Fanfics Brasil - Seu desejo Perigosas Lembranças

Fanfic: Perigosas Lembranças | Tema: Amnésia


Capítulo: Seu desejo

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Respire, Letícia. Respire.


Ela teve que dizer para si mesma duas vezes até se acalmar. Ricardo havia saído e ainda estava parada que nem uma tola. Deus, era pior que uma adolescente, com certeza!


Colocou a mão no lado do rosto em que seu marido havia beijado. Ainda era palpável; ele tinha lábios tão macios, a barba roçou de leve e o toque... sabia como tocar, como deixar sua marca.


Como seria o beijo dele?


Letícia arfou. Abanou-se com as mãos e balançou a cabeça para dissipar o pensamento. Se não mantivesse o controle, não conseguiria encarar Ricardo no jantar sem deixar transparecer o efeito que exercia cada vez mais sobre ela.


Hum... Até parece que estou tendo sucesso. Cada má nota que dou.


Concentrou-se em analisar o quarto com mais detalhes. Vermelho. Todo vermelho. Não conseguia se enxergar ficando ali. Deu uma boa olhada na cômoda com cremes, maquiagem, perfumes e colônias.


Havia também um computador e alguns livros que ficavam em pequenas prateleiras montadas acima da mesa da máquina.


Foi até um pequeno corredor que ficava na outra parte do quarto e viu um imenso guarda-roupa que se estendia por todo o espaço; abriu suas portas: inúmeros vestidos, saias, blusas, sapatos, bolsas e outros acessórios. Começou a contar cada item, mas desistiu; devia ter centenas. Não fazia a menor ideia de como alguém conseguia usar tudo aquilo durante um mês. Talvez nem durante um ano.


Súbito, teve um estalo.


Engraçado. Como puderam mudar tudo tão rápido em um dia?


O quarto, o papel de parede, os móveis, a arrumação, não pareciam terem sido preparados em menos de um dia. Era como se estivessem ali há mais tempo.


Bobagem. Ricardo tem vários empregados.


Com certeza, ele mandou organizar um mutirão assim que lhe deu resposta de que voltaria àquela mansão. Ou então talvez mandou preparar no primeiro dia de seu despertar como precaução.


Mesmo assim, aquele papel de parede, as prateleiras, o computador conectado a um cabo de internet... não pareciam detalhes a serem acrescentados em menos de uma semana.


Algo não se encaixava.


Não. Era paranoia sua.


Voltou a atenção para o guarda-roupa e revirou as vestimentas. A maioria era num estilo um tanto provocativo, com decotes, aberturas nas costas – como a blusa que usava – e centímetros de tecidos a menos acima dos joelhos nas saias e vestidos. Não diria que era vulgar, mas só de se imaginar num daqueles trajes, seu rosto queimava. E quase todos os sapatos ostentavam saltos tão finos e altos; se seus pés estivessem desacostumados, era capaz de se desequilibrar.


Queria uma roupa simples e mais sóbria para usar mais tarde no jantar. Por fim, encontrou um vestido florido de mangas curtas todo azulado cujo comprimento ia até a metade das pernas; escolheu uma sandália baixa de tiras da mesma cor. Levou-os até o quarto e deixou o vestido em cima da cama e o calçado aos pés do móvel.


Entrou no banheiro e mirou-o com admiração. Ricardo havia dito que não tinha banheira. Era dispensável, em sua opinião, com aquele tamanho e um box que talvez fosse o triplo do banheiro do leito no hospital. Havia espelhos em todos os cantos, inclusive o que se estendia acima da pia.


Letícia se mirou em um de corpo inteiro numa parede lateral e hesitou. Sentia vergonha de se despir e ver-se a si mesma nua. Talvez sua inibição se devesse a ter se despido para as enfermeiras que lhe ajudaram no banho nos três primeiros dias, por causa das dores em seu corpo. Ela não se permitiu se contemplar, desejosa de acabar rapidamente. Constrangia-se por outras pessoas lhe tocarem e verem-na nua, mesmo que fossem mulheres e profissionais.


Suspirou.


Deixe de bancar a garotinha virgem e boba.


Olhando-se com coragem, principiou-se a tirar a roupa. A vergonha começou a inundá-la, mas resistiu e encarou firme a imagem refletida sem roupa.


Admirou-se. Seu corpo era lindo. Ela com certeza se cuidava antes do acidente. Era bem magra e sem barriga, mas com as curvas generosas nos lugares certos: os seios grandes, a bunda empinada e até cheia, as pernas torneadas e as coxas um pouco grossas. Nada de celulite ou estrias.


Soltou o cabelo. Era longo e emoldurava seu rosto fino e harmonioso. Sim, agora se via com mais clareza. Era bonita. Muito bonita. Estava se acostumando com aquele rosto, embora não o reconhecesse em lembranças anteriores.


E pensar que Ricardo já a havia visto daquele jeito... e a tocado... e beijado cada parte sua... e... Nem completou o pensamento. Mas o calor que experimentava era maior do que a vergonha.


O jeito que ele a olhou e insinuou sobre a lua-de-mel deles. Confinados no quarto... fazendo...


Quando se deu conta, as mãos de Letícia estavam alisando seu pescoço e descendo para os seios. Pôs as mãos na cabeça e balançou-a várias vezes para o lado...


Não! Pare de pensar isso, sua pervertida!


Entrou rápida no box; tomaria um banho frio. Era o que precisava para apagar aquele fogo!


Como podia ficar pensando em coisas assim? E não era ela que estava com pudores até horas atrás? Ou será que aquele era outro lado de seu eu original que começava a se manifestar? Mesmo que fosse, não estava preparada para deixa-lo vir à tona.


Abriu o chuveiro e o choque da água fria em seu corpo fê-la se estremecer. Gemeu. Logo se acostumou com a temperatura. Encheu as palmas com sabonete líquido e começou a se ensaboar.


Sua mente a levou para outra direção. Ou quase. A foto dela que havia levado Ricardo a comentar sobre a lua-de-mel; um contraste com as fotos tiradas dela em seu casamento. Nessas, não parecia nada feliz, quase uma múmia ambulante; naquela, estava mais radiante e serena.


Ora, talvez significasse o que supôs: no dia de sua boda, aconteceu algum fato que a deixou entristecida a ponto de não conseguir posar feliz para aquelas fotos.


Mais uma vez, sua mente traiçoeira a conduziu para os pensamentos que queria evitar. Ricardo. E em como era a intimidade sexual entre eles. Tentou reprimir quaisquer imagens e fechou os olhos, disposta a desviar o rumo de seus pensamentos.


 


Ricardo imprensou suas costas contra a parede com rapidez, mas sem brutalidade. Ela arfou tanto por seu movimento como pelo contato frio dos azulejos molhados e mais ainda quando ele levantou seus braços e os prendeu acima de sua cabeça. No olhar do homem, brotava desejo e paixão incontroláveis. A respiração dele ofegava em seu rosto.


Uma mão, segurava seus braços imprensados na parede e, a outra, deslizou por seu rosto, demorou-se em contornar seus lábios com os dedos – ela fechou os olhos para apreciar o toque, uma simples carícia que conseguia enlouquece-la – e, em seguida, desceu lentamente pelo pescoço, massageando-o e acariciando-o.


 Os seios foram seu próximo alvo. O direito foi o primeiro ser envolvido numa carícia lenta e tortuosa, o mamilo latejava de excitação.


- Ah, Ricardo... – ela arqueou a cabeça e gemeu seu nome


- Isso, Letícia, não se contenha – ele aproximou a boca de sua orelha e sussurrou numa voz rouca enquanto a mão pressionava mais o seio e beliscava o mamilo – Geme para mim, querida. Me excita escutar você...


 


Letícia abriu os olhos assustada. O coração batia a mil, seu corpo fervia e a mente estava confusa. O que foi aquilo? Que imagem era aquela?


Uma fantasia? Não. Foi real demais. Era quase como ver o rosto de Ricardo diante dela, escutar o som de suas palavras, sentir o seu toque, a atmosfera do lugar e as sensações provocadas. Foi como... uma lembrança!


Uma lembrança de ter feito amor com seu marido debaixo do chuveiro. Tentou puxar mais alguma imagem associada ou a continuação daquela lembrança.  Nada. Mas tinha certeza que não era mera fantasia de sua cabeça, era uma recordação, embora um fragmento.


Tentou se lembrar dos detalhes. Fechou os olhos para se concentrar.


Ricardo e ela estavam no banho, debaixo de um chuveiro, não aquele em que estava. Seria do quarto dele, ou melhor, o que compartilhava com ele antes do acidente? Talvez.


Ficou mais alguns minutos tentando se recordar, mas nada mais saiu. Não, não adiantava forçar muito. Veio de uma forma natural, espontânea, assim como o neurologista lhe havia explicado. Sua memória voltaria aos poucos e em pequenos fragmentos no começo. Poderia ser ativada através de fotos, imagens, objetos ou associações com acontecimentos semelhantes, como foi o caso simplesmente por ela se banhar e estar com o pensamento voltado em sua intimidade com o marido.


Engoliu em seco. Ela se lembrou em parte de como era fazer amor com Ricardo, pelo menos um vislumbre de suas carícias e, o pouco que sentiu era muito bom. Ele sabia... como tocá-la. Sentiu seus mamilos ficarem rígidos e sua intimidade se umedecer.


Colocou as mãos na cabeça, tentando afastar aqueles pensamentos e ignorar as sensações. Virgem Santa! Agora é que ficaria com mais vergonha perto de Ricardo. Só de olhar para ele, lembraria da cena.


Deveria lhe contar dessa sua primeira lembrança? Nem pensar. Primeiro, porque era constrangedor. Sim, era uma bobagem, ele era seu marido, não deveria ter pudores, mas não conseguia evitar.


E segundo, não tinha tanta certeza de como ele receberia a informação. Era estranho, mas tinha quase certeza de que Ricardo não queria que ela se lembrasse da vida passada deles. Era loucura, mas suas atitudes colaboravam com tal impressão. Ou ele ficava tenso sempre que lhe fazia muitas perguntas ou fechava o rosto quando algo emergia de seu subconsciente, como foi o caso do apelido pelo qual o chamava. Rick.


Esperaria um pouco antes de compartilhar sua descoberta, talvez se viessem mais outros fragmentos. Contaria apenas a Tiago na próxima sessão.


- 0 –


Letícia não se arrumou de imediato após o banho. Faltavam ainda duas horas para o jantar. Em vez disso, permaneceu de roupão e vasculhou mais itens no seu quarto. Sentou-se diante de seu computador que ficava perto da janela e ligou-o. Talvez pudesse usar a internet para pesquisar informações sobre si e sua família, afinal, eram pessoas conhecidas, como seu pai afirmou. Seu marido também.


O computador pedia uma senha de acesso. Droga! Não conseguia se lembrar, talvez Ricardo soubesse e lhe diria se ela lhe perguntasse.


Resolveu dar uma folheada em alguns livros nas pequenas prateleiras. Variava entre romances da literatura brasileira a best sellers. Havia a biblioteca do segundo andar que Ricardo lhe mostrou, porém, deixaria para explorar em outra hora.


Escolheu o romance “O morro dos ventos uivantes”, recostou-se na cama e começou a lê-lo. Nem percebeu o tempo passar quando escutou batidas na porta. Olhou o despertador em cima da mesinha de abajur e viu que marcava oito horas. Droga! Atrasar-se-ia para o jantar!


Escutou mais batidas.


- Só um momento! – disse alto. Levantou-se e calçou os chinelos. Mas não abriu a porta de imediato. Se fosse Ricardo não queria que a visse apenas de roupão – Quem é?


- Sou eu, dona Letícia... Larissa, uma das empregadas. Eu...


- Ah, só um momento – abriu a porta. Diante dela, estava uma jovem que parecia ter sua idade, de cabelos loiros presos num coque. Havia um ar de petulância na empregada que incomodou Letícia, ainda mais por ela lhe medir de cima a baixo por vê-la metida no roupão – Er... oi. Pode falar.


- Desculpe incomodá-la... senhora. Só me mandaram lhe avisar que o jantar vai ser servido.


- Ah, sim. Eu... avise que vou só terminar de me arrumar, mas que já vou descer. – porém, a serviçal permaneceu onde estava com expressão confusa. Letícia a olhou com estranheza – Algum problema?


- Não... quer dizer... é que a senhora não costuma descer para jantar com seu Ricardo. Eu sempre venho avisá-la por ordem dele ou de dona Glória, mas a senhora nunca desce... e pede o jantar no quarto.


- Como? – foi a vez de Letícia demonstrar confusão no rosto. – Eu não costumo jantar com meu marido?


- Er... não... quer dizer, sim – Larissa se atrapalhou, como se caísse em si por ter cometido um erro – Perdão, dona Letícia... esqueci que a senhora perdeu a memória... Er... esqueça tudo o que acabo de lhe dizer. Não é da minha conta a senhora mudar de ideia – tentou sorrir sem graça – Er... uma vez ou outra que a senhora janta no quarto, mas claro que prefere a companhia do patrão. Foi... foi besteira minha. Eu... só vim lhe dar o recado. Com licença.


Saiu apavorada e quase correndo como se temesse alguma consequência de sua indiscrição. Letícia permaneceu ainda parada na porta tentando processar a informação desajeitada da empregada.


Então... não jantava com Ricardo? Larissa bem que tentou negar, mas não conseguiu disfarçar o deslize.


Era estranho não ter aquele tipo de contato diário com seu marido. E mesmo que não fosse o caso, era estranho a reação da empregada, como se fosse uma informação que não deveria ter compartilhado. Curioso.


Não pensou mais a respeito. Não havia tempo, tinha que se arrumar depressa. Depois, averiguaria com Ricardo.


Fechou a porta, aproximou-se da cama, tirou o roupão, colocou as roupas íntimas, o vestido florido e calçou as sandálias. O cabelo pelo menos estava penteado e arrumado com o secador que ficava no banheiro; deu apenas mais uma ajeitada com o pente. Passou um batom rosa, colocou uns brincos simples e apenas duas gotas de uma colônia bem suave da Calvin Klein.


Podia ser apenas um jantar caseiro com seu marido, mas ela intuía que se arrumava mesmo em simples ocasiões como essa. E queria estar bem vestida para Ricardo, apesar da vergonha em fazê-lo.


Lembrou-se da recordação na hora do banho. Que Deus a ajudasse a não se trair e deixar seu marido perceber as reações de seu corpo!


Desceu calmamente as escadas e seguiu pelo longo corredor que ia da sala de visitas até a sala de jantar. A mesa ampla era para quatorze pessoas. Ricardo estava atrás do móvel, de pé e em frente de uma janela olhando para o exterior, as mãos entrelaçadas nas costas. Letícia engoliu em seco.


Glória também estava no meio do recinto junto com Anselmo. Os dois esboçaram o sorriso mais falso quando a viram.


- Dona Letícia já está aqui, seu Ricardo – anunciou a governanta.


O empresário se virou e abriu um largo sorriso. Letícia estremeceu. Imagens da lembrança no banheiro invadiram sua mente, mas ela as expulsou de imediato, o que não evitou de sentir a temperatura de seu corpo se elevar. Aproximou-se e parou a poucos centímetros da mesa, do lado oposto ao do marido, único obstáculo entre eles.


- Oi... desculpe... pelo atraso – gaguejou e sentiu vontade de se chutar por isso. Procurou se dominar – Demorei muito?


- Não se preocupe – ele a mediu de cima a baixo com um olhar de aprovação... e desejo, que fê-la arrepiar – Valeu a pena.


Observou o modo como Ricardo estava vestido. Elegante e impecável como sempre, é claro, mas em roupas mais casuais. A camisa azul que vestia era de mangas mais curtas e deixava antever seus braços... uns braços fortes com pouquíssimos pelos e as mãos... somente agora reparava que as mãos dele eram grandes. Mãos grandes... que haviam acariciado seus seios.



- Vamos sentar?


Sobressaltou-se ao escutar sua voz; foi como acordar de um transe. Seu rosto queimou de vergonha ao notar o brilho divertido e intrigado nos olhos dele e um sorriso amplo e malicioso. Raios! Com certeza, notou o modo como ela o estava secando, mesmo que inconsciente.


- É... é... vamos... vamos sentar – de novo gaguejando feito uma idiota.


Aproximou-se de uma cadeira à direita da que ficava numa extremidade da mesa; Ricardo se antecipou e puxou-a para que se sentasse.


- Obrigada. – disse numa voz quase sumida e sem olhar para ele.


Em seguida, ele se dirigiu ao assento da ponta.


- Pode mandar nos servir, por favor, Glória – ordenou num tom polido


- Sim, senhor – respondeu a governanta e junto com Anselmo se dirigiram à cozinha


- Como está sendo seu primeiro dia? – indagou ele após Glória e o marido saírem


- Bom- respondeu ela com mais firmeza – Eu... li um pouco, um dos livros que tem no meu quarto.


- Qual?


- O Morro dos Ventos Uivantes.


- Ah, sim. É o seu favorito.


- É?


- Sim. E um dos meus. Bom... na verdade, não sou muito fã de romances ingleses, embora este seja um clássico. Prefiro mais um Ernest Hemingway ou Machado de Assis. Mas comecei a gostar desse livro por sua causa.


-  Por quê?


- Você defendia o amor de Heathcliff e Catherine com tanta paixão que acabou me contaminando – ele riu – Acho que você quem deveria ter escrito essa obra... se não fosse de outra época.


- Estranho. – disse pensativa


- O quê?


- Você saber tanto de mim, dos meus gostos, dos meus hobbies... e eu não me lembrar nada de mim mesma – levantou os olhos para encará-lo


- Não se preocupe. Teremos muito tempo para descobrir tudo sobre você... ou descobrir novos gostos.


Ele a fitou intensamente e colocou a mão sobre a dela. Foi como se uma corrente elétrica muito forte a percorresse. Ela sentiu dificuldade de respirar. Não conseguiu retirar a mão e se viu presa mais uma vez na imensidão dos olhos de Ricardo.


A entrada de três empregadas com os pratos da refeição a salvaram. Ela retirou a mão de uma maneira natural e endireitou-se no encosto.


Enquanto mais pratos, água e suco eram trazidos, os dois não trocaram mais palavras; Letícia passou a evitar o olhar de Ricardo, mas por sua visão periférica, sabia que ele não parava de olhá-la.


Oh, era uma tortura e um prazer ao mesmo tempo ser alvo das atenções daquele homem!


A maior parte do jantar transcorreu em silêncio. Ela não sabia se era porque ele não queria força-la e deixa-la mais à vontade ou se era porque não tinham muito assunto.


 


A senhora não costuma descer para jantar com seu Ricardo. Eu sempre venho avisá-la por ordens dele ou de dona Glória, mas a senhora nunca desce... e pede o jantar no quarto.


 


Se era verdade o que a tal Larissa havia comentado, significava que não havia comunicação entre eles. E se não havia... queria dizer que o casamento deles talvez não andasse bem.


Mas aquela lembrança de uma relação sexual entre eles dizia o contrário. Bem, talvez fosse do início do matrimônio. A dúvida a inquietava.


- Ricardo... – começou meio hesitante


- Sim?


- Nós sempre jantamos juntos? – notou ele se enrijecer na hora – Jantamos?


- Por que está me perguntando isso? – o tom era firme, mas ela podia notar a tensão.


- Por... por nada. Esqueça.


- Por quê, Letícia? – mantinha o tom calmo, mas havia imperiosidade no mesmo


- É que... não brigue com sua empregada, mas...


- Qual empregada?


- Er... a Larissa – arrependeu-se na hora de ter mencionado o tema. Não queria que a moça levasse uma bronca por sua causa. – Ela deixou escapar... notei que foi sem querer, mas ela se espantou por eu ter falado que desceria para jantar quando ela foi me chamar... e me disse que eu não costumo jantar com você... que janto no quarto. – Ricardo não respondeu de imediato, mas seu olhar transparecia alguma emoção que Letícia não captou o que poderia ser. – É verdade o que ela disse?


- Um... exagero – ele deu de ombros como se fosse nada – Havia ocasiões que realmente você se recusava jantar... quando nos brigávamos.


- Brigávamos? – arqueou a sobrancelha – Muito?


- Algumas discussões... como qualquer outro casal – ele sorriu, mas seus olhos não. Letícia teve a impressão de que não estava lhe contando toda a verdade – E aí você preferia se isolar no quarto a ter que me encarar na hora do jantar.


- Nossa... que infantilidade a minha. – não pôde deixar de dizer, embora suspeitasse haver mais do que ele contava – Eu era sempre assim?


- Não... claro que não. Por isso que estou dizendo que é exagero da Larissa. Esqueça o que ela disse – desdenhou como se fosse mexerico de empregada. Em seguida, encarou-a sério – Mas... se você não quiser jantar comigo, caso não se sinta à vontade... não precisa se forçar.


- Não, pelo contrário... me sinto bem em sua companhia – admitiu, mas de um modo tão entusiasmado que um sorriso se estampou no rosto dele. Ela desviou o rosto. – Bom... é verdade que fico um pouco sem graça, não sei muito o que falar com você, mas...


- É natural... é como se você estivesse me conhecendo agora. – sorriu – Nós costumávamos sempre ter um assunto um com o outro. Com o tempo, você vai ver... teremos isso de volta... e podemos até ser um casal.... se for seu desejo.


A última frase foi dita mais devagar e acompanhada de um olhar penetrante. Letícia engoliu em seco.


- Er... mais uma coisa – resolveu mudar de assunto.


- Diga.


- Eu... tentei entrar no meu computador, mas pede uma senha... e não estou lembrada. Por acaso, você sabe? Eu te falei minha senha?


- Não, mas pode usar o meu laptop que fica no escritório. Te passo a minha.


- Você não vai precisar dele?


- Só uso quando volto da empresa. Aliás, retorno amanhã. Importa-se?


- Não... pode ir tranquilo – na verdade, preferia que ele ficasse até ela se adaptar a morar ali, mas não queria parecer dependente – Vou ficar bem.


- Tem certeza? Posso deixar pra segunda.


- Não... eu... vou aproveitar o dia para pesquisar na internet alguma coisa sobre mim e a minha família. Devem ter alguma notícia nossa já que a empresa de papai e minha ONG são conhecidas.


- É – respondeu ele lacônico. E mais uma vez, Letícia notou aquela tensão sempre que ela tocava no assunto referente a recuperar sua memória – Você vai à sessão de neurologia amanhã?


- Sim. Lembre-se que tenho que ir três vezes por semana. Ainda não tive muito progresso, mas... – deteve-se. Sua mente acusou a mentira e mandava ela contar sobre a recordação do banho


- Mas o quê?


- Não... não vou desistir. – completou com a primeira frase que lhe veio


- É, você é bem persistente quando quer – declarou, mas o modo como falou soava de um modo amargo. Olhou-o intrigada – Você pode pedir o motorista para te levar. Eu faria isso, mas saio cedo amanhã.


- Tudo bem.


- Outra coisa: teremos que ir no banco para solicitar nova senha. É provável que você não se lembre da antiga.


- Eu tenho conta em qual banco?


- No Itaú. Mas vamos deixar para a segunda. Eu irei mais tarde ao serviço nesse dia para te acompanhar.


- Hum-hum.


E conversaram sobre outros assuntos. Ricardo falou com entusiasmo do trabalho na empresa, a pedido de Letícia. Ele parecia muito mais aberto e receptivo do que quando a visitava no hospital.


O resto do jantar transcorreu tranquilo e quando se findou, Ricardo convidou Letícia para que ficassem mais um pouco na sala de visitas. Ele acabou por se abrir no tocante a contar sobre os gostos dela não só por livros, mas em diversos aspectos. E também falou dos dele, alguns que ela sabia por uma revista que sua mãe lhe emprestou.


Letícia nem viu o tempo passar quando o relógio da sala marcou dez horas. Cada vez mais apreciava a companhia do marido, apesar de se esforçar sem sucesso, em esconder o quanto ele a afetava.


Acompanhou-a até a porta do quarto dela. Quando se despediram, ele fez questão de beijar a sua mão e demorar-se em fazê-lo, o que só atiçou mais as labaredas do seu corpo.


- Boa noite... Letícia – disse com voz sensual


- Boa noite – ela mal conseguiu responder e tateou desajeitada a maçaneta da porta com a outra mão até tocá-la – A... até amanhã.


- Tomo café bem cedo às sete. Mas... ficarei encantado se quiser me fazer companhia.


- C... claro. – assentiu várias vezes e abriu a porta. – Tchau.


- Tchau.


Mal escutou a resposta e nem o encarou. Entrou rapidamente, fechou a porta e precisou se afagar.


Deus, como estava dando na cara o quanto ele mexia com ela!


Mesmo sendo casados, ainda não queria deixar transparecer o quanto. Porém, ficava cada vez mais difícil e seu marido não queria facilitar. Definitivamente, ele estava a seduzindo! De um modo sutil e cavalheiresco, mas estava. E ela descobriu que gostava disso, embora ainda não soubesse como reagir.


O melhor a fazer no momento era não pensar mais nele – como se fosse fácil – e dormir. Foi ao guarda-roupa buscar uma vestimenta para se deitar.


Demorou-se uns vinte minutos para se trocar; optou por um pijama de seda, o único que tinha, já que só havia camisolas ou lingeries das mais ousadas (imaginava que fosse para agradar Ricardo). Antes de se deitar, porém, resolveu descer. Estava quente e queria muito beber água. Embora houvesse uma jarra e um copo no quarto, estavam vazios. No dia seguinte, lembraria de encher a jarra.


Colocou um robe por cima do pijama e saiu; os chinelos que usava não provocavam ruído. Quando chegou no final do corredor, escutou a voz furiosa de Ricardo:


- Essa é a última vez! Mais uma e você está na rua!


- Mil desculpas, seu Ricardo! – era a voz de Larissa que chorava – Eu... eu... não fiz por querer. Eu não pensei...


- Você não é paga para pensar e muito menos falar! É paga apenas para fazer seu serviço sem questionar! Entendeu?


- S... sim.


- E o mesmo digo para qualquer um de vocês. – abaixou o tom, mas a imperiosidade ainda estava presente – Eu não vou tolerar qualquer deslize desse tipo com minha esposa. Entenderam?


- Sim, senhor – responderam várias vozes, com certeza a dos empregados


- E outra coisa... se Letícia fizer qualquer pergunta sobre o passado dela ou mesmo sobre sua rotina, vocês simplesmente respondam que não sabem muito a respeito. São essas as minhas instruções – suspirou – Alguma dúvida ou objeção? – um longo silêncio. – Ótimo! Estão todos dispensados.


Escutou passos de pessoas saindo. Letícia voltou para o quarto, deixando de lado a sua sede.


Meu Deus, o que foi isso? 



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Autor(a): jord73

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