Fanfics Brasil - CAPITULO VI ***Bodas de Fogo*** ♥ D&C ♥

Fanfic: ***Bodas de Fogo*** ♥ D&C ♥


Capítulo: CAPITULO VI

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  Depois que Dulce saiu, Cristopher continuou sentado, imerso na escuridão, analisando o comportamento da esposa. Desde que a recebera em Dunmurrow, passara a viver apenas para aqueles breves encontros durante o almoço e o jantar, mesmo tendo cons­ciência de que cortejava o perigo. A verdade é que não conseguia agir de outro modo. Evitar a presença de Dulce seria como cessar de respirar. Aos seus olhos, ela se tornara o símbolo da própria vida. Se um dia ele pen­sara em cavalgar ao encontro da morte, hoje descobria que queria viver. Apesar de tudo, queria viver.

A voz suave, o perfume doce e feminino, o atraíam de maneira irresistível. Adorava ouvi-la falar, com seu jeito calmo e eficiente, sobre as tarefas desempenhadas ao longo do dia. Durante aquelas conversas, quase chegava a acreditar que eram marido e mulher de fato e que ele era um homem como qualquer outro. Embora soubesse que seria impossível continuar como estavam indefini­damente, não tinha forças para reverter a situação.

Uma batida repentina à porta obrigou-o a mudar o rumo dos pensamentos.

- Entre - ordenou, esperando Cecil.

Ao perceber que não se tratava do servo e sim de um de seus vassalos, sentiu-se mais animado.

Em duas passadas largas foi ao encontro do homem que lutara ao seu lado inúmeras vezes, do homem que agora treinava seus soldados e cuidava das suas terras, o homem a quem considerava seu melhor amigo.

- Você demorou a vir! - exclamou, dando um tapa forte e cordial nas costas de Afonso.

- Pelo visto, demorei muito mesmo. No momento em que coloquei os pés na aldeia, fiquei sabendo das novidades sobre o seu casamento. Que história é essa?

- É verdade, estou casado. Graças a uma manobra de Edward.

- Você deve estar brincando!

- E por que deveria brincar com um assunto sério?

- O que sua noiva disse? Ela sabe de tudo?

- Não! - Montmorency respondeu secamente. - Não sabe e nem vai descobrir.

- Mas como você conseguirá esconder um segredo des­ses? - Afonso parecia realmente assombrado.

- Como sempre fiz. Não se preocupe com isso. - De súbito ele queria que seu vassalo estivesse em qualquer outro lugar, menos ali, em Dunmurrow. Também expe­rimentava um sentimento estranho de posse em relação à esposa, Que ninguém ousasse questionar aquela união, nem mesmo Afonso!

Num esforço para controlar a raiva e fixar os pensa­mentos em questões mais produtivas, Cristopher mudou de assunto.

- Que notícias você me traz das minhas terras e dos meus homens?

Dulce vestiu uma de suas roupas mais velhas. Tinha muito trabalho a fazer hoje. Além do mais, se estivesse bem ou mal vestida ninguém iria reparar mesmo. Muito menos seu marido. A escuridão os impedia de se enxer­garem um ao outro. Aliás, se Cecil não a acompanhasse até a porta dos aposentos do barão, poderia fazer as re­feições nua em pêlo e Dulce nada notaria!

A idéia ridícula a fez sorrir. Até perceber que o con­trário também poderia acontecer. Com o rosto em fogo, Dulce tentou imaginar aquele homem enorme sem uma única peça de roupa no corpo. Oh, Deus, não era possível que estivesse gastando tanto tempo e energia pensando no Cavaleiro Vermelho, em especial de maneira tão im­própria. Determinada a afastá-lo da mente, terminou de se arrumar e preparou-se para enfrentar as tarefas que a aguardavam. Não valia a pena alimentar ilusões, prin­cipalmente depois de ontem à noite, quando Montmoren­cy deixara claro que não a desejava. A rejeição sofrida continuava a incomodá-la.

Rejeição sofrida? Dulce inspirou fundo, chocada com o rumo de seus pensamentos. Não era possível que estivesse chateada com o fato de Cristopher ter lhe ne­gado um beijo. Não era possível que se sentisse ansiosa por um simples toque do Cavaleiro Vermelho. Talvez Alice tivesse razão quando dissera que ela havia sido enfeitiçada...

Precisava admitir que pensava em Montmorency com uma freqüência assustadora. E o pior é que lembrava-se muito bem de como praticamente implorara por um beijo de boa noite. Quem sabe não agira assim por estar sob os efeitos de algum encantamento e, portanto, fora de si?

Um poção do amor? Dulce riu ao tentar imaginar a figura alta do marido diluindo ervas estranhas no seu cálice de vinho ou então espalhando pós desconhecidos sobre a sua comida. Não, Cristopher nunca faria isso simples­mente porque não parecia ter o mínimo interesse em ganhar a atenção da esposa!

Só podia estar ficando maluca por se deixar influenciar pelas suspeitas ridículas de Alice. A cada dia que pas­sava a serva aparecia com uma nova história de horror sobre o Cavaleiro Vermelho, entretanto, desde que pusera os pés em Dunmurrow, nunca o vira usar os tais poderes da magia negra. Cristopher jamais mencionara feitiçarias, ex­ceto em tom de brincadeira, e se no castelo existia um lugar oculto, para a prática de bruxarias, também nada tinha descoberto até agora.

Cansada de trançar os cabelos, Dulce abaixou as mãos e soltou os fios. Por que se dar ao trabalho de fazer um penteado quando ninguém em Dunmurrow iria fazer a distinção entre um penteado próprio às mulheres casadas e outro típico de solteiras? Se a verdade fosse dita, continuava a mesma donzela virgem de meses atrás. Olhando-se no espelho mais uma vez, fechou a porta do quarto e foi ao encontro de Alice.

Encontrou a serva na cozinha, uma expressão irritada no rosto.

- Mandei as duas aldeãs para Dunney, minha lady, como você pediu. Embora eu ache que uma única pessoa poderia muito bem fazer as compras no mercado sozinha.

- Será bom para os aldeões ver as duas mulheres juntas. Um sinal de que não há nada para temer. ­- Dulce olhou ao redor, satisfeita com as modificações do salão principal. As Paredes haviam sido pintadas, o assoalho esfregado e um fogo aconchegante brilhava na lareira de pedras. Estava ansiosa para exibir seus feitos. - Que tal se preparássemos uma ceia de natal? Apesar do pouco estoque de alimentos nas despensas, poderíamos mandar vir mantimentos de Belry. Seria uma boa maneira de atrair as pessoas da aldeia para o castelo, você não acha? - Mentalmente ela fez as contas de quantas mesas a mais precisaria colocar no salão para acomodar a todos com conforto. Porém ao fitar a criada, percebeu que Alice não estava tão de acordo assim com o plano. - Que foi agora?

- Não será fácil dominar o medo dos aldeões em troca de comida e bebida.

- Bobagem. Barriga cheia costuma fazer milagres.

- Mas o problema é Montmorency, minha lady. É o próprio barão quem espalha o pavor na alma das pessoas. Nenhuma comemoração vai mudar isso, a não ser que o Cavaleiro Vermelho apareça em público. O que não vai acontecer, é claro.

- Talvez ele resolva aparecer sim - Dulce respondeu sem muita convicção. Até onde pudera perceber, Cristopher nunca saía do quarto. Seu marido nunca saía do quarto. A súbita constatação do fato deixou-a zonza. Seria mesmo verdade?

Quando chegara a Dunmurrow, o castelo inteiro pa­recia encoberto pelas sombras que cercavam seu lorde. Entretanto agora, janelas haviam sido abertas e velas acendidas. Mesmo que o lugar jamais viesse a ser tão claro quanto Belvry, por causa das janelas estreitas, cas­tiçais e tocheiros encarregavam-se de proporcionar uma iluminação adequada. A escuridão que aterrorizava Dun­murrow fora banida para longe... Exceto as sombras dos aposentos principais. E era lá que Cristopher ficava.

Por que será que o homem não se mostrava em público? Por que se mantinha fechado dentro da escuridão? Ela não conseguia pensar numa explicação plausível, a não ser a idéia absurda de Alice, que afirmava, com todas as letras, tratar-se de um demônio. Montmorency não era nenhum demônio... Ou era?

- O barão não vai aparecer, e você sabe disso - a criada falou decidida.

- Fique quieta, deixe-me pensar.

- Não vou ficar quieta não. - Alice mal conseguia conter a agitação. - Fico feliz que você possa se dedicar a colocar o castelo em ordem, minha lady. Porém nada deste mundo irá mudar o fato de que seu marido é o Cavaleiro Vermelho. E como se já não bastasse o próprio diabo, ainda temos que lidar com o tal do Cecil. Juro que aquele homem pode estar em dois lugares ao mesmo tempo! Aposto que é uma criatura das trevas também, capaz de tomar tanto a forma humana quanto a animal para obedecer as ordens do mestre.

- Oh, pelo amor de Deus, mulher, chega! Já ouvi asneiras suficientes!

- Desculpe-me, minha lady. Mas só porque você o aceitou, não significa que o resto de nós tenha que aceitá-lo também. Como é que as pessoas podem confiar num lorde se nunca tiveram a chance de vê-lo? E o que devo dizer quando me fazem perguntas sobre o barão? Como posso explicar que mesmo depois de estar vivendo dentro deste castelo há dias só pude enxergá-lo de longe e muito mal, aliás, durante a breve cerimônia de casamento?

Alice cruzou os braços sobre o peito e ergueu a cabeça num gesto de desafio.

- Agora me diga, minha lady. Como é o seu marido? E por que ele se esconde?

Pega de surpresa, Dulce não sabia o que responder. Na verdade, seus últimos dias haviam sido tão movimentados que parara de pensar nas excentricidades do Cavaleiro Vermelho. Embora odiasse a escuridão dos aposentos principais, acabara se acostumando à eterna falta de luz. Também não acreditava que Cristopher pudesse ser a encarnação do mal. Contudo não conseguia evitar uma sensação esquisita ao pensar que, à exceção de Cecil, ninguém em Dunmurrow ainda pusera os olhos sobre a figura de Montmorency.

Era tudo tão estranho... Porém não estava disposta a admitir suas dúvidas nem para Alice. A velha criada parecia incansável, sempre remexendo no lado escuro das coisas. Pela primeira vez, desde que chegara a Dunmur­row, pensava em mandá-la de volta para Belvry.

O problema é que Alice ficaria de coração partido se fosse obrigada a voltar para Belvry porque a deixaria só na companhia do Cavaleiro Vermelho. Desacostumada a mentir, Dulce tentou responder a pergunta da serva da melhor maneira possível.

- Meu marido é alto.

Infelizmente Alice a conhecia bem demais para se dar por satisfeita com a resposta breve e evasiva.

- Oh, minha lady, então é como eu temia! Você ainda não conseguiu vê-lo também. Aquela criatura terrível a enfeitiçou!

- Que absurdo! Pare de dizer tanta tolice!

- Aiii! - O grito de dor pôs um ponto final à discussão. As duas mulheres correram na direção da cozinha.

A pequena Moira chorava a plenos pulmões, enquanto a mãe procurava consolá-la.

- Uma queimadura, minha lady - Glenna explicou.- Avisei minha filha, milhares de vezes para ficar longe do fogo.

- Pobrezinha... - Dulce ajoelhou-se ao lado da criança. - Posso dar uma olhada? Prometo que não vou machucá-la.

- Não - a menina choramingou. - O machucado é muito feio. E horrível. Você pode até desmaiar só de ver.

É muito feio... É horrível... De repente as palavras da garota ecoaram em sua mente como um aviso. Só conseguia pensar na figura alta do marido, eternamen­te envolto pelas sombras. Ele devia ter um motivo para agir daquela maneira... Talvez sofrera alguma queima­dura que o deixara desfigurado. Ali estava uma explicação razoável para o comportamento de Montmorency, uma explicação que não envolvia magia negra. Cristopher podia ter marcas horrendas pelo corpo, entretanto de uma coisa tinha certeza: seu marido não era nenhum animal.

- Tenho um estômago forte. - Dulce sorriu e pegou a mão de Moira com delicadeza, observando a pele ver­melha e repuxada na região dos dedos. - Veja só, não foi tão grave assim. Vai sarar logo e não deixará cicatriz. Vou lhe preparar um ungüento.

Ela levantou-se depressa para misturar as ervas, ainda atordoada com a idéia de que o isolamento de Cristopher pu­desse ter causas práticas. Já vira muitas queimaduras antes e algumas, realmente, chegavam a ser assustado­ras. Porém, nada, por mais horrendo que fosse, justifi­caria uma vida passada na escuridão.

Não, não era possível que fossem simples queimaduras decidiu, espalhando o ungüento na mão de Moira. O Cavaleiro Vermelho era um guerreiro temido. Talvez tivesse perdido um membro ou então fora ferido durante uma batalha, tornando-se irreconhecível. O pensamento trouxe um certo conforto. Melhor essa explicação que as histórias de magia negra. Se Montmorency mantinha-se isolado por uma questão de vaidade, quem sabe, com o passar do tempo, não conseguiria faze-lo ­sair das sombras?

- Bom dia. - O som de uma voz que não lhe era familiar a fez virar-se para trás a tempo de ver um estranho aproximando-se. Em vez de responder, Dulce ficou de pé, surpresa com a presença do desconhecido dentro do círculo fechado de Dunmurrow.

O homem, de altura mediana, era forte e tinha os cabelos castanhos. Um sorriso largo iluminava o rosto de feições agradáveis.

- Bom dia - ela respondeu afinal. Estava há tantos dias afastada da civilização que quase se esquecera das primeiras regras de boas maneiras.

Afonso sentiu-se feliz por tê-la cumprimentado antes que a castelã de Dunmurrow o fitasse de frente. Porque agora que podia vê-la por inteiro, precisava se esforçar para não ficar de queixo caído.

A esposa de Cristopher era a mulher mais bela que jamais vira em toda a sua vida.

Os cabelos sedosos caíam soltos sobre as costas, uma nuvem avermelhada além da cintura delgada. Embora não fosse alta, tinha um corpo de linhas harmoniosas. Esguia sim, porém arredondada em todos os devidos lugares.

Rosto oval, nariz reto e estreito, lábios carnudos, olhos verde-acinzentados. Afonso bem que tentava desviar o olhar de tamanha perfeição, mas era impossível. Não conseguia acreditar que aquela visão fosse a esposa de seu lorde.

Cristopher quase nada dissera sobre o casamento, exceto que fora um arranjo de Edward.

Apesar de não compreender por que o rei concederia uma esposa a Montmorency, suspeitara que se tratasse de uma donzela sem propriedades ou dinheiro, alguém que teria dificuldades para arrumar um marido. Nunca, nem seus mais loucos sonhos, lhe passara pela cabeça que Edward pudesse entregar nas mãos de Cristopher a mu­lher mais bela de todo o reino. Que maluquice seria essa? Será que a donzela caíra no desagrado do rei? Seria uma bruxa?

Com certeza havia muito mais coisas naquela história do que o barão deixara transparecer. Precisava descobrir os detalhes que faltavam. Quando acordara hoje de ma­nhã, não tivera a menor pressa de se levantar para co­nhecer a nova castelã. Contudo, depois que a vira, chegara a conclusão de que apreciaria um longa estada em Dunmurrow.

- Minha lady, sou Afonso Clinton, o vassalo do barão. Acabei de voltar de uma viagem de rotina pelas terras de meu lorde. É um prazer estar sob as suas ordens, senhora. - Ele fez uma mesura tão elegante, que Dulce não pode deixar de sorrir.

- Eu sou Dulce de... Dulce Montmorency. É um prazer conhecê-lo. Seja bem-vindo.

A presença de uma nova pessoa dentro daquelas quatro paredes, em especial de alguém que adorava contar no­vidades e falar sobre o mundo lá fora, era como um ver­dadeiro raio de sol capaz de iluminar sua vida sombria. O vazio e a escuridão eterna de Dunmurrow foram mo­mentaneamente banidos pela chegada do vassalo.

O tempo pareceu voar enquanto os dois conversavam, sentados junto à lareira. Afonso com um cálice de cidra na mão, e Dulce ouvindo-o falar sobre as terras do barão e as pessoas que viviam na aldeia. O recém-chegado parecia bastante impressionado com as mudanças ope­radas dentro do castelo e não poupava elogios. Tanto calor humano tornava fácil contar sobre os planos para a comemoração do Natal como uma maneira de atrair os aldeões.

- Acho que poderei ajudá-la, minha lady. Quando eu passar pelos campos e arredores, espalharei a notícia do que o barão anda. à procura de gente para trabalhar aqui.

Dulce inspirou fundo, surpresa e feliz.

- Você acha mesmo que eles virão? - indagou ansiosa. Depois baixou os olhos e ficou em silêncio, incapaz de discutir a possibilidade de ninguém aparecer no castelo e, principalmente, por que os aldeões se recusariam a aparecer.

Entretanto Afonso parecia imperturbável.

- Sempre existem aqueles que precisam trabalhar, minha lady. Gente que não pode se dar ao luxo de escolher o serviço. Aposto que ficariam felizes em ajudá-la aqui, dentro destas quatro paredes.

De repente Dulce sorriu, sentindo uma onda de afei­ção e gratidão por aquele homem que mal conhecia. O vassalo de Montmorency fora o primeiro a encorajá-la e a incentivá-la desde que pusera os pés em Dunmurrow.

Outra vez Afonso precisou se esforçar para não ficar de queixo caído. Se a esposa de Cristopher era linda séria, quando sorria tinha-se a impressão de que o próprio Sol se erguia para iluminar tanta beleza. Ele quase precisou se beliscar para sair do estado de admiração profunda. Certamente aquela mulher não era nenhuma feiticeira.

- Onde é sua casa, minha lady? - Afonso perguntou, procurando uma pista que pudesse explicar a conexão entre ela e o lorde de Dunmurrow. - Você morava perto daqui antes do casamento?

- Não. Venho de longe. De um lugar chamado Belvry. Por acaso você já ouviu falar?

Belvry? Quem ainda não tinha ouvido falar de Bel­vry? Uma das propriedades mais prósperas de todo o oeste.

- Sim, já ouvi falar de Belvry, embora jamais tenha estado lá. Dizem que é muito grande e bonito.

- Oh, não é apenas grande - Dulce falou orgulhosa. - É também espaçoso e bastante confortável. Claro que se trata de uma construção bem mais nova do que Dun­rnurrow. Foi meu pai quem construiu o castelo, antes de eu nascer.

- Então você é uma de Laci? - Apesar do esforço, o vassalo não conseguiu esconder o tom de surpresa na voz. Caía por terra sua segunda teoria, a de que tratava-se de uma donzela sem dote. Pelo contrário, era uma mulher muito rica. Como é que viera parar aqui... junto com Cristopher?

- Você estava sob a guarda de Edward? - Melhor deixar os subterfúgios e partir para as perguntas diretas.

- Não exatamente. - Pela maneira como Dulce res­pondeu, ficou claro a ausência de afeto entre ela e o rei. - Embora Edward tenha... tomado um certo interesse por mim depois da morte de meu pai.

O quê? Será que o rei cobiçara as terras dos de Laci? Embora a educação lhe segredasse que estava na hora de parar com as perguntas pessoais e indiscretas, Afonso não conseguiu colocar um ponto final na investigação. Estava morrendo de curiosidade.

- E você conheceu Cristopher...? - O resto da frase foi deixado deliberadamente no ar, à espera de comple­mentação.

Porém ela ignorou a deixa.

- Nunca me encontrei com Cristopher antes do casamento. O olhar frio e altivo de Dulce o fez desejar nada ter perguntado. Ele pigarreou e mudou de assunto.

- Acho que toda essa conversa me deixou com fome, minha lady. Devo admitir que estou ansioso para testar as mudanças que você implantou na cozinha. Deus sabe que jamais elogiei as qualidades culinárias de Dunmur­row antes porque eram inexistentes.

Quando Dulce riu de sua careta, Afonso suspirou cheio de alívio. Fora perdoado.

De repente o vassalo se deu conta por que motivo Cristopher andava tão irritadiço, como uma fera enjaulada. Lady Montmorency era capaz de fazer qualquer um perder a cabeça. A beleza perfeita, a voz suave, as maneiras ele­gantes, o perfume delicioso... Tudo aquilo poderia enlou­quecer o mais controlado dos homens. Ele mesmo, por exemplo, seria o primeiro a ceder a tantos encantamentos. Mas o que dizer do terrível Cavaleiro Vermelho?

Dulce ordenou que o almoço fosse imediatamente ser­vido no salão sem ao menos esperar que Cecil aparecesse para conduzi-la à presença do marido. A verdade é que queria escapar da atmosfera sufocante dos aposentos principais. Comer num local iluminado, na companhia de uma pessoa extrovertida, era uma pausa à escuridão e ao peso de Dunmurrow.

Ainda assim, sentia-se culpada.

Apesar de seus esforços para não comparar Afonso ao marido, ela sabia que os dois homens eram tão diferentes entre si quanto a água do vinho ou o dia da noite. Para começar, havia o pequeno detalhe de que podia enxergar o vassalo. Vê-lo mover-se, observá-lo, avaliar as expres­sões dos olhos e do rosto. Algo que sempre dera como garantido em sua vida e que depois da chegada a Dunmurrow transformara-se numa raridade.

Para completar, Afonso parecia de fácil convivência. Ele não a fitava com o desejo nojento dos cavaleiros da corte, nem com a desaprovação do emissário do rei. Também não a tratava com a hostilidade velada tão freqüente no comportamento de Montmorency. O vas­salo a tratava com a consideração de um amigo e seus elogios eram recebidos com prazer, pois nos últimos tempos vivia cheia de dúvidas a respeito de si mesma. Para alguém que sempre mantivera distância dos ou­tros, Dulce bebia aquela atenção com a sofreguidão de uma pessoa sedenta.

- Minha lady - Afonso empurrou o prato para o lado e sorriu -, eu suspeitava que a comida do castelo tivesse melhorado, porém nunca me passou pela cabeça que a melhora fosse tão espetacular. A refeição estava deliciosa. Acho que vou ter que manter os homens aquartelados longe daqui para evitar que se tornem gordos e pregui­çosos, incapazes de cumprir as suas obrigações.

Dulce riu baixinho, apesar de Alice não demonstrar o mesmo entusiasmo.

- Por que os homens estão aquartelados distante da­qui? - a criada indagou num tom desconfiado, carregado de suspeitas.

- As terras do barão são de grande extensão, en­globando várias aldeias e muitas casas - Afonso explicou sem hesitar. - De qualquer forma, não precisa se preo­cupar, Alice. Jamais nos distanciamos além de um de­terminado limite. Há sempre soldados no castelo, em­bora não tenhamos motivos para esperar um ataque inimigo.

A idéia de que alguém seria louco o suficiente para atacar o Cavaleiro Vermelho em seu próprio covil quase fez Dulce cair na risada. Desde que chegara a Dunmurrow experimentara muitas sensações estranhas, mas nunca se sentira desprotegida. Era impossível imaginar a existência de um homem corajoso o suficiente para ignorar os rumores terríveis que cercavam Cristopher Mont­morency ou então forte o suficiente para enfrentá-lo numa batalha.

- Se você está preocupada, posso mandar um homem para protegê-la. Ele será uma espécie de guarda pessoal - sugeriu o vassalo.

- Aceito o oferecimento, obrigada.- E pela primeira vez em muitos dias, a serva pareceu realmente sensibi­lizada.

Alguns segundos de silêncio se passaram e foi Afonso quem tornou a falar.

- Bem, minha lady, agora que já me satisfiz com essa comida deliciosa, acho que preciso de um pouco de exer­cício. Creio que uma cavalgada seria ótimo. Você já co­nhece os arredores de Dunmurrow? Gostaria de me acom­panhar?

Dulce ficou imóvel, a perspectiva de andar a cavalo enchendo-a de satisfação. Cavalgar era um prazer tão simples, algo que sempre fizera até sair de Belvry, e algo de que sentia muita falta.

- Sim - respondeu, resistindo à vontade de correr para o estábulo no mesmo instante.

Protegida por uma pesada capa de pele, finalmente partiu a galope, atrás de Afonso, pensando que aquele dia estava transcorrendo de uma maneira bastante diferente do que imaginara ao se levantar.

Dali em diante não iria se negar este prazer outra vez. Quer tivesse que arrastar Afonso para um passeio ou implorar a Cristopher para designar um de seus homens como acompanhante, iria cavalgar diariamente. Sentia-se como alguém voltando à vida depois de ter passado uma eter­nidade enterrada.

Sentia-se culpada também.

Enquanto se afastavam do castelo, Dulce lançou um olhar rápido para trás, imaginando quais das janelas estreitas pertenciam aos aposentos principais. Por um momento experimentou a sensação inquietante de que o Cavaleiro Vermelho espreitava. Estremecendo, baixou o olhar e impeliu o cavalo para frente.

As terras que lhe pareceram tão sombrias no dia de sua chegada, agora davam a impressão de possuir uma beleza crua, intensa. Porém, o que mais a encantou foi a floresta plantada nos arredores. Familiarizado com a região, Afonso apressou-se a lhe mostrar uma lagoa bem no meio das árvores.

- É linda - Dulce murmurou admirada.

- Sim...

Os dois permaneceram em silêncio durante vários se­gundos, ouvindo o barulho da água, o canto dos pássaros, os sons da vida animal ao redor.

Ela não tinha dúvidas de que a lagoa seria um lugar delicioso para se banhar no verão. Não, que bobagem. Quando o verão chegasse, muitas mudanças haveriam ocorrido. Com certeza estaria de volta a Belvry e seu ca­samento já teria sido anulado. Dunmurrow não passaria de uma lembrança sombria. Afinal era isso mesmo o que ela queria, não era?

- Obrigada por me mostrar este lugar. É o recanto mais belo que pude ver até agora dentro das propriedades do barão.

- Tem razão, é lindo. Mas acho que está na hora de regressarmos ao castelo. Está ficando muito frio.

- Até que não está tão frio assim para essa época do ano - Dulce protestou, odiando a idéia de voltar a se encerrar dentro de quatro paredes.

Percebendo-a hesitar, Afonso sugeriu:

- Bem, que tal se passássemos pela aldeia antes de irmos para o castelo?

- Os aldeões o conhecem?

- Sim. Costumo ir com freqüência à aldeia, para tratar de negócios do barão.

Porque o barão não se mostrou em público, ela pensou, tentando montar as peças do quebra-cabeça. Daria tudo para entender o motivo da reclusão de Montmorency.

- Você trabalha para o meu marido há muito tempo?

- Sim, minha lady.

Então qual é a aparência de Cristopher Montmorency? Em­bora não tivesse coragem de fazer a pergunta em voz alta, Dulce sentia-se vivendo um verdadeiro tormento. Por que será que ele se esconde na escuridão? Havia tanta coisa que Afonso poderia lhe contar... Entretanto sabia que não estava certo indagar, do mesmo modo que não estava certo o vassalo responder. Lutando para mudar o rumo dos pensamentos, obrigou-se a falar da aldeia. Contudo, apesar de todo o seu esforço, o mistério que envolvia seu marido não lhe saía da cabeça. Um mistério sobre o qual Afonso poderia lançar alguma luz.

Os moradores de Dunney, apesar de aparentarem tranqüilidade, não conseguiam disfarçar inteiramente a desconfiança que sentiam em relação à lady de Dunmurrow e ao vassalo do barão. Mais uma vez, Dulce encontrou aliados nas crianças e distribuiu moedas aos pequeninos. Ao perceber que Afonso a fitava, desejou do fundo do co­ração que fosse Cristopher quem estivesse ao seu lado, que o Cavaleiro Vermelho aparecesse em público e se dispu­sesse a ir até á aldeia para acompanhar a esposa.

Tentando ignorar a idéia absurda, ela se despediu das crianças e mandou-as brincar enquanto conversava com alguns adultos sobre os ungüentos que prometera mandar a um camponês idoso que sofria de reumatismo. Sem que percebesse, o sol começou a se pôr no horizonte e Afonso a chamava para irem embora. Estava na hora de regressar a Dunmurrow.

No trajeto de volta, Dulce resolveu falar sobre aquilo que a incomodava. Depois de passar quase que o dia inteiro na companhia do vassalo, chegara a conclusão de que se tratava de um homem sincero, honesto e de bom coração. Mesmo sabendo que poderia ser injusto e até insensato arriscar uma boa amizade com indagações a respeito de Cristopher, precisava, desesperadamente, que al­guém lhe desse certas informações. Por isso estava dis­posta a correr o risco.

- Os aldeões dizem que o barão nunca colocou os pés em Dunney - ela falou devagar, observando o homem que cavalgava ao seu lado.

- Eu não sei. - Apesar das palavras soarem com naturalidade, havia algo no tom de voz masculino que não chegava a convencê-ta. Afonso demonstrava afeto por seu lorde, porém não parecia disposto a discutir o com­portamento do barão. - Ultimamente não tenho passado muito tempo em Dunmurrow. Manter as terras sob con­trole e cuidar para que os homens estejam em perfeitas condições, caso sejamos convocados para uma batalha, me ocupa as vinte e quatro horas do dia.

- Quer dizer então que Cristopher não treina seus próprios homens?

- Não - Afonso respondeu cauteloso. - Ele costumava fazê-lo, mas desde que recebeu o castelo como recompensa pelos serviços prestados ao rei, acabou tendo outros as­suntos para ocupá-lo.

Que tipo de assuntos? Alquimia? Bruxaria? Sua von­tade era indagar sobre a terrível reputação do Cavaleiro Vermelho, porém achou melhor ficar de boca fechada. Embora dissesse a si mesma que não acreditava em ta­manha bobagem, não podia deixar de imaginar por que motivo Cristopher se mantinha trancado dentro dos aposentos principais, sem nunca se aventurar no meio das pessoas, sem nunca ver a luz do Sol...

Por que ele se esconderia nas sombras? Dulce quase fez a pergunta, mas se calou a tempo. Com uma clareza que chegava a ser dolorosa, concluiu que talvez Mont­morency não buscasse a escuridão quando estivesse na presença do vassalo. Ele podia muito bem receber Afonso em plena luz do dia, sem procurar esconder o corpo e o rosto num breu. Afinal parecia confiar naquele homem mais do que confiava na noiva.

Envergonhada demais para deixar Afonso saber que ja­mais vira o próprio marido, Dulce procurava uma ma­neira de consertar a pergunta que fizera momentos antes. Ali estava alguém capaz de lhe contar tudo, porém como poderia indagar qualquer coisa sem revelar sua situação bizarra? Afinal era esposa sem ser mulher. Continuava tão virgem e inexperiente como quando saíra de Belvry. Melhor ter muito cuidado, decidiu, ou acabaria pondo os pés pelas mãos.

- Sei que você conhece meu marido há anos e com certeza o tem em alta estima. Eu... eu gostaria de lhe perguntar... Por que Cristopher passa tanto tempo trancado dentro dos seus aposentos?

- Minha lady... - Incapaz de fitá-la de frente, Afonso fixou o olhar na linha do horizonte, onde o Sol se punha devagar espalhando as sombras sobre as muralhas de Dunmurrow. - Minha lady, não sou eu quem devo lhe dar as respostas para as suas perguntas. Vamos, precisamos estar de volta ao castelo antes da hora do jantar, ou Cristopher me arrancará a cabeça por ter tomado tanto tempo de sua adorável esposa.

Desapontada, Dulce inspirou fundo procurando não se deixar abater com as evasivas do vassalo. Como se o Cavaleiro Vermelho se importasse onde e com quem ela passasse as horas do dia ou da noite! Provavelmente Cristopher estaria satisfeito por tê-la fora do caminho. E com certeza ficaria feliz da vida se pudesse se ver livre dela para sempre.



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Autor(a): nathyneves

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  Cristopher estava furioso. Andando de um lado para o outro, tentava se concentrar no que Cecil contava, mas era difícil. O servo lhe dizia coisas que preferiria não ouvir e cada palavra caía sobre sua raiva como uma chicotada em carne viva.- E onde estão eles agora?- Fui informado de que se dirigiram à aldeia, meu lorde.- Depois ...


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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 60



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  • stellabarcelos Postado em 27/10/2015 - 02:17:36

    Muito perfeita! Foi lindo! Amei

  • JokittaVondy Postado em 14/07/2014 - 18:29:06

    PERFEITA <3 Amei o final

  • sophiedvondy Postado em 21/09/2013 - 22:50:29

    embora seja pequena é perfeita, linda parabéns <3 quem gosta de fic? leiam a minha pfvrr http://fanfics.com.br/fanfic/27130/sumemertime-adaptada-vondy-vondy

  • larivondy Postado em 24/06/2013 - 13:17:00

    ameeei, linda a história *-*

  • claudia_miranda Postado em 15/03/2013 - 17:50:50

    li a sua web e amei parabens perfeita..

  • claudia_miranda Postado em 15/03/2013 - 17:50:50

    li a sua web e amei parabens perfeita..

  • claudia_miranda Postado em 15/03/2013 - 17:50:50

    li a sua web e amei parabens perfeita..

  • claudia_miranda Postado em 15/03/2013 - 17:50:49

    li a sua web e amei parabens perfeita..

  • claudia_miranda Postado em 15/03/2013 - 17:50:49

    li a sua web e amei parabens perfeita..

  • eduardooliveira Postado em 27/10/2011 - 20:06:44

    Para quem é vondy e tem orkut, vá nessa fanfic: http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=118052479 ,se gostar,comente! =)


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