Fanfic: Sopro de Esperança (Terminada)

O rock
pesado de sempre berrava do novo mezanino quando a equipe de Poncho
apareceu para desejar boa noi­te brincando sobre como recuperariam o dinheiro
na partida do dia seguinte.

E então, após pensar muito quanto a
ser ou não boa idéia, Annie fechou o laptop e foi ver o que Poncho fazia. O
projeto era dela, afinal, e era seu direito conferir os resul­tados. Não tinha
nada a ver com o fato de que, durante dez ou 15 minutos depois que os operários
foram embo­ra, quando falaram sobre o assunto neutro da galeria, eles realmente
conseguiram conversar sem qualquer tentativa de romper a trégua.

A música estava ainda mais alta no
segundo andar, o que significava que ela podia continuar no topo da escada,
observando Poncho sem que ele notasse sua presença. Annie fazia muito isso
ultimamente... Todo homem do planeta com um físico daqueles devia vestir roupas
de operário, deduziu após o primeiro dia de trabalho. Principalmente se todos
ficassem tão bonitos quanto Poncho. Não que ele não ficasse charmoso de
smoking, inclusive. Mas há algo de muito másculo em um homem de roupas
casuais que não liga se está sujo. Era uma coisa primitiva, supôs. Uma coisa sexual. Mais provavelmente porque envolvia a palavra "sujo".

Annie observou-o flexionar os músculos
do antebraço ao abrir a tampa de uma lata de tinta. Obrigou-se a não comê-lo
com os olhos quando ele abaixou para pegar o pincel. E quando ele levantou a
barra da camiseta para tirar a poeira do rosto, Annie franziu a testa ao captar
um vislumbre tentador do tipo de abdome que fazia jus ao título de
"tanquinho".

Quando a gente não gosta de alguém,
não acha a pes­soa tão atraente, acha?

- Você não tem de ir para casa?

Quando Annie abaixou o volume da
música, Poncho espiou por cima do ombro.

- Eu podia perguntar a mesma coisa.

- Já estou de saída. Moggie passou a
tarde inteira trancado, portanto espero encontrar vários cadáveres de
estofados, que morreram de um jeito horrível.

- Ainda acho que não pode chamar um
cachorro de Moggie. Eleja deve ter um tremendo complexo de infe­rioridade por
causa da raça.

- Para a sua informação, os
labradoodles são uma mistura de labrador com poodle, e ficaram muito popu­lares.
Essas são as cores para as partes emboçadas das paredes?

Quando Annie parou ao lado dele, Poncho
olhou para as três largas faixas de teste.

- Vai secar durante a noite e amanhã
você poderá escolher uma a tempo de eu encomendar os galões.

- Não vai ser tudo branco? - Annie
cruzou os braços                enquanto ambos analisavam as faixas,
determinada a não olhar para Poncho. Ela andava observando-o demais ulti­mamente,
e isso a irritava além do limite. - Nenhuma dessas é branca.

- Sim, são sim.

- Não, não são.

- Sim, são sim. É o que está escrito nas
latas.

Annie cometeu o erro de espiá-lo, só
para ver que os olhos de Poncho reluziam ameaçadoramente. No mesmo instante, o
coração disparou. Droga. E não havia motivo algum para ficar toda nervosa e
incomodada quando o que ele fez pela enésima vez foi provocá-la. Era o pas­satempo
favorito dele, afinal. E ela o odiava por isso. porque Poncho sabia o
que estava fazendo. Parecia que ele queria que ela o detestasse tanto quanto a
despreza­va, por mais que lhe sorrisse.

Annie descruzou os braços e abaixou-se
para ler o rótu­lo da lata.

- Gelo. - Ela deu uma risadinha,
abaixou e apanhou outra. - Marfim. - Outra lata. - Oh-h-h, e o que temos aqui?
Ora, é um champanhe. Nenhum desses é branco, Alfonso.

- Aqui diz que é branco.

- Ainda não é branco. - Annie
sorriu com ternura. - E você sabe disso, ou não estaria pintando faixas de cada
uma para eu escolher, não é?

- Ah, mas veja... Uma é brilhante, uma é fosca e a outra é aveludada. Ainda é branco, com
acabamentos diferentes.

Annie analisou o rosto dele, abaixando
o olhar para a curva larga dos lábios carnudos, para o peito largo, e um elfo
travesso alegremente forneceu um meio de provar o argumento.

- A sua camiseta é branca, certo?

- Era, antes de eu começar a trabalhar
hoje.

- Ótimo,
então. - Annie tirou o pincel da lata, lambuzou o peito de Poncho com tinta e
sorriu. - Agora pode ver que champanhe não é branco. Tem um tom mais queimado...

A entonação
intimidadora da voz dele fez o coração de Annie disparar de novo.

- Confie em mim quando digo que você realmente não
quer fazer isso.

- Jura? E por que não?

Poncho franziu os lábios e ela quase sentiu o
instante exato em que ele decidiu dar o troco. Annie colocou o pincel de volta
na lata, contendo o riso. O coração batia um pouquinho mais alto e ela
reconheceu aquela ansiedade emocionante, tão familiar. Aquele jato de
adrenalina nas veias que ela sempre procurava quando não conseguia lidar com
alguma coisa. E isso sempre, sempre a colocou em apuros.

A culpa era dele, disse para si. Poncho continuava
a forçá-la a recair nos velhos hábitos.

- Eu só tentei provar meu ponto. A culpa é minha
se você é daltônico?

- Então me diga, só por curiosidade: de que cor
você diria que essa sua blusa bacana é?