Fanfic: 2023 O Ano da Guerra Civil | Tema: Política, Atualidades, Conspirações, Esquemas, Corrupção
Absorto em seu luxuoso apartamento situado bem no centro da capital do país, Tácio Lisboa, engolia uma boa dose do whisky escocês que pedira para seu motorista trazer do armário do seu gabinete no trabalho, repousou o líquido na boca e depois deixou descer sentindo os efeitos da bebida na garganta. Após um banho quente e bem demorado, ele se levantou da sua macia poltrona enrolando ao corpo o grande e felpudo roupão de banho, tragou mais uma vez o charuto e andou em direção a larga vidraça do prédio, a qual dava ampla visão da avenida a frente do edifício imponente em que morava. Observou o movimento dos carros e tentou em vão identificar um padrão em seus movimentos, ou mesmo reconhecer algum veículo que pudesse indicar alguma coisa. Seria esta noite! Ele sabia. Havia se arriscado em demasia durante seu último gesto, um passo muito perigoso para se fazer naqueles tempos, mesmo para um homem em sua alta posição. Eu me arrisquei demais. Será o meu fim! Porém, foi um gesto que ele não conseguia mais conter dentro de si ou ele explodiria de furor. Tácio Lisboa não era um homem capaz de ver seu mundo mudar sem que ele tivesse a chance de mexer nas peças do tabuleiro, ele observou seu reflexo na vidraça como quem tentava esconder de si próprio o turbilhão de sentimentos que o pertransiam por todo o corpo, um corpo nada robusto de estatura mediana sem qualidades atléticas para uma pessoa que passou toda sua vida com a cara nos livros. Seu rosto maduro e a vista cansada mostrava as marcas de noites em claros buscando conhecimento para um dia ter o status que sempre sonhara. Os cabelos grisalhos denotavam que já haviam se passado muitos anos desde sua formação e ingresso na carreira dos magistrados. A tez morena e os olhos castanhos não escondiam a descendência humilde e sofrida em um dos Estados mais pobres da região do Nordeste.
Eles virão esta noite, eu sei!
Caminhando pela larga sala, pisando sobre o espesso tapete importado que se estendia por todo o centro do ambiente, Tácio acionou a tela do seu celular, mas não havia nenhuma nova mensagem. Ele sabia que o aparelho não havia tocado, mas olhou a tela num ímpeto de talvez não ter escutado o som de uma nova notificação. Pensou em entrar em contato com seu velho amigo, mas ele compreendia que seria outro movimento perigoso. Poderiam descobrir a localização do seu velho parceiro e até, inclusive, revelar seus intentos. Não poderia botar mais nada a perder. Sua vida já estava em jogo agora, e Tácio admitia apenas mais esta perda somente. Não poderia arriscar mais ninguém. Ele não falaria nada sob nenhum pretexto. O plano que haviam montado não poderia falhar. Então... eles surgiriam do nada! E tudo iria parecer um acidente, um suicídio, ou coisa do tipo.
Ele buscou em suas reminiscências todos os esforços que fizeram para consertar a nação e desfazer o estrago que o Partido dos Vermelhos havia feito por quase três décadas no poder. Agora, por um simples deslize, tudo fora perdido. Os Vermelhos de volta ao poder. Certamente, sabia ele desde há muito tempo, que iriam desfazer os erros que cometeram no passado, agiriam de todas as formas para perseguir seus opositores e montar um estratagema poderoso e perspicaz para nunca mais deixarem o poder novamente. Afinal, eles deixaram o poder por um simples descuido, uma pedra de tropeço formada pela sua própria arrogância. Mas agora eles seriam perspicazes! Perspicazes de tal maneira que já se faziam quase seis meses que o corpo do seu parceiro de toga havia desaparecido naquele acidente aéreo no meio da selva amazônica. Acidente! Ele riu consigo mesmo. Realmente a perspicácia dos Agentes Rubros era tão grande que os opositores do partido morriam sempre em circunstâncias fora de qualquer suspeita, ou era um acidente, ou se suicidavam, ou mesmo desapareciam misteriosamente.
Uma boa parte das pessoas acreditavam na existência de uma organização como essa, porém, jamais foram encontrados quaisquer indícios de que haveriam de existir esses tais Agentes Rubros. O que se comentava era que eles vinham sempre a noite, nada se escutava, não haviam lutas, gritos, murmúrios, latidos, nada. Apenas corpos, e em algumas vezes, não havia corpo algum. Tácio Lisboa se recusava a sair do seu próprio apartamento e ser vítima de algum acidente de automóvel, todavia lembrou que já soube de alguns casos em que os desafetos do partido tinham sofrido acidentes domésticos fatais. As largas paredes brancas ornadas de quadros pareciam não ser suficiente para protegê-lo, no entanto, ele queria enfrentá-los de frente. Fitou a poltrona confortável e convidativa, mas recusou-se a sentar para não cair no sono e correr o risco de ser pego de surpresa pelos famigerados Agentes Rubros.
Com teimosia o decano manteve-se de pé afastando o sono com mais uma tragada no caríssimo charuto importado e ele pode ver a brasa incandescente brilhar no reflexo do vidro da fachada, enquanto que repentinamente, sua mente o fez lembrar da tenacidade de seu colega de toga, André Toledo, ao ignorar seus avisos para não embarcar naquele avião. Não naquelas circunstâncias! Toledo havia enfrentado o partido com grande heroísmo, porem foi fulminado pelos olhos do todo poderoso, então novo presidente da Governo Republicano Independente do Brezil, e com certeza, o ministro André Toledo não escaparia impune dessa ousadia. O seu substituto na Corte dos Lordes, indicado pelo novo chefe de Estado, com os olhos inquisidores, nariz aquilino e a ausência de pelos em toda a cabeça, ele era um ser desprezível e tenebroso. Sob seu comando, a nova equipe de Ministros daquela casa de justiça parecia não querer mais tolerar nenhum tipo de desvio de conduta ou alguma forma de desrespeito para com seus membros como outrora acontecia, tanto que já se falava em controlar os conteúdos publicados nas redes sociais em todo o país.
Depois de outro grande gole no copo de whisky, o ministro Tácio Lisboa sentou-se na poltrona e observando o teto, pensou como o Brezil se transformara tão rapidamente naquela república instável e refletiu também sobre qual seria o futuro dos jovens que viveriam dali pra frente. Que tipo de geração seria esta, meu Deus! Em um espaço de pouco mais de um ano, o Estado Democrático de Direito era agora apenas uma frase bonita eloquentemente gritada em discursos vazios pelos membros do Partido dos Vermelhos, o qual, ele bem sabia, que não fazia o que pregava. Eram apenas perseguições, cerceamento, prisões, espancamentos, mortes. Tudo diante de um parlamento mudo e calado. Era essa a harmonia entre os poderes que estava faltando? Vamos assistir a todas essas barbaridades, calados? Vociferava o ministro André Toledo enquanto dava uma entrevista coletiva para a imprensa. Agora, ele havia sido realmente ‘calado’, pensou Tácio. Calada foi também sua entrevista que sumiu dos registros das emissoras de TV. O único ministro religioso havia sido calado. Vai com Deus meu amigo! Disse baixinho ao pensar na forte religiosidade do parceiro que fora indicado à Corte dos Lordes pelo antigo presidente Jairo Bosco assim como ele o foi. O copo de whisky caíra no chão e o ministro Tácio sucumbindo ao cansaço, adormeceu.
No dia seguinte, em um pronunciamento extraordinário, o presidente eleito democraticamente pelo resistente sistema eletrônico de votos, Nicácio Calamar Varas, do Partido dos Vermelhos, anunciava com tristeza e profundo pesar a morte repentina do Ministro da Corte dos Lordes, Tácio de Lisboa, o qual fora encontrado já sem vida na banheira da suíte do seu quarto onde morava, da qual transbordava água pelos corredores do prédio. A camareira que encontrou o corpo do ministro submerso na banheira, assustada, chamou a polícia. Sem demora, os Federais instauram inquérito para investigar a causa da morte e já apresentavam o laudo afirmando que se tratava de um suicídio. Após a cerimônia fúnebre de despedida do decano, o presidente Varas anuncia a indicação do seu próprio advogado como o próximo ministro integrante da Corte dos Lordes sob aprovação unânime do senado para ocupar o lugar que antes era de Tácio de Lisboa. Agora, os dois ministros que haviam sido indicados pelo ex-presidente, do Partido dos Liberais, Jairo Bosco, eram substituídos pelas novas indicações. Com isso, em menos de dois anos, todos os atos do governo anterior estavam definitivamente desfeitos e enterrados em algum momento da história do país. Na perspectiva do novo governo era que a sensação do povo deveria ser que jamais teria havido essa ruptura, essa intercalação entre partidos. O governo do Partido dos Liberais nunca devia ter existido!
Autor(a): Mauro Celso
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 1
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Mauro Celso Postado em 30/08/2023 - 14:23:31
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