Fanfic: Cega paixão (terminada)

O sapato vermelho estava caído no chão empoeirado. O couro era brilhante, novo, com poucas marcas para macular o brilho impecável. O salto, quebrado. Havia manchas de sangue por toda parte. Secas, de um vermelho bem escuro, envelhecido, mas não havia dúvidas de que eram de sangue. Algumas delas no sapato, no chão, nos degraus de madeira tosca da entrada da construção abandonada. Ninguém que perdesse tanto sangue sobreviveria.

Tudo tinha se passado na montanha. Anahí conseguia enxergar os picos recortados das montanhas Rochosas atrás da construção, sentia a neve ainda suspensa no ar. Um carro, não, um caminhão estava parado a um canto. Um caminhão azul e ainda novo, com listras douradas de um lado e o pára-choque traseiro amassado.

Anahí parou de súbito. Sentia muito, muito frio; como se estivesse sob uma camada grossa de gelo que nada conseguiria derreter. Ela sentiu a dor irradiar-se dos ombros por todo o corpo, ondas insuportáveis de frio congelando-lhe os músculos, cortando-lhe a pele. Então, gritou, e começou a suar frio, um suor estranho que lhe deixou as mãos molhadas e as pernas frágeis, roubando-lhe por completo as forças.

Ela fechou os olhos, apertando-os bem, procurando ignorar a dor e se concentrar na carga do caminhão. Mas o cheiro de sangue continuava entranhado em suas narinas, fazendo-a sentir o estômago enjoado. O frio era cortante, e a cabeça parecia prestes a explodir.

Frustrada, afundou-se na cadeira de metal e abriu os olhos, destruindo a visão.

- O que você viu, Anahí?

Eles não se encontravam, de fato, numa construção abandonada nas montanhas Rochosas, nem tampouco havia sequer uma gota de sangue por perto. Anahí Hardy estava sentada na sala de interrogatório de uma simples delegacia de Denver; os dedos agarrados aos braços metálicos da cadeira desconfortável. O detetive de polícia Phil Grayson a olhava, um tanto cético, contribuindo para o seu mal-estar.

A respiração dela estava ofegante, como se tivesse corrido muito, e o suor frio que lhe molhava o corpo magro a fez estremecer apesar de a sala ser aquecida.

- Quase nada de novo - disse, por fim, a voz rouca e baixa. - O sangue, o sapato, os degraus da frente; tudo exatamente como já havia descrito. Agora tenho certeza de que era nas Rochosas, como presumíamos.

Phil assentiu, o rosto largo de meia-idade fechado numa expressão preocupada.

- Não importa; é sempre bom termos uma confirmação.

- Concordo. - Anahí já conseguia falar com mais desenvoltura e o frio ia aos poucos passando sob o calor das lâmpadas. - Sei que ainda duvida do mérito da minha colaboração.

Phil enrubesceu.

- Já trabalhamos juntos há algum tempo, Anahí, e não posso negar que você vê coisas que não se pode explicar. Coisas que por diversas vezes se mostraram muito úteis, só que sou um homem pragmático. Passei vinte anos no Exército e outros dez aqui na corporação e é difícil para mim admitir que preciso da ajuda de uma... uma...