Marcie tentou me acalmar quando um horror profundo tomou conta de mim. Coloquei meus óculos, vesti as primeiras roupas que encontrei no meio do caminho, beijei rapidamente os lábios dela e corri para o NYPD. “Vai ficar tudo bem”, foram as palavras de conforto que apareceram no meu celular ao lado da foto de minha noiva, no momento em que eu entrei no departamento. Fred Jones e parte das nossas equipes me aguardavam no local, ele tinha uma cara mais séria e mais preocupada que a minha e discava impacientemente o número de Daphne, mas ela não atendia.
Fred: Assuma a liderança do caso, Dinkley. Eu vou atrás da Daphne. Ela não me responde desde o fim da tarde, eu tenho certeza que ela foi atrás de Mayberry sozinha para confrontá-lo. Depois dos resultados da perícia, eu tenho medo do que aquele psicopata é capaz de fazer…
Eu assenti e Fred nos deixou. Miller então me deu os detalhes das amostras, e logo começamos os exames complementares para confirmar as nossas suspeitas. No laboratório, as horas passaram como se fossem minutos, meu peito sentia uma aflição tão profunda a cada resultado obtido que pensei que teria um infarto. A falta de resposta de Fred e o desaparecimento de Daphne adicionavam mais desespero ao meu coração aflito, eu só consegui me sentir um pouco melhor quando Jones me respondeu “eu estou com ela, estamos a caminho”.
Miller: E então, doutora, o que descobriu sobre as amostras?
Velma: Temos amostras recentes e mais antigas, então acredito que não tenha sido uma chacina. Imagino que as vítimas foram executadas naquele local uma de cada vez, ou talvez em pequenos grupos. Eu diria que os crimes ocorreram entre doze e nove meses atrás, o que condiz com o tempo de desaparecimento de Cho Sang-woo. A motivação obviamente é financeira. Os exames de DNA dizem que todas as vítimas têm origem asiática. Temos informações de que uma quantia em dinheiro foi transferida da Liberty de NY para uma ilha na Coréia do Sul, e uma das vítimas é de Seul, então suspeito que todos sejam sul-coreanos. Ainda não cruzei os DNAs com o banco de dados de desaparecidos. Pode fazer isso por mim, por favor?
Miller: Claro, doutora.
De repente, eu fui surpreendida por uma pata em meu joelho. Era Scooby-Doo, sentado ao meu lado, tentando chamar a minha atenção. Logo atrás dele estavam Norville e também Crystal segurando Amber na coleira.
Velma: É, parece que você tinha razão, amigão! Bom trabalho, Scooby! E você também, Shaggy. Você estava certo desde o início sobre o comportamento de Scooby, me desculpe por não perceber isso antes.
Shaggy: E tipo, sobre o aplicativo também, não é?
Velma: Não exagera. Eu sou uma mulher da ciência, eu não vou apoiar seu aplicativo não-científico.
Ao contrário de Fred Jones, Shaggy não é vaidoso, então sequer se importou quando eu não lhe dei razão. Pelo contrário, ele riu, pensando que eu estava brincando.
Shaggy: Tipo, isso está parecendo um crime de vingança feito por mafiosos!
Velma: Eu não descartaria essa hipótese, Shaggy. Um cassino ilegal com uma geladeira secreta para fazer execuções? É algo que a máfia faria.
Shaggy: E Alan é suspeito, pois Scoob se comportou da mesma maneira estranha perto dele e na cena do crime. Ele nunca se comportou assim em nenhum lugar, então, tipo, não é uma coincidência.
Eu havia me esquecido desse detalhe sombrio, e estremeci quando Shaggy me lembrou. Aparentemente, todas as nossas hipóteses sobre Alan Mayberry estavam erradas, então teríamos muito trabalho investigativo pela frente. De repente, Scooby começou a latir e a abanar o rabo, de acordo com o aplicativo idiota de Norville, Scooby dizia “meus amigos estão chegando”, e logo Daphne e Fred apareceram no laboratório. Daphne parabenizou Scooby por seu trabalho e lhe deu biscoitos, o que causou ciúmes em Norville (ciúmes dos biscoitos, obviamente). Shaggy também ganhou biscoitos, e esfregou a tela de seu celular na minha cara enquanto mastigava, para provar que seu aplicativo funcionava de verdade.
Velma: Turma, nós temos uma grande reviravolta em nosso caso…
Fred: Um momento, Velma, antes de contar os detalhes da perícia, Daphne precisa dizer o que descobriu.
Velma: Não me diga que você foi confrontar Alan! Daphne, nós dissemos que era perigoso!
Daphne: Não, eu não procurei Alan. Pelo contrário, eu estou recusando chamadas dele desde a perícia, quero evitar que ele saiba dos detalhes que descobrimos. As contas da Liberty são de Applegate Bank, então eu procurei Steven Applegate, o sócio de papai e dono de Applegate Bank, e ele concordou em falar conosco em algumas horas. Com a fusão de Applegate e Blake Bank após a falência do Sr. Applegate, muitos dos serviços da Applegate passaram a ser controlados por Blake Bank. Ou seja, se Alan tem a tal chave especial de Blake Bank, pode ser que essa chave funcione também nas transações de Applegate Bank…
Velma: …e que a transferência secreta para Silmido tenha sido feita por ele mesmo!
Daphne: Exatamente. Se provarmos que a chave secreta daquela transferência pertence a Alan, provaremos que a transferência foi feita por ele. E, quem sabe, nós conseguiremos provar que ele também está por trás dos desvios que levaram Applegate à falência, ou então, que ele está por trás dos desvios que supostamente foram feitos por Sang-woo. Assim teremos mais um crime para a lista dele.
Shaggy: Falando na lista de crimes de Alan, temos mais um: assassinato. Velma descobriu que as manchas na geladeira são de sangue de várias pessoas. E o Scoob fica estranho quando está perto do Alan e da cena do crime.
Velma: Bem, infelizmente, Shaggy tem razão. Miller e eu achamos o DNA de trinta e cinco pessoas diferentes nas centenas de amostras que colhemos, entre elas, o DNA de Cho Sang-woo. Todas as pessoas são supostamente asiáticas, eu diria que são todos sul-coreanos, considerando a nacionalidade de Cho Sang-woo, mas preciso pesquisar mais sobre as identidades delas antes de confirmar. Imagino que o motivo das execuções sejam dívidas financeiras, considerando nossas descobertas sobre a Liberty, mas eu não imagino o que tenha ocorrido. Shaggy sugeriu hipótese de ser uma máfia, e eu acho plausível.
Shaggy: Tipo, se for mesmo uma máfia, Alan poderia ser o líder. Ele é muito rico, tem acesso a dois bancos para fazer transações secretas…
Velma: Perfeito, Norville. Acho que o perfil de Alan se encaixa em um perfil de líder de máfia.
Fred: Velma, você conseguiu achar alguma coisa sobre as outras vítimas?
Velma: Eu pedi para Miller acessar o banco de dados de pessoas desaparecidas, e também os bancos de dados de instalações militares, prisões, delegacias e departamento de imigração. Eu mesma vou tentar coletar dados civis de hospitais e necrotérios, pois ele é extenso e requer cuidado ao analisar.
Fred: Ótimo. Precisamos do máximo de informações possíveis sobre essas pessoas. Enquanto isso, o que sabemos sobre Sang-woo?
Shaggy: Tipo, não muito. Ele possui green card, sul-coreano, origem humilde, aparentemente brilhante em investimentos, fez carreira na Liberty, trabalhou em quatro países diferentes e possui acusações de desvios financeiros e estelionato nesses quatro países. Tipo, eu não tenho informações sobre esposa ou filhos, o único vínculo familiar é sua mãe, que é feirante e mora em Seul. Foi ela que comunicou o desaparecimento dele à polícia local em junho de 2020.
Todos nós olhamos boquiabertos para Norville depois de ouvir todas as informações que ele coletou.
Shaggy: Qual é, turma, tipo, eu também faço pesquisas!
Daphne gargalhou e deu um tapinha amistoso nas costas dele.
Daphne: E nesse caso, o nome da “pesquisa” que Norville fez é Flim Flam, um agente da Interpol na China que nós conhecemos quando fomos visitar o Tibet.
Shaggy: Mas, tipo, eu tive que perguntar tudo isso para ele, isso também conta como uma pesquisa!
Daphne: É claro que conta, Shaggy!
Fred: Então a mãe não deve saber dos crimes financeiros do filho. Se soubesse que ele era procurado pela Interpol, ela não comunicaria seu desaparecimento a eles.
Shaggy iniciou uma chamada com Flim Flam para perguntar a resposta da pergunta que ele não sabia responder, e Daphne gargalhou novamente, encerrando a chamada antes que o agente atendesse.
Daphne: Não, Shaggy, ela não sabe, Flim Flam já me falou. Que triste, teremos que dizer a ela que seu filho é um criminoso e está morto.
Daphne é o coração da equipe e sempre expõe o lado emocional de tudo o que enfrentamos. Eu nunca me importei com isso, mas dessa vez eu fiquei muito abalada.
Fred: Enquanto não encontrarmos o corpo dele e dos demais, não temos certeza de que ele está morto.
Velma: A hipótese é de homicídio, Fred, levando em consideração que algumas amostras são de respingos de sangue no teto daquela sala…
Shaggy: Tipo, e por que outra razão mais de trinta pessoas sangrariam em um único lugar, Fred? Como eles fariam seu próprio sangue respingar no teto?
Fred: Entendo o raciocínio de vocês dois, mas é a lei. Sem os cadáveres, não temos nada além de uma prova de que Sang-woo e todos os demais estiveram no lugar.
Daphne: Fred tem razão, os juízes não aceitarão a hipótese de homicídio sem um corpo…
Fred: Por isso, preciso de você e Scooby novamente no prédio da Liberty. Scooby nos indicará para onde essas pessoas foram levadas.
Shaggy: O quê? Você enlouqueceu, Jones? Tipo, eu não volto naquele lugar sozinho nem se a Liberty fizer transações milionárias para a minha conta, você esqueceu como lá é perigoso?
Velma: Então, qual é o seu preço em comida?
Shaggy arregalou os olhos imediatamente e ficou empolgado com a oferta irrecusável que eu lhe fiz.
Daphne: Espere, gente, Shaggy tem razão, é muito perigoso voltar lá sozinho depois de tudo o que aconteceu hoje de manhã. Além do mais, eu marquei com o Sr. Applegate daqui a duas horas no escritório dele, para ele nos esclarecer sobre o envolvimento da Applegate nesse caso, então precisaremos de Scooby para farejar o local, quem sabe ele pode encontrar algo?
Shaggy se irritou por Daphne ter estragado a sua rara oportunidade de receber comida para trabalhar.
Shaggy: Tipo, eu aceito levar o Scooby, mas meu preço são duas caixas de biscoito, três donuts de creme, dois pretzels e…
Velma: Você não vai mais à Liberty, Norville.
Shaggy: É, tipo, mas para ir à Applegate tem um preço também, não adianta fingir que você não perguntou o meu preço porque eu ouvi muito bem! E agora que você perguntou, tem que pagar!
Eu revirei os olhos impacientemente enquanto Daphne ria e pagava com biscoitos o preço necessário para que Shaggy levasse Scooby à Applegate. De repente, Miller apareceu para informar que não encontrou informações das demais pessoas nos bancos de dados que ele consultou, então eu comecei a minha busca nos registros civis. Para a minha surpresa, pouco depois de eu ter iniciado a pesquisa, meu computador acusou quinze registros compatíveis com as vítimas, todos eles em hospitais.
Fred: O que achamos exatamente, Velma?
Shaggy: Tipo, eles estão vivos?
Daphne: Eles estão bem?
Quando cliquei no primeiro registro, meu coração disparou e o pânico se espalhou por cada centímetro do meu corpo. Os registros encontrados eram dados de um transplante de rim feito em um hospital particular luxuoso em Boston, e o DNA de uma das amostras era compatível com o DNA do “doador anônimo”. Os outros registros eram semelhantes: todos eram registros de transplantes de órgãos diversos, e o DNA das amostras sempre era compatível com um “doador anônimo”.
Velma: Jinkies!
Fred: O quê? Ah, não…
Daphne sempre dizia “Jeepers”, e Shaggy, “Zoinks”, mas desta vez, eles não conseguiram dizer nada.
Velma: Eles estão vivos sim, turma… quer dizer, pelo menos parte deles ainda está.