Fanfic: Aconteceu no Verão (Terminada)

-
Estou entendendo o que quer dizer, Anahí, mas ainda acho que você
merecia coisa melhor do que isso-disse ele, apontando o
espaço da cabana.

Anahí olhou ao redor,
procurando guardar na memória todos os detalhes daquele local, onde tivera
uma experiência tão importante para sua
vida. Naturalmente o chão era duro, e havia ali um leve odor de maresia
e sala de exercícios, que a remetia ao tempo em que cursara o
colegial. A uma época em que fora mais autêntica
do que nos últimos anos, com certeza. Apesar do desconforto,
ou até por causa dele, sentia-se outra vez uma mulher
desejada.

-
Você foi perfeito. Impulsivo e descontrolado na
medida. Eu não trocaria o que aconteceu por nenhuma outra
pessoa, em ne­nhum outro lugar. Principalmente por velas e champanha,
com ou sem trufas de chocolate. Foi uma das coisas mais certas que já
fiz na vida.

Tinha esquecido como
parecer viva de novo.

Ela não
tinha arrependimento algum, nem iria permitir que ele tivesse.

-
Isso é verdade - admitiu ele, enxergando
esse novo ângulo.

-  O fato de acontecer hoje, para mim é
muito significativo. É meu último dia como
salva-vidas.

-
É
mesmo?

-
É.
E em todos os seis anos que trabalhei como chefe dos salva-vidas dessa praia,
nada tinha acontecido que pudesse nem lembrar o que aconteceu hoje.

-
Isso quer dizer que você nunca... Namorou ninguém
aqui da praia? - quis saber Anahí.

-  Ninguém que eu tivesse
conhecido enquanto trabalhava. Sempre fui muito rígido comigo, nesse
ponto. Tenho visto outros colegas, mas não gostei do que vi.

-
Isso é melhor ainda, para mim. Quero dizer, que você
seja assim tão "careta". Exatamente como eu.

Ela não
sabia o que iria acontecer quando saíssem dali, mas pretendia
aproveitar todos os momentos ao lado daquele homem. Passou os dedos pelo abdômen
achatado e musculoso, fazendo com que a pele se arrepiasse.

-
Está com frio, Alfonso? Se quiser, posso devolver a
camisa.

-
Não
estou com frio. Além do mais, ainda podemos desligar o
ar-condicionado, se for esse o caso.

-
Talvez deva levar isso em consideração.

Sem esperar, ele se
levantou e foi até o aparelho de ar-condi­cionado, procurando o
controle que ligava e desligava. Na penum­bra reinante, não
encontrou o que procurava, e achou melhor seguir o fio elétrico
e retirá-lo da tomada.

-
Pronto, assim está melhor. Aliás, se me devolvesse a
camisa, ia acabar provocando um acidente de trânsito por aí,
dirigindo só de calcinha. Aliás, falando nisso, deve
ter alguma fêmea de golfi­nho por aí,
no mar, toda vaidosa, fazendo sucesso com a parte de cima do seu biquíni.

Anahí riu.

-
Bem, espero que faça mesmo sucesso. O biquíni
custou oi­tenta dólares, o que significa que ela está
usando a metade. Para um golfinho, acho que está ótimo.

-
Uau! As mulheres pagam isso tudo por tão pouco? -
espantou-se Alfonso. - Quer dizer, é um pedaço
de pano que mal daria para fazer uma touca de boneca.

-
Isso pode ser, mas garanto que, apesar de cobrir pouco, é essencial.
Hoje, com a falta dele, é que descobri como é
importante.

 A superfície que ele cobre é
essencial.

Ele estendeu a mão
para o próprio calção, concordando com um
gesto de cabeça.

-
A única forma de dar o valor correto para as coisas
é
quando as perdemos - afirmou ele, colocando seu calção.

-
Quer dizer que precisamos jogar fora as coisas para saber se gostamos delas ou
não?
-
perguntou Anahí, confusa.

-Não
necessariamente. Mas o oposto é verdadeiro. Só
sabemos se alguma coisa ou alguém são
importantes de verdade, quando as perdemos. Nós humanos temos a tendência
a nos acostumar com as coisas, boas e ruins. Nos adaptamos muito bem às
condições.

-
Está dizendo que para nós
é
tudo a mesma coisa?

-
Não.
Não
é
a mesma coisa. Mas só podemos saber quando estivermos observando de
longe. Sem elas.

-
Como assim?

-  Veja, por exemplo, um viciado em drogas.
Enquanto ele estiver sob o efeito da droga, vai achar que está
tudo normal. Talvez até ache bom o que ele faz, quando se droga. Mas no
dia em que ele largar, só então vai perceber como
estava dominado por ela, sem vontade própria e sem chance de
progresso na vida. Quantas vezes você não
chorou por um namorado, ao qual não dava o menor valor
antes de brigar?

-
Bem, confesso que já aconteceu.

-
Isso acontece porque nos acostumamos com tudo. São os hábitos.
Não
existem pessoas que acham natural sentirem dor o tempo inteiro?

-
Eu que o diga!

-
Conhece pessoas assim? - quis saber Alfonso.

-
Várias.
Meu pai era uma delas, antes de falecer. Tinha dores nas pernas, e tomava remédios
todos os dias. Dizia que a dor não passava completamente,
mas que dava para suportar. Nunca en­tendi isso. Não
se pode parar de lutar contra a dor. Não entendo quem se
acostuma com a doença. Com a dor.

-
O fato é que não sabemos se algo é
bom ou ruim até largar.

-
Não
sei se é tão fácil
assim... - declarou Anahí, pensativa.

-  Não estou dizendo que é
fácil,
mas é simples. Quando a gente não
tem outro jeito, mais simples ainda. Dentro da floresta, não
sabemos o tamanho dela, só depois que saímos -
disse Alfonso.

-
Por exemplo, eu achava que minha vida estava ótima, antes de conhecer
você. Até ontem.

-
E agora?

-
Agora está melhor ainda, porque eu tive a sorte de ter en­contrado
você. Minha vida anterior era muito vazia, se eu
comparar com tudo o que senti hoje. Mas só pude saber disso depois
que nos encontrou. Depois que experimentei algo diferente.