Fanfic: Antes Mal Acompanhada Que Solteira

Raphael dá uma enorme festa de aniversário todos os anos.

Ele sempre organiza tudo sozinho, e sempre faz no apartamento dele, no bairro do Meatpacking District. Um corretor de imóveis de Manhattan um otimista ou um idiota cego poderia dizer que o lugar é um loft em um galpão reformado, mas basicamente nenhuma reforma foi feita ali. Continua com cara e jeito de galpão: é um lugar cavernoso, úmido e praticamente sem janelas que nem Martha Stewart, armada com uma pistola de cola e metros de cbintz e rolos de tapetes persas, poderia transformar em algo remotamente aconchegante.

Mas é um apartamento grande e todos sabem que, em Manhattan, apartamentos grandes são difíceis de encontrar. Raphael usa o dele muito bem: sempre convida todo mundo que conhece para suas festas de aniversário e pede que tragam todo mundo que conhecem.

De acordo com Kate, que conhece Raphael há um ano a mais que eu e, portanto já foi a uma festa de aniversário dele, o público geralmente é composto de gays incrivelmente lindos, modernos e na moda, acompanhados por suas amigas heterossexuais incrivelmente lindas, modernas e na moda.

Este ano, por ser um aniversário importante para Raphael, deve aparecer mais gente que o normal, e também mais gente incrivelmente mais linda, moderna e na moda.

Raphael me disse que a festa sempre é temática.

No ano passado, o tema foi selva. Homens com corpos maravilhosos de tanguinha e estampas de animal.

No ano anterior, foi praia. Homens com corpos maravilhosos de sunguinha.

Este ano, o tema é festa nas ilhas dos Mares do Sul.

Percebeu a tendência? Os motivos de Raphael são escolhidos para que um mínimo de roupa seja usado (isso sem falar no consumo máximo de álcool, na forma de drinques divertidos com frutas).

Este ano, ele alugou palmeiras falsas. Queria colocar tochas tribais acesas, mas eu o convenci de que não seria boa idéia. Thomas, amigo dele, que faz cenários na Broadway, criou uma cachoeira com uma lagoa azul reluzente com algum tipo de tecido escorregadio. Coquetéis do tipo frozen estão sendo servidos em copos de plástico em forma de coco.

Chego quase duas horas atrasada, com Kate a reboque. É por causa dela que chegamos tarde. Ela foi ao salão de beleza depilar o buço um pouco antes da hora marcada para o início da festa, e tivemos de esperar que o inchaço avermelhado desaparecesse.

Agora, quando entramos na festa lotada de Raphael, ela puxa meu braço e pergunta:

- Tem certeza que estou bem?

Na verdade, não está. Para combinar com o tema de ilhas dos Mares do Sul, ela está com o que parece ser um bigode de Ki-suco de morango por cima do lábio, apesar das tentativas em vão de cobrir o vermelhão com corretivo. A iluminação no apartamento dela é tão fraca que eu só percebi o quanto estava aparecendo quando chegamos ao metrô.

- Você está ótima - minto.

Ela coloca a mão em concha na orelha:

- O que foi que você disse?

- Você está ótima - berro, para ser ouvida acima da canção de Jimmy Buffet e das vozes abafadas. - Mas não dá para acreditar que você ficou esperando até antes da festa para depilar o buço. Por que não foi fazer isso mais cedo, ou ontem? Você sabe que sempre fica toda vermelha por causa da cera.

- Eu só percebi que meu bigode estava de volta hoje à noite - grita Kate em resposta. - Quero dizer, o que você queria que eu fizesse, aparecesse aqui com uma sombra por cima da boca? Não dá para acreditar que você não me disse nada quando a gente se encontrou hoje de manhã.

- Eu não reparei, Kate. Acho que estava preocupada demais com meus próprios traumas.

- Está muito horrível? - Ela dá alguns passos na direção do aparelho de TV e tenta examinar seu reflexo na tela escura.

- Anahí! - Raphael se materializa com um berro estridente, daiquiri de morango frozen com enfeite de guarda-chuvinha na mão e me dá um beijão.