Fanfic: Cega paixão (terminada)

Mohamed Ali Reza viu quando se afastaram e teve vontade de praguejar, mas conteve-se. Acessos de raiva já o haviam levado a cometer muitos erros!

O tira não fora de grande ajuda. Mais bem treinado do que imaginara e capaz de suportar bem a dor, morrera com dignidade, e Mohamed o admirou por isso. Teria que cuidar, agora, dos outros dois.

Mas não precisava pressa. Sabia para onde estavam seguindo: encontrara numa das gavetas de Phil Grayson um papel com o nome e o endereço do grandalhão em Washington. Além disso, logo, logo a polícia lerda de Denver entraria em alerta quando o corpo de Phil fosse descoberto, mutilado tal e qual o das outras mulheres.

Não tivera alternativa. Pensara em queimar a casa, mas não tinha o equipamento necessário. Além do mais, estava com pressa de achar logo a moça e o sapato. Porém, no fim, acabara perdendo-os.

Paciência. Depois de Washington rumaria para sua amada Itália, um país muito mais bonito e interessante que os Estados Unidos.

Observando Anahí dormir na poltrona ao seu lado, Alfonso achou-a com uma aparência muito frágil. E ele? Com que aparência estaria? As aeromoças o olhavam, desconfiadas, ao cruzarem o corredor, e serviam-lhe doses generosas do seu uísque preferido.

A aeromoça de nome Clarice estampado na plaqueta presa sobre o colo generoso o olhava com uma expressão de curiosidade, um misto de medo e fascinação. Afinal, não era comum dois passageiros pegarem o avião às pressas e sem passagem. Na certa, devia ser um alto funcionário do governo.

Anahí murmurou algo durante o sono e Alfonso voltou-se para ela, não se importando com a atenção da aeromoça. Sua pele, normalmente pálida, estava branca como cera; as olheiras profundas, os lábios entreabertos. A trança que fizera antes de embarcarem começava a desmanchar e os cabelos caíam-lhe pelos ombros. Continuava abraçada àquela manta e Alfonso ficou feliz por vê-la tranqüila.

Tinha tido muita sorte em conseguir um lugar naquele vôo. Estava decidido a chamar um avião militar para vir buscá-los e levá-los a Washington, mas levaria mais tempo, e não queria levantar suspeitas tendo que se explicar, detalhadamente. Afinal, o caso parecia mais complicado do que se podia imaginar, e poderia haver muita gente importante metida na confusão. Toda cautela era pouca.

Então, tecera os pauzinhos e conseguira dois lugares naquele que era o primeiro vôo comercial a decolar depois da nevasca. Mesmo às três e quarenta da manhã, o avião estava lotado. A maioria era de passageiros de outros vôos cancelados, com mais de cinco horas de espera.

Aterrissariam logo depois do amanhecer e seguiriam para o seu apartamento até decidirem qual o próximo passo. E em quem confiar.

- Alfonso?

A voz suave de Anahí tirou-o dos seus pensamentos. Era a primeira vez que ela o chamava assim, pelo nome. Antes era sempre "coronel Oliver", ou "Alfonso Oliver". Gostava do som de seu nome nos lábios dela.

- Sim? - indagou num tom desencorajador.

- O que vai acontecer com Phil?

"Droga!", pensou, tentando ignorar o nó na garganta. Não que tivesse esquecido a tragédia, más procurava não pensar mais no assunto, como forma de se defender da dor.

- Como assim?

- Não quero que ele fique lá estendido por muito tempo. - Os olhos azuis de Anahí estavam atormentados. - Isto é...

- Sei o que quer dizer. Vou dar um telefonema anônimo para a polícia assim que aterrissarmos,está bem?

- Não vão querer nos interrogar?

- Não, se conseguirmos escapar. Pelo menos, por enquanto. Assim que tivermos algumas respostas, poderemos voltar e ajudá-los.

Ela assentiu e recostou a cabeça no banco, abraçando a manta com mais força. Usava uma de suas roupas caseiras, de formas soltas e cores claras, pálidas como ela mesma. Alfonso imaginava, curioso, como Anahí ficaria num vestido de cor vibrante e formas justas. Vermelho, por exemplo.

- Você está bem? - Anahí perguntou.

Por um segundo, ele não entendeu a pergunta.

- O quê?

- Perguntei se está se sentindo bem.

- Não.

Não havia nada que pudesse dizer para confortá-lo. Mas, por outro lado, Alfonso não esperava mesmo nenhuma atitude nesse sentido por parte dela.

- Sinto muito.

- Já vi este filme várias vezes - confessou, bebendo um gole de uísque. - Inocentes morrendo à toa, por uma causa idiota, enquanto os culpados conseguem escapar. Já perdi muitos amigos assim, mas... não pensei que fosse perder Phil também.

- Entendo.

Provavelmente entendia mesmo. Aliás, com aquele jeitinho frágil e doce, a sensibilidade fora do comum, Anahí Hardy entendia de tudo. Alfonso não sabia se Phil havia lhe contado sobre os momentos difíceis que haviam passado juntos e a amizade profunda que os unia, mas sentia que não havia muitos segredos para Anahí.

- Agora, durma, guru - murmurou, desligando a luz de leitura. - Daqui a duas horas estaremos em Washington e teremos muito que fazer. É melhor descansar enquanto pode.