Fanfic: Cega paixão (terminada)

Alfonso não se voltou, não diminuiu a marcha, não parou a velha caminhonete. Manteve os olhos fixos na estrada, sem sequer importar-se em olhar se Marcy Lou tinha saído para ver o que acontecera com sua nova aquisição.

Anahí ficou aliviada ao ver a loirinha sair da loja e correr para o pátio, ilesa, observando com ar desolado o carro que continuava em chamas. À exceção das vitrines da loja do posto, o prejuízo parecia mínimo.

Ela virou-se no banco e olhou para Alfonso.

- Ninguém se machucou. Foi você quem ligou a bomba?

- Claro que não! Alguém queria nos eliminar de vez. E não conseguiu por pouco.

- E se a garota tivesse morrido?

- Não havia nada que eu pudesse fazer. Não sabia que havia uma bomba no carro. Os companheiros de Kempton são mais profissionais do que imaginei. Jamais teria feito aquela troca se achasse que um inocente fosse morrer. Mas o fato é que ninguém morreu, portanto não quero mais ficar pensando no que passou. Era para estarmos nós dois naquele carro e fico feliz por ter raciocinado com clareza, me livrando dele ainda a tempo.

- Você é mesmo um insensível, não? Não tem um pingo de sentimento!

Ele nem se incomodou em fitá-la. Mais atrás, começaram a soar as sirenes de um caminhão de bombeiro, mas Alfonso não se abalou.

- Faço o que posso. Além do mais, avisei a moça para que não se aproximasse do carro até amanhã de manhã.

Anahí não tinha o que dizer.

Quando o vira pela primeira vez, achara que o coronel Oliver era um homem de pedra, de modos duros e frios, tão frios quanto seus olhos. No entanto, a convivência a fizera compreender que se enganara no julgamento, apesar das couraças de proteção, havia em seu peito um coração humano que não se abatera com aquele estilo de que levava. Batia forte e, quem sabe, batesse por ela... Recostando a cabeça no banco, Anahí gemeu quando uma mola quebrada espetou-lhe as costas. A caminhonete era mesmo uma lata velha se comparada ao Audi. Contudo, o belo carro não tinha sido uma boa aquisição para Marcy Lou.

O ruído das sirenes foi ficando para trás e, alguns quilômetros adiante, Alfonso pegou uma outra estradinha. Anahí quis perguntar para onde iam mas mudou de idéia. Já perguntara várias vezes e ele se recusava a responder.

- A polícia não virá à procura da caminhonete?

- Sim, virá.

- E não vai encontrá-la?

- Não.

Cansada daquelas respostas curtas, ela se calou e relembrou os acontecimentos da tarde. Queria ter algo mais em que pensar em vez de ficar procurando uma justificativa para os fatos, uma saída. Já não tinha mais dúvidas de que Kempton planejara matá-la, e a Alfonso também; no entanto, nem esta certeza era suficiente para convencê-la de que agira certo matando-o. Jamais imaginara um dia vir a tirar a vida de alguém.

Arrepiada, fechou os olhos. Uma chuva fina começava a cair. No Colorado, seu único amigo estava morto e o chalé não era mais seu refúgio. Não lhe restava no mundo nenhum lugar para onde pudesse voltar, onde pudesse se refugiar; nada que a fizesse esquecer tantas mortes...

Passara a vida toda atormentada por sonhos terríveis e aprendera a conviver com eles mas, naquele instante, a realidade conseguia ser ainda mais terrível que seus sonhos e visões. Teria que aprender a enfrentá-la com coragem.

Anahí adormecera. Alfonso não pensava que ela conseguisse, tamanha a tensão que vivera mas, de novo, a subestimara. Anahí enfrentara com bravura os acontecimentos traumáticos do carro. Tudo sem perder o controle emocional, como Alfonso chegara a temer; apenas ficara zangada com ele por haver trocado de carro com a moça, pondo sua vida em perigo. Alfonso deu uma olhadela para Anahí. Sim: ela era uma mulher especial, pensou.