Fanfic: Desconhecido

O Diário de Félix Monteiro

     Mãe!

     Eu não sei explicar meus sentimentos quanto à isso.

     Ela estava do meu lado. Morta!

     A primeira lágrima foi o sentimento de perda.

     A segunda lágrima foi de culpa. Eu matei minha mãe?

     Não, isso com certeza não. Mas, como posso ter tanta certeza?

     A última coisa da qual me lembro é de minha mãe me chamando para fora e da nossa conversa depois disso.

     Quando saímos ela começou:

_ Como você fez isso comigo?

_ Eu não fiz nada de mais (respondi). Não é fácil! Se eu tivesse opções, mas eu não tenho. Então por favor, não me culpe!

     Essa discussão aconteceu por causa daquele maldito diário debaixo do meu colchão. O que estava escrito nele?! Minha vida em poucas palavras.

     Diário, você pode me ser útil. Algumas pessoas dizem que você é terapêutico e que escrever tudo no papel é relaxante. Então, por favor, prove isso!

     Meu nome é Félix Monteiro. Nasci numa cidade do interior de São Paulo chamada Ibitinga. Eu tinha apenas cinco anos quando meus pais se separaram. Motivo: não me pergunte qual. Mas essa separação só fortalece minha teoria sobre mim mesmo.

     Eu precisei tanto de um pai. Eu nunca soube o que era receber amor de um homem.

     Quando meus pais se separaram, minha mãe e eu fomos morar com meus avós. Minha mãe (Julieta), sempre me amou e me educou brilhantemente. Sempre recebi muito carinho de todas as mulheres de minha família, sem exceção!

     Quanto aos homens, estes se afastaram de mim.

     Meu avô nunca gostou de mim. Mal nos falávamos. Tios, estes sempre foram muito distantes. Pai, esse não preciso nem lembrar que foi ausente.

     Eu sempre digo que tudo que se aprende na infância é levado para a vida toda. Se um pai ensina a seu filho a ser generoso quando ainda é criança, ele vai ser generoso quando for adulto. Se um filho, na infância ver seu pai roubando, ele pensará que isso é certo e roubará quando for adulto.

     Eu não aprendi a roubar, e aprendi a ser generoso. Mas não aprendi algo muito importante!

Nunca me ensinaram a agir como homem.

     Fui criado entre mulheres, e não vi elas jogando futebol. Vi elas fazendo as unhas, passando batom, beijando homens.

     Há dias que eu quero pular da ponte, desaparecer. É difícil ser diferente! Ser gay, no meu caso.

     Quando era criança, os homens eram muito receptivos na escola, por exemplo. Me chamavam de bicha, boiola, viado. Nomes horríveis. Eu observava o modo como eles pronunciavam essas palavras.

     Elas eram pronunciadas com ódio, com nojo!

     São incontáveis as vezes que eu voltei para casa chorando por causa dessas palavras que cortavam meu coração como uma espada.

     Hoje, não choro mais. Se eu pudesse escolher eu seria como a maioria é. Chamam isso de “ser normal”. Mas não tive escolhas. Não me deram opções!

      Eu sou gay. Não há como fugir agora por mais que eu queira.

     Ainda assim, não posso ser feliz desse jeito.

     Já ouvi diversas vezes pessoas dizendo que Deus não aceita a homossexualidade. E isso me machuca ainda mais. Mais que aqueles xingamentos no colégio. Na verdade, nem dá para comparar a dor que eu sinto.

     Eu peço todos os dias: Deus, por favor! Me tira dessa prisão! Se você não me quer assim então me leva. Eu não quero te contrariar. Eu quero estar ao seu lado quando tudo acabar. Mas por favor, permita que eu seja feliz.

     E a lista dos por favores só aumenta.

     Eu, Félix Monteiro, prometo que só estarei com um homem se eu amá- lo. E Deus não pode me apedrejar, nem considerar um pecado uma pessoa amar outra. Quer dizer que seria melhor se eu a odiasse? Seria?

     Por essas razões e outras minha vida é triste e solitária. Que bom que ao menos eu tenho as mosqueteiras para me consolar. Haryélle, Juliane e Paula minhas amigonas do peito. Quero estar com elos para sempre.

     Por hoje é só querido diário.

     Quero te encontrar outras vezes.

                                                    Félix

     Eu perguntei para minha mãe:

     _ Como você achou isso?

     _ Eu estava vendo umas coisas no baú e...

     _ Qual baú? Eu a interrompi.

     Isso era tudo do que eu me lembrava.

     Eu fiquei muito curioso! Como mexendo num baú ela encontraria meu diário que estava embaixo do baú?

     Se passaram os dias. Velório, enterro, drama, choro! Tudo nessa ordem.

     Eu agora, estava aparentemente sozinho.

     Mas eu queria saber que baú era esse.

     Olhei em baixo do meu colchão, o diário estava todo amassado.

     Olhei por todo o meu quarto.

     Embaixo da cama foi interessante. Havia uma entrada para uma chave.

     Lá devia ser o esconderijo do baú.

     Bastava encontrar a chave.

     Olhei pela janela. No portão havia algo que parecia com uma correspondência. Logo que vi, fui buscá-lo.

     Era uma carta. Parecia mais com um bilhete.

     Não fique com medo Félix. Agora eu não posso ir, mas logo que eu puder irei para te explicar tudo. Eu vou te ajudar. Você não está sozinho. Eu nunca vou deixar você sozinho. Não eu.

     Te amo,

     X

     Eu precisava saber quem me enviou isso.

     Foi bom saber que não estou sozinho.

     Que lindo alguém escrever isso. Alguém nesse mundo me amava. Bom saber disso.

     Mas, o próximo passo seria encontrar a chave que abriria aquele baú.

     Era o mais importante no momento.

     Começou a chover. Eu sempre amei chuva. Me deixava feliz. 

     A chuva serve para deixar os homens de alma lavada, para apagar de vez todas as impurezas do nosso coração.

     Ficou mais forte.

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