Fanfic: Desconhecido

Infeliz Aniversário Félix!

A celebração de mais um ano de vida é a celebração de um desfazer, um tempo que deixou de ser, não mais existe. Fósforo que foi riscado. Nunca mais acenderá.Daí a profunda sabedoria do ritual de soprar as velas em festa de aniversário.Se uma vela acesa é símbolo de vida, uma vez apagada ela se torna símbolo de morte.

Rubem Alves

          A Giselle não apareceu, mas o desfile foi bom. Dormi no sofá, não queria voltar para aquela cama. Decidi que teria uma cama redonda. Agora eu estava rico! Fantástico! A não ser que a última da minha mãe fosse encher o porão de bijuteria só para me enganar. Mas isso é muito difícil.

         Uma cama redonda e vermelha!

       Eu acordei mais velho e isso é péssimo! 16 anos?! Tinha certeza que as três mosqueteiras tentariam quebrar ovos na minha cabeça, ou planejar uma festa surpresa para mim.

       Então levantei e fui direto para o chuveiro e fiquei lavando meu cabelo durante uma hora com o melhor xampu que existia naquela casa. Para o ovo não fazer tanto efeito!

       Tá certo! Confesso!

       X não saiu da minha cabeça. Eu queria vê-lo logo, estava muito ansioso. Imaginava as coisas mais absurdas e infantis. Será que ele é alto ou ele é baixo? Gordo ou magro? Quantos anos ele tem? Será que ele vai gostar de mim? Isso era provável. Pelo que ele escreveu é bem provável que ele goste de mim. Ele, de qualquer forma já era especial para mim.

       Eu já podia sentir cheiro de armação no ar! Haryélle sempre tinha boas idéias e dessa vez não seria diferente. O vestido dela, seria espetacular e com certeza ela faria um discurso para encerrar.

       Eu fui fazer mais uma visitinha ao porão.

       Dei mais uma olhada em tudo!

       Acho que a coreografia da Madonna afetou meu cérebro. Quer dizer todos os meus sentidos.

       Olhando dentro do baú achei outro papel. Nossa, se eu não passar no Vestibular vai ser por azar mesmo! Eu fico o tempo todo lendo, lendo!

       Félix  Monteiro, eu ... sob todos os efeitos conheço sua mãe! Ela me pediu para cuidar de você quando ela partisse, você sabe.Eu não vou me identificar por enquanto porque tem muito dinheiro envolvido nessa história e eu quero manter nossa segurança.

Quando sua mãe falecer, (acho que quando você ler isso ela já vai estar morta) eu farei o possível para te ajudar. Eu vou estar com você para sempre. Já nos conhecemos, acho que posso te falar isso. Eu te amo desde o primeiro momento que te vi. Da última vez acho que você tinha 14 anos, acho até que é pedofilia isso. Brincadeira.

Sua mãe não sabe que eu coloquei isso aqui, faz pouco tempo e ela prometeu que não mexeria mais nesse baú. Você seria o próximo. Mas, eu entrei aqui na sua casa, achei a chave que abria o porão e deixei isso aqui pra quando você achasse. Eu espero que você entenda uma única coisa, a mais importante: você é a pessoa mais amada nesse mundo! Eu te amo de verdade. Estou ansioso para te rever. Espere-me um pouquinho. A Irlanda é longe!

       Agora estava tudo explicado. X pensou que minha mãe não mexeria novamente no porão, mas se enganou. Aposto que ela leu essa declaração (se é que posso chamar de declaração, combina mais compromisso de amor eterno) e desconfiou que eu fosse gay. Com certeza, ela mexeu nas minhas coisas para ter uma prova e achou o que procurava. Na verdade, ela encontrou a própria morte agindo assim.

       Foi difícil de qualquer forma contar aos policiais que minha mãe se matou, mas se eu dissesse que não sabia eles desconfiariam que eu fosse o assassino. E, para falar a verdade até eu desconfio de mim mesmo. Como pude matar minha própria mãe? Eu pensava nisso o tempo todo torcendo para que houvesse uma terceira pessoa nessa história. Não queria levar essa dúvida comigo para sempre. Queria me lembrar daquela noite, mas não conseguia. Até isso era curioso: Por que eu não conseguia me lembrar daquela noite?

        Meu aniversário.  06 de janeiro de 2009. Terça- feira. As mosqueteiras demoraram a chegar. O sol apareceu. Elas trouxeram um bolo de chocolate e tomamos um delicioso café da manhã. Mas saímos logo. Compras!

        No dia seguinte estaríamos saindo de viagem para um outro estado e lá nós iríamos arrasar. E arrasar era a nossa especialidade! Saímos por Sete Quedas, eu ainda não tinha contado para elas que fiquei rico do dia para a noite e nem da existência de X. Eu tinha que contar tudo isso para elas: sobre X, a morte da minha mãe, o porão... Mas deixei as coisas ficarem mais certas na minha cabeça antes de contar qualquer coisa.

        Enquanto isso, gastamos até anoitecer nas lojas de Sete Quedas! As mosqueteiras ficavam se perguntando de onde eu tinha tirado tanto dinheiro para enchê-las de presentes.

        O Sul do Brasil é meio imprevisível quando o assunto é clima! Então tive que escolher umas roupas para tomar um solzinho e também umas no caso de fazer frio e eu tiver que tomar um chocolate quente!

        Cachecóis! Minha paixão! Comprei 8.

        7 calças. Meias, blusas, sem contar os presentinhos das mosqueteiras.

        Não almoçamos mas fomos em uma pastelaria.

        Milk Shake a tarde. Um dia bom esse meu aniversário. A única coisa chata foi ficar um ano mais velho. Minhas calças pretas eu imitei as do vocalista de The Bravery. Acho ele muito estiloso!

         Voltamos para casa exaustos!

         Contar esses últimos acontecimentos, decidi que seria ideal na viagem! Num dia de chuva talvez, não naquele dia. As meninas foram embora, mas eu tinha certeza que elas apareceriam com várias pessoas para uma festa enorme, era a cara da Haryélle.

         Foi uma espera em vão! Não aconteceu mais nada. O dia foi perfeito, elas não precisavam fazer festa surpresa ou coisa parecida! Ninguém sujou meu cabelo com gemas e cascas de ovos. Se soubesse, não teria gastada meio pote de xampu.

         Sozinho em casa, fui assistir televisão. Mais um daqueles canais religiosos.

_ Está escrito na Bíblia: Deus abomina homem que se deita com homem!

        Mais um pastor falando a mesma coisa. Eu pedi a Deus para que por favor me aceitasse. Ás vezes nem eu me aceito com medo de Deus na primeira oportunidade me pôr para brincar de boneca no Inferno. Eu fico sem saída.

        Eu queria muito sim estar ao lado de Deus para sempre. Ele sim é o meu pai, o pai que nunca me abandonou. Mas, meu pai devia deixar que eu amasse outras pessoas além dele. Amar não pode ser o motivo dessa abominação. Até cachorro ama seus filhotes, por que eu não posso AMAR uma pessoa? Se eu estivesse roubando, matando, violentando... Seria aceitável? Seria menos feio? Por favor, alguém me responde! Eu pedia isso todos os dias. Eu precisava urgentemente de uma resposta. Esse canal de TV estragou o dia do meu aniversário. Fez eu me sentir tão inútil, tão errado. ABOMINAÇÃO não é uma palavra qualquer. É como se todos que estavam na TV gritassem: Infeliz aniversário Félix!

        Coloquei no canal de moda.

        Ouvi o bater de palmas no portão da minha casa.

        Fui até lá. Um menino de aproximadamente 13 anos me disse:

        _ Mandaram te entregar isso.

        Antes de eu perguntar quem mandou ele me entregar aquilo ele saiu correndo. Mas só podia ser X, quem mais me mandava bilhetes? Quem mais dominava meu coração e controlava totalmente minha alma?

Desculpe-me Félix, eu não conseguiria esperar mais um minuto, um segundo sem te ver. Eu estou muito preocupado com você, sua mãe já se foi e não tem ninguém ai para te ajudar. Encontre-me hoje à meia-noite na praça do lado da rodoviária. Eu preciso te ver,

Do seu X

     Fiquei sem saber o que fazer. Mas é claro que eu tinha que ir. X QUERIA ME VER NO DIA DO MEU ANIVERSÁRIO. Isso é muito bom. Tecnicamente não seria no dia do meu aniversário porque seria à meia-noite. Mas, dane-se! Eu iria vê-lo. Isso é que importava.

        Ainda eram 7 horas da noite. Tomei um banho de aproximadamente uma hora e vinte minutos. Nenhum pouco ecologicamente correto! Tive que cozinhar. Mas saiu um desastre, então pedi uma pizza.

        10 horas da noite. Fui dormir um pouco até que chegasse a hora. Sonhei com o dia que minha mãe foi assassinada.

“Quando saímos ela começou:

_ Como você fez isso comigo?

_ Eu não fiz nada de mais (respondi). Não é fácil! Se eu tivesse opções, mas eu não tenho. Então por favor, não me culpe!

_ Bicha! Meu filho é uma bicha! Entra no carro agora! Ela ordenou.

        No táxi ela não disse uma palavra. Ela mandou o taxista parar na frente de uma boate. Saímos do carro.

_ O que você está fazendo? Eu perguntei à minha mãe.

_ Você vai ter que aprender a fazer coisas de homem. Ela respondeu nervosa.

_ Não me obrigue a...

_ Entre nesse bar (ela me interrompeu).

_Isso não é um bar. É um prostíbulo. Eu não vou...

_ Vai sim. Eu estou mandando.

_ Não vou. Que parte do “eu sou gay” você não entendeu mãe? Não bisbilhotou as minhas coisas, não leu o meu diário? Agora você sabe de tudo. Se eu pudesse mudar, eu já o teria feito para o meu próprio bem.

        Ela me deu um tapa na cara. Antes mesmo de pagar o taxista, entramos no carro. Nunca tinha recebido um tapa na cara. Foi horrível.

       Tive pequenos flashes de nós dois parando no meio do nada, em uma rua deserta. Estávamos sozinhos. Ela me derrubou no chão.

       Depois disso, só me lembro dela ao meu lado morta e a arma do crime do meu lado.

        O despertador do meu celular tocou. Acordei. Nove e meia da noite.

        Saí na frente da minha casa, vi um homem de costas numa moto. Ele estava todo de preto. Fiquei me perguntando se era X.

        Passei por ele.

        _ Sobe na moto. Ele disse.

        _ Quem é você? Você é o... X? Eu perguntei.

        Ele usava um capuz preto.

        _ Eu sou a pessoa que mais te ama nesse mundo. Ele respondeu. Mas pode me chamar de X.

        Eu não pensei duas vezes, subi na moto.

        _ O que nós vamos fazer hoje? Perguntei curioso.

        _ Tem muita coisa que você precisa saber, e eu sou a pessoa mais indicada para explicar. Hoje você vai descobrir quem eu sou, mas também quem você é.

        Uma noite longa estava por vir.

_ Feliz aniversário. Disse X.

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Unconditional- The Bravery