Fanfics Brasil - Capítulo 27 – Bolinhas de gude e de esperança. Ambas perdidas. Scooby-Doo: Wicked Game

Fanfic: Scooby-Doo: Wicked Game | Tema: Scooby-Doo, Round 6


Capítulo: Capítulo 27 – Bolinhas de gude e de esperança. Ambas perdidas.

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Eu me arrependi profundamente da minha decisão idiota seis os sete metros depois de ter entrado na tubulação de ar. A escuridão e a miopia me impediam de seguir em frente, mas o medo me impulsionava a tatear ao redor e procurar um caminho melhor do que ter que jogar um jogo mortal novamente. Quando atingi a primeira bifurcação, amarrei uma linha solta do meu agasalho em um parafuso da tubulação e torci para que aquele nó funcionasse. Continuei a engatinhar no escuro por vários minutos, confiando apenas em meu tato e no fio de Ariadne que deixei metros atrás. Quando finalmente encontrei uma saída luminosa, eu me arrastei em direção a ela e percebi que ela terminava em um dos corredores que levavam aos banheiros. Por ser um local muito movimentado, desisti daquela saída e me arrastei na tubulação escura por vários minutos até encontrar outra luz no fim do túnel. Felizmente, desta vez foi realmente uma luz no fim do túnel.


            Através da grade, eu pude ver uma espécie de escritório com uma escrivaninha longa de mogno no centro e várias prateleiras cheias de pastas e livros ao redor. Em cima da escrivaninha havia um computador, um celular e um telefone fixo, e eu concluí que aquele lugar deveria ser a sala do Front Man, conforme Flim Flam havia dito. Eu me aproximei da saída da tubulação devagar e olhei ao redor em busca de câmeras, alarmes ou sensores de presença. Como não encontrei nada que pudesse denunciar a minha presença– e o próprio Flim Flam já havia mencionado que esteve naquele local e não foi descoberto -, eu removi a grade da tubulação e entrei. O pânico não me deixou prestar atenção em muita coisa, eu apenas revirei os objetos do local com cuidado em busca de armas, facas, remédios ou qualquer coisa que pudesse nos ajudar durante uma futura fuga. Infelizmente, o único objeto de valor que encontrei foi um cartão de visitas de Squid Game com uma etiqueta RFID no verso, muito parecido com aquele que encontramos em Applegate Bank dias atrás. Sem hesitar, guardei o cartão no bolso e continuei a procurar por mais objetos. Não demorou muito até que eu ouvisse risadas e vozes se aproximando, então eu imediatamente voltei para a tubulação de ar e me escondi na escuridão.


            Eu já estava a vários metros do escritório quando percebi que o fio que eu havia amarrado no parafuso havia se rompido e eu não fazia ideia de como voltar para o dormitório. O medo que senti fez meu ar faltar, e tudo piorou quando notei que eu estava vagando por tubos totalmente diferentes daqueles em que eu havia estado quando entrei. Mas havia algo bem pior do que a sensação de estar perdida para sempre: todas as coisas que vi nas saídas daqueles tubos. Primeiro vi uma sala ricamente ornamentada, com vários homens engravatados que usavam máscaras de carnaval assustadoras e conversavam enquanto bebiam champanhe; depois, vi quartos que serviam de palco para cenas infernais de abusos e violências tão horríveis que me fizeram fechar os olhos. A única cena que me trouxe algum conforto foi a imagem de um dos homens engravatados abrindo uma sequencia de portas, usando um cartão parecido com o que eu tinha em meus bolsos, e eu concluí que eu tinha em mãos uma chance de escapar sem ter que lutar. Eu já havia perdido a esperança de retornar quando, ao virar um cruzamento de tubos, eu senti um fio enroscar em minhas mãos. Eu sorri aliviada ao perceber que era, de fato, o fio que eu havia amarrado no parafuso, e através dele eu consegui voltar até o tubo inicial. Porém, quando abri a grade da tubulação do dormitório, todas as luzes se acenderam bem antes do amanhecer, e vários guardas se aproximaram com armas apontadas para a minha cabeça.


            Os guardas gritaram ordens em idioma coreano e eu não compreendi, por isso, eu apenas me rendi e levantei os braços para cima. Fred imediatamente correu em minha direção e ficou na minha frente, impedindo que os guardas mirassem em mim. Wang e Andrei vieram logo atrás, e Wang respondeu algo em coreano que deixou os guardas ainda mais nervosos. Aparentemente, os guardas contaram a ele sobre a minha fuga, pois Wang olhou para mim com reprovação e questionou por que eu havia feito aquilo.


            Velma: Eu não sei! Eu… eu… só queria ajudar!


            A angústia me fez chorar desesperadamente, mas ao invés de despertar compaixão, meu choro irritou os mascarados, e dois deles me pegaram pelos braços com violência e me arrastaram. Fred me puxou de volta até conseguir me soltar e entrou em luta corporal com um dos guardas, mas acabou atingido por tantos socos e pontapés que não conseguiu mais impedir que os demais me carregassem. Eu ouvi os gritos e o choro de Daphne e Lupe, mas Wang e Andrei impediram-nas de me ajudar. A última visão que tive ao passar pela porta aberta foi Shaggy e Fred lutando para me alcançar. Sabendo que eu teria um triste fim, eu apenas fechei meus olhos e aguardei pelo pior.


            Alan: PAREM!


            Uma voz conhecida me fez reabrir os olhos, e pude ver um homem alto, usando uma túnica preta com capuz e uma máscara negra assustadora olhando para mim. O grito ríspido dele fez os guardas recuarem e me soltarem imediatamente. Em seguida, o homem retirou a máscara negra e revelou ser Alan Mayberry. Eu tentei manter uma postura séria ao encará-lo, mas lágrimas desciam descontroladamente pelo meu rosto.


Alan: Tem sorte de ser a estrela desse jogo, Srta. Dinkley, caso contrário, seria um prazer te fuzilar na frente dos seus amigos. Neste momento, sua vida vale mais de 200 milhões de dólares em apostas, a maioria dos VIPs admira a sua inteligência e acredita que você será a grande vencedora de Squid Game. Por isso, eles permitiram que você fique viva desta vez. Mas não abuse da sua sorte, se for pega em mais um deslize, seus órgãos serão retirados enquanto você ainda estiver viva.


O ódio e o medo que senti eram tão profundos que eu sequer tive forças de me levantar, enfrentar Mayberry e elaborar qualquer tipo de resposta para aquela ameaça cruel. A única reação que meu corpo teve foi fechar os olhos para drenar um pouco o imenso fluxo de lágrimas que inundavam meu rosto. Enquanto os guardas me arrastavam de volta ao dormitório, eu pude ouvir Fred totalmente fora de si, gritando e ameaçando Mayberry de todas as formas. Ele retomou o controle somente quando me viu viva e a salvo, e correu para me abraçar. Em seguida, Daphne, Shaggy e os demais também vieram em minha direção e me abraçaram aliviados. Passada a comoção inicial, eu senti um tapa forte em minhas costas, e logo em seguida, outros tapas mais leves em minha cabeça e ombros. Quando me levantei e abri os olhos, vi que a agressora era Daphne, que chorava descontroladamente enquanto tentava me agredir.


Daphne: VOCÊ É TÃO EGOÍSTA! COMO PODE FAZER ISSO? VOCÊ… VOCÊ… VOCÊ PODIA TER MORRIDO!


Eu desconsiderei as agressões quando percebi que a dor que Daphne sentiu ao pensar que iria me perder foi maior do que a dor dos tapas que recebi. Fred imediatamente segurou os pulsos dela e a abraçou para acalmá-la, e todo o desespero dela se converteu em lágrimas. Apesar de não demonstrarem com palavras, percebi que Fred e Shaggy me olhavam com raiva, por isso eu tentei me justificar.


Velma: Desculpe, turma, eu pensei que seria uma boa ideia procurar uma forma de escapar…


Shaggy: É, tipo, foi uma excelente ideia! Você quase morreu e agora todas as porras dos guardas estão em alerta! Não vamos mais conseguir fugir pela tubulação porque você é uma egoísta teimosa do caralho que gosta de dar ordens, mas não gosta de segui-las…


Shaggy ficou tão nervoso que parou de falar de repente e se afastou sem olhar para mim. O sentimento de culpa apertou meu coração, e piorou quando percebi que todos me olhavam com a mesma reprovação. Fred foi o único que não sentiu ódio de mim - talvez porque ele teria feito o mesmo que eu – e se ocupou apenas de confortar Daphne.


Fred: Eu espero que, ao menos, essa sua fuga idiota não tenha sido em vão…


O comentário de Fred me deixou menos tensa e fez com que a raiva dos demais diluísse um pouco. Com os olhos baixos, eu sacudi a cabeça de forma negativa, tirei o cartão do bolso e, disfarçadamente, mostrei Fred, Daphne e os demais.


Velma: Não foi. Agora não precisamos mais fugir secretamente pela tubulação, podemos organizar uma rebelião e passar pelas portas.


***


             A revelação sobre o cartão fez o humor de meus amigos melhorar, e ao ouvir a boa notícia, Shaggy se aproximou e sorriu para mim.


            Shaggy: Tipo, então vamos convencer os demais e organizar uma fuga!


            Fred: Esperem! Não podemos falar sobre o cartão, eles podem nos matar para pegá-lo.


            Wang: Fred tem razão, pode ser perigoso. Precisamos tentar novamente convencer a maioria a desistir dos jogos.


            Shaggy: É, mas tipo, ninguém aqui parece estar a fim de fazer isso, todo mundo está de olho no prêmio!


            Velma: Infelizmente, Shaggy está certo, não conseguiremos convencer a maioria, mas podemos conseguir mais aliados e tentar uma fuga. E eu sei exatamente como convencê-los a ficar do nosso lado: vamos trocar o apoio deles por informações privilegiadas sobre os próximos jogos.


            Os rapazes se entreolharam de maneira séria, e logo em seguida concordaram com a minha ideia. Desta vez, Andrei e Wang se ofereceram para negociar com nossos inimigos, uma vez que Fred e Shaggy já haviam brigado com eles várias vezes. A escolha dos dois, porém, não amenizou a rivalidade entre nossos grupos, nem foi capaz de convencer os ingleses a se aliarem a nós.


            Tom: Vocês estão achando que somos burros? Vocês não têm nenhuma informação privilegiada sobre os jogos, sabemos que todos eles estão desenhados nas paredes! E agora que sabemos, usaremos isso a nosso favor para eliminar cada um de vocês!


            Mesmo diante da petulância de Tom, Wang e Andrei não se deixaram abalar e retornaram sem dizer uma palavra. Infelizmente, Fred não teve o mesmo equilíbrio emocional e ameaçou ir em direção à gangue de ingleses para agredi-los, mas Shaggy o impediu.


            Wang: Bem, parece que estamos sozinhos. Temos que articular um plano de fuga apenas com a nossa equipe.


            Lupe: Não podemos fazer isso! Dmitri não conseguirá fugir!


             A voz de choro de Lupe atraiu nossas atenções para Dmitri, que não havia conseguido se levantar da cama. Ele estava muito pálido e suado, e Lupe nos informou que ele estava com febre alta, provavelmente devido a uma infecção causada pelo ferimento do dia anterior. Dmitri tentou fingir que estava bem o suficiente para fugir, mas não conseguiu fazer muito além do que sentar na cama com dificuldade. Inevitavelmente, Fred olhou para os ferimentos de Daphne com preocupação, e eu percebi que ele temia que ela também não conseguisse fugir.


            Shaggy: Tipo, mas se não fugirmos, teremos que jogar outro jogo brutal como o de ontem, e com certeza ele não terá chance nenhuma! É melhor arriscarmos uma chance de fugir do que deixá-lo morrer aqui, assim como ocorreu com o agente Li!


            Andrei: Shaggy tem razão, não podemos ficar…


            Ginevra: Mas como faremos isso? O próximo jogo é daqui a poucas horas, não teremos tempo para planejar e executar uma fuga! E qualquer ação sem planejamento pode resultar na morte de vários de nós! Por pior que seja, é mais sensato jogarmos o próximo jogo e fugir durante a noite… se Velma teve conseguiu sair na noite passada, nós podemos conseguir esta noite…


            Quando Ginevra mencionou o que fiz, eu senti o peso de alguns olhares de reprovação, mas não soube dizer se ainda estavam zangados por eu ter fugido sem avisar ou se estavam irritados pelas consequências do que fiz. Não tivemos tempo de discutir qual das opiniões estava certa. De repente, a porta se abriu antes do horário habitual e os guardas anunciaram que seríamos levados para a higiene matinal. Enquanto a fila se formava para sair do dormitório, combinados de observar as portas, rotas e esquemas de segurança que encontrássemos durante o caminho, para que assim pudéssemos planejar alguma coisa quando retornássemos.


***


            Na fila das mulheres, eu fui a única que se atentou a caminhos alternativos e contou o número de portas, fechaduras eletrônicas e guardas durante todo o trajeto. Daphne ainda sofria com os próprios ferimentos e se esforçou para conseguir caminhar. Lupe parecia preocupada com o estado de saúde de Dmitri e Ginevra parecia estar em transe devido ao medo e às imagens horríveis que presenciamos no dia anterior. Pouco antes de chegar ao lavabo, eu ouvi um assobio, e ao olhar ao redor, eu percebi que um guarda muito baixo, com máscara em forma de triângulo, acenava para mim em um corredor. Meu coração disparou de alegria ao perceber que era Flim Flam, então eu me afastei da fila disfarçadamente, sem avisar as demais garotas, e o segui até uma sala. Quando a porta se fechou, Flim Flam rapidamente retirou a máscara e pediu que eu lhe devolvesse o cartão que roubei.


            Flim Flam: Você perdeu a cabeça, Velma? Eles perceberam que um cartão foi roubado! Me devolva imediatamente!


            Velma: Relaxa, não tinha câmeras naquele escritório…


            Flim Flam: Não há câmeras na área dos VIPs, mas você foi a única que saiu do dormitório! É óbvio que eles saberão que o cartão está com você!


            Velma: Mas Alan não vai deixar os guardas me executarem! E quando eles pedirem para eu mostrar os bolsos, eu posso deixar o cartão com outra pessoa…


            Flim Flam: E então eles pedirão para cada participante mostrar os bolsos, até acharem o cartão… e o culpado será executado… eles podem executar até mesmo todos os envolvidos! Nem pensar, me devolve agora!


            Velma: Flim Flam, não podemos! Estamos planejando uma fuga e precisamos do cartão! Temos que correr algum risco de qualquer forma! Já perdemos pessoas demais, não podemos continuar jogando…


            Flim Flam: Mas se usarem esse cartão para fugir, todos vocês morrerão! As fechaduras eletrônicas avisarão aos computadores dos guardas o exato caminho que vocês estarão fazendo, não há como ser dessa forma! Não há como fugir, Velma, acredite, não temos a menor chance nesse momento…


            A revelação de Flim Flam me causou, ao mesmo tempo, raiva, desespero e tristeza, e eu comecei a chorar descontroladamente. Flim Flam então me apressou para devolver o cartão, e quando eu o tirei do meu bolso, ele arrancou de minhas mãos e me conduziu imediatamente à porta, sem tempo para me consolar. Antes de sairmos, ele deu um tapinha nas minhas costas.


            Flim Flam: Força, Velma! Não é hora de desistir! Não perca a esperança, o momento certo chegará e eu avisarei vocês. Boa sorte.


            Como de costume, ele me empurrou para fora e eu caí no chão sem ter forças para me levantar. Quando percebi que meu choro atraía a atenção de alguns guardas, eu procurei a direção do lavabo e me juntei às demais mulheres. Eu lavei meu rosto diversas vezes, mas não consegui retirar dele as lágrimas e a vermelhidão do choro incessante. Daphne se aproximou de mim enxugando os cabelos, e quando me viu chorando, imediatamente me abraçou e perguntou o que havia acontecido. Então, eu suspirei e tentei controlar meus sentimentos.


            Velma: Estou chorando pelo que não aconteceu, Daph… não conseguir fugir daqui hoje… e talvez não sairemos daqui tão cedo…


***


            Depois de dar a péssima notícia a Lupe e Ginevra, a nossa volta ao dormitório pareceu um cortejo fúnebre. Quando chegamos, Lupe correu em direção a Dmitri - que lutava para se manter em pé - e procurou ajudá-lo, provavelmente porque ela já previa que o pior poderia acontecer a ele. As expressões de tristeza em nossos rostos logo confrontaram os sorrisos esperançosos dos rapazes, e logo dissemos a eles que os planos de fuga que eles elaboraram foram em vão. Shaggy teve um ataque de raiva e se afastou de nós; Wang e Andrei foram mais equilibrados, apesar de também demonstrarem frustração em seus olhares. O único que conseguiu nutrir um fio de esperança foi Fred.


            Fred: Ótimo, pelo menos sabemos que Flim Flam está vivo, e certamente está procurando uma forma de nos tirar daqui…


            O otimismo conformista de Fred, apesar de apropriado para aquele momento, me irritou profundamente.


            Velma: Ótimo? Você acha ótimo nós termos que participar dessa merda novamente? Como pode dizer isso? Não sabemos se todos nós estaremos vivos ao fim do dia!


            Eu me senti um pouco melhor ao descontar a minha raiva em Fred, mas logo me arrependi ao perceber que o otimismo dele era da boca para fora. Ao invés de me responder com mais palavras de esperança, ou me confrontar de maneira ríspida, ele apenas olhou de maneira triste para Daphne, que estava tão ferida que mal conseguia manter os dois pés no chão. Também me arrependi do que fiz quando percebi que minhas palavras causaram uma crise de choro em Shaggy e Ginevra, e me odiei por ser tão irresponsável a ponto de colocar mais medo em meus amigos.


            Wang: Bem, o melhor que podemos fazer agora é manter o foco, a estabilidade emocional, e pensar no próximo jogo. Pelo desenho, parece que jogaremos bolinhas de gude. Temos que unir nossos cérebros e pensar em todas as formas que esse tipo de jogo pode ser jogado, inclusive nas mais brutais…


            Fred e eu balançamos a cabeça afirmativamente, e logo em seguida meu coração acelerou ao perceber que eu nunca havia tocado em uma bolinha de gude em toda a minha vida.


            Andrei: Geralmente há um círculo e o objetivo do jogo é usar uma bolinha de gude para empurrar as peças do oponente para fora desse círculo. Pelo menos é como jogávamos na Rússia… não é difícil…


            As palavras de Andrei encorajaram um pouco os demais.


            Ginevra: Ou então há um circuito desenhado no chão, e o objetivo é empurrar uma bolinha através dele, usando o dedo e outra bolinha. Ganha quem chegar primeiro, perde quem deixar uma bolinha sair do circuito… realmente, não é difícil, apenas temos que ter boa coordenação motora…


            Wang: Na China, o jogo é parecido, mas o objetivo é ganhar as peças do oponente…


            Lupe: Bem, eu tive uma babá que jogava esse jogo comigo e com meus irmãos… realmente, não é difícil…


            Lupe terminou a série de depoimentos otimistas olhando para nós quatro com um sorriso no rosto, esperando que também falássemos sobre as nossas experiências com o jogo nos Estados Unidos, mas nossos olhares de interrogação logo denunciaram que as nossas experiências eram nulas. Ao perceber nossa aflição, Ginevra tentou nos acalmar.


Ginevra: Não fiquem tensos, como eu disse, não é difícil de aprender, nem de jogar, basta ficar atento e ter boa coordenação nas mãos ao atirar as bolinhas…


O comentário de Ginevra imediatamente fez Shaggy testar o movimento dos próprios dedos, e ao perceber que eles eram bem ruins, ele sorriu desconcertadamente para nós. Fred suspirou e olhou de maneira tensa para os dedos machucados de Daphne, e eu percebi que ele temia pela vida dela. Dessa vez, Daphne assumiu o papel de otimista.


Daphne: Relaxa, turma… Shaggy sabe atirar pipocas para o alto como ninguém… e eu gostava de brincar com as pérolas da mamãe… e vocês dois… bem… Velma, você já sabia escrever antes da pré-escola, sempre teve uma coordenação motora excelente… e, Freddie… bem, certamente todos vocês brincavam com os diamantes que a “fada do dente” trazia para vocês, não brincavam?


O comentário absurdo e inocente de Daphne atraiu olhares de indignação dos demais, mas Fred e eu apenas nos olhamos e rimos. Isso fez com que Daphne percebesse que 99,9% das pessoas do mundo não recebem diamantes quando perdem um dente na primeira infância, e ela suspirou de frustração. Mesmo assim, Fred beijou a testa dela com ternura e a abraçou. O movimento dos guardas trazendo o café da manhã encerrou a nossa discussão, pois muitos de nossos amigos não haviam comido no fim do dia anterior e estavam famintos – inclusive Shaggy, que havia comido muito no dia anterior, mas sempre estava morrendo de fome.


***


            Mesmo nos apressando, não conseguimos um bom lugar na fila da comida, e isso deixou Shaggy apreensivo, temendo não sobrar nenhum alimento. Dmitri parecia mais pálido, tremia e não conseguia ficar em pé sem a ajuda de Andrei e Lupe. O grupo de ingleses estava metros a nossa frente, e entre eles e os demais participantes havia uma movimentação estranha que chamou a atenção de Fred e Wang. Como um bom observador, Wang se aproximou deles, e logo em seguida voltou para nos alertar.


            Wang: Eles estão formando duplas para o próximo jogo… talvez eles saibam de algo que não sabemos sobre a competição, então acho melhor fazermos o mesmo.


            Imediatamente, Shaggy agarrou o meu braço, e Daphne segurou o braço de Fred, determinando que duas duplas já havia sido formadas. Ginevra se aproximou de Wang, e Dmitri, Andrei e Lupe se entreolharam, pois sabiam que um deles ficaria sozinho. Entretanto, a difícil decisão de deixar um de nossos amigos sem par não foi tomada imediatamente, logo em seguida chegou a nossa vez de pegar os alimentos e todas as atenções se concentraram nisso. No momento em que Daphne e eu chegamos a uma das extremidades da mesa, percebemos que Tom nos olhava com um sorriso malicioso na outra extremidade. Nós desviamos o olhar e o ignoramos, mesmo assim, Tom se aproximou de nós rindo debochadamente, entrelaçou os dedos nos cabelos molhados de Daphne e tentou beijar o pescoço dela à força. Imediatamente, Daphne o empurrou e eu fiz o mesmo, logo em seguida, distribuímos tapas nos braços e no rosto dele, para evitar que ele se aproximasse novamente. Não tivemos tempo de avisar os rapazes sobre o acontecimento, no momento seguinte, Fred atingiu Tom no rosto com força e o derrubou sobre a mesa. O impacto de Tom fez a mesa cair no chão, e a briga violenta entre ele e Fred chamou a atenção dos guardas. Os guardas prontamente apontaram suas armas para Fred, no intuito de fazê-lo parar de atingir Tom, mas nem mesmo o risco de morte foi capaz de pará-lo. Shaggy, Wang e Andrei então correram em direção a Fred e o arrastaram para longe dos guardas e de Tom, e eu e Daphne nos aproximamos para acalmá-lo. Estranhamente, os demais ingleses não se aproximaram para ajudar o seu líder, e Tom se levantou de onde estava de maneira vitoriosa, com o mesmo sorriso debochado de antes, e passou por nós rindo. Shaggy e os demais se desesperaram ao perceber que toda comida e toda água havia sido perdida, e ao se dar conta de que ele foi o responsável por deixar todos nós em jejum, Fred tentou se justificar.


            Fred: Parem de me olhar com raiva, seus merdas, ele queria fazer mal para a Daphne!


Shaggy: Não, Fred, tipo, ele só queria te irritar para fazer a gente perder toda a comida e ficar fraco o bastante para ser fuzilado no próximo jogo! E como você é um filho da puta impulsivo, ele conseguiu exatamente o que ele queria! Olha só para o Dmitri, ele está ferido e fraco, e agora não vai comer por sua culpa!


Shaggy gritou de raiva e apontou o dedo para o rosto sério de Fred, e isso fez com que Fred partisse para cima dele e o empurrasse. Shaggy o empurrou de volta, e nós procuramos separá-los antes que eles começassem a trocar golpes.


Wang: Vocês dois estão certos, então não há motivos para brigarem. Tom nos atacou e nos desconcentrou uma vez, e se continuarmos essa discussão sem sentido, perderemos o foco de vez.


Fred e Shaggy pararam de falar e de se agredir, mas ainda olhavam com raiva um para o outro. Shaggy se afastou e junto com Lupe, Ginevra e Andrei, eles procuraram os poucos alimentos que restaram no chão e comeram. Eu não tive coragem de fazer a mesma coisa, por isso permaneci ao lado de Daphne e Fred. Pouco tempo depois, os guardas reapareceram e anunciaram o início de outro jogo, e Wang nos reuniu para repassar as informações.


***


            Wang: Os guardas pediram para formarmos duplas. Escolham seus pares e sigam os mascarados até a próxima sala.


            A ordem de Wang foi acatada imediatamente, pois já havíamos formado pares. Lupe hesitou por um momento entre os dois russos, mas logo em seguida decidiu ficar com Dmitri, mesmo gravemente ferido. Andrei, então, partiu em busca de um novo par, e nós caminhamos com nossos pares em direção à próxima sala. Ao chegar perto da entrada, porém, eu senti que havia algo de errado e parei. Como eu não sabia exatamente o que aquele sentimento estranho estava tentando me avisar, eu procurei olhar ao redor cuidadosamente, para tentar entender nas entrelinhas algum tipo de informação que eu estava perdendo. Demorei tanto que Shaggy e eu ficamos praticamente em último, e ele ficou me apressando até eu olhar para os ingleses e perceber que eles não haviam formado pares entre eles.


            Velma: Jinkies! Eles vão nos obrigar a jogar contra os nossos pares!


            Shaggy: O quê? Tipo, de onde você tirou isso? Vamos logo, estamos ficando para trás!


            Velma: Não, Shaggy, espere, olhe para os ingleses, eles são uma equipe, estiveram juntos em todos os jogos e brigas, por que não formaram duplas entre si? Obviamente, porque eles sabem que os membros das duplas jogarão uns contra os outros! E se eles formaram as duplas com antecedência, certamente sabem de algo!


            Eu pude ver desespero nos olhos de Shaggy, principalmente porque havíamos nos separado de Daphne, Fred e os demais.


            Shaggy: Rápido, vamos avisar os outros! E, tipo, vamos formar outras duplas com desconhecidos, assim temos mais chances de sobreviver!


            Shaggy disparou a correr antes que eu pudesse lhe dizer qualquer coisa, e eu o segui. No caminho, eu procurei desesperadamente por outra pessoa para formar uma dupla, mas não encontrei ninguém. Felizmente, quando cheguei à grande sala, Shaggy já havia conseguido espalhar a notícia para os nossos amigos e Wang, Ginevra, Fred e Andrei já haviam formado duplas com outras pessoas. Daphne desesperadamente procurava por uma pessoa, enquanto tentava se desvencilhar de um dos ingleses que insistia em segui-la. Lupe, por sua vez, não estava tão desesperada em achar um par, aparentemente, ela não queria deixar Dmitri sozinho e sequer havia soltado a mão dele.  Com uma escassez cada vez maior de membros avulsos, o inglês desistiu de Daphne e formou dupla com uma mulher coreana que havia recusado Shaggy. Então, Shaggy agarrou o braço de Mathias, o alemão que havia nos ajudado a vencer o cabo de guerra, e olhou para mim totalmente transtornado, sabendo quão ruim e quão antiética era aquela decisão. Em seguida, eu me vi sozinha com Daphne e meus olhos se encheram de lágrimas quando segurei a mão dela e formei a nossa dupla. Indignado, Shaggy fez gestos de reprovação e sinalizou para eu desfazer o par imediatamente, porém, Daphne olhou para mim com lágrimas nos olhos e segurou a minha mão com mais força. Ao ver o impasse, Fred imediatamente abandonou o homem com quem havia formado dupla e veio em nossa direção, e Andrei fez o mesmo.


Fred: Vocês perderam a cabeça? Qual o problema de vocês duas? É para formar duplas com estranhos! O mesmo serve para você, Lupe!


            A bronca em voz alta de Fred causou certo tumulto, e alguns guardas apareceram, apontaram armas para a cabeça dele e ordenaram que ele voltasse para o seu par. Fred desobedeceu e segurou a mão de Daphne com força, desafiando os guardas e demonstrando que não sairia dali. A ação dele fez Daphne se desesperar e chorar, além de fazer os guardas ficarem mais agressivos e irritados. Quando a discussão estava quase terminando na execução de Fred, Dmitri largou a mão de Lupe e segurou a outra mão de Daphne. Apesar de ter entendido que Dmitri estava disposto a se sacrificar para que Daphne e Fred sobrevivessem, Fred olhou para ele interrogativamente e com raiva, afinal, o plano original não estava sendo obedecido. Então, alguns guardas escoltaram Fred de volta até sua dupla, enquanto outros permaneceram onde estávamos e exigiram que formássemos nossas duplas definitivas. Repetindo o heroísmo de Dmitri, Andrei desistiu de seu parceiro e segurou a mão de Lupe, enquanto eu não tive escolha a não ser apertar a mão do homem coreano que havia sido deixado para trás. Não tivemos nem um segundo para processar as emoções fortes e complicadas que aquelas pequenas decisões nos causaram. Imediatamente, os guardas nos conduziram até um cenário em forma de labirinto e nos informaram que, de fato, jogaríamos contra as pessoas que havíamos escolhido.


            Wang: Eles disseram que podemos jogar qualquer tipo de jogo com as bolinhas de gude. A única coisa que temos que fazer é conseguir ganhar todas as peças de nossos oponentes. Quem ganhar primeiro vence. Boa sorte a todos.


            Apesar de meu par ser extremamente competitivo e estar muito determinado a me eliminar, quando o jogo começou, minha atenção se voltou a Lupe e Andrei, pois não queria que nenhum deles fosse eliminado. Fred aparentemente fez a mesma coisa, mas a preocupação dele era certificar que Daphne jogaria um jogo que ela pudesse vencer. Ele começou a focar no próprio jogo apenas quando percebeu que seu oponente já havia ganhado quatro de suas peças – e que, infelizmente, Dmitri estava tão debilitado que mal conseguia se levantar do chão e mexer as mãos para jogar. Eu ainda mantive minha atenção intercalada entre meu próprio jogo (por sorte, meu oponente era tão ruim com bolinhas de gude quanto eu) e Lupe e Andrei, até que uma ideia brilhante surgiu em minha mente.


Velma: Jinkies! Eu tive uma ideia genial que pode fazer todos vencerem esse jogo!


Meu oponente, Lupe e Andrei olharam imediatamente para mim e aguardaram instruções.


Velma: É muito simples! Tudo o que temos que fazer é conseguir pegar as dez bolinhas do nosso oponente, não importa como, certo?


Andrei e Lupe: Certo…


Velma: Muito bem, então tudo o que devemos fazer é: a cada rodada, um oponente ganha a bolinha do outro… por exemplo, primeiro a Lupe ganha uma bolinha do Andrei, e depois o Andrei ganha uma bolinha da Lupe, e assim ocorre até cada um ter em mãos as dez bolinhas do outro. Dessa forma, os dois terão as dez bolinhas do oponente ao fim do jogo, e todos vencerão!


Lupe: Velma, isso é genial!


Todos nós sorrimos e logo começamos a colocar meu plano em prática. Jogamos um jogo bem idiota, de modo que a cada rodada, cada um dos oponentes ganhava uma bolinha. Ao ver a evolução rápida dos nossos grupos, dois guardas se aproximaram e observaram a maneira como estávamos jogando. Quando finalmente “ganhamos” as bolinhas de nossos oponentes, Lupe sorriu e mostrou o resultado para os dois guardas.


Lupe: Nós jogamos um jogo em que cada rodada, cada um ganhava uma bolinha do oponente, e no fim todos nós ficamos com dez bolinhas de nossos oponentes. Então, todos nós ganhamos e ninguém será executado.


Lupe terminou a frase com um sorriso enorme, achando-se mais esperta que os guardas. O silêncio entre eles demonstrou que os guardas não haviam compreendido as explicações dela em um idioma espanhol misturado com inglês básico, por isso o meu par repetiu em idioma coreano tudo o que ela havia dito. Os guardas, então, se entreolharam em silêncio, e logo em seguida dispararam contra Lupe e o meu par. O grito de revolta e angústia que saiu de minha boca foi mais alto que o tiro ecoando por todo o labirinto. Imediatamente, Fred, Wang e os demais vieram em nossa direção, e ao encontrarem Lupe morta, todos estremeceram. Aquele foi o primeiro momento em que minha racionalidade foi totalmente suspensa. Sem saber como, eu me joguei sobre o corpo dela sem me importar com o rio de sangue manchando minhas roupas, e lá eu chorei e gritei por vários minutos. Eu não consegui parar nem mesmo quando a ponta de duas ou três armas encostaram em minha nuca, exigindo o meu silêncio. Fred, então, me pegou no colo e me arrastou para longe dela, enquanto eu me debatia de chorava. Eu só consegui me recompor quando Andrei me confortou e me lembrou que nossos amigos ainda precisavam vencer seus oponentes.


Wang: Os guardas disseram que vocês trapacearam… por favor, não tentem vencer o jogo de outra forma…


A observação de Wang me feriu mais do que ver Lupe e meu oponente sendo colocados em caixas negras de presente. A culpa que senti era tão insuportável que, naquele momento, eu não conseguia ver nenhum alívio em ter vencido mais um jogo. Ginevra, Wang e Shaggy imediatamente voltaram aos seus jogos, apenas Fred demorou um pouco mais para checar se eu estava bem, e se Daphne estava conseguindo jogar.


Daphne: Freddie, ele está muito mal e sequer consegue jogar, eu não posso enganá-lo! Não posso vencê-lo dessa forma!


A confissão de Daphne arrancou algumas lágrimas dos olhos dela, e nos fez caminhar até Dmitri para checar seu estado de saúde. De fato, ele parecia ainda mais debilitado do que antes, e mal conseguia manter os olhos abertos quando chamado. Daphne se afastou um pouco e começou a chorar, recusando-se jogar. Andrei, então, a segurou pelo pulso e sinalizou para que ela abrisse as mãos. Antes de obedecer, ela consultou os olhos de Fred, e ele sinalizou para que ela recebesse as peças de Dmitri. Daphne obedeceu, e Andrei despejou nas mãos dela as dez bolinhas do amigo em estado terminal. Daphne teve a mesma reação que tive ao ver Lupe perder a vida, e ao invés de comemorar sua vitória, ela chorou descontroladamente.


Andrei: Quando saiu de Moscou, Dmitri tinha uma missão, Daphne. E ele acabou de cumpri-la. Não chore por ele. Ele merece nossa admiração, não nossa tristeza.


As palavras equilibradas de Andrei não foram suficientes para reestabelecer o descontrole emocional de Daphne, ela apenas procurou abrigo nos braços de Fred e chorou ainda mais. Um barulho repentino de tiro me assustou e fez Fred lembrar que ainda precisava batalhar por sua vida. Felizmente, o tiro não foi em direção a Dmitri, porém, quando nos aproximamos dele, percebemos que ele havia nos deixado. Os tiros que surgiram em seguida não me assustaram mais, mas alertaram Daphne e ela correu em direção a Fred.  Andrei fez continência até os guardas carregarem Dmitri para uma caixa de presente, e a sequência de tiros seguintes me fizeram procurar meus amigos.


Encontrei Wang e Ginevra nervosos, andando de um lado para o outro e com várias bolinhas de gude nas mãos. A ausência de seus pares indicou que eles já haviam concluído a missão. Após algum tempo e uma série de tiros, Daphne e Fred surgiram de mãos dadas, com rostos tristes, e Andrei surgiu logo em seguida. Como o fim do jogo se aproximava, eu temi por Shaggy, que ainda não havia aparecido. Comecei a andar pelo labirinto a procura dele, e ao avistá-lo com apenas quatro bolinhas de gude, eu estremeci. Shaggy tremia muito e nervosamente jogou mais uma bolinha, mas ela passou longe da bolinha do alemão. Mathias, por sua vez, jogou uma peça e acertou em cheio mais uma bolinha de Shaggy. Apesar de saber que não podia fazer nada para ajudá-lo, eu não consegui sair de perto dele. Eu olhava repetidamente para o relógio e para o rosto dele, demonstrando desespero e exigindo que ele arranjasse uma maneira de se apressar e vencer o jogo. Shaggy, então, me olhou de maneira angustiada, e eu percebi que dentro dele o desejo de vencer lutava contra a necessidade de salvar a vida do homem que havia nos salvado. Naquele momento, eu senti empatia por Mathias e meu coração doeu tanto que não consegui proferir nenhuma palavra de incentivo a Shaggy. Entretanto, logo em seguida, Mathias pegou a bolinha que havia acertado e devolveu a Shaggy.


Mathias: Não! Eu não vou fazer isso de novo. Pode ficar com elas. Se eu fizer, eu vou estragar tudo novamente, então essa merda de ciclo acaba hoje.


Shaggy: Tipo, fazer o quê? Do que você está falando?


Mathias: Eu não posso matar outro policial… toma… fique com elas e vença o jogo. Tenho certeza que você vai fazer a coisa certa quando vencer e vai acabar com filhos da puta como eu, que tiram vidas por diversão e dinheiro…


Mathias juntou todas as peças que tinha e derramou nas mãos de Shaggy, que assistiu à cena, incrédulo.


Shaggy: O quê?  Que porra é essa, cara? Tipo, isso não é justo! Vamos jogar novamente, agora pra valer…


Mathias apontou para o relógio, que mostrava apenas 70 segundos para o fim do jogo, e logo em seguida recusou a tentativa de Shaggy de lhe devolver bolinhas e iniciar um novo jogo.


Mathias: Cara, você veio aqui para fazer justiça e acabar com o jogo, e eu vim aqui só pelo dinheiro… é mais do que justo que você viva e eu não, até um criminoso como eu reconhece isso… além disso, eu não tenho futuro nenhum lá fora, eu sou um condenado de merda que fugiu da prisão… eu já matei muitos caras como você, eu já roubei velhinhas como aquela que morreu no segundo jogo, eu já matei garotas como as suas amigas só para ter cinco minutos de prazer, e esfaqueei imigrantes como aqueles chineses só porque eles eram imigrantes… por causa disso, eu acabei com a vida da minha família, fui um filho e um irmão de merda que sujou o nome deles para sempre… e eu tenho certeza que eu vou continuar colecionando crimes impunes se eu tiver em minhas mãos todo o poder econômico desses milhões que o jogo irá pagar… então, isso tem que parar… algo tem que me parar e me fazer pagar por tudo, entendeu? Eu não quero ser como aqueles ingleses… pela primeira vez na minha vida, eu preciso fazer algo certo… e o momento é agora…


O depoimento me comoveu e deixou Shaggy confuso. Apesar de visivelmente estar aliviado por segurar em suas mãos todas as bolinhas de gude de seu adversário, ele ainda insistiu em jogar, talvez motivado pela empatia típica que sempre move suas ações. Mathias negou balançando a cabeça, e no momento em que o relógio marcava 15 segundos para o fim do jogo, ele acenou para os guardas e demonstrou que havia perdido todas as suas peças para Shaggy.


Velma: Mathias, você é…


uma boa pessoa”,foram as palavras que Mathias nunca ouviu. Os guardas sequer se aproximaram dele para disparar o tiro que tirou sua vida, no momento em que o relógio marcou zero. O corpo dele caiu no chão ao som de inúmeros disparos que surgiram ao fim do jogo, encerrando as vidas daqueles que não haviam conseguido cumprir o objetivo. Shaggy e eu nos abraçamos e choramos juntos por algum tempo, sem ter coragem de reabrir os olhos e ver o cenário triste do fim de mais um jogo. Só voltamos à realidade quando Fred se aproximou e deu um tapinha em nossas costas, indicando que deveríamos nos juntar aos demais e voltar ao dormitório


Quando saímos para realizar a higiene noturna, eu não consegui formular rotas de fuga, contar portas, nem imaginar meios de sair daquele lugar. Minhas esperanças de sobreviver a Squid Game foram perdidas aos poucos, bolinha a bolinha, e morreram junto com nossos amigos.



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Autor(a): kendrakelnick

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