Fanfic: Volume 1 - O Segredo da Banshee | Tema: Forgotten Realms
FICHA TÉCNICA:
Volume 1 – O Segredo da Banshee
Título: Cap.1 – Uma Tempestade Inesperada
Autor: Andrei Maurey
Gênero: Aventura Fantástica
Capa: Imagem gerada por Inteligência Artificial do NightCafé Studio
Copyright © 2023 por Andrei Maurey
Primeira edição: Fevereiro, 2023
Fundação Biblioteca Nacional – Escritório de Direitos Autorais, RJ.
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Em 1362 DR, o Ano do Elmo, ao pôr do sol do dia 4 de Tarsakh, a embarcação da companhia Blue Water, de Rawlin Strowbar, singrava as águas profundas do mar a noroeste do arquipélago de Korinn. Em seu porão, trazia grandes quantidades de baús e caixas contendo minérios de ferro das montanhas de Ruathym e um cofre com as famosas pérolas prateadas, ambos extraídos da região para o próspero comércio em Orlumbor.
Fortes ventos do sudoeste sopravam as velas do Onda Voadora, de dois mastros. A tripulação, apressada, preparava-se para uma perigosa tempestade.
— Andem depressa, suas lesmas do mar! — berrava o capitão, Draper Torden. — Se a carga afundar, não serão pagos!
Ele tentava, em vão, encontrar alguma ilha enquanto localizava a sua posição no mapa e fazia uso de sua velha luneta. Tinha bons conhecimentos sobre os caminhos marítimos da região, pois havia dois anos que fazia essa rota, Orlumbor-Ruathym, mas apenas nos últimos seis meses passou a ocupar essa posição (o antigo capitão, Halden Vayne, desaparecera misteriosamente durante uma noite após desembarcar em Dagger Port). Rawlin o escolhera por ser de sua inteira confiança e o mais experiente dentre os marinheiros da companhia.
No entanto, as tempestades sempre o deixavam preocupado, sobretudo quando tinha uma carga generosa a perder. E essa não seria uma tempestade qualquer, como constatou. Havia meses que não via o céu se fechar tão ameaçadoramente sobre o barco.
Conforme as pesadas nuvens iam se aglomerando, a tripulação passou a clamar pela compaixão de Talos, de Selûne, ou, ao menos, por uma ajuda de baixo, da poderosa e misteriosa Umberlee dos mares. Subitamente, um gigantesco raio percorreu o firmamento, rachando o céu por um segundo. O estrondo fez com que alguns marinheiros se assustassem e caíssem no chão.
Zolbek Rosghal, humano das tribos selvagens da Floresta Fria, e Belwas Amberjaw, anão das Colinas de Trielta, contemplavam do convés a fúria com que as ondas acertavam o barco. Eles eram os dois guardas contratados para fazerem a segurança pessoal do capitão quando estivesse em terra. O primeiro é careca, negro, tem uma longa barba espessa e veste uma calça e um casacão de pele de tigre vermelho. Seu machado duplo jazia pendurado nas costas por grossas tiras de couro. O segundo não tem barba, é menos obeso que o padrão entre os anões, tem uma pele avermelhada, cabelos negros e um volumoso bigode da cor do ébano. Ele veste um manto cinza escuro que utiliza por baixo da armadura de cota de talas. Na cintura, carrega sua espada longa e sua cimitarra, ambas um pouco enferrujadas.
— Calma... Não parece chuva perigosa... — afirmou Zolbek, para tentar acalmar o anão, mesmo duvidando de sua afirmação.
— Pouco importa, anões não foram feitos pra barcos, eu nem sei se consigo boiá! — seu bigode enrolava quando ficava nervoso e sua voz estava tremendo.
— Você anão sem barriga, não bóia, você ir primeiro fundo do mar! — e abriu um sorriso, pois esperava que a brincadeira pudesse aliviar os ânimos de seu recém conhecido amigo. Em seguida, ele colocou a mão sobre o seu ombro.
— O quê? — protestou o anão, tirando a mão pesada do ombro. — Nada disso! Eu me agarro em você e iremos boiando até a ilha mais próxima...
— Mesmo nadando bom, eu não aguenta peso bigode! — Zolbek brincou novamente.
— Não sei porque fui aceitá esse trabalho! — disse Belwas, com a voz falhando. — Por que não me falô pra desistir?
— Nós precisa dinheiro e capitão paga bom.
— Errado! Eu que preciso de dinheiro. Pra você que come e bebe o que tivé pelo caminho é tudo de graça... — ele interrompe, olha mais uma vez para as nuvens cinzentas e suspira. — Essa é a última vez que saio da terra firme! — exclamou.
— Seis dias, nós volta, se tudo ficar bom.
— Bem, Zolbek. Bem... Ficá bem — Belwas começava a mostrar sinais de impaciência. Apesar de estarem viajando há doze dias, a lembrança de andar livre pelo continente, correr pela relva, sentir o chão firme debaixo dos pés e bem longe dessas ondas “malignas”, ainda enchia o coração do anão de esperança. Nessa hora, outro raio cortou o céu e o deixou apavorado.
— A-Acho que i-irei ajudá os outros, pe-pelo menos não morro afogado como inútil! — saiu, tentando disfarçar a voz tremida.
Zolbek acompanhou o seu amigo caminhando pelo convés. Em seguida, mesmo com a pouca luz dos últimos raios de sol, observou grandes ondas se formando à frente e engoliu em seco. Olhou em volta para a tripulação amarrando e prendendo as cordas e pensou em seu idioma: “espero que o capitão saiba o que está fazendo”.
Draper desceu as escadas de sua cabine e aproximou-se de seus homens com uma expressão facial de seriedade. Seu cabelo curto e marrom escuro voava aos ventos. Ele vestia uma camisa branca e um colete preto. Suas calças eram de couro e, na cintura, portava duas bainhas que sustentavam as suas “joias do deserto” (como as chamava), as Rapiers Gêmeas de Calimshan, cujas lâminas a sua tripulação jamais havia visto. Pingos grossos de chuva começavam a cair, molhando os marinheiros. Ele guardou a luneta na algibeira atravessada no peito e tomou uma decisão.
— Virem as velas para bombordo! Depressa, suas lesmas! Vamos para o arquipélago de Whale Bones! Que Talos e a mãe dos mares nos permitam viver! — depois, falou consigo mesmo em voz baixa. — Rainha das Profundezas, deixe-nos passar, eu lhe rogo!
A tripulação, pega de surpresa, correu velozmente para ajustar a direção das velas. Em um ato atípico, o capitão juntou-se a eles, pegando uma das cordas ao seu alcance e amarrando-a a um dos mastros. Seus homens tampouco estranharam a atitude, tomada para esconder o seu nervosismo.
Aliás, ninguém estranhou além de Lans Donovan, o jovem meio-elfo de Amn. Com os seus cabelos escuros, olhos cor de mel, barba feita e roupas azul marinho por baixo do colete de couro, era um exímio observador de comportamentos e, por isso, compreendeu o perigo que enfrentavam, mas manteve para si a informação.
Ele andou depressa para o lado de sua amiga, Arzayla Alrellyn, a elfa cinzenta da Floresta Alta, de cabelos prateados, olhos cinzas, roupas verde-musgo e um turbante roxo que escondia parte do seu rosto. O grande arco de “madeira alta” jazia em suas costas ao lado da aljava com flechas de ponta de cristais.
— Precisamos fazer alguma coisa se a embarcação afundar... — alertou o meio-elfo.
— Você tem meios de nos manter todos na superfície? — a calma da elfa era espantosa diante da situação.
— Não. Consigo apenas garantir a nossa sobrevivência e de mais uns três, no máximo...
— Ora, então faremos de tudo para manter esse barco por sobre as águas! — exclamou ela, levantando as sobrancelhas em sinal de alerta. — Acate os comandos do capitão e fique atento às ondas. Subirei ao cesto da gávea para ajudar a verificar a existência de uma ilha nas proximidades. Ajude os outros com as cordas!
— Farei isso, embora não domine o ofício... Se o pior acontecer e você cair lá de cima, agarre-se a um barril ou algo flutuante, do resto, eu cuido — assegurou Lans, abaixando a cabeça e pensando consigo mesmo: “Se afundarmos, será uma pena a perda de tantas esforçadas vidas”.
Arzayla limpou o rosto encharcado e seguiu para o mastro. Lans se abaixou para ajudar a puxar as cordas e levantar as velas.
Draper e os marinheiros iam sendo deixados na mais completa escuridão quando o capitão fez surgir dois globos de luz em tochas encharcadas, uma em cada mastro, clareando o convés. Esse era o seu modo de iluminar o Onda Voadora, poupando litros de óleo.
Uma enorme onda chocou-se a estibordo do casco e um homem perdeu o equilíbrio, quase escorregando para o mar. Por sorte, fora agarrado já com as pernas para fora.
Contudo, o grito apavorado do marinheiro fora o suficiente para tirar alguém de sua profunda meditação.
Deitado em sua diminuta rede no porão do barco, sozinho e com uma calma invejável, estava Jevish, o gnomo do templo de Ilmater, o deus do sofrimento, da perseverança e do martírio. Seu transe era tão intenso que ele mal notara as violentas pancadas das ondas e os estrondos provocados pelos raios e trovões. Entretanto, um grito estridente, do qual reverberavam frequências amedrontadas e clamava por ajuda, ele jamais deixara de perceber em toda a vida.
Seus companheiros de embarcação, tendo lhe conhecido apenas há doze dias, dizem ironicamente que “sua cabeça nunca está onde o corpo se encontra”. Isto porque Jevish passa horas meditando, rezando e divagando em puros devaneios. Mesmo tendo nascido em Waterdeep, a imensa cidade ao norte da Costa da Espada, seus hábitos eram bastante estranhos, assim como suas roupas, um robe marrom-escuro rasgado sobre vestes brancas encardidas. Os seus cabelos castanhos e encaracolados são mal cortados e seus olhos, semelhantes a duas ônix negras lapidadas à perfeição, transmitem uma sensação de paz, capaz de aquecer o coração daqueles que os contemplam. No peito, jazia o glorioso símbolo de Ilmater feito de barro, exibido orgulhosamente em seus momentos de reza.
Graças ao grito do marinheiro, Jevish se desconcentrou e subiu rapidamente as escadas. Odiava ser interrompido e achava falta de respeito fazê-lo perder o contato extraplanar com a sua divindade, mas pelo tom de agonia, sabia que o responsável tinha boas razões.
Quando ele pôs os pés no convés, os fortes ventos e o volume de água no rosto fizeram-no entender depressa a situação. Era difícil uma observação apurada das ondas, mas ao coçar os olhos com as costas da mão, contemplou o horizonte e avistou a imensa muralha aquática se formando.
Jevish teve tempo apenas de berrar para todos se segurarem.
No momento do impacto, a água invadiu a embarcação e levou para o mar rolos de corda, sacos de pano, caixas, baldes, tábuas de madeira e barris de suprimentos. Dois marinheiros escorregaram e caíram nas águas geladas. Zolbek lançou uma corda e resgatou um deles, mas o outro, como dizem em Orlumbor, “irá dormir na cama de areia salgada”.
A chuva engrossava, os raios furiosos abriam fendas cada vez mais avassaladoras no céu e as ondas castigavam o casco do Onda Voadora. Desesperado, Draper tirou do bolso um pequeno saco de couro com 74 dragões de ouro, a moeda local, beijou-o e fez uma promessa.
— Senhora Mãe das Ondas, Rainha das Profundezas, eu imploro pela sua misericórdia! Se nos guiar pra terra firme, pegarei esse saco com todas essas moedas e o deixarei em seu templo. É quase o que ganho por viagem! Não nos leve para o abismo do seu lar!
A resposta veio rápida e severa, com um aumento dos ventos e a formação de um perigoso e apavorante redemoinho logo à frente. Terrivelmente assustado por talvez ter insultado a deusa com uma quantia tão desprezível, o capitão berrou com toda a força de seus pulmões:
— Senhora, a soberana Onda-Mãe dos mares agitados, por favor, eu amo este barco, não o tire de mim! Faço o que for possível, darei um baú inteiro ao seu templo! Eu juro! — um raio cortou os céus e o estrondo derrubou os marinheiros. — T-Três baús! Conduza-nos à ilha mais próxima e viverei para pagar minha promessa. Eu juro, minha senhora, Dama das Tempestades e do Abismo Marítimo!
Em seguida, Draper fez um corte na mão, afundou-a num balde de ferro com água do mar e quando o líquido ficou turvo com o seu sangue, ele atirou-o ao oceano. O juramento estava completo.
A tripulação ouvia o capitão e rezava por um destino favorável. Arzayla, ocupada tentando avistar a silhueta escura de uma ilha, ouvira suas súplicas lá do alto, sentiu pena do capitão e torceu para serem atendidas.
Então, uma onda impactou violentamente o casco, fazendo a âncora despencar no mar agitado. Desconsolado, Draper sabia que se não a tirassem da água, iriam se perder no redemoinho e seria o fim do Onda Voadora.
Em meio ao caos total, Belwas agarrava-se fortemente ao mastro traseiro e Lans ajudava os homens com a pesada corda da âncora. Zolbek, vendo a impossibilidade da tarefa, fez voar o seu machado e cortou a corda, rachando o convés. Pela força que faziam, Lans e os marinheiros caíram para trás, mas a embarcação estava livre para encarar o redemoinho e escapar dos seus trilhos circulares de espuma branca. Jevish, de joelhos, curava as feridas da tripulação e tentava colocá-los de volta em pé. Sem dar-lhes uma folga, outro raio atingiu a vela do mastro principal, destroçando-a em segundos e transformando o barco em uma pira sobre as águas.
Apenas um milagre poderia salvá-los.
E foi isso que aconteceu.
— Terra à vista! — berrou Arzayla lá de cima do cesto da gávea, apontando para norte-noroeste. Sua doce e melodiosa voz jamais soara tão prazerosa aos ouvidos daqueles homens. O marinheiro ao lado era incapaz de enxergar a ilha, mas confiou nos afiados olhos élficos.
Draper correu para a proa e observou atentamente junto com os outros. Não havia nada, a embarcação estava coberta por um véu negro por todos os lados. Até que um relâmpago revelou uma ilha desenhando-se à frente e eles puderam suspirar de alívio.
O capitão assumiu o timão de madeira e começou a girá-lo com força para fugir do redemoinho e direcionar o Onda Voadora rumo à esperança.
Ao se aproximarem do litoral, por sorte, ganharam velocidade graças às correntes marítimas do arquipélago e puderam se salvar.
A embarcação encontrava-se em frangalhos, quase destruída e, sem âncora, veio a encalhar na praia de uma pequena baía, cujos pontais fechavam-se atrás deles num abraço apertado e rochoso de pedras e recifes.
Sem pestanejar, os marinheiros pularam e trataram de amarrá-lo a grossos coqueiros, garantindo que não se soltasse e voltasse ao mar. Os raios aumentaram e a chuva se tornou uma tempestade terrível. Mas eles não estavam mais apavorados. A doce sensação de terra firme sob seus pés encorajou-os a enfrentar o que surgisse pelo caminho. Belwas dava pulos na areia, caindo em seguida para beijá-la, incrédulo com tamanha sorte.
Draper selecionou seis marinheiros para dormirem na praia e observar a embarcação durante a noite. Ao resto, deu ordens para segui-lo. Ele, então, sacou um facão da mochila, lançou um globo de luz na tocha encharcada e tomou a frente, guiando a tripulação mata adentro.
— Estamos numa das ilhas do arquipélago de Whale Bones... Eu nunca estive por aqui e não sei se há um lugar seco pra passarmos a noite. Alguém reconhece essa ilha? — perguntou, sabendo que a resposta seria negativa.
Os marinheiros se entreolharam e ninguém respondeu.
— Espero que estejamos longe de Finback, a ilha da desprezível Tauntzoth das Rochas — disse ele, com certo tremor na voz.
— Mas, capitão, a “salvadora dos marinheiros” não ‘tá morta? — questionou um deles. — Ouvi histórias de sua morte anos atrás. Ela caiu na luta contra uns caçadores das Montanhas da Espada.
— Boatos, sua lesma desinformada! Os caçadores forjaram essa história para não perturbar as navegações pela região. De qualquer forma, não quero dar chance ao azar e encontrar uma criatura tão sórdida pelo caminho. Espero passar longe do seu traiçoeiro lar!
Os marinheiros se entreolharam, curiosos pela reação negativa. Em nenhum dos relatos, eles jamais haviam ouvido esses adjetivos nas frases que reportavam os feitos lendários do dragão-fêmea.
Mais adiante, Draper parou, enxugou o rosto e chamou Jevish.
— Ei, gnomo, seja útil, precisaremos de comida e água limpa — e retomou a caminhada sem esperar uma resposta.
— Eu proverei água para todos, mas quanto ao alimento, ele terá de ser devidamente encontrado, pois não possuo meios de obtê-lo — alertou, calmamente, com sua voz levemente aflautada.
Draper bufou, decepcionado com a informação.
— Que os deuses concedam uma gruta pra dormir seco e carne pra pegá no sono! — suplicou Belwas.
— Não iremos caçar, anão — interrompeu Draper. — Se está com fome, espere os meus homens buscarem o que quer que possa ser salvo no estoque do barco. O principal é acharmos abrigo. Amanhã, consertaremos a vela e retornaremos ao mar.
Triste pela notícia de uma estada tão curta na ilha, Belwas pôs as duas mãos sobre a barriga a fim de averiguar o tamanho da fome e o quanto havia “emagrecido” nas últimas horas.
— Quando soubé onde iremos ficá, faço questão de retorná ao barco — disse, amargamente.
— Eu acompanhar você, ruim dormir com barriga sem comida — ponderou Zolbek.
— Me juntarei a vocês dois — adicionou Lans. — Mas primeiro, vamos nos abrigar — ele virou-se para Arzayla e, com o olhar, ela respondeu que ficaria aguardando-o no local onde descansassem.
O pequeno bando caminhou por cerca de cinquenta relâmpagos até avistarem um aglomerado de rochas no litoral sudoeste da ilha. O local ficava ao pé de portentosas rochas, no canto de outra praia, cujas águas formavam uma estreita baía, funda e repleta de corais. Após atravessarem enormes pedras, encontraram o que parecia ser a entrada de uma apertada gruta. Com a tocha à sua frente, Draper entrou cuidadosamente e verificou que estava vazia.
Como puderam notar, era de fato uma gruta, cavada na rocha e na areia, formando uma câmara meio subterrânea a apenas alguns metros da arrebentação. O feixe de luz revelou um teto feito de pedras amontoadas e de cujas fendas pingavam as gotas da chuva. O ambiente tinha uns catorze metros quadrados, era úmido e frio, mas poderiam descansar. O forte cheiro de maresia misturava-se a um leve odor de peixe podre.
— Passaremos a noite aqui. Descansem o máximo que puderem — ordenou o capitão. Depois, acenou para o seu imediato para que ele retornasse ao barco com mais pessoas e trouxesse alimentos. — Amanhã, teremos muito trabalho a fazer! — exclamou.
Valko, o imediato, estava ofegante, mas respirou fundo e saiu da gruta para liderar o grupo de volta ao Onda Voadora. Belwas, Lans e Zolbek juntaram-se a eles. O restante dos marinheiros desabou na areia do chão da gruta. Estavam todos exaustos. Quatro deles aglomeraram-se para acender a fogueira, mas com o equipamento encharcado, não obtiveram sucesso. Jevish encheu um recipiente com água potável para todos beberem. Arzayla procurou um canto da gruta para sentar e descansar.
Esgotado física e psicologicamente, Draper Torden encostou-se numa rocha próximo à entrada. A tocha iluminava apenas o lado direito de seu rosto, conferindo-lhe tons lúgubres, sobretudo pelas expressões faciais sombrias que revelava. Em sua mente, reflexões enigmáticas sobre o naufrágio tiravam-lhe a tranquilidade. Afinal, a sua salvação fora orquestrada pela vontade da deusa ou a própria sorte teria vencido a disputa contra os caprichos da onda-mãe?
Após um gole vigoroso da bebida alcoólica que trazia, pensou se não deveria ter esperado um pouco antes de efetuar o juramento, mesmo sob as circunstâncias nas quais ele se encontrava. “A minha sorte jamais me abandonou”, pensou ele, entristecido. Depois, deu outro gole, tossiu para limpar a garganta e ponderou sobre as suas futuras decisões.
Um raio partiu o céu.
Do lado de fora, a chuva continuava a cair torrencialmente. Um punhado de marinheiros, não tão exaustos, sacaram dos bolsos os seus kits do famoso jogo de Orlumbor, o 7 Adagas, que consiste em espetar sete pequeninas adagas (do tamanho de dedos), feitas de madeira ou ferro, de forma a deixá-las de pé na mesa ou no chão e, de acordo com a rolagem de sete dados a cada rodada, os jogadores eliminam uma adaga, ganhando parte das apostas de cada uma que é retirada de jogo. Aquele que conseguir recolher a última adaga, leva todas as moedas da atual rodada e sai do jogo. Portanto, os que ficam até o final costumam perder quase ou praticamente todo o dinheiro investido inicialmente.
O jogo é uma febre na região de Orlumbor há mais de quinze décadas, e já foi, inclusive, utilizado oficialmente por indivíduos de cargos públicos e jurídicos para tomar decisões quanto à divisão de renda e dos espólios de herança entre os envolvidos, além de já ter servido para desempatar os votos em seleções para magistrados e carreiras políticas. Há outras variações, cabendo à criatividade dos participantes para designar o preço e o objeto das apostas. Tudo é válido, contanto que seja acordado anteriormente. Muitos nobres, por diversão, apostam os seus próprios kits de adagas em tamanho real, cravejadas de pedras preciosas, cujos valores são tidos como inestimáveis; outros, apostam negócios, propriedades e/ou servos. Para esses humildes marinheiros, as apostas incluíam porções da comida que estava para chegar e moedas de prata do pagamento a ser recebido em Dagger Port.
Em um canto da gruta, Jevish comia os biscoitos de viagem que trazia na sua bolsa e preparava-se para meditar e dormir. Arzayla, debruçada sobre uma pedra lisa, transpunha os pensamentos para a Floresta Alta e o período de sua infância. E assim, ela adormeceu. Depois de um tempo, despertada do sono pelo grito de acusação de roubo de um dos marinheiros, o susto fez com que ela empurrasse, levemente, a pedra de encosto para trás. Ao virar para inspecioná-la, descobriu uma ponta brilhante soterrada na areia. Tentou pegar o objeto com as mãos, mas verificou que estava firmemente preso. Decidiu então cavar e remover a areia em volta. Quando conseguiu finalmente retirá-lo, soprou-o e ficou maravilhada.
Em suas mãos, jazia um octadecaedro transparente do tamanho de um punho fechado, cujo centro emitia feixes estáticos de cores do espectro luminoso. Ela limpou os olhos e buscou perscrutar os mínimos detalhes. Era um objeto magnífico! Um ser humano seria incapaz de perceber as nuances com tão pouca luz na gruta, mas a elfa cinzenta poderia admirá-lo em suas mais discretas minúcias. A princípio, imaginou ser uma estrela d`água, apesar das colorações no centro e da impecável limpeza. Ou talvez uma opala d`água, mas ao se certificar, se fosse, não possuiria o mesmo tamanho, dureza e lisura. Espantada, chegou à conclusão que jamais havia visto algo tão belo e perfeitamente lapidado. “Helfir Elaren poderá conferir e certamente saberá que gema é esta”, pensou ela, acreditando que o experiente artista élfico da Floresta Alta seria capaz de desvendar o mistério.
Com um movimento, ela guardou o objeto na algibeira, mas ao fazer o gesto com a mão, fora traída pela tocha do capitão. A gema emitiu um ínfimo brilho ao atravessar o ângulo de incidência dos raios de luz. Um brilho policromático, aguçado pela escuridão da gruta, que tingiu a rocha lisa na parede oposta como um relâmpago iridescente. O suficiente para que Draper o notasse e atiçasse a sua curiosidade.
Desconfiado, o capitão olhou na direção dela. Depois, levantou-se e se aproximou.
— Que brilho estranho foi esse, elfa?
— Nada, capitão. Algo que eu encontrei... — respondeu Arzayla, imediatamente se arrependendo de suas palavras.
— Se encontrou, mostre-me para que eu possa lhe ajudar com o que precisar. É um pedaço de vidro, uma lâmina, um espelho?
— N-não... — gaguejou ela, desejando voltar atrás, pois poderiam ser uma boa desculpa.
— Então, o que é? — a curiosidade de Draper aumentava diante do nervosismo dela.
Arzayla tinha sérias dificuldades em mentir. Além de uma forte fibra moral, ela tampouco dominava a arte da mentira e costumava piorar as situações quando buscava falsear suas intenções, por isso, decidiu falar a verdade.
— É uma gema... Por favor, não revele isso aos outros, podemos ter problemas — solicitou ela, mostrando-lhe o fascinante objeto.
— Certamente... — Draper fitou-o de perto, cobiçando-o. Depois, olhou para os lados para se certificar de que ninguém o ouvia. — Este será nosso segredo! Ninguém saberá disso. Deixe-me guardá-la em segurança...
— Não, capitão — interrompeu. — Eu a encontrei e ela pertence a mim. Serei sua guardiã até atingir a compreensão de sua essência ou as circunstâncias de seu paradeiro nesta remota ilha.
— Mas foi por minha liderança que chegamos aqui nessa gruta! Eu estou no comando, logo, entregue-a a mim! — disse, levantando a voz e apoiando a mão sobre o cabo de uma das rapiers.
— As suas ordens são para sua tripulação. E dela não faço parte. Pagamos a passagem de ida e volta e não havia acordo algum com Rawlin sobre a posse de objetos encontrados — asseverou ela, com a segurança de estar impondo um excelente argumento.
Os olhos de Draper flamejaram de raiva e ele sentiu uma súbita vontade de sacar as lâminas gêmeas e tomar o objeto para si, ali mesmo. Certamente, teria a ajuda dos seus homens. A única pessoa de fora da tripulação do Onda Voadora era o gnomo, que estava em sono profundo. “Tirar a gema à força seria como pescar siris num aquário”, pensou ele, abrindo um agressivo sorriso.
No entanto, prestes a avançar sobre a elfa, ele parou e repensou sua estratégia. Apesar da situação inteiramente a seu favor, não era como se eles estivessem sozinhos, às margens de um rio, e pudesse, sem o menor perigo, enforcar aquele macio e fino pescocinho a fim de obter o precioso objeto. Não. Havia outro método, capaz de lhe render o mesmo resultado sem ter de lidar com interrogações e um desnecessário combate, além da perda de indispensáveis braços na reconstrução do barco: a sua lábia.
— Pense melhor, elfa! — recomendou ele, com a voz baixa, lenta e melodiosa. — Minha tripulação não tem permissão pra entrar nos meus aposentos, ela estará segura lá... — parou para engolir saliva e tomar fôlego. — Além do mais, uma hora você terá de dormir e algo pode acontecer à senhora ou alguém tentar roubá-la...
Arzayla olhou fundo nos olhos de Draper e tentou descobrir se era uma sugestão racional ou uma ameaça.
— Imagina se, sem querer, os meus homens ficam sabendo disso, você não estaria segura em momento algum na viagem de volta... — Draper percebeu que a elfa analisava as suas palavras e aumentou a confiança nos seus propósitos.
Arzayla, sem conseguir discernir as intenções por detrás de tão cuidadosas palavras, acabou acatando. Ela desconhecia as normas e tradições da região. Não tinha como saber que ninguém se torna capitão em Orlumbor ou ao sul da Costa da Espada sem um ótimo nível de habilidade nas elocuções afiadas.
— Está bem, mas apenas durante a viagem. Quando chegarmos a Dagger Port, eu desembarcarei com ela. Está decidido!
Ela entregou o octadecaedro nas mãos de Draper, que o pegou e o colocou contra a luz, extasiado. A luminosidade chocou-se com as múltiplas facetas da gema, disparando raios multicoloridos no rosto do capitão. O fascínio pelo objeto era iminente e ele caiu em um transe do qual escapou somente quando a elfa encostou no seu braço para reiterar o combinado.
— Estarei de olho em você, capitão!
— Magnífica! Perfeita! — exclamou ele, agradecendo o presente do destino e ignorando as palavras dela.
Dois marinheiros se viraram para observá-los, mas ele já havia escondido a gema no bolso.
— Não foi nada, lesmas! Voltem pro seu jogo, estamos cansados e apenas comemorando a gruta que encontramos — explicou, com a voz falhando pela emoção exacerbada, mas convincentemente.
Sem motivos para estranhar, os marinheiros voltaram a jogar e Draper retornou ao seu lugar junto à entrada, colocando a gema na algibeira. “Deve valer muitos sóis brancos, estou feito”, pensou. A elfa continuou em dúvida, mas entendeu as razões do capitão, elas faziam sentido. Se ele estivesse mesmo disposto a atacá-la, nada poderia fazer, ninguém a defenderia. O melhor era ganhar tempo e contar com a viagem de volta tranquila. Com esses pensamentos de amparo, ela ajeitou a pedra lisa e recostou-se para dormir.
Cerca de uma hora mais tarde, os marinheiros, Zolbek, Belwas e Lans retornaram à caverna com um barril abarrotado de arenques salgados prontos para serem assados no espeto. Valko aproximou-se de Draper com as notícias.
— Foi o qui`deu pra salvar, capitão. O resto `tá tudo molhado e estragado. Acho qui`alguns arenque até ‘perdeu’ o sal.
Draper, sem virar o rosto, levantou a mão e aceitou. A sua mente estava mergulhada em planos gloriosos e não seria um mero barril de arenques encharcados que estragaria essas imagens.
Belwas era o mais animado, apesar da refeição de carne píscea.
— Não é que os anões não gostem de peixes, nós podemos comê quase tudo que já respirô um dia — ao dizer isso, passou a língua nos dentes. — Mas preferimos carne vermelha, é mais farta, não tem espinha e podemos engolir pedaços inteiros!
— Você aprende! Minha terra, nós come peixe. Carne de caça só banquete pra deuses e festas — falou Zolbek.
— Então deveriam rezá e festejá todas as noites! — brincou ele. — Tome isso pra acendê a fogueira!
Belwas ia entregar sua pederneira ao amigo, quando Lans secou alguns galhos de madeira com um truque mágico dos seus dedos e ateou fogo a eles, sem esforço. Os marinheiros acordados olharam para a sua habilidade com inveja. Em seguida, os três colocaram os peixes para assar e convidaram todos para o inesperado banquete. Arzayla optou por ficar distante, pensativa, analisando sua decisão anterior. Jevish dormia silenciosamente.
Passada uma hora mais ou menos, Belwas mal se aguentava.
— Se demorá mais, vou engolir os peixes assim mesmo, tô muito magro... — lamentou, enquanto pegava a tigela de água para dar um gole, deixando o líquido escorrer pelo queixo liso.
— Avisem-me quando estiverem prontos — pediu Lans, que se retirou para perto da amiga, viu-a dormindo e sentou-se ao lado, em silêncio. Ele abriu sua mochila e pegou documentos e cartas de Amn. Sempre que era possível, seu passatempo envolvia descobrir informações importantes nesses papeis.
Pouco depois, os peixes estavam devidamente assados.
— Belwas, senta aqui e come igual minhas terras — disse Zolbek, cruzando suas pernas e tirando duas toalhas velhas e molhadas da algibeira. Ele ofereceu uma ao anão e estendeu a outra sobre o seu colo, cobrindo o buraco no meio das pernas. — Faz igual. Depois, restos volta pra terra!
Belwas o copiou, avançou para tirar um arenque do espeto e deu a mordida crocante que lhe restabeleceu a paz estomacal.
— Ei, esses peixes não têm espinha! — virou-se para Lans e falou em voz alta. — Venha comê logo, senão vai acabá!
Lans pegou dois peixes e os comeu sem tirar os olhos das cartas. Outros marinheiros interromperam o jogo e aguardaram, cada um, a sua vez de encher as esfomeadas barrigas.
— Se eu não tivesse com tanta fome, poderia ter preparado algo pra incrementá o prato principal. Mas até que o gosto não ‘tá ruim, considerando que estavam num porão inundado.
— Sim, muita sorte achar peixes! — disse Zolbek, devorando-os com apenas duas mordidas.
— É... Podemos adicioná arenque à mesa de Belwas daqui pra frente. Já comi muito pior em situações melhores! — comemorou.
— Como ser a vida em Colinas de Trielta? — perguntou Zolbek, a fim de iniciar uma conversa com o amigo.
— Muitos diriam que é bem monótono lá, mas não é. De vez em quando um sortudo descobre uma mina de ouro e o lugar se torna um formigueiro, com tendas e pessoas de todos os lugares.
— Isso não bom? Não melhora comércio, negócios?
— Que nada! A multidão me fazia ter mais trabalho pra protegê os patrões... E tem também os roubos, que aumentam bastante — o anão deu outra forte mordida, dessa vez, na cabeça do peixe.
— Ter muitos anões lá?
— Não, eu era o único. Fui deixado por meus pais com um casal de halflings pra ser criado por eles. Nunca soube o motivo...
— Você então....? — Zolbek fazia esforço para tentar encontrar a palavra.
— Só até crescê — respondeu Belwas, julgando ter entendido o que o amigo quis dizer. — Quando fiquei adulto, eles decidiram me pagá pra trabalhá na proteção dos negócios.
— Por que sair ano passado? — Zolbek arrancou um pedaço de peixe com os dentes e continuou olhando para o anão.
— Meus pais adotivos perderam tudo. Houve escassez de ouro e prata há quatro verões e eles fizeram dívidas pesadas com o lorde local. Pra liquidá as contas, viraram servos dele...
Zolbek ficou entristecido e Belwas percebeu.
— Mas consegui escapá. Eu não era parte do acordo. Fui embora na primeira chance e tenho vagado pela região arranjando trabalho onde ele é oferecido.
— Eu igual. Trabalho qualquer coisa.
— Se, por um milagre, conseguir seiscentos sóis brancos, posso voltá e comprá a liberdade deles. É trezentos cada um...
— Sóis brancos?
— É a peça de platina de Waterdeep e da Costa da Espada, vale dez dragões de ouro cada uma... Você entende a conta? Preciso de seis mil moedas de ouro! — exclamou, deprimido. — Ou trezentas viagens como essa pra Ruathym...
Ambos dividiram a dor e a impossibilidade de sucesso da tarefa. Para Belwas, era certo que os halflings estariam fadados a viver o resto dos dias como servos de um lorde implacável.
Para mudar de assunto, ele sugeriu outro tópico.
— Como era sua vida na tribo?
— Eu protetor da tribo, protetor velhos, crianças... Depois, não mais protetor...
— O que houve? — Belwas apanhou mais dois peixes do espeto, mordeu a cabeça de um e começou a chupar um apetitoso olho.
— Teghyr assumir controle da tribo e seguir Gruumsh, deus orc, mau e perverso...
— E você com isso?
— Eu recusar mistura mulheres e orcs, fazer filhos mais fortes e conquistar sangue, poder. Eu recusar matar desprotegidos — disse ele, mastigando e enrugando o cenho devido às lembranças. — Eu sair da tribo porque recusar entregar mulheres!
— Você tem um coração bom. Isso é raro por essas bandas...
— Viagem pro sul, sobrevivência... Trabalho no mar pra viver.
— Se for do seu interesse, podemos vê um serviço pra você em Dagger Port... Com sua estatura e força, vai ser fácil.
— Obrigado, eu interessado.
— Qué dizê, vou tentá... Moro há poucos meses na vila, mas a palavra de um conhecido vale mais que a de um estranho, né?
Zolbek se animou com a notícia.
— Posso arrastar, empurrar, puxar, carregar, levantar qualquer coisa... Trabalho igual dois homens!
— Isso eu acredito, mas consegue realizá trabalho de dois anões? — brincou Belwas e ambos deram risadas, satisfeitos por verem os estômagos cheios.
Após terminar de comer, Zolbek embrulhou o pano contendo as espinhas dos peixes, foi para um canto da gruta, cavou um buraco, despejou os restos e cobriu de areia, solicitando ao amigo para que fizesse o mesmo. Pouco depois, os dois deitaram para descansar e foram seguidos pelo restante dos marinheiros, que haviam parado de jogar para irem dormir na areia fofa e úmida do lugar.
O fogo ainda crepitava sem ter mais nada para grelhar. Lá fora, a chuva diminuiu, mas progredia sem sinais de cessar. Eles estavam todos em silêncio, adormecidos, quando, de súbito, ouviram sons estrondosos de objetos caindo no mar bem próximo deles, como se grandes pedras tivessem rolado pela encosta. Pegos de surpresa, aqueles que acordaram levantaram-se depressa e ficaram receosos de correrem perigo de vida. Draper tratou logo de apagar a tocha, inundando a gruta de escuridão. Houve outro baque na água, desta vez, de um objeto ainda maior. Belwas e Zolbek pularam para trás de susto e tentaram sair para averiguar, porém, Draper os impediu.
— Fiquem aqui, só saiam se eu gritar — sussurrou. O capitão saiu e foi pulando de pedra em pedra na direção do som, contrária de onde vieram. Belwas e Zolbek ficaram prostrados junto à entrada da gruta enquanto Jevish, Lans, Arzayla e os marinheiros estavam prontos para qualquer ação defensiva que precisassem tomar.
Cerca de dez ou doze relâmpagos depois, Draper retornava mais calmo, apesar de incrédulo.
— Não faço ideia do que aconteceu, mas não encontrei nenhum sinal de perigo... Podem descansar, eu fa-farei a guarda esta noite... Se precisar, chamo os senhores — explicou o capitão, olhando para os dois seguranças enquanto acendia a tocha novamente. Lans foi o único que percebera uma leve gaguejada em sua voz, um sinal de que não estava inteiramente calmo e tranquilo.
Zolbek e Belwas recostaram-se na parede de rocha e, em pouco tempo o cansaço grudou suas pálpebras para outro merecido sono. Lans dormiu ao lado de Arzayla preparado para se defender numa eventual emergência e Jevish cobriu-se com seu cobertor surrado, num sono plácido e profundo.
Outra vez a gruta estava em total silêncio e ouvia-se somente o som da chuva, salvo por um ou outro trovão isolado e o ronco dos marinheiros.
A ansiedade de Draper o impedia de dormir. Com a mão dentro da algibeira para proteger a gema e se certificar de que ela não iria evaporar, imaginou uma vida onde seria rico, poderoso e influente em Orlumbor. Compraria uma frota maior que a de Rawlin e iria se mudar para Waterdeep, onde ampliaria os negócios para dentro do continente. O seu nome seria pronunciado de Cormyr e Sembia ao imenso Mar das Estrelas Cadentes, chegando a Aglarond, onde ele seria convidado de honra da rainha mágica, uma das sete irmãs, as Escolhidas de Mystra. Era a vida de heróis, de nobres famosos e de seres formidáveis que tanto sonhara para si. E junto à influência de seu mestre e as conexões com o submundo, os inimigos haveriam de se ajoelhar perante a sua presença e imponência!
Com estes pensamentos dominando a sua sórdida mente, abriu um acentuado sorriso e passou a fria noite na gruta. Nem chegou a considerar que a gema não lhe pertencia, sua posse estava decidida e ninguém separá-lo-ia dela.
De manhã, um raio de sol tocou-lhe a face e ele acordou. Mesmo fatigado e com uma forte dor de cabeça, levantou-se e chamou sua tripulação. Os marinheiros começaram a acordar e ficar de pé para os serviços do dia. Arzayla e Lans observavam as ondas lá de fora. A praia parecia uma piscina mortal de água salgada. Coqueiros e palmeiras infestavam toda a sua extensão, como se tivessem sido colocados ali para escondê-la de visitantes vindo do centro da ilha. Muitas rochas de vários tamanhos protuberavam da sua superfície, tornando impossível a entrada de barcos, mesmo os pequenos. E as ondas azul-esverdeadas quebravam a cerca de quarenta metros da areia, chocando-se contra o recife de corais coloridos e venenosos. No céu, o sol começava a esquentar e as nuvens iam se dissipando. O dia estava claro e o aroma de maresia preenchia o ar.
— Mas a viagem não foi perda de tempo... Sabemos agora que ele passou por Ruathym — lembrou o meio-elfo.
— Isso é o que me deixa intrigada... Por que ele não ficou lá com os elfos do mar? Por que retornou ao continente? — disse a elfa. No rosto, as feições de preocupação.
Lans abaixou a cabeça, pegou um punhado de areia e a deixou cair lentamente por entre os dedos.
— Teria sido mais fácil, mas imagino que ele tenha tido um bom motivo. Os elfos do mar estão em guerra, afinal...
— E agora, como vamos achá-lo? Essa era a única pista, ele quase nunca deixa rastros... — comentou, desolada.
— Calma... Ele pode ter retornado pra casa. Certeza que seu pai o receberia de braços abertos, agora que algum tempo se passou.
— Meu pai? Se ele chegar a cinquenta milhas da Floresta Alta, o meu pai irá destroçá-lo completamente. Ele não seria tão insano...
— No dia que eu conhecer o seu pai, me lembre de jamais irritá-lo — sorriu Lans, tentando suavizar a situação.
Arzayla continuava nervosa.
— Com estranhos, ele é delicado como a pétala da lágrima-de-Selune, você seria tratado como um príncipe, apesar da linhagem do seu sangue. O problema é de família. Meu pai nunca irá perdoá-lo... E vice-versa, pois ele também ainda carrega ciúmes por não ter sido o escolhido...
— Só saberemos quando os dois se encontrarem, e... — ponderou o meio-elfo, interrompendo a conversa quando dois marinheiros se aproximavam deles. Depois, retomou o assunto.
— Não desanima, Zay... Se não temos pistas, encontremos novas! Confie em mim, vamos achar o seu irmão — declarou ele, satisfeito por conseguir animá-la.
— Quando você tem de retornar à Athkatla? — indagou ela para continuar a conversa.
— Não menos do que um ano, mais ou menos... Ou, se conseguir decifrar os documentos, posso voltar imediatamente. Neste caso, eu teria de abandoná-la... — respondeu, com um súbito lampejo de furor nos olhos. Lans parecia se tornar outra pessoa sempre que os documentos que carregava surgiam nas conversas. Arzayla sorriu e fitou o meio-elfo com seus olhos cinzentos enquanto ele observava a pequena baía à sua frente e vislumbrava a paisagem.
— Que sorte termos encontrado a gruta ontem! Veja, a praia é incrivelmente fechada e escondida pelos coqueiros e palmeiras — constatou, levantando-se para retirar a parte de cima das roupas. — Vou dar um mergulho antes de eles acordarem. O dia está perfeito!
— Verdade... O capitão teve muita sorte ao nos guiar pela mata — concordou a elfa, suspirando ao espreitar a densa composição das árvores. De repente, percebeu que ele já estava distante, escalando uma pedra para mergulhar lá de cima. — Cuidado com esses corais, são venenosos! — gritou ela, esperando que ele a ouvisse, mas Lans sacudiu os braços como se não se importasse com o aviso.
O meio-elfo posicionou-se na ponta da pedra, escolheu o melhor lugar para cair, olhou para sua amiga na praia e acenou. Atenta, ela dirigiu seus olhos para a água e vislumbrou algo próximo a ele.
— Ei, não pule! — esgoelou-se na tentativa de avisá-lo.
Prestes a dar impulso para executar o salto, Lans viu uma flecha voar e atingir a rocha abaixo dele. A ponta de cristal entregava a sua dona. Assustado, ele virou-se na direção dela e percebeu que a elfa apontava com dois dedos para os próprios olhos e, em seguida, para um ponto na água.
Lá de cima, Lans constatou a presença de uma sombra nadando nas águas rasas, atrás de uns grandes pedregulhos que ele ignorara. Era um tubarão-martelo de cinco metros de comprimento. Agora, mais alerta, perscrutou a região onde iria cair e nadar e verificou a presença de mais três tubarões, dois martelos e um branco, esse último com cerca de oito metros de uma ponta a outra. “Ainda bem que não fomos nadar ontem à noite!”, pensou.
Lans desceu calmamente, foi até a parte rasa e jogou um pouco de água sobre a cabeça para se refrescar. Em seguida, dirigiu-se ao coqueiro onde Arzayla estava encostada.
— Não vai agradecer? — provocou ela, sorrindo.
— Obrigado por salvar a minha pele — suspirou, ofegante. Olhou outra vez para o mar na direção dos tubarões. — Ei, você não acha estranho quatro tubarões em águas tão rasas?
— Conheço pouco da fauna marinha... — afirmou a elfa. — Vendo daqui, nem sabia que eram tubarões, apenas manchas deslocando-se na água... Talvez estivessem perseguindo um cardume?
— Improvável. Se fosse um, talvez, mas não em conjunto... — ele parou e vestiu as roupas de cima. — Estranho, bastante estranho.
Arzayla sorriu novamente e os dois retornaram para a gruta.
Nesse ínterim, os marinheiros já estavam todos preparados para a jornada de volta e os dois se juntaram a eles. Com o tempo bom e o sol forte nos rostos, voltaram na metade do tempo em relação ao dia anterior.
De longe, eles avistaram os seis marinheiros já trabalhando na restauração do Onda Voadora. Com a maré baixa, o casco estava quase inteiramente fora d’água. Ao lado do barco, havia uma pilha de cocos e frutas a serem estocados para a viagem de volta.
— Consertem primeiro os mastros e as velas queimadas... Tudo mais é dispensável! — vociferou o capitão, dando as novas ordens.
Lans e Arzayla aproveitaram para ajudá-los. Ele consertava as partes mais cruciais com o uso de efeitos mágicos e ela com as suas habilidades manuais. Belwas e Zolbek recolheram objetos pesados e organizaram o convés. Jevish, contratado misteriosamente pelo próprio Rawlin e sem uma função específica na viagem, resumiu-se a ficar na praia, rezando e contemplando o horizonte.
Debaixo do sol quente, todos trabalharam com bastante esforço. Após muitas horas, seus corpos estavam suados e esgotados, mas conseguiram drenar a água do porão e organizar o estoque de água e frutas, além de consertar os danos causados pela tempestade e de deixar as velas prontas para serem içadas. Só havia um problema: a maré subira e o Onda Voadora continuava encalhado.
O capitão sabia que se não fizessem algo depressa, eles ficariam presos até o dia seguinte e isso era impensável. Ele engoliu em seco ao relembrar o que testemunhara na noite anterior e o que poderia ocorrer se continuassem na região por muito tempo. Nesta hora, ele percebeu o vento mudando de direção, indo agora para o mar. Animado, aproximou-se do gnomo com uma ideia.
— Ei, gnomo, preciso de ajuda... Se meus homens empurrarem o barco na direção do horizonte e com as velas hasteadas, é possível fazer essa montanha de lixo desencalhar? — indagou ele, curioso. A sua aflição para regressar à Dagger Port era notória e, pelo visto, ele não demonstrava mais o mesmo carinho pelo Onda Voadora.
Jevish pediu um momento de reflexão e com ajuda do símbolo religioso, fechou os olhos e rezou profusamente durante o período da quebra de vinte ondas. Draper aguardou ansiosamente.
— Sim, capitão. Ilmater envia o sinal de prosperidade, mas todos devem participar dessa atividade, sem exceção, isto inclui o senhor — avisou ele, bastante sério. — E façam força no momento exato em que as ondas se chocarem contra o casco.
— Atenção, suas lesmas! Peguem as cordas e desçam, nós iremos empurrar esse trambolho inútil! — berrou o capitão, deixando seus marinheiros atônitos. O Onda Voadora estava encalhado de costas para o grande oceano, a missão não seria fácil.
— O que será que ele `tá querendo fazer? — perguntou o anão.
— Vai, não ser bom ficar mais tempo aqui — ponderou Zolbek.
— Aí é que estamos em desacordo de novo! — concluiu Belwas, olhando para o oceano e se desanimando. — Por mim, ficaria mais uns dias, uma semana, aprenderia a pescá, qualquer coisa pra não voltá pra lá — desabafou, apontando o dedo para alto mar.
Zolbek ajudou-o a descer. Os marinheiros içaram as cordas para hastear as velas e caíram na água para cumprir seu dever. Junto ao casco, eles puseram toda a força nos braços, descansando apenas durante os breves intervalos. Draper criou uma rajada de vento das mãos para ajudar a impulsionar as velas e Lans reduziu o tamanho de duas pedras que estavam debaixo do barco, liberando-o para deslizar pela areia. Zolbek chamou atenção pelo tremendo esforço que fazia, superior aos outros. Percebendo nele uma oportunidade de contribuir, Jevish o tocou na cintura. Imediatamente, as veias de seus braços saltaram da pele, formando um desenho, em relevo, de centenas de ramificações inchadas de sangue. Zolbek passou a urrar no seu idioma, sentindo o poder da força extra.
Com o agrupamento de todas as energias, físicas e extrafísicas, eles conseguiram que grande parte do casco se soltasse do fundo e começasse a girar, apontando a proa na direção do horizonte a ser enfrentado.
— Mais força, vamos, agora é tudo ou nada! — ordenou Draper, o único de testa seca e que empurrava o casco com apenas uma mão, pois a outra estava dentro da algibeira, acariciando a gema.
Finalmente, fizeram o Onda Voadora avançar e encontrar águas mais profundas. O capitão decretou que embarcassem, ajustassem as velas e usassem os ventos para manobrá-lo no curso designado. Em pouco tempo, eles contornavam a baía para singrar novamente as águas ao norte do arquipélago de Korinn. E uma vez livres de problemas, a tripulação retornou às tarefas normais. Draper pediu a Valko que assumisse o seu posto e trancou-se em seus aposentos, sob a ordem de não ser interrompido até a chegada à Dagger Port, salvo em caso de perigo mortal.
Durante os seis dias restantes de viagem, a tripulação só o viu uma vez, quando, ao cair do quinto dia, ele passou pelo convés às pressas para certificar-se da aproximação do destino.
Ao entardecer do dia 11 de Tarsakh, com o tempo nublado e uma leve neblina sobre as calmas águas do litoral, eles avistaram o cais da vila de Dagger Port. Como a costa de Orlumbor é composta por centenas de quilômetros de montanhas e colinas que se encerram diretamente no mar, não há praias. Para se chegar à vila, é preciso aportar no cais e subir a escada de degraus feitos de tábuas velhas, rente à queda de dez metros da cachoeira do Rio Windling. Apesar de não se comparar aos portos das grandes cidades, os habitantes de Dagger Port nutrem um imenso orgulho por ele. A capacidade é mais ou menos de dez embarcações do tamanho do Onda Voadora, sem contar os barcos a remo dos pescadores locais, que atracam à distância. Além disso, ele nunca está vazio, pois o seu movimento agitado é devido ao famoso comércio de grãos e especiarias, carne de bode e galinha, leite de ovelhas e roupas de couro, incluindo sua maior especialidade e fonte de riqueza: a de melhor fabricante de navios de guerra de toda a Costa da Espada.
O Onda Voadora aproximava-se do cais com as velas abaixadas, deslizando suavemente. A fria tarde e a neblina davam a impressão de estarem navegando por sobre as nuvens. O capitão, apreensivo, saiu para dar as ordens e agilizar o desembarque, porém, Arzayla o aguardava na porta da cabine.
— Capitão, esqueceu-se da nossa conversa?
— De forma alguma — respondeu ele, ironicamente. — Lembro muito bem... Vou levá-la para o cofre da companhia e hoje à noite, quando estivermos livres dos compromissos, eu a devolverei...
— Não! Desejo reavê-la agora... Entregue-a para mim! — o tom de voz da elfa tornou-se áspero.
Draper sentiu uma pontada de raiva, pois a elfa estava abusando de sua paciência.
— Está bem... — ele fingiu ponderar, escondendo suas intenções. — Mas fale baixo, venha, entre na cabine e eu a devolverei.
Arzayla receou, mas se isso era o que precisava ser feito, ela não iria recuar. Quando os dois entraram, ele fechou a porta atrás dela.
Depois, em menos tempo do que levaria para devolvê-la a gema ou até iniciar uma conversa para tentar persuadi-la do contrário, a porta já se abria novamente e Draper se despedia dela, sorridente.
— Estamos combinados... Quando tudo estiver em segurança, eu entrarei em contato — anunciou ele, satisfeito. A sua macabra aura mal podia esconder o quão possesso e viciado ele havia se tornado, mas Arzayla parecia não perceber. A expressão no seu rosto era de despreocupação e tranquilidade.
— Confiarei em você, capitão... E aguardarei o momento para tê-la de volta... — assentiu ela, com voz mecânica, retirando-se para ir encontrar Lans.
Draper abaixou a cabeça lenta e exageradamente para consentir o acordo feito. Então, respirou aliviado. Ele conhecia a resistência dos elfos. Seu perverso sorriso só foi interrompido pela vontade de pôr logo os pés em terra firme, portanto, tratou de devolver aos bolsos o restante dos favos de mel e a língua ofídica que estavam em sua mão e dirigiu-se ao convés.
Três marinheiros pularam para o cais e amarraram o barco com cordas. Quatro pescadores que consertavam uma rede de pesca se aproximaram para ajudar, em busca de uns trocados.
Antes de desembarcar, Draper procurou Zolbek e Belwas e lhes entregou, cada um, vinte dragões de ouro, agradecendo pelos seus serviços prestados. Em seguida, pulou para o cais com o cofre das pérolas debaixo do braço e deu as últimas ordens aos seus homens.
— Irei avisar Rawlin que a carga está em perfeito estado e que chegamos todos muito bem... Não se esqueçam de lavar o convés e mover os baús e as caixas para o galpão da companhia. Só quando tudo estiver estocado e trancado, serão pagos!
O capitão gostava de ir à frente para anunciar a chegada ao dono da companhia, mas desta vez, sua pressa tinha razões extras. Além disso, para levarem a carga até o galpão, os marinheiros tinham de pô-la numa espécie de bandeja próxima à parede rochosa, donde lá de cima, dois homens giram uma roda para içar uma parte da carga por vez. E ainda tem a caminhada pela estrada até a vila. Logo, era um trabalho penoso e até indigno para um capitão de sua estirpe, como gostava de pensar Draper Torden.
A tripulação começou a remover as caixas contendo os minérios de ferro do porão do Onda Voadora e os passavam de mão em mão até o seu destino, a plataforma de içamento. Outros percorriam o convés para lavá-lo com esfregões, baldes contendo água do mar e pedaços de sabão.
Lans aproximou-se de Arzayla, desconfiado.
— O que há? — indagou ele, pondo a mão sobre o ombro dela.
— Nada... — respondeu ela. A elfa sentia uma sensação estranha, como se tivesse um compromisso e não se lembrasse dos detalhes. Mesmo assim, respirou fundo e recuperou a confiança. — Estamos com sorte! Em breve, cumpriremos nosso objetivo! — comemorou, renovando os ânimos.
— Descobriu uma informação nova? — indagou o meio-elfo com os olhos brilhando de satisfação.
— Não... Mas temos de ficar atentos às flores que desabrocham em pleno inverno... — replicou, olhando para o chão, pensativa.
Lans não compreendeu, mas optou pelo silêncio.
Nesse instante, Zolbek viu Belwas desembarcando.
— Ei, você não ajuda? Com você, terminar rápido e bebe depois!
— Escuta aqui, seu verme selvagem! — o anão estava levemente irritado, pois apesar da alegria de voltar à terra firme, o cansaço da viagem e a dieta frugívora do retorno, “sem uma carninha sequer”, arrancaram-lhe os últimos resquícios de paciência. — Não tô sendo pago pra lavá barco, nem pra carregá essas coisas — resmungou.
— Não custa. É bom ajudar marinheiros...
— Nada disso! Eu preciso é ajudá meu estômago com cerveja e bastante carne — ele pôs a mão na barriga. — Vem comigo! Não viu que o capitão liberou a gente? — Belwas exibiu as moedas na mão peluda para tentar convencer o amigo. — O último a cair, carrega os outros!
Zolbek olhou para os marinheiros e convenceu-se de que não precisavam de ajuda. Ele deixou a caixa no convés e, ao passar por Lans e Arzayla, resolveu convidá-los.
— Vocês acompanha a gente? Come boa comida e bebida!
Lans conjecturou se deveriam aceitar o convite. Não por falta de afinidade ou interesse, mas queria comer algo rápido para voltar a estudar os documentos. Arzayla ficou aguardando a sua decisão.
Nesse momento, Jevish se aproximou deles de bom humor.
— Posso acompanhá-los na taverna, o meu dever está cumprido! Mas ficarei pouco tempo, tenho novos compromissos...
Zolbek fez um aceno com a cabeça e um marinheiro viu a cena.
— `Cês tem qu`ir! É o costume. Sempre qui`aportamo, a gente vai na Maresia Doce. Depois daqui, vamo pra lá! — comentou, com seu forte sotaque, ansioso pelo momento de diversão.
— Tá vendo, Zolbek? É o ritual deles, devemos respeitá! Vamos indo na frente! — anunciou o anão, iniciando a subida das escadas de tábuas velhas de madeira.
Zolbek olhou novamente para Lans e Arzayla, curioso.
— Bem, se é uma atividade costumeira, também quero participar — ponderou o meio-elfo. — Você vem? — disse, virando-se para sua amiga.
Arzayla consentiu e os três seguiram para a escada, alcançando Belwas no topo da parede rochosa. A vila de Dagger Port estava a cerca de um quilômetro à frente.
Autor(a): dreimaurey
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
FICHA TÉCNICA: Volume 1 – O Segredo da BansheeTítulo: Cap.2 – O Assassinato em Dagger PortAutor: Andrei MaureyGênero: Aventura FantásticaCapa: Imagem gerada por Inteligência Artificial do NightCafé StudioCopyright © 2023 por Andrei MaureyPrimeira edição: Dezembro, 2023Fundação Biblioteca ...
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