Fanfic: Sopro de Esperança (Terminada)

Annie gesticulou para que ele se
calasse, comentando alto o suficiente para Poncho escutar:

- Finja que ele não existe. Faço isso
há anos. Então Poncho recuou um passo e sussurrou:

- Exceto daquela vez. Pareceu-me que
você sabia muito bem que eu existia enquanto me beijava. E quem sabe o que
faríamos se os seus amigos não nos interrom­pessem?

Annie tornou a corar, tentando
intimidá-lo com o olhar.

- E nunca saberemos, não é? Porque,
mesmo se você fosse o último homem do mundo, garanto que isso nunca mais
aconteceria de novo, nunca.

Annie cravou os dentes no lábio
inferior ao enfatizar a palavra "nunca". Mas após um vislumbre
daqueles olhos acinzentados, cujas manchas douradas flamejavam de raiva, Poncho
afastou-se, rindo por dentro. Foi inevitável, pois, querendo ou não, ela acabou
de chamá-lo para a briga. De repente, a palavra nunca virou um desafio.
Talvez ele devesse tirar a prova...

Quando o oponente retornou, Annie não
progredira muito na tentativa de iniciar uma nova amizade. Respirou fundo ao
sentir o aroma sutil da colônia de Poncho, que apareceu com um prato quase
transbordante de comida.

- Então ela já recrutou você para a
sua campanha de terror, Dulce? Tomara que você tenha um bom advogado.

Ah, Poncho podia provocá-la à vontade.
Ela não se mete­ria num bate-boca com ele, mesmo porque estava se saindo bem ao
circular pelo salão conforme lhe recomendaram. Portanto, deu-lhe uma cotovelada
no estômago, forte o bastante para fazê-lo deixar cair um salgadinho no chão.

- Hoje só preciso de um advogado para
conseguir um mandado e manter você longe de mim.

Sim, quando ameaçada, recaía nas
velhas atitudes, Annie... Que maneira incrível de mostrar o quanto havia
mudado. O problema é que era fácil demais voltar a ban­car o saco de pancadas
de Poncho, que parecia tão disposto a acreditar que ela não mudara nem um
tiquinho. Afinal, o que ele sabia a seu respeito agora? Ela não sabia nada
sobre Poncho... Bom, além do fato de que, por fora, ele cresceu um bocado em
oito anos, desde que ela fora em­bora de casa com o rabo entre as pernas.

Tão logo o avistou no salão lotado, Annie perdeu o
fôlego. Não foi difícil localizá-lo na entrada, observando a multidão. Sim, o
fato de que ele vestia um smoking ajudava, mas ela duvidou que faria qualquer
diferença se Poncho estivesse de jeans e camiseta. Ele era tão, bem, ele era
tão...

- Ahá, e a luta recomeça. - Ucker enlaçou Dulce
pela cintura e tentou assaltar o prato de Poncho. - Ninguém diria que esses
dois não se vêem há oito anos, não é?

Poncho tirou o prato do alcance de Ucker.

- Pegue um para você, imprestável. O bufê fica
daquele lado.

Annie não se conteve e riu da brincadeira. Afinal,
aquele clima era muito mais familiar. E mais próximo das melhores lembranças
dos velhos tempos. Contudo, aquilo deixou óbvio que o relacionamento de Alfonso
Herrera com cada um dos irmãos Portilla era tão diferente quanto água e vinho.
Mas, talvez, se ela insistisse...

Annie olhou admirada para o prato de Poncho.

- E sobrou comida para o Ucker no bufê, por acaso?

- Eu estou em fase de crescimento.

- Se você crescer mais um pouco o teto vai
precisar de reforma.

Uma idéia da altura do revestimento de madeira
centenário tornava a cena ainda mais ridícula. Mas o sujeito era muito alto
mesmo. No mínimo l,92m, e nem o smoking disfarçava o corpo musculoso. Junte
isso aos cabelos úmidos em desalinho, aos olhos azuis penetrantes, ao sorriso
sedutor nos lábios carnudos e, bem, não era mesmo de admirar ter perdido o
fôlego ao vê-lo. Com certeza isso explicava porque se sentia tão agitada perto
dele. Porque, de repente, o suor brotou nas palmas das mãos, o coração começou
a bater mais forte e a temperatura no salão pareceu subir alguns graus.

Entretanto, Annie também sabia que parte daquela
reação se devia ao choque do reencontro. Pois, na verdade, não podia culpá-lo
por desprezá-la tanto, podia?

- Nem sempre os melhores perfumes vêm em pequenos
frascos. Às vezes, tamanho é documento sim.

Annie flagrou um brilho demoníaco no olhar de Poncho.
Uma risada nervosa escapou-lhe aos lábios quando olhou para Ucker e Dulce, para
ver se também ouviram o comentário. Mas os dois pareciam entretidos demais para
ter escutado.

- Não acredito que você acabou de dizer isso na
frente de pessoas civilizadas.

- Mas é verdade. E não estou entre pessoas
civilizadas. Estou conversando com você - replicou Poncho.

- A frase certa é: tamanho não é documento. Poncho
respondeu sem parar de mastigar.

- Que nada, as mulheres só dizem isso para
consolar homens abaixo da média...

Annie fitou-o, boquiaberta, e tornou a olhar em
volta para conferir se alguém tinha ouvido. Passara a droga da noite inteira
espiando por cima do ombro, atenta às próprias atitudes e à quantidade de gente
na torcida para vê-la cometer uma gafe. Porém, como única Portilla com um
histórico de "gafes", será que deveria mostrar-se tão chocada com
aquele comentário "sutil"?

Ela não podia morder a isca.

- É mesmo? E você sabe disso por
quê...?

- Bom, você deve saber melhor que
eu... - Poncho en­goliu a comida e sorriu sem graça. - Por causa dos caras com
quem saía até ir embora. O último exagerou um pouquinho para compensar o fato
de estar abaixo da mé­dia, não foi?

Agora o queixo dela caiu para valer.

- Ora, seu...