele e abraçou-o entusiasmada.


- Ricardo, que felicidade! - exclamou


– Ô, eu só saí um instante. Já está com saudade? – perguntou num tom brincalhão. - Ou aconteceu alguma coisa?


- Aconteceu, sim, uma coisa incrível! - ela se desvencilhou de seus braços e encará-lo – Eu… estava aqui observando o movimento do pessoal nos caixas eletrônicos… e aí me veio na mente uns números, eu resolvi testar, fui numa máquina para sacar dinheiro, digitei e deu certo. Eu me lembrei da minha senha do banco, Ricardo!


Sua euforia se desmanchou ao contemplar o semblante surpreso e temeroso que ele rapidamente substituiu por uma falsa expressão de alegria.


- Que bom – disse num tom mal disfarçado de desânimo – Significa que não precisamos mais falar com o gerente. Poupou… nosso tempo.


Mas o tom de zombaria era falso. Letícia continuou a fitá-lo com evidente decepção. Por que Ricardo simplesmente não podia se alegrar por ela se recobrar de detalhes de sua vida aos poucos? Era por temer que recuperasse a memória? Qual a razão? Às vezes duvidava se era mesmo por um desejo de protegê-la como sua mãe alegou.


- Vamos voltar para empresa? - ele tentou aparentar animação, talvez por perceber seu desapontamento – Fiquei de mostrá-la e disponho ainda de uma hora antes da reunião que tenho agendada.


Ela apenas assentiu com um meio sorriso tão falso quanto o dele.


- 0 -


No interior da limusine, estavam mergulhados em total silêncio. Letícia estava chateada com Ricardo por sua estranha reação, a que sempre tinha toda vez que ela lhe confidenciava alguma lembrança. Não deveria surpreendê-la mais, nem aborrecê-la, porém, não deixava de lhe incomodar. Mesmo assim, não queria demonstrar sua decepção para o marido.


Escutou um suspiro cansado de Ricardo e teve seu rosto virado delicadamente pela mão dele que lhe segurou o queixo.


- Letícia, sei que está chateada comigo por minha reação quando você me contou sobre ter lembrado da sua senha… e te peço desculpas por isso. - Letícia engoliu em seco ao vê-lo admitir – Não é a primeira vez que não demonstro entusiasmo por qualquer recordação sua. Tento até disfarçar, mas não consigo te enganar, não é? - ele deu de ombros com um sorriso melancólico – Você sempre foi perceptiva… e parece que nem sua amnésia tirou isso de você.


- Eu tenho notado há muito tempo esse tipo de reação que você tem – desabafou ela – Não só da sua parte, mas também dos meus pais. Sei que me escondem fatos da minha vida intencionalmente, eles mesmos admitiram.


- Eles… admitiram? – Letícia detectou um leve tom de alerta em Ricardo


- Me disseram que era para me poupar de certas lembranças desagradáveis… e que você estava de conluio com eles nisso – a expressão de Ricardo se fechou entre aborrecida e temerosa. Ela colocou a mão sobre o rosto dele e acariciou para tranquilizá-lo – Minha mãe explicou que você só está preocupado em me proteger e que até exagera por causa disso Entendi que se vocês me escondem segredos é porque tanto você como eles se preocupam comigo – suspirou – Mas… tenho direito de saber mesmo assim.


- Não é apenas superproteção, minha querida. O médico… também nos falou que jogar uma enxurrada de lembranças em cima de você não é muito recomendável, principalmente fatos ruins. Pode confundir sua cabeça.


- Mas se me lembro naturalmente não me fará mal, não é? É por isso que estou indo às sessões.


- É. - disse ele lacônico – Eu só não quero que se chateie caso eu não parecer entusiasmado quando você se lembrar de qualquer coisa.


- Tudo bem, Ricardo, eu… compreendo.


- Então quero ver um sorriso neste rostinho lindo.


Letícia lhe obedeceu e ganhou um beijo ardente dele. Ficaram assim até a limusine chegar à empresa.


Conforme o programado, Ricardo começou a mostrar as instalações principais do local para Letícia desde a fundação. Passaram por três outros prédios que compunham a multinacional, mas se concentraram no principal que era o maior, onde foram em todos os andares e em vários departamentos. Ele apresentou os coordenadores e os diretores-gerais e ela gentilmente cumprimentou a todos. Letícia notou que todos sabiam de seu estado, mas não se incomodou, era até melhor para evitar constrangimentos.


- Contei de sua amnésia com alguns funcionários, entre eles a Bianca e os diretores – comentou Ricardo como se adivinhasse seus pensamentos – Como não lhes pedi discrição, a informação deve ter se espalhado – fitou-a de modo terno – Espero que não se importe. Achei melhor porque de qualquer jeito eu teria que falar sobre o assunto ao te apresentar de novo para todos.


- Tudo bem. Sem problemas – sorriu-lhe


Ricardo lhe explicou durante aquele tour que ele era o presidente de toda a estrutura da Dell Fontes, não só daquele conjunto de edifícios que era a matriz, mas de outras filiais espalhadas pelo Brasil e até umas cinco em outros países. Cada filial possuía um presidente que se reportava a ele. Ela o escutava admirada por falar mais detalhes dos megas projetos que realizavam em diferentes áreas.


Voltaram ao andar da presidência, o último local que faltava mostrar com maior detalhamento e apresentar a alta cúpula de executivos que atuavam diretamente com Ricardo.


Na sala de reuniões, havia onze pessoas – oito homens, em sua maioria. Todos ostentavam uma expressão indefinível no rosto, mas um ar cordial. Porém, entre eles, estava um homem moreno claro que observava Letícia com certa vivacidade. Ricardo apresentou a todos como os respectivos diretores-gerais de cada área da Dell Fontes; Letícia apertou a mão de todos.


O último a ser apresentado foi justamente o tal moreno; Letícia reparou que era um homem muito bonito, tanto quanto seu marido; era da mesma altura que Ricardo, possuía olhos castanhos claros, o rosto fino e oval e suas feições lembravam vagamente as do esposo.



- Este é o vice-presidente de toda Dell Fontes… meu primo Roberto.


- Seu primo? - Letícia se voltou para o marido, não escondendo a surpresa – Pensei que seu pai fosse filho único.


- Todos pensam o mesmo – adiantou-se Roberto na resposta e tomou a mão de Letícia com certa liberdade que a surpreendeu. Ela não protestou, embora se constrangesse. Ele beijou o dorso de sua mão. O gesto parecia respeitoso, porém, Letícia reparou uma sutil tensão no maxilar de seu marido. Ela tratou de retirar a mão rapidamente sem ser indelicada, mas Roberto pareceu notar sua atitude, embora esboçasse um leve sorriso - É um prazer conhecê-la de novo… Letícia. Que bom que se recuperou de seu acidente… Pena que sua memória não tenha retido suas lembranças… algumas delas, com certeza, bastante agradáveis.


Letícia notou uma insinuação nestas últimas palavras cujo sentido não soube captar exatamente, porém, causaram-lhe certo incômodo, assim como a maneira como o tal Roberto lhe fixava o olhar. Não era de uma forma indecorosa, pelo menos não de forma evidente, era mais… analítica, como se quisesse lhe perscrutar seu íntimo.


- Roberto é filho da irmã de meu pai, tia Aurélia – Ricardo esclareceu – Ele nunca declarou para a imprensa que tinha uma irmã para não expô-la.


- Ele queria protegê-la de abutres e caça dotes – acrescentou Roberto com um sorriso sarcástico – Titio era muito protetor com mamãe, mas não adiantou muito… já que eu acabei nascendo.


Letícia alternou o olhar de um para o outro como se pedisse uma explicação para o comentário de Roberto, mas Ricardo apenas se limitou a dizer:


- É uma longa história… depois eu te conto.


- Ora, Ricardo, por que não divertir sua esposa com uma das histórias de nossa família? - retrucou o primo com expressão sarcástica – Garanto que ela adoraria saber… ou relembrar se você contou para ela antes do acidente.


- Porque não há mais tempo. Daqui a pouco começa nossa reunião – tornou Ricardo com expressão aborrecida mostrando o relógio de pulso. Roberto torceu a boca e revirou os olhos. Os outros executivos se afastaram e começaram a se organizar em volta de uma grande mesa oval. Ricardo se virou para a esposa – Letícia, infelizmente, vou ter que ir.


- Tudo bem, Ricardo, também está na minha hora. Daqui a pouco tenho sessão.


- Como é sexta-feira e não tenho nada agendado para amanhã cedo, pensei de sairmos hoje para jantar… e também dançar. Conheço um lugar ótimo assim. - propôs Ricardo ignorando o primo – Que tal?


- Eu adoraria! - disse ela sem se conter.


- Então me espere linda hoje – tocou em seu queixo e fitou-a com olhar terno – Como se isso fosse mais possível.


E sem se importar com a presença de Roberto ou a dos demais, ele a beijou suavemente nos lábios. Letícia se retesou um pouco constrangida, mas não o afastou. Quando desgrudaram as bocas, pode observar pelo canto do olho uma expressão tensa no rosto de Roberto. Ao se virarem para ele, abriu uma expressão alegre, mas claramente forçada.


- Bem, vou tratar de solicitar a sua secretária e a minha a pauta da reunião e conferir a organização. - respondeu ele sorridente, embora o tom não fosse descontraído


- Ótimo! Faça isso. - retrucou Ricardo com ar superior. Letícia o detectou, mas não compreendeu o motivo.


- Foi um prazer novamente, Letícia – ele disse, mas dessa vez, com ar mais distante e sem lhe tomar a mão


- Igualmente – respondeu ela


- Com licença.


- Toda – respondeu o casal em uníssono.


Enquanto Roberto se afastava, Letícia reparou discretamente a fisionomia de seu marido. Além do ar superior que conservava, havia um olhar hostil que ele dirigia ao primo, o que a intrigou. Ao notar que ela o observava, Ricardo desfez a expressão carregada e abriu-a num largo sorriso.


- Eu vou… acompanhá-la até a recepção – disse ele e deu-lhe o braço.


Cruzaram com Roberto no meio do caminho dando instruções para Bianca, mas ele nem lhes olhou – ou fingiu não olhar. Foram até o hall do andar onde se encontravam as secretárias dos demais diretores. Igor estava lá à espera, sentado a um canto em posição ereta. Levantou-se imediatamente ao vê-los.


- Até mais tarde, querida. – Ricardo lhe deu um selinho e dirigiu-lhe um olhar malicioso. - Mal posso esperar


- Eu tampouco – ela abaixou o rosto. Lembrava-se de sua resolução, mas não queria demonstrar seu nervosismo – Até mais.


E se afastou com o segurança, com a imagem de Ricardo a observando com expressão suave e terna. Mesmo quando tomou o elevador, pôde vê-lo na mesma posição até que as portas do ascensor se fechassem.



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Autor(a): jord73

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