Fanfics Brasil - Capítulo 24 – Batatinha Frita, 1, 2, 3 Scooby-Doo: Wicked Game

Fanfic: Scooby-Doo: Wicked Game | Tema: Scooby-Doo, Round 6


Capítulo: Capítulo 24 – Batatinha Frita, 1, 2, 3

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            “Essa daqui é tão pequenininha, pelo jeito ela acabou de fazer 18 anos…”


            “Ela não tem cara de espanhola… nem de latina…”


            “Milagros! Nacionalidade não tem cara… ela pode ser que qualquer lugar do mundo, até mesmo daqui da Coréia!”


             “Claro que nacionalidade tem cara! E essa daqui tem cara de inglesa…”


            “Será que ela é européia?”


            “Não sei de onde ela é, mas com esses óculos, eu acho que ela parece ser bastante inteligente… uma cientista… professora… advogada, algo assim…”


            “Ou é apenas uma vadia que usa óculos…”


            “Milagros!”


            “Só estou sendo sincera, Lupe…”


            “Cabelo castanho, aparência elegante, baixa… ela é certamente italiana…”


            “Você quer que ela seja italiana, Ginevra, mas visivelmente ela não é!”


            “É claro que eu quero, eu não aguento mais falar espanhol com vocês duas e ter que ouvir o idioma coreano a todo o momento, caspita!”.


            A interjeição emitida pela voz feminina foi tão enfática que fez meus olhos abrirem, porém, minha mente ainda permanecia em um estado letárgico profundo. A primeira coisa que vi foram três borrões de cabelos castanhos me examinando como se eu fosse um alienígena, e logo em seguida minha cabeça doeu de maneira tão forte que achei que fosse ter um AVC. Eu tateei ao redor do meu rosto e percebi que estava usando os meus óculos, então a causa da imagem borrada certamente era a vertigem que estava acometendo meus sentidos. Minha memória, por outro lado, estava intacta, e logo me lembrou da última imagem horrível que meus olhos foram forçados a ver: Gi-Hun sangrando em cima de mim, Flim Flam e Scooby-Doo fugindo de uma rajada e tiros e homens mascarados carregando meu corpo desfalecido para dentro de um carro. Em seguida, meu coração disparou e fez meu corpo sentar imediatamente e tatear à procura de pistas sobre o local onde eu me encontrava. Para a minha surpresa, eu estava em uma cama, na verdade, na parte de baixo de um grande beliche feito de metal. Aos poucos, meus olhos e meu cérebro se entenderam e ajustaram o foco da imagem à minha frente, revelando três mulheres de diferentes idades usando agasalhos de moleton verde com um grande número branco na lapela esquerda. Todas elas estavam sentadas à minha frente e me olhavam com surpresa. Novamente, minha memória se mostrou operante e me lembrou que o agasalho que elas usavam – e que eu também estava usando, para o meu desespero – era idêntico ao agasalho que as vítimas usavam naquelas fotos que achamos na parte secreta da Liberty, e isso me levou à pior conclusão de minha vida: eu havia me tornado mais uma vítima de Squid Game.  Minha primeira reação foi levar as duas mãos à boca e cair no choro.  Minha atitude causou reações distintas nas três mulheres: a mais jovem delas, número #64, imediatamente se aproximou e tentou me confortar com um abraço.  A mais velha, número #85, riu debochadamente enquanto fazia uma careta de desprezo e murmurava algumas palavras em espanhol que eu não compreendi bem. A última, número #122, aparentava ter uma idade intermediária entre a mais nova e a mais velha, e apenas sorriu compreensivamente para mim.


            Lupe: Relaxa, querida, é o efeito do remédio! Eu também me senti horrível quando eu acordei! Isso logo passa… meu nome é Lupe Flores… consegue me entender? Você fala espanhol? Do you speak English? Parlez-vous Français?


            Desta vez, as palavras foram faladas em um espanhol compreensível, e eu compreendi que espanhol deveria ser a língua nativa daquela mulher. Em condições normais de temperatura e pressão eu começaria a falar russo com a pobre moça apenas para me divertir e para ver a cara de interrogação dela, mas infelizmente eu não estava em uma condição normal. Eu estava na porta do inferno. 


            Velma: Eu falo inglês, mas posso te compreender em espanhol, francês e em mais 5 idiomas.


Milagros: Eu não disse? Ela é inglesa…


Velma: Na verdade, eu sou norte-americana…


            Ginevra: Mas é inteligente, como eu disse…


            As três mulheres iniciaram um falatório sobre as impressões que tiveram de mim, mas eu não senti vontade nenhuma de dialogar e corrigir se aquelas impressões estavam certas ou erradas. Eu apenas queria encontrar os meus amigos e arrumar uma maneira de sair daquele lugar o mais rápido possível. Infelizmente, meu desespero não foi perceptível a nenhuma delas, e logo em seguida elas se apresentaram sem demora. A mulher que falou comigo – a mais nova, de número #64, se apresentou como Anahí Guadalupe Flores, uma jovem mexicana de 23 anos, filha de um industrial têxtil e de uma latifundiária, estudante de moda, e uma versão latina, morena e mais nova de Daphne Blake. Por algum motivo, ela achou interessante compartilhar que possui compulsão por sapatos e acabou se endividando por isso. Em seguida, a mulher número #122 se apresentou como Ginevra Bianchi, uma professora italiana de 52 anos, viúva, que ficou mais tempo falando de seus três filhos do que de si mesma. Quando as duas terminaram e um silêncio longo aliviou meus ouvidos, eu esbocei a intenção de me levantar da cama e me afastar, mas infelizmente a última mulher começou a falar antes que eu tivesse forças de colocar meus pés no chão.  A velha carrancuda de número #85 se apresentou como Milagros García Cambi, aposentada, 79 anos, e afirmou que ama apenas três coisas: dinheiro, truco e gatos. O término das apresentações me obrigou a dizer alguma coisa sobre mim.


            Velma: Eu sou Velma Dinkley, tenho 26 anos e trabalho na perícia da polícia de Nova York.


            Eu pensei que uma apresentação breve me livraria das três mulheres, mas o oposto aconteceu e foi bombardeada por uma avalanche de perguntas como: “Então você é policial?”, “Você é filha do casal Dinkley que ganhou o prêmio Nobel?”, “Que tipo de perícia você faz? É igual ao CSI?”, e coisas do tipo. Apenas uma das perguntas me pareceu relevante o suficiente para elaborar uma resposta: “Então porque você veio ao reality show? A polícia de Nova York paga mal?”. Eu encarei Lupe, a autora da pergunta, por algum tempo e demorei para decidir se falava a verdade sobre a investigação a respeito de Squid Game ou se inventava alguma desculpa convincente. Como uma boa perita, eu decidi colher alguma evidência antes de fornecer a minha resposta.


Velma: Bem… é uma história um pouco longa e complicada… mas digam vocês primeiro… por que estão aqui?


Ginevra: Dinheiro, é claro! Ser professora, viúva e com três filhos é algo que te faz adquirir algumas dívidas… e nos últimos meses, as dívidas levaram minha casa…


 Milagros: É claro que eu vim por dinheiro… não dá para jogar truco com a aposentadoria de merda que eu recebo… pelo menos não tanto quanto eu gostaria… não sobra muito dinheiro quando você tem 7 gatos famintos para alimentar todo mês…


Lupe: Bem… estou aqui por causa de sapatos! Eu estourei o limite de alguns cartões de crédito por causa deles… meus pais têm dinheiro suficiente e pagaram tudo, mas ficaram muito decepcionados e preocupados comigo, por isso decidiram me colocar na terapia… daí eu descobri que eu tenho compulsão por compras e transtorno bipolar… agora que estou melhor, eu percebi a gravidade do que fiz para eles, por isso decidi aceitar participar desse reality para ganhar bastante dinheiro e ressarci-los… e, claro, comprar mais sapatos com o que sobrar…


Os depoimentos anteriores já haviam machucado meu coração de alguma forma, mas a inocência no rosto de Lupe me causou mal-estar. E esses sentimentos me forçaram a ser sincera.


Velma: Como eu disse, eu sou perita da NYPD, e estou aqui porque há alguns dias minha equipe iniciou uma investigação a respeito desse reality show… aparentemente, ele não é apenas um reality show comum que proporciona ganhos aos participantes, ele é um…


Contra a minha vontade, a minha voz cessou e eu não consegui expressar a verdade horrível a respeito de Squid Game. Meu coração entrou em pânico ao perceber que eu e elas éramos vítimas, e que muito em breve, eu, elas e muitas das pessoas ao nosso redor estariam mortas.


Lupe: Oh, então você é uma infiltrada! Que demais! Eu nunca achei que vocês faziam isso na vida real, pensei que só acontecia nas séries…


Ginevra: O que há de errado com o reality, perita? Sabe, eu confesso que quando recebi a propaganda online eu achei meio suspeito mesmo… pensei que seria algo voltado à pornografia ou alguma baixaria do tipo, porque é muito dinheiro! 38 milhões de dólares… isso dá quase a mesma coisa em Euros… nem o Grande Fratello paga tanto assim lá na Itália… mas quando você tem três crianças, dezenas de dívidas e nenhuma casa, você não tem muitas escolhas…


“Jinkies! Então é por isso que não havia recrutadores nos metrôs de Seul, eles recrutaram pessoas de todo o mundo online, malditos!”, foi o primeiro pensamento que tive, e tentei focar nele para não permitir que a pena que senti de Ginevra machucasse ainda mais o meu coração. Tentei ser o mais objetiva possível na minha resposta.


Velma: Nesse reality tudo está errado, Ginevra… apenas uma pessoa sairá daqui…


Ginevra: Mas é assim que os realities funcionam… pessoas são eliminadas e apenas um participante fica com o prêmio…


Velma: Temos evidências que provam que os eliminados são eliminados… de verdade… só uma pessoa sairá viva daqui, por isso precisamos agir rápido. Avise o maior número de pessoas que vocês puderem, vamos fazer uma rebelião!


Eu terminei de falar e saí. Pensei que minha notícia chocante tinha causado grande impacto nas três mulheres, mas ao invés disso, elas permaneceram onde estavam e se entreolharam com estranheza. Milagros fez um gesto de deboche e riu, e me desesperei ao perceber que teria muito trabalho para conseguir tirar todas aquelas pessoas dali. Em seguida, comecei a procurar obsessivamente por Fred, Daphne, Shaggy e os agentes chineses, mas a grande quantidade de pessoas naquele local dificultou meu trabalho. À primeira impressão, ninguém ali possuía cabelos vermelhos, então certamente Daphne não estava lá. O grande número de pessoas com características orientais me impediu de procurar imediatamente pelos agentes chineses, por isso comecei a procurar pelos loiros, para tentar achar Fred mais rapidamente. Eu estava a poucos passos de uma cabeça loira masculina que dormia em uma cama encostada à parede quando um grito desesperado conhecido ecoou por toda a sala. Imediatamente, eu olhei em direção ao grito e reconheci Shaggy na parte de cima de um beliche, vestido da mesma maneira que eu e chorando muito. Eu corri na direção dele, e assim que cheguei, procurei abraçá-lo e acalmá-lo. O choro de Shaggy causou risos em muitos homens presentes, que provavelmente não tinham a menor noção sobre o destino que teriam.


Velma: Shaggy! Calma… respira… tenta se acalmar, ok? Nós vamos dar um jeito de sair daqui! Mas para isso eu preciso que você me ajude a achar Fred e os outros…


Shaggy: NÃO VAMOS NÃO! NÓS VAMOS MORRER DE MANEIRA HORRÍVEL IGUAL A DAPHNE! E… E… OSCOOBYDOOMORREUVELMAAAAA!


A angústia que o choro e os soluços de Shaggy transmitiam me contaminou e eu senti vontade de chorar e gritar como ele. As reações de deboche que as demais pessoas expressavam me fizeram sentir raiva e nutrir um sentimento egoísta de sair dali com meus amigos e deixar aqueles idiotas para trás. Apesar disso, eu procurei manter a calma, e tentei ser o mais racional possível.


Velma: Não temos provas de que Daphne morreu… pelo contrário, as jóias achadas na cena do crime do Sr. Applegate sugerem apenas que ela foi sequestrada, e que os VIPs desejam negociar com George pela vida da filha. Quanto à Scooby, ele e Flim Flam estão vivos! A última coisa que vi antes de desmaiar foi os dois correndo dos tiros dos homens mascarados e desaparecendo pela esquina mais próxima… Gi-Hun não teve a mesma sorte e foi atingido, eu me lembro de vê-lo sangrando, caído em cima de mim… quando eu vi os mascarados levando você, achei que você estava morto e eu tinha perdido você para sempre!


O meu abraço sufocou o choro copioso de Shaggy e ele retribuiu o carinho. Em seguida, ele mostrou uma marca no pescoço e sinalizou uma marca parecida no meu pescoço, e eu entendi que havíamos sido atingidos por dardos de tranquilizantes.


Shaggy: Então… há chances de Scoob estar vivo?


Velma: Sim, se teve alguém que sobreviveu foi ele… também acredito que os VIPS e os mascarados não se dariam o trabalho de sacrificá-lo, afinal, ele é apenas um animal indefeso…


Shaggy: Puxa, eu espero que alguém o alimente… e que ele encontre o caminho da delegacia… e que alguém da polícia tenha baixado o meu aplicativo na Playstore e consiga traduzir exatamente o que Scoob tem a dizer sobre os fatos…


Nas condições normais de temperatura e pressão, eu iria desmerecer aquele maldito aplicativo, mas como estávamos vivendo situações excepcionais, eu permiti que aquela ilusão barata trouxesse algum conforto ao meu amigo e o abracei novamente.  Meu abraço foi interrompido pelo barulho brusco e violento de um chute na grande porta de metal daquela sala. Ao olhar em direção ao som, eu notei o agente Daniel Crane violentamente surrando a porta e gritando impropérios a plenos pulmões. Logo atrás dele estava Vivian, igualmente ameaçadora, mas sem atingir a porta.


Velma: Venha! Vamos ajudá-los! Precisamos tirar essas pessoas daqui o mais rápido possível!


Shaggy desceu do beliche sem usar as escadas e eu fui logo atrás pelos degraus. Quando nos aproximamos de Daniel e Vivian, percebemos que Andrei e Dmitri vinham em nossa direção juntamente com os agentes Wang e Li. Para a minha surpresa, os agentes russos e chineses permaneceram calmos, olhando minuciosamente ao redor da sala, e não aderiram ao descontrole de Daniel. Em compensação, Shaggy, que geralmente se acovarda diante de situações complicadas, começou a socar e a chutar a porta com violência. Menos de um minuto depois, o agente Li me cutucou e me mostrou disfarçadamente a ponta de uma arma em um canto da sala. Atrás da arma havia um homem mascarado vestido de vermelho, que estava mirando a arma para Daniel. Imediatamente eu segurei Shaggy e o impedi de continuar a descontar sua raiva naquela porta, e logo sem seguida, ao ser alertada por Li, Vivian fez o mesmo com Daniel.


Daniel: O que foi? Vai atirar em mim? Vá em frente, seu covarde de merda! Você matará um agente da inteligência britânica! E isso não irá mudar o fato de que o joguinho de vocês acabou, em questão de horas nossos reforços chegarão e o mundo saberá a verdade sobre vocês!


Daniel só parou de falar quando os agentes russos o tiraram da visão do mascarado e de todas as pessoas que assistiam estupefatas àquele descontrole. Ele foi praticamente arrastado para o meio da multidão de uniformes verdes, e foi seguido por Vivian. Eu não precisei fazer o mesmo com Shaggy, mas pude notar nos olhos dele que a raiva permanecia em seu coração.


Velma: Vamos achar Fred! Precisamos ser mais rápidos e mais inteligentes se quisermos sair daqui com vida.


Quando Shaggy e eu nos juntamos aos demais, Lupe e Ginevra vieram em nossa direção, e eu as apresentei a Shaggy.


Ginevra: Então o que você disse sobre o reality show é verdade? Eles… eles realmente irão nos matar se formos eliminados nas provas?


Velma: Eles não farão isso se conseguirmos trabalhar juntos. Avise os demais, temos que achar um jeito de sair daqui. Eles estão armados e estão mirando em nós.


As duas mulheres começaram a avisar as demais pessoas em espanhol e nos poucos idiomas que elas conheciam. Eu me desesperei quando percebi que as diferentes nacionalidades daquelas pessoas impediam que elas entendessem uma mensagem simples, e dificilmente conseguiríamos alertá-las sobre o perigo que estavam correndo.  O agente Wang então subiu em um dos beliches e começou a explicar a situação em voz alta em idioma coreano. Li, então, fez o mesmo em chinês, e em seguida a mesma mensagem foi transmitida em inglês, russo, espanhol e italiano pelos nossos amigos. Dessa vez, um grande número de pessoas compreendeu o que dissemos, e elas começaram a discutir entre si a respeito do que tinham ouvido. Ainda assim, havia um pequeno grupo de pessoas com características árabes, indianas e africanas que provavelmente não conseguiam compreender os idiomas falados, por isso, não compreenderam nossas mensagens. Entre a pequena agitação que estava se formando, eu avistei um homem loiro sentado em uma cama encostada à parede, em seu rosto havia uma expressão confusa. Imediatamente, eu me aproximei e fiquei feliz de perceber que era Fred.


Fred: Cadê a Daphne? Eu não a achei em lugar nenhum…


A pergunta foi tão instantânea que eu não tive tempo de esboçar nenhuma reação de alegria ao vê-lo.


Velma: Ela não está aqui, Fred, nós já procuramos…


Fred: Precisamos encontrá-la, Velma!


Velma: Certamente! Mas, para isso, precisamos sair daqui antes… venha! Você ouviu a mensagem, vamos mobilizar essas pessoas e trabalhar em equipe, é a única chance que temos!


Fred imediatamente se levantou e caminhamos em direção à porta. Quando nos aproximamos, não precisamos convencer ninguém: dezenas de pessoas já estavam batendo na porta, gritando pedidos de socorro e implorando para sair dali. Uma voz que soava como um megafone disse algo em coreano que eu não compreendi muito bem. Conforme esperado, Fred atingiu a porta com violência, descontando nela toda a raiva que estava sentindo por ter sido pego em uma armadilha e ter perdido Daphne. Várias pessoas ao redor o copiaram, até mesmo as pessoas que estavam sentadas em suas camas se levantaram e vieram em nossa direção para manifestar descontentamento. Novamente, a voz se manifestou em coreano, e dessa vez eu consegui compreender que ela pediu para todos se afastarem da porta. Em certo momento, havia tantas pessoas agredindo aquele portão de metal que eu, Fred, Shaggy e os demais fomos empurrados para trás. O barulho e o esforço contra a porta eram tão grandes que eu pensei que assustariam os mascarados, mas ao invés disso, eles nos assustaram. Inesperadamente, um tiro atingiu a cabeça de um homem que estava chutando a porta e ele caiu morto em cima da multidão logo atrás dele. Logo em seguida, mais três ou quatro pessoas foram atingidas da mesma forma fatal, e todos entraram em pânico – inclusive eu. Sem hesitar, eu peguei Fred e Shaggy pelos pulsos e corri para longe daquela porta o mais rápido que pude, até conseguir abrigar nós três embaixo de um beliche. Durante a corrida, os tiros não cessaram, e eu vi várias pessoas caírem mortas ao meu lado. Não sei dizer quantos minutos aquele terror durou, mas quando os tiros e os gritos de desespero finalmente acabaram, havia cerca de vinte pessoas caídas no chão em um verdadeiro rio de sangue. O silêncio que veio logo em seguida foi ensurdecedor, quebrado apenas pelo barulho da grande porta se abrindo, revelando meia dúzia de mascarados vestidos de vermelho, carregando grandes caixas de presente pretas com laços cor de rosa. Conforme Shaggy havia suposto, as caixas de presente eram mesmo caixões. As vítimas foram colocadas uma a uma dentro delas e depois carregadas para fora dali pelos mascarados. Quando os homens foram embora e a porta finalmente se fechou, murmuros começaram a surgir na sala, interrompidos apenas quando um grande cofre transparente em forma de porco surgiu no teto e uma porção de maços de dinheiro caiu dentro dele. As três mulheres que eu encontrei quando acordei se aproximaram com expressões de horror em seus rosto, mas eu estava chocada demais para dizer qualquer coisa. Felizmente, Fred Jones não estava tão comovido com os acontecimentos, e por isso assumiu a liderança.


Fred: Vocês estão vendo?  Isso é um pequeno exemplo do que nos aguarda! Precisamos trabalhar em equipe e sair daqui o mais rápido possível…


Tom: Exatamente! Toda essa grana que caiu no cofre é só um pequeno exemplo do que iremos ganhar nos jogos!


O sotaque do homem que contrariou Fred me fez crer que ele era inglês. Quando ele terminou de falar, uma multidão lhe encarou estupefata, e Fred o encarou com ódio.


Fred: Ninguém vai ganhar porra nenhuma, esse reality show é uma armadilha! Somente uma pessoa sairá viva e o resto será sacrificado…


Tom: Exatamente, e essa pessoa serei eu… ou melhor… a minha gangue… e dividiremos os milhões…


Fred se aproximou do homem com a clara intenção de agredi-lo, mas antes que pudesse alcançá-lo, Daniel se colocou na frente dele e o impediu.


Daniel: Cavalheiros, vamos tentar manter a calma. É o seguinte, como vocês perceberam, nesse jogo, as pessoas eliminadas morrem. Por isso, creio que seja justo deixar vocês decidirem o que querem para as suas vidas… quem não quiser correr o risco de morrer pode vir conosco… quem quiser ficar e correr risco de vida por dinheiro, que fique com ele…


Tom: Quem for covarde o suficiente para sair daqui e voltar a ser um verme no sistema capitalista, pode ir com eles… quem tiver um pouco de dignidade e estiver a fim de dias de glória, venha conosco conquistar os milhões e a vida de luxo que merece…


Não sei se foi por colocar centenas de pessoas em perigo ou simplesmente por ter mencionado a palavra “covarde”, mas Fred novamente se aproximou para agredir o rapaz. Dessa vez, Daniel se juntou a ele, e coube aos russos a função de separá-los. Infelizmente, pude notar no rosto de muitas pessoas – antes assustadas pelo ocorrido – que elas concordavam mais com o homem de sotaque inglês do que com Fred e Daniel.


Ian: É isso aí, Tom tem razão… vocês querem mesmo sair daqui e voltar a passar fome? Ou querem ter dinheiro para comer qualquer coisa? Querem morar na rua e em abrigos de caridade ou querem suas casas de volta? Já pensaram em poder comprar a casa que vocês quiserem? Poder comprar casas para seus pais ou filhos? Dar uma vida digna aos seus filhos, com roupas, educação e brinquedos? Se vocês ficarem aqui, vocês terão tudo isso… nunca mais terão dívidas, nem serão perseguidos por credores… dívidas educacionais ou despesas abusivas de saúde não serão um problema… mas a escolha é de vocês!  Querem continuar sendo perdedores ou vão dar o máximo de si mesmos para se tornarem vencedores?


Os murmuros ficaram mais altos, e ao ver várias pessoas sorrindo e balançando a cabeça afirmativamente, eu percebi que a mensagem motivacional patética daquele homem estava surtindo efeito.


Tom: Além do mais, esses dois caras aqui são tiras… eles ganham a vida humilhando e prendendo vocês… eles recebem uma fortuna para bater em vocês quando vocês roubam comida no supermercado, ou para expulsar vocês de suas casas em uma ação de despejo… eles não sabem o que falam, e como sempre estão dando ordens que não irão favorecer vocês… já nós,  somos pessoas como vocês… somos pessoas comuns que se cansaram de ser massacradas apenas por não ter dinheiro o suficiente… nós estamos dispostos a lutar até o fim pelo conforto que merecemos… então, vocês decidem: querem seguir as pessoas que perseguem vocês fora do jogo ou  querem seguir seus irmãos de luta?


Ian: Ninguém irá morrer nos jogos! Aquele massacre só aconteceu porque aquelas pessoas obedeceram aos policiais e começaram a destruir a porta! Tudo o que aconteceu aqui foi culpa deles!


O homem nem havia terminado de falar quando os russos carregaram Fred para longe e impediram que ele eliminasse os dois homens na frente de todos. Viviam fez o mesmo com Daniel – obviamente, de uma maneira mais delicada – e eu os segui. Após o discurso encorajador ridículo, senti que os olhares em nossa direção se tornaram hostis, e confesso que temi pela minha vida após isso.


Fred: Somos em 7, aqueles ingleses estão em 5, estamos em vantagem e podemos dar uma boa surra neles!


Andrei: E com isso afirmaríamos à multidão todas as mentiras que eles disseram sobre nós e despertaríamos uma ira generalizada… não, Fred, nós precisamos ser mais estratégicos se quisermos sair daqui carregando o maior número de pessoas possível…


O agente Li fez um gesto com a mão pedindo silêncio e percebi que a voz de megafone estava falando em coreano. Não consegui compreender uma palavra do que foi dito, e aquilo me causou uma angústia enorme por não saber o que estava acontecendo. Ao fim, Li nos explicou.


Li: Os jogos vão começar e seremos conduzidos para assuntos burocráticos. Não sejam violentos, pois podem acabar baleados como os outros. Prestem atenção ao redor, se virem uma oportunidade para fugir, fujam. Boa sorte a todos.


Nós concordamos e seguimos a grande fila que se formou na porta. Cada um de nós teve que assinar um contrato com cláusulas duvidosas, uma delas dizia que os jogos seriam suspensos se a maioria assim quisesse, e eu guardei essa informação para tentar usá-la o mais rápido possível. Logo em seguida, fomos conduzidos para um labirinto colorido confuso, e aquela visão despertou em mim uma sensação de déjà-vu muito forte. Passada a confusão inicial, eu me lembrei do meu pesadelo dias atrás no apartamento de Fred, e entendi porque eu sentia que já havia visto aquele local antes. Eu não conseguia lembrar muitos detalhes do pesadelo – e a tensão que eu sentia naquele momento impedia que minha memória funcionasse como deveria-, mas eu me lembrava bem daquele sentimento ruim que experimentei durante o sonho. Lembrei das certezas mórbidas que tive ao sonhar, e fiquei ainda mais angustiada ao pensar que aqueles sentimentos - e fatos do pesadelo - poderiam se tornar realidade a qualquer momento.  Ao passar pelo labirinto de escadas, terminamos em uma sala vermelha e cada um de nós foi fotografado. Entendi que as diversas fotos de vítimas que recebemos de Gi-Hun haviam sido tiradas naquele local, provavelmente em edições anteriores do jogo, e não pude deixar de pensar que aquela seria a última fotografia de muitas daquelas pessoas, inclusive eu. Quando voltamos para a sala inicial, nosso grupo estava intacto e aparentemente ninguém havia achado uma oportunidade de fugir. Ao me aproximar de Shaggy e Fred, questionei se eles haviam visto alguma porta ou algum lugar por onde pudéssemos escapar. O olhar de Shaggy estava distante e ele balançou a cabeça negativamente. Fred conseguiu me encarar, mas sua expressão era séria.


Fred: Não consegui prestar atenção em nada. Eu não consigo parar de pensar que Daphne está morta e nós somos os próximos…


Velma: Eu também, Fred…


***


            A voz de megafone falou novamente e antes que eu pudesse procurar os agentes chineses para traduzir o que foi dito, a grande porta abriu e homens mascarados carregaram uma grande mesa com comida. O ânimo de Shaggy melhorou imediatamente, ele se levantou da cama com rapidez, mas Fred o segurou pela camisa e o impediu de continuar.


            Fred: Os erros aqui são fatais, Shags… vá com calma…


            A única coisa maior do que a fome de Shaggy é o medo de Shaggy, por isso ele obedeceu sem questionar. Quando uma enorme fila começou a se formar na mesa, nos juntamos aos demais para receber nossa refeição. Ao chegar a vez de Shaggy, infelizmente, ele não conseguiu se controlar. Ele comeu rapidamente a porção individual que recebeu e pegou mais uma porção, mas ao fazer isso, um dos homens mascarados pegou um bastão e bateu com tanta força em sua mão que eu pensei que seus ossos tivessem quebrado. Eu dei um grito de pânico e Shaggy caiu no chão gemendo de dor, em seguida, vários mascarados armados se aproximaram para deixar claro que atirariam se alguma rebelião se formasse. Fred e eu nos aproximamos de Shaggy para ajudá-lo, mas apesar da grande dor, ele estava aflito porque a outra porção de comida estava no chão, a poucos centímetros dele. Fred e eu ajudamos Shaggy a se levantar, mas a primeira reação dele ao se colocar de pé foi perseguir a maldita porção de comida que estava no chão. Eu prendi a respiração com medo de que algum mascarado atirasse nele, e felizmente isso não aconteceu. Ao invés disso, Shaggy foi recebido com um grande chute no rosto e caiu no chão. Em seguida, o mesmo homem oriental autor do chute  começou a chutá-lo na barriga e a dizer em coreano que aquela comida era dele. Fred se aproximou e derrubou o homem que estava agredindo Shaggy, e isso fez com que a gangue de ingleses e mais homens orientais se aproximassem para agredir os dois. Eu percebi a movimentação dos mascarados e comecei a gritar o nome dos meus amigos para que a briga parasse, pois temia que todos fossem mortos da mesma maneira que aquelas pessoas que se rebelaram. Segundos depois, os agentes russos e chineses apareceram para separá-los, mas todos estavam incrivelmente machucados. Shaggy apanhou tanto que precisou ser carregado até uma das camas, e eu não consegui fazer nada além de chorar. Não sei dizer se o que me afligia era vê-lo gravemente ferido ou se era pensar que ele teria que competir gravemente ferido, o que lhe dava menos chances de sobrevivência. Passado algum tempo, Fred e eu voltamos à fila para pegar nossas refeições. A briga me abalou tanto que não senti vontade de comer e cedi minha refeição a Shaggy, e pela primeira vez na vida, ele recusou comida e disse que estava sem fome. Fred não me deixou insistir.


            Fred: Shaggy já comeu uma porção e é o suficiente para ele sobreviver. Você precisa se alimentar para conseguir competir, não sabemos o que nos aguarda, se você ficar sem comer, você pode passar mal e não ter chances…


            Eu cedi ao pedido de Fred e engoli a porção de comida apenas por necessidade de sobrevivência. Enquanto eu terminava de comer, a voz no microfone começou a falar novamente, e assim que ela terminou, o agente Li se aproximou de nós com uma cara preocupada.


            Li: Eles disseram que o primeiro jogo irá começar, venham!


***


            O mesmo esforço que tive que fazer para mastigar e engolir a comida contra a vontade, eu tive que fazer para manter a comida no meu estômago. O anúncio de Li me causou uma ansiedade indescritível e uma náusea tão brutal que eu tive que lutar para não vomitar tudo o que havia ingerido.


            Li: Muito bem, o primeiro jogo é aparentemente muito simples. É um jogo infantil conhecido como Mugunghwa kkoci pieot seumnida na Coréia do Sul… a tradução fiel dessa expressão seria “A flor de hibisco floriu”, mas creio que esse jogo deve receber diferentes nomes ao redor do mundo… ele é assim, uma pessoa ficará em uma árvore com o rosto escondido, enquanto nós ficaremos atrás de uma linha, a certa distância desta pessoa. Enquanto a pessoa disser “A flor de hibisco floriu” com o rosto escondido na árvore, nós podemos avançar em direção a ela… quando ela terminar a frase e olhar para nós, devemos congelar em nossos lugares, e quem se mexer é eliminado… o objetivo do jogo é conseguir avançar até a linha atrás da árvore sem ser pego… vocês conseguiram entender como funciona?


Andrei: Sim… esse jogo se chama “Quanto mais devagar você se mover” na Rússia… jogávamos na escola…


            Vivian: No Reino Unido, é “Red Light, Green Light”… mas isso é ridículo! Eu não vou fazer jogos infantis estúpidos, eu estou aqui em uma missão policial!


            Li: Estúpido ou não, é o que devemos fazer se quisermos salvar as nossas vidas e a nossa missão policial… quero que todos vocês prestem muita atenção e cumpram as regras do jogo ao máximo, pois sabemos que “ser eliminado do jogo” significa ser fuzilado a sangue frio… entenderam? Velma? Fred, Shaggy? Conseguiram entender as regras?


            Velma: Sim, brincamos muito de Red Light, Green Light quando estávamos na pré-escola, lembra Shaggy? Mas nós chamávamos de “Batatinha Frita 1,2,3”! E nós éramos muito bons, dificilmente alguém do bairro ganhava de nós, principalmente se era a Marcie que ficava na árvore… você corria muito rápido, a Daphne era muito ágil e…


            Shaggy: E agora a Daphne está morta, eu mal consigo andar depois daquela surra e a pessoa que está na árvore tem uma AK47 apontada para as nossas cabeças…


            Minha tentativa de tranquilizar meus amigos - e também a mim mesma – com uma memória boa foi destruída com as palavras ríspidas que saíram do rosto raivoso de Shaggy. Li tentou contornar o balde de água fria que recebi e deu um tapinha em nossas costas, desejando-nos boa sorte nos jogos. Porém, isso não alterou a expressão de ódio de Shaggy, nem o pavor que eu demonstrava estar sentindo. Ao olhar ao redor, percebi que alguns estrangeiros haviam se aproximado de nós para tentar entender a explicação de Li em inglês. Fred, então, começou a repetir as explicações em alto e bom som para esclarecer o maior número de pessoas possível, e eu o admirei por ter força suficiente para priorizar outras pessoas enquanto ele mesmo estava prestes a passar pelo risco de ser executado. As três mulheres que me acordaram se aproximaram de mim e imploraram por detalhes em espanhol. Eu não senti vontade nenhuma de dizer nada, mesmo assim, eu falei. Porque sabia que aquelas poderiam ser as minhas últimas palavras.


***


Fred: Velma, você sabe que meu pai sempre considerou que essas brincadeiras eram coisa de menina e de viadinho, então ele nunca me deixou participar disso…


Velma: Seu pai é um idiota, Fred…


Fred: … também sabe que enquanto vocês brincavam disso na rua eu era forçado a treinar para os campeonatos estaduais…


Velma: Isso confirma que seu pai era um idiota… porra, porque você está me falando isso agora?


Fred: O que eu estou querendo dizer é que… eu não faço ideia de como esse jogo funciona… então… se eu não chegar ao fim… e as chances disso acontecer são grandes… eu quero que…


Velma: CALA BOCA, IDIOTA, ISSO NÃO VAI ACONTECER!


O grito que saiu da minha boca chamou a atenção de todos ao redor, e inevitavelmente arrancou lágrimas dos meus olhos. Fred pareceu não se incomodar e continuou seu discurso.


Fred: Se eu não chegar ao fim, eu quero que você saia daqui, procure a Daphne… e diga a ela que eu…


A voz de Fred ficou rouca e se calou abruptamente. Ele olhou para mim com tristeza e tentou fazer palavras saírem de sua boca, mas não conseguiu. Ao invés de compaixão, a atitude dele me causou raiva.


Velma: ESQUECE A DAPHNE, PORRA! ESQUECE E CONCENTRA TODA A MERDA DA SUA ATENÇÃO E DA SUA FORÇA EM SALVAR A SUA VIDA!  TÁ ME ENTENDENDO?


Meu descontrole foi tão grande que terminei a frase apontando o dedo no nariz de Fred, e ele apenas desviou o olhar, demonstrando que não tinha desistido daquilo que havia falado. Shaggy foi um pouco mais empático e deu um tapinha nas costas de Fred.


Shaggy: Tipo, só pensa que você precisa sobreviver para ajudar ela, ok?


Shaggy fez um sinal para nós dois andarmos, pois a multidão já se acumulava ao redor de um dos portões que estavam se abrindo. Vivian se aproximou debochando do drama que protagonizamos.


Vivian: Qual é, gente! Que exagero é esse! Nós só vamos jogar Red Light, Green Light, não vamos para a floresta amazônica com o Bear Grylls! Vamos terminar com essa merda logo e sair daqui!


Daniel: Exato! Esse caso precisa acabar antes do dia 3 de julho, temos um casamento à nossa espera!


A tensão que nos acometia não permitiu que alguma curiosidade a respeito do casamento que Daniel mencionou viesse à tona, mas o gesto que ele fez logo em seguida – beijar uma linda aliança de diamantes que estava na mão esquerda de Vivian – deixou claro que ele estava falando que ele e Vivian se casariam em poucos dias. Nos momentos seguintes, caminhamos até uma grande arena com decoração de um parque infantil, e no fim dela havia uma boneca gigante com vestido amarelo. Eu estremeci ao me lembrar da boneca que vi no meu pesadelo, e senti um mau agouro me avisar que algo estava muito errado. A voz no megafone anunciou mais algumas regras finais e Li nos informou que teríamos apenas cinco minutos para atravessar a arena. Eu me desesperei, visto que o local parecia bem maior que um estádio de futebol. Nos minutos seguintes, eu abracei meus amigos com força, mas não lhes desejei sorte. Desejei-lhe sucesso na árdua tarefa de lutar por suas vidas.


***


            Quando o relógio digital começou a funcionar em contagem regressiva, eu conseguia ouvir o barulho rápido de meus batimentos cardíacos.


            Velma: Fred, não respire quando essa maldita boneca olhar para trás, ok? Feche os olhos para você não piscar… Shaggy, esqueça a dor que está sentindo… e lembre-se: você passou os últimos anos na companhia daquele cachorro pateta, então corra como se fosse um dog alemão!


            Os dois balançaram suas cabeças afirmativamente no mesmo momento que a boneca virou a cabeça em direção ao cenário de árvore, levou a parte de trás de uma das mãos até os olhos e cantou de maneira arrepiante:


“Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


Eu pensei em segurar as mãos de Shaggy e Fred para poder arrastá-los em direção à linha de chegada, mas todos dispararam a correr e acabamos nos separando. Quando a canção acabou, eu paralisei em uma posição confortável e estável e fechei meus olhos com força. Uma nova onda de silêncio permitiu que eu ouvisse meus batimentos cardíacos, e foi interrompida apenas pelo som de diversos tiros sendo disparados. Os tiros provocaram uma reação desesperada nas pessoas, que começaram a gritar e a correr de volta para o ponto de partida. Infelizmente, a frequência e a quantidade de tiros aumentou até que todos os gritos cessassem. Mesmo fechados, meus olhos foram inundados por lágrimas de desespero. Eu nunca aprendi uma oração em minha vida, mas orei da forma que pude, pedindo que nenhum daqueles tiros tivesse atingido meus amigos. Quando ouvi o barulho mecânico da cabeça da boneca retornando à arvore, eu abri os meus olhos e comemorei o fato de que nenhuma das pessoas com quem eu tinha vínculo – nem mesmo as três mulheres estrangeiras que havia conhecido há algumas horas – tinha sido atingida. Por outro lado, percebi que as vítimas eram aquelas mesmas pessoas que não haviam compreendido as mensagens que traduzimos horas antes – consequentemente, elas também não conseguiram compreender as instruções do jogo-, e meu coração doeu quando me dei conta que elas sequer tiveram uma chance de lutar por suas vidas.


“Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


Shaggy, Fred e os russos dispararam na minha frente, por isso eu corri em direção a Vivian, Lupe e Ginevra. Nós três paralisamos bem antes da canção acabar e novamente eu apertei meus olhos para não ver o massacre que viria. Desta vez, o número de tiros foi menor, e não houve fuga nem gritos de desespero. Quando a boneca se virou, eu abri os olhos e vi Shaggy sorrindo a poucos metros da linha de chegada e isso me deu certo conforto, uma vez que 2 minutos já haviam se passado.


“Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


Shaggy, Daniel e Andrei conseguiram cruzar a linha de chegada, e Fred e Dmitri ficaram a poucos metros dela. Eu e as demais mulheres corremos o máximo que pudemos, mas ainda havia um longo caminho a ser percorrido. Quando eu paralisei, eu percebi que os agentes Wang e Li haviam se aproximado de nós. Como de costume, eu fechei meus olhos bem antes do término, mas um participante desesperado passou correndo por mim gritando e fez meus olhos se abrirem. O homem descontrolado empurrou o agente Li e Vivian no momento em que a boneca virou a cabeça e continuou a correr. Li teve a lucidez de cair no chão e permanecer congelado da maneira que caiu, porém, Vivian cedeu aos reflexos da queda e se moveu, na tentativa de se levantar novamente. O homem que causou a queda de ambos então foi baleado no peito pela boneca e, em seguida, Vivian recebeu um tiro na testa. Eu quis gritar de horror, mas não pude. Senti medo até mesmo das lágrimas que correram pelo meu rosto, elas poderiam denunciar algum tipo de movimento ao sensor e causar a minha morte. A reação de Daniel ao ver a sua quase-esposa ser sacrificada foi a coisa mais horrível e triste que vi em toda a minha vida. Shaggy e Andrei tentaram impedi-lo de voltar, mas ele se soltou das mãos deles com raiva e se juntou ao corpo ensanguentado de Vivian. Eu fechei os olhos com força para não ver a cena horrível que eu sabia que estava para acontecer, mesmo assim, fui forçada a presenciá-la através do som de um tiro e do pranto de Daniel cessando logo em seguida. Como se esses horrores não fossem suficientes, quando abri os olhos, vi que o homem que causou a morte de Vivian ainda estava vivo quando foi arrastado pelos mascarados e colocado em uma caixa de presente. Para piorar, vi que o relógio marcava apenas 1 minuto e meio para o fim do jogo, e eu ainda estava longe.


“Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


Desta vez, Fred e Dmitri e Wang cruzaram a linha de chegada logo no início da canção, e Lupe, eu e Ginevra ficamos a poucos metros do fim. Percebi que o agente Li não se esforçou muito para correr nessa rodada, e perdeu mais tempo observando os sensores e armas no canto da sala do que correndo para salvar sua vida. Apesar de despedaçado por ter presenciado tantos horrores, meu coração estava um pouco mais calmo por saber que meus amigos estavam a salvo, e muito em breve eu e os demais também estaríamos. No entanto, o conforto que senti durou muito pouco. Enquanto a boneca se ocupava de eliminar mais pessoas, percebi Fred Jones falando algo aos russos e olhando fixamente para Milagros, que havia conseguido avançar muito pouco desde o início do jogo. Eu pude ler os lábios de Fred dizendo: “Eu vou buscá-la”, e meu coração disparou de medo ao imaginar o que poderia acontecer ao meu amigo.


 “Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


Quando a canção começou novamente, Fred deixou a linha de chegada e correu até a arena, até atingir a velha. A atitude de Fred me deixou tão aflita que fiquei o tempo todo olhando para trás e avancei pouco em direção à linha de chegada. Felizmente, Lupe e Ginevra cruzaram a linha de chegada dessa vez, e eu fechei os olhos com força para não ver Fred ser baleado por descumprir as regras. Inevitavelmente, os tiros começaram, e pude ouvir a voz de Shaggy e dos demais gritarem desesperadamente logo após o último tiro. Eu abri os olhos em meio a um pranto e me preparei para ver meu amigo de infância baleado e ensanguentado no chão. Para a minha surpresa, Fred e Milagros estavam bem. Meu olhar então vagou brevemente pela arena até encontrar o motivo dos gritos de horror de meus amigos: o agente Li havia sido atingido nas costas. Novamente, eu me segurei para não esboçar nenhuma reação emotiva que me fizesse ter o mesmo fim que ele, e tentei fixar meus olhos no chão para não piscar nem chorar. Uma dupla de mascarados passou por mim arrastando o cadáver de Li em direção à caixa, formando uma trilha com o sangue que saía de suas costas. Quando meus olhos encontraram o rosto inerte dele, ele sorriu, piscou para mim e murmurou: “eu tenho um plano”. Perceber que Li ainda estava vivo trouxe um pouco de alívio ao meu coração, mesmo não tendo certeza por quanto tempo ele sobreviveria com aquele ferimento dentro de um caixão.


“Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


Na primeira sílaba emitida pela boneca, Fred pegou a idosa nos braços e a carregou até a linha de chegada, o que fez todos irem ao delírio. Quanto a mim, eu corri até sentir meus pulmões implorarem por oxigênio, mesmo assim, ainda restavam três ou quatro metros até a linha de chegada. Eu procurei não olhar para o relógio, porém, eu sabia que restava pouco tempo até o fim do jogo. Nesta rodada, apenas dois tiros foram disparados, e eu comemorei que nenhum deles me atingiu.


“Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


O heroísmo de Fred motivou várias pessoas a deixarem a linha de chegada para ajudar colegas que estavam próximos e tinham pouca mobilidade. Percebi que o fato de muitas pessoas estarem concluindo o jogo irritou os dois ingleses que haviam enfrentado Fred e Daniel horas antes… e, talvez por isso, não percebi quando os dois conspiraram contra mim. A cerca de dois metros da linha de chegada, um deles esbarrou em mim com violência e me fez cair no chão. Meus óculos provavelmente cruzaram a linha final, mas meu corpo permaneceu à mercê do tempo e da boneca assassina. Mesmo sem conseguir enxergar perfeitamente, eu consegui ver que os dois homens cruzaram a linha e apenas eu permaneci na arena. Também vi que o relógio só possuía números nas casas dos segundos, o que significava que eu tinha poucos segundos de vida. Antes da boneca se virar eu fiquei de pé e congelei para não ser atingida, mas não conseguia enxergar a direção exata que eu deveria correr na próxima rodada.


“Mugunghwa kkoci pieot seumnida”


Sabendo que eu tinha poucos segundos, eu foquei na direção correta e gastei toda a minha energia naquela corrida. Mas ao invés de cruzar a linha, eu fui atingida por um braço rápido que agarrou a minha cintura e me abraçou com força. Eu fechei os olhos por temer o que estava acontecendo e senti o corpo que me carregava pular. Em seguida, nós dois caímos com violência de costas na arena, como se tivéssemos sido arremessados, e eu ouvi gritos e palmas de alegria. Quando uma mão estranha me entregou meus óculos (e eu pude ver que era Shaggy), eu vi Fred e eu deitados na arena e o último segundo se esvaindo do relógio. Em meio à multidão irradiante devido à vitória coletiva, eu não consegui me levantar, não consegui agradecer Fred, nem consegui esboçar nenhum tipo de reação. Eu apenas deitei meu rosto no chão e chorei copiosamente como uma criança pequena. Eu havia sobrevivido. Pelo menos, por enquanto.


***


            O fim do primeiro jogo despertou um falatório e diversos risos nos sobreviventes. Parecia uma atitude extremamente inadequada após a morte violenta de mais de cem pessoas, mas logo eu entendi que não era uma alegria verdadeira, era apenas uma reação fisiológica aos quilos de adrenalina que todos nós recebemos em nossas correntes sanguíneas. A atitude de Fred o tornou um herói e mais pessoas se juntaram a nós, inclusive Milagros, que passou a considerá-lo um verdadeiro anjo. Aproveitei para utilizar essa união em nosso favor e sugeri aos nossos aliados que desistíssemos do jogo. Infelizmente, no mesmo momento em que eu convencia algumas pessoas a desistir, o grande cofre recebeu centenas de maços de dinheiro, quantia essa referente às vidas que foram perdidas no primeiro jogo. Então, os aliados que eu pensei que tinha foram tomados por uma ganância irracional e se negaram a desistir dos milhões que lhes aguardavam.  Senti vontade de agredir cada um deles, e para evitar que isso acontecesse, eu me afastei em direção aos beliches e me deitei na cama em que eu havia acordado horas antes. Percebi que Ginevra e Lupe ficaram envergonhadas das escolhas que tomaram, por isso não ousaram me seguir. Quando a adrenalina em meu sangue começou a se converter em cansaço, meus olhos ficaram pesados e se fecharam.


            Fred: Shaggy! Pare! Pare com isso!


            Acordei de um sono confuso com gritos e barulhos de louça se quebrando. Entre as vozes que gritavam, a voz de Fred se destacava. Eu abri os olhos e me sentei na cama com urgência para ver o que estava acontecendo… e então vi a grande mesa de comida posta, duas filas de pessoas aguardando pela comida e Shaggy no chão trocando golpes com um homem oriental. Fred tentava puxá-lo para fora da briga, mas cada vez que Shaggy se levantava, ele agredia ainda mais o homem oriental com chutes e arremessando louças. Os dois homens ingleses se aproximaram para ajudar o homem oriental, e com eles, mais três homens com características ocidentais. Shaggy os ameaçou com palavrões e atirou louça contra eles, e isso apenas fez com que a briga envolvesse todos os homens presentes.


            Shaggy: Dessa vez eu não peguei a comida de ninguém, eu só estou querendo pegar a minha comida! E eu mato quem me impedir!


            As agressões contra Shaggy começaram e logo envolveram Fred. Imediatamente, eu, Wang e os russos corremos na direção deles para impedir que eles se machucassem ainda mais – ou, pior, que os mascarados os punissem letalmente. Nossa ação teve pouco efeito, e a briga só cessou quando a porta se abriu e quatro homens vestidos de vermelho surgiram atirando para cima. Eu me joguei no chão, temendo ser atingida, e de repente vi algo de cortar o coração. Por inocência, eu achei que ver Vivian ser executada - e em seguida Daniel reagir à sua morte de maneira dolorosa e morrer da mesma forma- seria a cena mais triste que eu veria na vida… mas, infelizmente, eu estava errada. Enquanto os mascarados gritavam ordens em coreano, Shaggy começou a chorar descontroladamente e a esmurrar o chão com raiva, demonstrando um nervosismo que eu nunca achei que ele demonstraria. Seu choro só foi interrompido por uma ânsia de vômito intensa, que o fez cuspir uma grande quantidade de sangue. Eu chorei ao vê-lo tão machucado e derrotado, engatinhei em direção a ele o envolvi nos meus braços como um bebê gigante que mal cabia em meu colo. Nessa posição, nós choramos juntos por vários minutos, sem nos importarmos com os fatos, os olhares, nem com os nossos algozes. Nossos corpos estavam machucados demais para demonstrar qualquer reação. E a nossa alma, mais ainda.


***


            Quando eu finalmente parei de soluçar, eu limpei meus óculos e os meus olhos. Shaggy se levantou rapidamente por necessidade, não por ânimo. Ele estava tão tenso que parecia uma bomba prestes a explodir a qualquer momento. Quando percebi o hálito cetônico que ele exalava, eu entendi que além de estar sentindo muito medo e muita raiva, ele também estava sentindo muita fome. Eu também estava com muita fome, por isso me ocupei de pegar o pouco que havia sobrado nas mesas. Enquanto eu voltava para a minha cama, ouvi alguns mascarados dizerem alguns números em voz alta. Imediatamente, cerca de seis participantes do sexo feminino se apresentaram, e eu percebi que elas tinham em suas roupas os números que foram ditos. Os homens de vermelho conduziram as mulheres para fora da sala sob a mira de uma arma, enquanto outros mascarados se ocuparam de tirar a mesa. Quando eu cheguei à minha cama, Shaggy estava roendo uma cenoura mais rápido do que um coelho. Ao ver as migalhas de pães e as duas batatas que estavam em minhas mãos, ele engoliu a cenoura imediatamente… mas não tirou nenhuma comida de mim. Ao invés disso, ele olhou nos meus olhos e fez um gesto para eu comer.


            Shaggy: Tipo, lembra do que o Fred disse? Você precisa comer… vai saber que porra nos aguarda daqui a algumas horas… tipo, dá um pouco pro Fred tb, eu não vi ele comer porra nenhuma…


            O excesso de adrenalina certamente havia me deixado mais sensível, mas naquele momento, eu me derreti unicamente por perceber a linda atitude de Shaggy de… dividir a sua comida. Eu podia ver nos olhos dele que ele queria loucamente arrancar aqueles alimentos da minha mão e devorar antes mesmo que eu pudesse protestar, mesmo assim, ele estava sacrificando seu desejo por mim e por Fred. O gesto de amor de Shaggy renovou minhas energias, e eu o abracei com força. Em seguida, eu me alimentei e obriguei Fred a comer alguma coisa enquanto mensagens eram transmitidas no megafone. E, é claro, eu deixei a maior batata para o meu amigo faminto que estava disposto a fazer greve de fome pela minha vida.


            Wang: Escolham suas camas, a luz será apagada em dez minutos.


            Fred: Vamos ficar próximos uns dos outros. Certamente não teremos uma noite tranquila com as luzes apagadas…


            Wang: Vamos ficar de olho em Shaggy. Esse segundo ataque que ele sofreu foi descabido. Aqueles homens simplesmente implicaram com ele e o agrediram. Pode ser que mais ataques venham durante a noite…


            Fred: Vendo como eles ficam satisfeitos com a morte de um participante, eu não duvido que eles ataquem pessoas propositalmente só para ganhar mais dinheiro…


            Todos nós aceitamos as sugestões de Fred e Wang e ficamos próximos. Milagros, Ginevra e Lupe e várias outras pessoas se juntaram a nós, e parecíamos ter vantagem numérica perto dos homens que haviam ameaçado Shaggy. Fred já havia se deitado quando vi Andrei se aproximar de sua cama e dizer em voz baixa.


            Andrei: Aqueles homens de vermelho levaram seis mulheres para fora e elas ainda não retornaram. Também não gosto da maneira como os homens que atacaram Shaggy olham para as mulheres que estão aqui. Creio que deveríamos ficar atentos… você sabe… contra esse tipo de ataque também…


            Mesmo sabendo que eu não deveria, eu prestei atenção em cada palavra de Andrei e senti um arrepio na coluna quando compreendi o que ele estava falando.  Devido a isso, quando as luzes se apagaram, eu não consegui dormir, apesar de saber que eu deveria descansar para enfrentar os desafios do dia seguinte. Shaggy apagou como um bebê, assim como as mulheres. Depois de certo tempo no escuro, eu vi Fred Jones pular de sua cama na parte de cima de um beliche e se afastar de nós. Imediatamente, eu fui atrás dele, não sei se por preocupação, por medo, ou por simplesmente querer uma companhia tão insone quanto eu. Eu não sei se Fred me ignorou ou simplesmente não se importou com a minha presença, mas a apatia dele me incomodou e me forçou a dizer alguma coisa.


            Velma: Eu ainda não te agradeci por ter salvado a minha vida hoje…


            Fred: Eu sei que você faria o mesmo por mim… quero dizer, você faria o mesmo se não fosse do tamanho de uma criança de dez anos e não tivesse a visão de uma marmota míope… nem os bíceps e a agilidade de uma idosa de 88 anos…


            A ironia fez um pequeno sorriso se formar nos meus lábios e eu me senti confortável quando percebi que o velho Fred de sempre estava ali.


            Velma: Mesmo assim, muito obrigada pelo que você fez… por mim, por Shaggy e por todos… obrigada por se arriscar pela nossa sobrevivência…


            Fred: A Daphne não pode dizer o mesmo…


            A declaração de Fred soou como um soco no estômago e o pequeno bem estar que eu senti se desfez imediatamente. Eu me esforcei para reverter aquele desconforto, mesmo sem saber o que eu deveria dizer.


            Velma: Sim, ela pode… onde quer que ela esteja, tenha certeza que ela pode…


            Fred: Se ela estiver no céu, ela não pode…


            Velma: Fred, nós acabamos nesse reality show maluco por causa dela, estamos fazendo tudo para salvá-la!


            Fred: E se for tarde demais?


            Velma: Não é tarde demais!


            Fred: Como você sabe?


            Velma: EU NÃO SEI, MAS EU QUERO ACREDITAR QUE ELA ESTÁ VIVA, OK?


            Eu elevei tanto a voz que recebi diversos “shhhhh” como resposta.


            Velma: Olha só, estamos no inferno de Dante, e não é hora de desistir nem de deixar de acreditar! Nutrir um pouco de ilusão nesse momento seria muito útil, sabia?


            Fred: Eu nutri ilusões demais nesses últimos dez anos, Velma… tantas que eu acabei aqui, como você mesma disse, no inferno de Dante… eu sacrifiquei a Daphne por uma ilusão, e estou prestes a morrer pelo mesmo motivo… e no fim, eu só terei vivido ilusões…


            Velma: A DAPHNE NÃO MORREU, NEM VOCÊ VAI MORRER AQUI, PARE DE DIZER ISSO! EM POUCOS DIAS, NÓS VAMOS SAIR DAQUI E ENCERRAR ESSE CASO!


            Mais uma enxurrada de “shhhhhhh” surgiu como resposta à minha fala em voz alta.


            Fred: Foi exatamente o que Daniel disse antes de assistir a noiva dele ser executada, e logo em seguida, ter o mesmo destino…


            O argumento de Fred me machucou e me desarmou totalmente. A lembrança daquelas vidas perdidas fez meus olhos se encherem de lágrimas e um soluço dificultou a saída da minha voz. Minha falta de argumentos para refutar uma realidade tão cruel me irritou.


            Velma: Fred, que droga, vamos dormir e focar em sobreviver mais um dia, ok? Não é momento para pensar demais e reagir com antecedência… é hora de ser aquele espartano troglodita viking que você sempre foi a sua vida inteira! Agora, vá já para a cama!


            Eu pensei que a minha pequena piada causaria algum riso nele, mas não notei nenhuma reação. Eu, então, me levantei, peguei a mão dele e puxei com força, tentando fazê-lo se levantar também.


            Velma: Venha! Vamos! Precisamos dormir para vencer mais uma vez!


            Fred: Pode ir na frente, eu já vou… preciso só fazer algo que eu me esqueci de fazer desde o ataque ao nosso hotel… chorar…



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Autor(a): kendrakelnick

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