Fanfic: Cega paixão (terminada)

. Anahí não imaginara que um agente do FBI pudesse parecer tão inofensivo. Ele era mais baixo do que ela, mais gordo e suas mãos rosadas lhe pareciam incapazes de segurar uma arma.

- S-sim - disse, tentando disfarçar a preocupação. Alfonso a aconselhara a não deixar ninguém entrar e ela o desobedecera. E o pior: justo com Kempton, um sujeito com quem Alfonso não simpatizava. Sua esperança era que ele não estivesse mentindo.

Por outro lado, não acreditava que o sr. Kempton pudesse lhe fazer algum mal. Talvez tentasse apenas extrair-lhe umas informações, e não havia muito o que lhe dizer, exceto pelo que via em sonhos.

Da cozinha, enquanto preparava duas xícaras de café solúvel, viu-o perambular pela sala sem tocar em nada.

- Obrigado - ele agradeceu ao ser servido. - Está gostando mais de Washington do que do Colorado?

- Mais ou menos... - respondeu, sem saber o que dizer.

- É uma cidadezinha ótima. Isto é, para quem gosta de política. - Depois de provar o café, elogiou-o: - Do jeito que eu gosto. Como adivinhou?

Ela sorriu e um medo estranho cresceu em seu íntimo.

- Devo ser adivinha - brincou.

- Conhece Alfonso há muito tempo? - ele perguntou num tom casual indo olhar pela janela. Atenta, viu-o espiar por entre as lâminas, afastando-as com os dedos. Fez isso três vezes. Anahí arrepiou-se, sentindo um frio repentino.

- O aquecimento destes prédios novos é péssimo, não? - comentou, esperando sinceramente que ele concordasse.

- Para mim, está quente aqui dentro - ele respondeu, surpreso, pondo a xícara na mesinha.

"Tenho que tocá-lo", pensou, assustada. "É o único modo de saber se estou presa aqui com um assassino." Sim, porque trancara a porta de novo e, caso ele a atacasse, não teria tempo de escapar.

- Mais um café?

- Não, obrigado. Por que não se senta? Eu queria lhe fazer umas perguntas.

- Eu preferia esperar até que Alfonso chegasse.

O sorriso dele, antes tão amigável, tornou-se irônico.

- Como queira.

Kempton sentou-se no sofá e pôs a mão no bolso. Ela sabia o que ele ocultava: não a faca que matara Phil, Mary Nelson e tantas outras, mas uma arma com silenciador. Kempton estava apenas aguardando.

- Vou tomar mais um café - disse, voltando vagarosamente para a cozinha, consciente de que seria o alvo perfeito para uma bala.

A televisão continuava alta e o controle remoto estava perto da mão dele. Tudo o que tinha a fazer era aumentar. o volume ainda mais, e atirar.

Chegando à cozinha, apoiou-se no balcão e respirou fundo. Só podia estar maluca: aquele sujeito era inofensivo, tudo não passava de imaginação. Tudo o que queria era arrancar-lhe umas informações e fora um erro ter permitido que entrasse.

Tinha que dar um jeito de tocá-lo... Ao virar-se para voltar à sala, percebeu que ele mudara de canal, para um clip barulhento, e aumentara o volume.

Anahí soube, então, que tinha pouco tempo. Já sabia que não havia na cozinha nenhuma faca afiada que pudesse servir de arma, e a arma que Alfonso lhe deixara estava no quarto, fora de seu alcance.

Mesmo sem vê-lo, sentiu-o aproximar-se. Cansara-se de esperá-la e vinha ao seu encontro.

A pesada frigideira de ferro ainda estava em cima do fogão. Sem refletir ou fazer barulho, ergueu-a no ar e girou-a no exato instante em que Kempton surgia na porta da cozinha, golpeando-o na cabeça.

O agente caiu no mesmo instante, bloqueando a passagem. Anahí continuava segurando a frigideira com as mãos trêmulas e suadas, lembrando-se do impacto horrível que sentira ao atingi-lo.

E se estivesse enganada? E se ele tivesse vindo apenas pedir mais café? E se tivesse ferido um inocente?

Aproximando-se do corpo imóvel, tocou-o de leve mas Kempton não se mexeu. Uma sensação estranha a invadiu, mas Anahí não saberia dizer do que se tratava. Talvez fosse apenas medo de ter matado um inocente. Mudando a frigideira de mão, começou a virá-lo.

Então viu Kempton abrir os olhos e apontar-lhe uma arma com silenciador. Parecia tenso e atordoado. Sem pensar duas vezes, Anahí  atingiu-o de novo. Kempton não mais se mexeu.

Anahí não esperava que houvesse sangue, e ficou perplexa ao vê-lo surgir nos lábios do homem. Consciente de que não precisaria mais da frigideira, colocou-a no chão. Pulando o corpo sem vida, correu pelo corredor e foi para o quarto.

Algum tempo depois, ouviu a batida de Alfonso na porta mas não teve coragem ou forças para se levantar. Alfonso a chamava pelo vão da porta, presa pela corrente. Ela tentou responder, mas a voz faltou-lhe, como se estivesse em estado de choque. Então, procurou levantar-se, mas suas pernas se recusavam a sustentá-la e Anahí caiu no chão, perto da porta do quarto. Alfonso teria que encontrar algum modo de entrar. Foi então que ouviu um enorme estrondo e o barulho surdo de madeira partida. Alfonso arrombara a porta com um pontapé. Em seguida, veio o silêncio. Segundos depois, ele surgia na porta do quarto, apavorado.

- Você está bem? - perguntou, ajoelhando-se ao seu lado. - Ele te machucou?

- Não...

Alfonso fechou a porta do quarto atrás de si.

- Quem o matou?

Anahí queria que Alfonso a tocasse mas não sabia como pedir. Mas não foi preciso. Ele abraçou-a, pondo-a de pé, mantendo-a bem junto de si e aquecendo-a com seu calor.

- Fui eu - confessou, o rosto enterrado no tecido grosso do casaco dele. - Ele queria me matar; tinha uma arma com silenciador.

Alfonso abraçou-a com carinho, confortando-a.

- Tudo bem, Anahí. Tudo bem.

Então ela conseguiu sentir-se um pouco melhor.