Fanfic: Os Amores de Anahí *AyA (terminada)
O visitante estava coberto de poeira. Viajara a cavalo e vinha de Lyon por Nímes.
Era homem bastante alto, de uns trinta e cinco anos. Começou falando em italiano, passou depois para o latim, que Anahí compreendia mal, e acabou expressando-se em alemão.
Foi nesta última língua, familiar a Anahí, que o conde lhe apresentou o viajante:
- O Professor Bernali, de Genebra, dá-me a grande honra de vir tratar comigo de problemas científicos sobre os quais há muitos anos vimos mantendo farta correspondência.
O forasteiro inclinou-se com galanteria italiana e se desmanchou em protestos. Com certeza ia importunar com seus discursos abstratos e suas fórmulas uma dama encantadora cujas preocupações eram, sem dúvida, menos graves.
Um pouco por exibição e um pouco por curiosidade, Anahí pediu para assistir à conversa. No entanto, para não ser indiscreta, foi sentar-se no canto de uma alta janela que deitava para o pátio.
Era um dia de inverno, mas de frio seco e sol brilhante. Subia dos pátios o cheiro dos braseiros de cobre em torno dos quais se aqueciam os domésticos.
Anahí, com um trabalho de bordado na mão, escutava a palestra dos dois homens, sentados frente a frente junto à lareira, onde se mantinha sem muito empenho um pequeno fogo de lenha.
De início falaram de personalidades que lhe eram totalmente desconhecidas: do filósofo inglês Bacon, do francês Descartes, do engenheiro francês Blondel, contra o qual os homens estavam indignados porque, diziam, considerava as teorias de Galileu como estéreis paradoxos.
De tudo isso acabou a jovem por deduzir que o recém-chegado partidário ferrenho do chamado Descartes, que seu marido, ao contrário, combatia.
Sentado no fundo de uma poltrona estofada, em uma das negligentes posturas que lhe agradavam, Alfonso de Peyrac parecia pouco mais sério do que quando discutia com as damas as rimas de um soneto. Sua atitude desenvolta fazia contraste com a do interlocutor empertigado na beira de seu tamborete pela paixão que lhe inspirava o diálogo.
- Seu Descartes é certamente um gênio - dizia o conde -, mas isso não quer dizer que tenha razão em tudo e por tudo.
O italiano acalorava-se.
- -Gostaria de saber como se poderia pilhá-lo em erro. Vejamos! Foi o primeiro homem que opôs à escolástica e às idéias abstratas e religiosas seu método experimental. Doravante, em vez de julgarem as coisas como se fazia antes, segundo os princípios absolutos, julgá-las-ão efetuando medidas e experiências, para depois deduzir-lhes as leis matemáticas. Isso devemos a Descartes. Como é que o senhor, que se gaba de possuir o espírito realista tão caro aos homens da Renascença, pode não aderir a este sistema?
- -Adiro a ele, creia-o, amigo. Estou convencido de que, sem Descartes, nunca haveria a ciência podido romper a crosta de necessidade em que a envolveram os últimos séculos. Mas o que lhe censuro é carecer de franqueza para com seu próprio gênio. Suas teorias estão inquinadas de erros flagrantes. Mas não quero contrariá-lo se está convencido.
- -Vim de Genebra, e atravessei neves e rios para aceitar seu desafio acerca de Descartes. Estou escutando-o.
- -Tomemos, se quiser, o princípio da gravitação, isto é, o da atração recíproca dos corpos* e, portanto, da queda dos mesmos rumo ao solo. Descartes afirma que, quando um corpo se choca com outro, não pode imprimir-lhe movimento se não tiver massa superior a ele. Assim, uma bola de cortiça que se choque com uma bola de ferro não poderá deslocá-la.
- -É a evidência mesma. E permita-me citar a fórmula de Descartes: "A soma aritmética das quantidades em movimento das diversas partes do universo permanece constante".
- - Não! - exclamou Alfonso de Peyrac, levantando-se tão bruscamente que fez Anahí tremer. - Não! Isso não passa de uma falsa evidência, e Descartes não fez a experiência. Ter-lhe-ia bastado, para perceber seu erro, tomar uma pistola e disparar uma bala de chumbo de uma onça contra uma bola de trapos comprimidos com o peso de duas libras. A bola de trapos sairia do lugar.
Bernalli olhou o conde com estupefação.
- -Confesso que o senhor me confunde, mas seu exemplo esta, bem escolhido? Nessa experiência do tiro de pistola entra talvez um elemento novo... Como chamá-lo? A violência, a força,
- -É simplesmente a velocidade. Mas não é um elemento específico do tiro. Cada vez que um corpo se desloca, esse elemento entra em jogo. O que Descartes denomina a quantidade de movi mento é a lei da velocidade e não uma soma aritmética das coisas,
- -E se a lei de Descartes não é boa, que outra o senhor encontra?
- -A de Copérnico, quando fala da atração recíproca dos corpos, dessa propriedade invisível, semelhante à do ímã, que não se pode medir, mas tampouco se pode negar.
Bernalli, com o punho cerrado sobre os lábios, meditava.
- Já pensei um pouco em tudo isso e discuti-o com o próprio Descartes quando o encontrei em Haia, antes de sua partida para a Suécia, onde, coitado, iria morrer. Sabe o que me respondeu? Disse-me que essa lei da atração devia ser posta de lado porque nela existia "alguma coisa de oculto" e ela parecia herética e suspeita.
O Conde de Peyrac soltou uma gargalhada.
- -Descartes era um pulha, e sobretudo não queria perder os; mil escudos de pensão que o Sr. de Mazarino lhe dava. Recordava-se do pobre Galileu, que teve de retratar, sob as torturas da Inquisição, a sua "heresia do movimento da Terra" e que mais tarde morreu suspirando: "E, no entanto, ela se move!... " Também quando Descartes, em seu Tratado do Mundo, adotou a teoria do polonês Copérnico De Revolutionibus Orbium Coelestium, absteve-se de afirmar o movimento da Terra. Limitou-se a dizer: "A Terra nâo se move, mas é arrastada por um turbilhão". Não é uma hipérbole encantadora?
- -Vejo que o senhor não é muito benévolo para com o pobre Descartes - disse o genebrino -, e, no entanto, o considera um gênio.
- - Detesto os grandes espíritos quando se mostram mesquinhos. Descartes, infelizmente, preocupava-se demasiado em salvar a pele e assegurar o pão cotidiano, que devia às liberalidades dos granAcrescentarei que, em minha opinião, se revelou um gênio nas matemáticas puras, não era forte em dinâmica nem em física em geral. Suas experiências sobre a queda dos corpos, se é que na verdade tentou verdadeiras experiências materiais, são embrionárias. Teria sido preciso, para completá-las, que avançasse um fato extraordinário, mas que no meu entender, não e impossível, e que o ar não está vazio. __ Que quer dizer? Seus paradoxos me enlouquecem!
- Digo que o ar em que nos movemos não seria em realidade senão um elemento denso, algo como a água que respiram os peixes: elemento com certa elasticidade, certa resistência; em suma, um elemento invisível a nossos olhos, mas real.
_ O senhor me espanta - repetiu o italiano.
Levantou-se e pôs-se a caminhar agitado pelo aposento. Deteve-se abriu várias vezes a boca como um peixe, sacudiu a cabeça e voltou a sentar-se junto à lareira.
- Às vezes quase o considero louco e, no entanto, existe dentro de mim mesmo algo que prova o que o senhor diz. Sua teoria seria o remate dos meus estudos sobre os líquidos em movimento. Ah! Não me arrependo desta perigosa viagem, que me proporciona o gozo insigne de falar com um grande sábio! Mas tenha cuidado, meu amigo. Se eu, que nunca pronunciei palavras com a audácia das suas, fui considerado herege e obrigado a exilar-me na Suíça, que não poderá suceder-lhe?
- -Ora essa! - disse o conde. - Eu não procuro convencer ninguém, a não ser a espíritos iniciados e capazes de compreender-me! Nem sequer tenho a ambição de registrar e publicar o resultado de meus trabalhos. Entrego-me a eles por prazer, assim como me divirto versejando algumas canções com amáveis damas. Estou tranqüilo em meu palácio tolosano, e quem virá procurar querela comigo?
- -O olho do poder está em toda parte - disse Bernalli lançando em derredor um olhar desencantado.
Autor(a): Bela
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Naquele mesmo instante Anahí percebeu, não longe de si, um levíssimo rumor, e pareceu-lhe que um reposteiro se havia movido. Sentiu uma impressão desagradável. Daquele momento em diante seguiu distraidamente a conversa dos dois homens. Seu olhar fitava inconscientemente o rosto de Alfonso de Peyrac. A penumbra que ia invadindo a hab ...
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Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 109
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luccaitalo Postado em 25/09/2010 - 13:34:35
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luccaitalo Postado em 25/09/2010 - 13:34:19
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luccaitalo Postado em 25/09/2010 - 13:34:16
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carolvondy Postado em 07/09/2010 - 17:44:41
ops doca nao, dica!
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carolvondy Postado em 07/09/2010 - 17:44:23
doca: coloca quem está falando na frente das falas.
ex.
anahi: ----------
ok?
fica mais fácil de entender quem está falando cada fala! -
carolvondy Postado em 07/09/2010 - 17:44:23
doca: coloca quem está falando na frente das falas.
ex.
anahi: ----------
ok?
fica mais fácil de entender quem está falando cada fala! -
unposed Postado em 16/08/2010 - 17:16:23
Ai ela ta começando a ficar com ciume dele, que fofo!
Posta maisss!