Fanfics Brasil - Capítulo 19 Scooby-Doo: Wicked Game

Fanfic: Scooby-Doo: Wicked Game | Tema: Scooby-Doo, Round 6


Capítulo: Capítulo 19

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  Chegamos ao apartamento de Fred depois de Norville e Crystal. Shaggy debochou de Fred por ter demorado – aparentemente ele ainda estava ressentido pelas brincadeiras que Fred e Flim Flam fizeram sobre as habilidades de motorista dele- e no momento em que percebi que eu teria que ajudar a descarregar toda a bagagem da van eu amaldiçoei cada peça de roupa que estava dentro nas malas de Daphne. Felizmente, o cavalheirismo patético (e até um pouco machista) de Fred se manifestou antes que pudéssemos pegar nas alças das malas e ele carregou toda a bagagem de Daphne para o hall do prédio. Logo em seguida, Norville começou a descarregar as minhas malas do carro de Fred – obviamente, Shaggy não fez isso com a intenção de ajudar, ele ainda estava ressentido e queria mostrar a Fred que conseguia carregar mais malas pesadas do que ele – e eu agradeci à masculinidade frágil e infantil de ambos pela oportunidade de não ter que carregar toda aquela merda até o décimo andar. Quando o elevador chegou, Scooby-Doo foi o primeiro a entrar e Fred não teve chance de dizer que o cão deveria ser levado ao canil da K9 Unit.  Antes de subirmos, Crystal se despediu de nós e deu um intenso beijo de boa noite em Shaggy.


            Daphne: Crystal, por que não fica conosco essa noite? Depois do que passamos hoje, é perigoso que você fique sozinha…


            Crystal: Ah, não se preocupe, eu moro com os meus pais… meu pai foi militar a vida toda, é um veterano do Vietnã, então acho que ficarei segura…


            Crystal e Shaggy se despediram novamente de maneira romântica, e a minha mente maldosa não conseguiu deixar de reparar que uma hippie de quase 30 que mora com os pais e adora cães seria a mulher perfeita para o nosso amigo que aos 28 ainda pede dinheiro ao pai para comprar créditos em jogos online. Durante o trajeto do elevador, Scooby-Doo se divertiu subindo na bagagem e nos pisoteando até derrubar uma pilha de malas e cair em cima de nós. Quando o elevador parou, Scooby abocanhou uma das minhas maletas de perícia e saiu correndo, enquanto Norville empilhou o resto da minha bagagem nos ombros. Daphne resolveu arrastar as malas dela até o apartamento para demonstrar que não precisava da ajuda de Fred e sinalizou para que eu a ajudasse. Eu suspirei, amaldiçoei aquele empoderamento em momento inoportuno e retirei as últimas malas do elevador. Quando coloquei a maldita bagagem na sala de Fred, a dor muscular dos meus braços sedentários se transformou em raiva e saiu em forma de palavras.


            Velma: Daphne, você sabia que com duas calças, duas blusas, dois sapatos e dois casacos você ocuparia apenas uma mala e conseguiria se vestir de dezesseis maneiras diferentes? É um problema simples de resolver… matemática básica…


            Daphne: Eu sei, Velma, mas o que tem nessas malas resolve qualquer problema…


            Daphne abriu uma das malas e no interior havia dezenas de maços de notas de cem dólares. Nós três paralisamos diante de tanto dinheiro.


            Daphne: Essa outra tem maços de notas de cinquenta… porque se eu combinar duas notas de cem com duas de cinquenta dá para pagar de várias formas diferentes…


            O deboche de Daphne não diminuiu o nosso espanto. Mesmo assim, ninguém conseguiu sair do choque e dizer alguma coisa.


            Daphne: O que foi, gente? Nunca viram dinheiro na vida?


            Shaggy: Tipo, isso é muito mais do que todo o dinheiro que eu já vi em toda a minha vida…


Fred: Daphne, você estava andando pela cidade com uma mala de dinheiro?


            Daphne: O que foi? Eu sei que em breve eles congelarão as contas de Blake Bank devido ao escândalo… por isso eu tirei um pouquinho para eu poder sobreviver… eu também avisei meus pais para fazer o mesmo… avisei até as chatas das minhas irmãs… só não avisei a Dawn porque eu quero muito que o cartão dela seja recusado na frente de todo mundo quando ela estiver comprando passagem em um vôo comercial…


            Velma: Daphne, isso é ilegal!


            Daphne: Não é ilegal se você explicar a origem do dinheiro… e eu tenho provas suficientes de que ele é meu…


            Daphne me olhou com uma expressão que claramente dizia “nada é ilegal quando você tem dinheiro o suficiente e um sobrenome mundialmente famoso”, mas ela não ousou verbalizar. E eu não ousei continuar aquela discussão.


            Velma: E quanto de dinheiro há nessas malas?


            Daphne: Bem, cada maço de notas de cem tem 1,2 cm de altura, 6,9cm de largura e 15,5 cm de comprimento, com uma fita métrica você consegue descobrir as dimensões da mala… é só fazer as contas… como você mesma disse, é um problema simples de resolver… matemática básica…


            Eu revirei os olhos diante da provocação sarcástica de Daphne e não recebi nenhum apoio, pois todos começaram a rir de mim. Enquanto eu retirava meus pertences das maletas de perícia e organizava tudo em cima da mesa de jantar, Scooby-Doo passeava pelo apartamento farejando cada centímetro e Shaggy vasculhava a geladeira e as gavetas da cozinha. Quando Norville pegou todas as embalagens de comida que queria, ele acompanhou Scooby em sua exploração pelo local. Quando os dois encontraram o escritório, Shaggy jogou as embalagens em cima da mesa e começou a exclamar com empolgação todos os componentes e configurações do computador de Fred.


            Shaggy: Hey, Jones, tipo, por que você nunca me disse que tinha uma máquina dessas em casa?


            Fred: Por que todas as vezes que você veio aqui você não saiu da cozinha…


            Todos riram novamente e dessa vez eu também participei. Norville e Fred começaram a discutir coisas inúteis sobre um jogo de computador enquanto eu e Daphne montávamos o meu microscópio. Quando Norville finalmente parou de falar – provavelmente porque o tal jogo havia começado - Fred começou a levar as malas de Daphne para o quarto dele, e isso gerou um desconforto instantâneo nela, que corou violentamente e o impediu de continuar.


            Fred: Eu pensei que… talvez… você e a Velma… pudessem ficar com a minha cama… eu ficarei bem aqui na sala… e Shaggy…


            Shaggy: Tipo, eu e Scooby ficaremos bem aqui!


            A ênfase que Fred deu em “você e a Velma” fez a timidez de Daphne diminuir, mas inevitavelmente me fez corar. Sem Daphne perceber, eu sinalizei a Fred para que me acomodasse em outro lugar, mas ele simplesmente me ignorou e levou minha bagagem para o seu quarto. Eu suspirei e desejei mortalmente que jamais chegasse aos ouvidos de Marcie Fleach que eu dividi a cama com Daphne. Com os meus aparelhos prontos, eu comecei a investigar as embalagens e o conteúdo dos galões. Fred se sentou ao meu lado para analisar os cartões, apesar de Daphne constantemente insistir para que nós dois fôssemos descansar. Depois de muito insistir, Daphne desistiu de nós e foi tomar um banho para poder dormir. Scooby-Doo se ocupou de destruir uma bola de baseball rara que Fred recuperou em um home run e Shaggy não apareceu para nos ajudar, exceto nas raras vezes em que passou por nós para ir até a cozinha buscar mais salgadinhos. O resultado inicial de meu trabalho foi anunciado menos de uma hora depois de eu ter começado:


            Velma: Jinkies! Achei uma digital perfeita na embalagem, vejam! É um polegar…


            Fred deixou os cartões por um momento para olhar a minha descoberta. Nós dois ficamos analisando a digital por alguns minutos, até que Fred colocou o próprio polegar ao lado da marca e, em seguida, puxou o meu polegar e também colocou ao lado para comparar.


            Fred: Acho que podemos seguramente dizer que essa digital é de Gi-Hun. Pelo tamanho do dedo, parece ser um polegar masculino…


            Velma: Acho que você está certo, Fred, eu me lembro de Sarah ter dedos finos…


            Após a minha fala, Fred agarrou Shaggy pelos pulsos contra a vontade dele, depois levou o polegar de Norville até a mancha enquanto ele recitava os palavrões de costume. A marca de Doritos que o dedo magrelo de Norville deixou era do mesmo tamanho que a digital, e isso contribuiu para as nossas suspeitas. Em um impulso, Fred pegou o cartão que achamos em Applegate Bank com uma pinça e logo em seguida esparramou um pouco de pó em cima dele. Eu fiz os procedimentos necessários para tirar o excesso e o resultado foram duas digitais perfeitas de polegar e uma digital parcial de indicador. À primeira impressão, as digitais de polegar eram do mesmo tamanho que a digital que achamos nos galões. Fred sorriu para mim e Shaggy se afastou com pressa, murmurando maldições por termos atrapalhado o seu jogo online.


            Fred: Se as digitais forem idênticas, a teoria de que Gi-Hun plantou as provas é verdadeira…


            Velma: Na verdade, provaremos que a mesma pessoa que pegou esses galões pegou o cartão de Applegate Bank… ainda não comparamos essas digitais com as digitais de Gi-Hun para afirmar que elas são mesmo dele…


            Fred: Mas podemos supor que sejam…


            Daphne: Não precisamos supor, vamos mandar as digitais para a Interpol! Eles podem confirmar se elas são de Gi-Hun… e se não forem, eles podem descobrir de quem são…


            Da mesma maneira inesperada com que apareceu, Daphne se aproximou das nossas lentes, fotografou todas as digitais sem pedir permissão e encaminhou tudo a Flim Flam, inocentemente acreditando que uma simples foto seria eficaz. Em seguida, ela comparou o tamanho do próprio polegar com as digitais encontradas. Fred perdeu totalmente a concentração devido à camisola de Daphne e o cheiro delicioso de pêssego de vinha dos cabelos úmidos dela, então eu tive que preparar as digitais com métricas e contrastes adequados para que Flim Flam pudesse analisá-las. Quando eu terminei, eu comecei a analisar a substância química que encontramos dentro dos galões. Daphne aparentemente desistiu de nos convencer a ir dormir, por isso, puxou uma cadeira ao lado de Fred e começou a analisar os cartões achados na Liberty com uma das minhas lentes. Fred permaneceu inútil, preso em seu transe ridículo devido à camisola curta que evidenciava a boa forma de Daphne, por isso não foi muito produtivo. Daphne analisou mais de cem cartões e espalhou pó em cada um deles, o que revelou centenas de digitais parciais. No intervalo entre uma reação química e outra, eu preparava as digitais parciais e Fred fotografava de maneira desajeitada - ainda perturbado com a presença sensual ruiva ao lado dele. Por ironia do destino, enquanto trabalhávamos para obter provas, a prova mais interessante de todas se revelou sozinha.


            Velma: Jinkies, vejam isso!


            O pó que Fred havia esparramado no cartão achado em Applegate Bank fez uma enorme mancha escura na superfície dele, manchando grande parte do cartão. No centro da mancha, havia um pequeno quadrado intacto onde a cor original do cartão foi mantida. Imediatamente, Fred pegou o cartão com uma pinça e apertou o quadrado com uma espátula.


            Fred: Vejam, é maciço! Há algo aqui dentro!


            Fred então começou a fazer manobras cuidadosas para tentar retirar o objeto quadrado de dentro do cartão. Ao ver a coordenação motora de Fred falhar algumas vezes, Daphne decidiu ajudar e se aproximou para segurar o cartão, mas a proximidade do corpo dela só contribuiu para que ele falhasse ainda mais. Enquanto os dois persistiam em remover cirurgicamente aquele quadrado, eu fiz alguns testes químicos em um dos cartões achados na Liberty - pinguei a substância que havia dentro dos galões neles e depois adicionei um pouco de pó – e no fim, a mancha foi idêntica àquela obtida no cartão que Fred e Daphne examinavam.


            Velma: Vejam só, tudo indica que o cartão de Applegate Bank foi manchado anteriormente com essa substância dos galões… agora eu preciso fazer testes para comprovar se a substância que está nesse cartão é a mesma dos galões…


            Fred: Se isso for verdade, confirmaremos que Gi-Hun espalhou essa substância em Applegate Bank para nos levar até o cartão… e também na Liberty para levar Scooby até o sangue que havia dentro do frigobar…


            Daphne: Jeepers, com certeza ele fez isso, turma! Vejam isso!


            Com a ajuda de uma pinça, Daphne retirou um quadrado minúsculo e maciço, com uma superfície dourada e brilhante de um lado e cinza escuro do outro. Eu lhe ofereci uma placa de Petri e ela colocou o quadrado dentro, logo em seguida eu aproximei a lente de maior aumento e nós três nos aproximamos para ver.


            Fred: Parece um microchip?


            Velma: Hmm... não vejo um circuito, Fred… na verdade… isso está parecendo uma mini etiqueta RFID, veja essas partes laminadas…


            Fred: Tem razão… veja a freqüência… 125 kHz…


            Daphne: Dá para vocês falarem uma língua que eu entenda?


            Fred: É uma etiqueta de identificação por radiofreqüência, Daphne… como aquelas etiquetas que as lojas colocam em alguns produtos para não serem roubados…


            Daphne: Ah, sim, elas também servem para abrir portas, portões e cancelas com a aproximação de cartões magnéticos, não?… Blake Manor está cheia delas… eu tinha uma dessas fechaduras eletrônicas no meu apartamento, mas depois que Alan o invadiu, eu quero uma fechadura biométrica e dois seguranças…


            A fala de Daphne fez Fred e eu nos olharmos com espanto. Daphne não entendeu a nossa conclusão, por isso começou a se explicar, temendo ter dito algo errado sobre a etiqueta.


            Velma: Daphne, você é um gênio! É isso! Essa etiqueta deve ser a chave para abrir algum tipo de acesso restrito aos VIPs!


            Fred: E isso prova que esse cartão é diferente dos demais porque ele realmente pertence aos VIPs…


            Velma: E também explica porque Gi-Hun queria que nós o encontrássemos!


            Daphne: Mas como vamos achar esse lugar restrito? Não temos mais acesso à Liberty… e com os federais no controle, eu duvido que consigamos ter acesso a Applegate Bank novamente…


            Fred: Infelizmente Gi-Hun não deve ter pensado que nossos acessos à ficariam restritos…


            Velma: Ou será que ele pensou? Ainda não visitamos os endereços em que ele esteve aqui em Nova York… talvez um deles tenha um acesso secreto à Liberty…


            Daphne: Turma… e se esse local restrito for um pouco mais longe daqui… por exemplo… Coréia do Sul…?


            Ao terminar a frase, Daphne apontou para um pequeno desenho que havia embaixo do local onde estava a etiqueta quadrada. O desenho era feito por uma linha fina e prateada, e parecia ter uma forma peculiar. Em seguida, Daphne nos mostrou o mapa da Coréia do Sul na tela de seu celular, e percebemos que o pequeno desenho era uma representação em miniatura do mapa da Coréia do Sul.


            Velma: Jinkies, talvez seja um acesso àquela ilha?


            O meu comentário nos fez estremecer, pois sabíamos que a comprovar a presença dos VIPs na ilha significava fortalecer a teoria de Shaggy. Fui tirada dos meus pensamentos pela coloração viva e uniforme que todas as amostras adquiriram quando adicionei um indicador ácido-base, e após finalizar a titulação, concluí que todas as amostras tinham o mesmo composto: uma mistura de alvejantes à base de hipoclorito. Antes que eu pudesse verbalizar a boa notícia, Fred comparou os resultados idênticos entre as amostras e sorriu.


            Fred: Gi-Hun realmente fez uma trilha com esse composto químico!


            Velma: É o que a química nos diz… o líquido do cartão e o líquido do galão são a mesma mistura…


            Fred: Agora só nos resta entender por que ele fez isso… será que ele está mesmo querendo nos dizer algo ou está nos conduzindo para uma armadilha?


            Velma: E também entender para quê ele fez isso… por justiça pelas vítimas? Para denunciar os VIPs e livrar George e Steven? Ou está agindo em benefício próprio?


            Daphne: Bem, eu acho que agora o que nos resta é dormir, turma. Tivemos um dia realmente longo e amanhã faremos uma viagem de mais de 15 horas, precisamos descansar.


            Fred ia continuar a contra-argumentar na linha de raciocínio “o que nos resta a fazer é…”, mas a imagem de Daphne espreguiçando dentro da camisola de cetim o interrompeu. Logo em seguida, um bocejo longo se apropriou de mim e eu concordei com Daphne. Eu então acertei o despertador do meu celular para as 8h e Fred trouxe seu travesseiro para o sofá. Quando tirei os meus óculos, eu vi um borrão ruivo deixar um beijo na testa do borrão loiro que ocupava todo o sofá, mas não consegui ver a expressão facial que os dois borrões adquiriram depois do beijo. Enquanto Daphne fazia movimentos felinos para se aninhar na cama de Fred, eu pedi para Norville desligar aquela porcaria e ir dormir.


***


            Quando abri os olhos, eu estava em um corredor estreito e mal iluminado muito parecido com aquele em que estive na Liberty.  O local estava silencioso, exceto por um barulho agudo e repetitivo ao fundo, vindo de algum lugar. Eu caminhava lentamente, e a cada passo que eu dava o barulho se tornava mais intenso. Crescia também o mau agouro em meu peito, o desespero que aquele local sinistro instigava contaminava lentamente o meu corpo, fazendo-o tremer. Ao olhar ao redor, não havia saída, o corredor continuava indefinidamente com suas paredes lisas e frias, vez ou outra, o desenho de um triângulo, um círculo ou um quadrado aparecia rabiscado no concreto. O medo me fez apertar o passo, e os meus passos rápidos despertaram algum tipo de máquina (que eu não sabia o que era, nem conseguia ver) que começou a me perseguir. Meus passos se tornaram maiores e mais rápidos, e eu já podia ouvir o barulho de engrenagens logo atrás de mim. Meus pés pisaram em um líquido frio e brilhante que estava em toda parte (luminol?), e no segundo seguinte, a angústia de meus pés e mãos deixaram manchas fluorescentes nas paredes. De repente, um estalo me fez tropeçar e cair no chão, e no segundo seguinte, todo o luminol – e também as manchas que eu deixei no corredor – se tornou vermelho vivo. Então, eu me vi sentada no chão e banhada em sangue, com centenas de corpos vestidos em moletom verde caídos de bruços ao meu redor. As engrenagens se aproximaram e revelaram ser uma boneca gigante em vestido amarelo, que me olhava como uma presa fácil. No auge do meu desespero, eu não conseguia gritar por ajuda. Também não conseguia ouvir nada além daquele barulho incessante e fúnebre que se repetia infinitamente no mesmo compasso do meu medo. Pensei nos meus amigos. “Eles estão mortos”, respondeu uma certeza assustadora que se apoderou da minha mente, pedindo para que eu olhasse cada um daqueles rostos frios que estavam no chão. Não tive coragem de me mexer. Tampouco precisei, porque logo em seguida um barulho de sino ecoou pelo corredor, os cadáveres se levantaram e marcharam como zumbis através de labirintos coloridos tão confusos quanto uma pintura do Escher. Eu tentei me esquivar daquela imagem apavorante, mas fui pega por três homens vestidos de vermelho que – para o meu desespero – não tinham face. No local de seus rostos havia figuras geométricas - um triângulo, um círculo e um quadrado – estampadas em uma máscara maciça que me dava arrepios. Em um impulso, eu me soltei das mãos deles e fugi.  Em uma das escadarias do labirinto eu vi Scooby-Doo e a imagem ruiva de Gi-Hun correndo desesperadamente em minha direção. Antes que eu pudesse alcançá-los, eu senti meu corpo desfalecer e minha consciência diminuir aos poucos até eu perder totalmente os sentidos. Presa em um estado entre o sono e a vigília, eu ouvi rajadas de tiros, gritos de pavor e meu nome sendo chamado diversas vezes…


            Daphne: Velmaaaaaa! Acorda! Será que eu vou ter que jogar água no seu rosto?


            O chamado de Daphne me fez sentar na cama. Minha consciência estava totalmente confusa por confrontar a realidade da vigília com os horrores do sono, mas meu peito sentia um grande alívio por perceber que nada daquilo aconteceu.


            Daphne: É o Flim Flam, ele tem boas notícias sobre as suas digitais.


            Daphne praticamente jogou o celular dela na minha cara, virou de costas para mim e se cobriu até a cabeça, deixando claro que ela iria voltar a dormir. Eu ainda estava desorientada pelo pesadelo, e quando olhei o relógio do celular de Daphne marcando 5:40 da manhã, percebi que também estava desorientada por conta do horário inapropriado para uma chamada de vídeo. Ao perceber o meu desconforto, Flim Flam ficou sem jeito por ter esquecido a diferença entre os nossos fusos-horários e perguntou se deveria ligar em outro momento. Eu disse para Flim Flam permanecer na linha e tateei a cabeceira da cama em busca dos meus óculos. Não consegui compreender imediatamente o que Flim Flam dizia porque as palavras dele foram abafadas por Daphne gemendo e resmungando em protesto por eu estar com uma fonte de luz e de áudio bem ao seu lado, por isso pedi um momento e migrei para a sala.  Quando eu finalmente despertei e assimilei as informações, eu me senti aliviada por ter sido tirada de um pesadelo tão horrível.


            Flim Flam: As digitais que você encontrou são mesmo de Gi-Hun, a polícia de Seul confirmou…


            Velma: Ótimo! Então estamos certos em supor que Gi-Hun nos levou até as pistas… 


            Flim Flam: E tem mais: um agente da polícia de Seul disse que Gi-Hun procurou a delegacia no ano passado com um desses cartões estranhos em mãos… ele estava bastante assustado e quis fazer uma denúncia contra a pessoa que lhe entregou o cartão… Gi-Hun contou aos policiais que ligou para o número e foi convidado a participar de um jogo com outros participantes, e o vencedor ganharia uma grande quantia em dinheiro… mas os participantes que perderam foram executados… então ele pediu para os agentes ligarem para o tal número, mas quando eles ligaram, ninguém atendeu, então eles não acreditaram em Gi-Hun… tempos depois, Gi-Hun também desmentiu  o que disse à polícia, ele mesmo afirmou que estava bêbado quando contou aquela história, então os policiais não deram atenção a isso… porém, logo em seguida, o detetive Hwang Jun-ho desapareceu… e está desaparecido desde junho de 2020… durante algumas buscas recentes na casa dele, adivinha? Os agentes acharam um cartão idêntico ao de Gi-Hun, idêntico a esses cartões que vocês acharam na Liberty… e aquele número de telefone também estava no histórico das últimas chamadas que Jun-ho fez… então, tudo indica que a história que Gi-Hun contou é real e Shaggy está certo…


            As palavras de Flim Flam foram gradativamente embrulhando meu estômago, até que uma náusea profunda tomou conta de mim, juntamente com aquela sensação maldita de que algo ruim vai acontecer. A menor lembrança daquele pesadelo me fez estremecer, e eu fiquei tão abalada que Flim Flam percebeu e parou de falar.


            Flim Flam: Está tudo bem com você?


            Velma: Sim… eu só estou… um pouco… assustada… com a proporção que esse caso está adquirindo… começamos a investigação pensando se tratar de um caso simples de estelionato e agora estamos lidando… com… jogos mortais?  É a mais pura crueldade humana… sabe… eu… até… tive…


            “Um sonho”. Eu quis gritar, chorar e falar sobre aquele maldito sonho que parecia tão real quanto às evidências que confirmavam que o reality show existia… porém, o meu medo de parecer ridícula era maior que a minha angústia, e o meu orgulho cético me fez engolir cada pedaço daquele sofrimento intuitivo.


            Flim Flam: Bem-vinda à Interpol, agente Dinkley! Aqui nós temos que lidar com o que há de pior em cada nação…


            Velma: …eu não sei se consigo lidar com isso, Flim Flam… eu acho… que… não estou preparada… para isso…


            Flim Flam: Ninguém está preparado, agente… mesmo assim, alguém tem que fazer o trabalho sujo…


            Velma: Como você consegue lidar com isso? Quero dizer… é tão irracional… eu fico me perguntando: por quê?… por que capturar e sacrificar inocentes?… não há nenhum motivo! Não tem lógica nenhuma na maldade…


            Flim Flam: Nem tudo tem uma explicação lógica, Velma… “existe muita coisa entre o céu e a terra do que pode imaginar a nossa vã filosofia”… alguém importante falou isso um dia, eu não lembro quem foi e também não vou sair do Free Fire para abrir um navegador e procurar, então foda-se, a ideia é mais ou menos essa…


            Uma pequena risada escapou de meus lábios diante da sinceridade de Flim Flam, mas ela não foi suficiente para acalmar o desespero em meu peito. Eu, que nasci no berço da ciência, fui criada com ciência e cresci no meio científico… não estava preparada para lidar com algo tão anticientífico quanto a vil natureza humana. Eu não estava preparada para dar ouvidos a premonições que eram confirmadas através de evidências terríveis, eu não estava preparada para lidar com pesadelos que pareciam ser… reais. Mas havia um trabalho sujo a fazer. E ele deveria ser feito, mesmo que eu não estivesse nem um pouco preparada para isso. Um silêncio incômodo tomou conta da nossa chamada de vídeo, interrompido apenas por barulhos de tiros vindos de Flim Flam e risadas de Shaggy vindas do escritório de Fred. Em seguida, foi a vez de Fred resmungar e gemer para mostrar que eu deveria parar de fazer barulho. Como o barulho não cedeu, ele se levantou, atirou uma almofada em minha direção e inconscientemente migrou para a própria cama, buscando o conforto necessário para continuar a dormir. Apesar de eu saber que eu deveria avisá-lo sobre a presença de Daphne na cama, eu não fiz nada e deixei que eles descobrissem sozinhos na manhã seguinte. Eu já estava lidando com coisas anticientíficas e irracionais demais e não podia aturar a falta de lógica do amor óbvio que aqueles dois insistiam em negar. Entre um tiro e outro, Flim Flam se despediu. E eu, assombrada por pensamentos, me encolhi no sofá e deixei que o sono me trouxesse alguma paz.


            




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Autor(a): kendrakelnick

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