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Dulce suspirou ao descer as escadas que davam
acesso à praia. Não gostava daquele silêncio que perpetuou durante a curta
distância que percorreram da área dos quartos, até a areia da praia. Seu pai
estava totalmente monossilábico. E no fundo, ela pressentia o porquê, desde a
noite anterior que ele estava calado. Talvez estivesse com problemas... Talvez
não... Tragou a saliva, lembrando que Christopher mencionou algo de contar toda
a verdade a seu pai, enquanto estavam sentados à beira-mar no dia anterior.
Será que ele dissera algo? Passaram o dia juntos, bebendo... Lembrava bem que
Christopher não estava sóbrio na noite anterior. Conversa, bebida... A língua
de Christopher sempre afrouxava à medida que ingeria álcool. Será que...? Deus!
Não! Christopher não poderia ter dito nada. Ele nem ao menos mencionou nada
respeito. Não, não acreditava que... Suspirou pesadamente, enquanto passava a
mão na testa, extremamente preocupada. Seu estômago se encolhia a cada passo
que davam, a cada segundo de silêncio intenso... Não sabia o que pensar. Forçou
a mente, e o único que lembrou foi de Christopher ter dito...

Nós estávamos hoje conversando na piscina...e
falamos em você. Ele
me disse que você conversa muito pouco com ele...e disse que não gosta muito
disso, que às vezes chega a se sentir um completo estranho na sua vida.

Piscou os olhos tentando afugentar qualquer
suspeita sobre Christopher, assim que chegaram debaixo do guarda-sol onde não
estavam Blanca e Alexadra, quem estavam no mar, aparentemente conversando
animadas, já que dava para ouvir as gargalhadas de longe. Ficaria mais esse
tempo sozinha com seu pai. Não poderia dar uma desculpa e sair de fininho...
Havia acabado de sair do quarto. Estava a sua mercê... Não! Não! Podia se
juntar a Blanca e Alexandra no mar. Grande idéia! Graças a Deus sua cabeça
funcionava quando estava numa situação de perigo! Sorriu por dentro, enquanto
se desfazia da canga que estava amarrada a sua cintura.

E quando ia se levantar, a voz do seu pai a
fez sentar-se outra vez:

- Nem vi você entrando ontem...

- Pois sim, você estavam divertidos
dançando...que não quis interromper. Estava cansada demais.

- Sei... - e tirou a camisa, colocando os
óculos de sol. - Christopher te levou?

Dulce tirou a unha da boca para responder, um
pouco desconfiada.

- Sim, ele também estava cansado.
Afinal...fazem quase duas noite quase não dormimos...

- Humm... – indagou enquanto coçava a
barriga. - Esse namoro é sério mesmo?

Dulce franziu a testa e virou-se para ela com
uma interrogação na cara.

- Por que pergunta isso?

- Parece que se gostam mesmo... – disse ele
olhando o movimento das ondas.

- Sim, papai, eu amo Christopher e todo mundo
sabe disso.

Virou-se para frente, e observou o mar ainda
com o cenho franzido.

- Você acredita que isso seja algo
passageiro?

- Pai, o que é isso? - virou-se na cadeira de
frente a ele.

- PORQUE EU QUERO CONVERSAR COM VOCÊ PELO
MENOS UMA VEZ NA VIDA!

Dulce prendeu a respiração, enquanto o ouvia
gritar. O casal que estava do lado deles, ficou olhando os dois com cara de
assustados, enquanto murmuravam algo. Dulce passou a mão na testa, vendo como
ele se projetava para frente para apoiar os cotovelos nos joelhos. Sabia que
ele buscava serenar-se, coisa que não conseguia. Quando seu pai ficava nervoso,
era difícil se controlar.

- Já cheguei ao meu limite, Dulce. - ele
falava rápido. - Quero a verdade! Quero saber o que passa na sua vida! Eu sou o
seu pai, droga! - e virou a cabeça de lado, encarando-a. - Tenho o direito de
saber a vida da minha filha!

Ela se retesou em sua cadeira e levou uma mão
à boca, receosa de dizer qualquer coisa.

- Pai...

- Vocês passaram a noite juntos?

- Pai... – Dulce tentou outra vez.

- Responda, Dulce!

Deus! Nunca pensou que fosse tão difícil
assim conversar com o pai. Fungou forte e soltou um muxoxo, tomando coragem
para responder.

- Por que tem tanto medo de mim?! Por acaso
sou um monstro?

- Claro que não, papai..

- Então o que acontece? Por que não se sente
à vontade de conversar comigo?

- Ahh, essa é fácil... Há certas coisas que
não dá para conversar com o pai.

- Essa desculpa não cola mais. Ou você não
sabe que Claudia sempre conversou comigo, e nunca teve problema?

Dulce arregalou os olhos, surpreendida.

- Com Claudia?

- Sim! Sempre me disse tudo! Ela sabe como
dividir a atenção entre mim e Blanca. Você não. Sempre é Blanca, Blanca e
Blanca...sempre foi a ela a quem você sempre escolheu primeiro... Foi a ela a
quem você chamou por primeira vez, foi a ela que correu pela primeira vez para
dar um abraço... Ela sabe de tudo de você! Tudinho! E eu, Dulce? O que eu
represento na sua vida?

O ataque repentino de ciúmes de seu pai a
divertiu imensamente.

- O que representa na minha vida?! Ainda me
pergunta isso? - e abriu um sorriso. - Você é meu pai e eu te amo demais!

- Sim. Sei que você me ama. Mas o que eu
represento? O que eu sou pra você? Sou somente aquele que suou para pagar teus
estudos e tua vida boa?

- Ai pai... O Senhor é mais do que uma
carteira! - e os dois riram um pouco, dissipando, momentaneamente, a tensão - O
Senhor é o exemplo maior do que um pai deve ser. É bom, é valente, é
trabalhador, é amigável, generoso...N coisas a mais. E eu me orgulho muito de
ter nascido nessa família, pois tanto o Senhor como a mamãe, são o maior
exemplo de amor que eu tenho...

Até hoje... sussurrou para si,
inaudivelmente, pensando que aquela criaturinha seria muito mais do que alguém
ousou ser para ela.

- Então que sou tudo isso...por que nunca se
abre comigo? Você acha que não estou interessado na sua vida?

- Em parte, sim. Mas a maior parte é
que...bom... - baixou a cabeça, suspirando - tenho receio, não sei... Não sou
uma filha perfeita e nem uma pessoa perfeita...o Senhor sabe... Eu sou como
todo mundo, cometo deslizes e sou repleta de imperfeições...

- Sempre soube que não é perfeita... – a
interrompeu ele. - Mas esse não é motivo para me anular de sua vida.

- Eu não o anulo!

- Não? Então faz o que? Se esquece de mim?

- Também não. Só que alguns assuntos...

- Que assuntos?

- Assuntos que não podem ser tratados com
homens. Ou seja, assuntos de mulheres.

- Ayy Dulce, você pensa que eu sou tapado em
acreditar que você nunca dormiu com algum dos seus namorados?

Dulce o olhou intensamente, sentindo como
suas bochechas ardiam pelo rubor.

- Eu já tive a idade dos seus namorados... E
sei como as coisas acontecem agora. E você é minha filha, não vou ser mentiroso
ao ponto de não sentir nada ao saber disso. Eu tenho ciúmes. Mas é só isso.
Nunca fiquei contra namoro nenhum seu, nem ao menos daquele goleiro idiota!

- Eu sei, pai... Mas se coloque no meu lugar.
Como seria conversar sobre suas particularidades de homem com a sua mãe?

- Minha mãe mal olhava na minha cara, imagina
conversar. – e ele riu sem evitar. – Mas não estou questionando isso, Dulce.
Não estou tocando no ponto de sua vida sentimental...me refiro a tudo... Sei
lá, queria saber algum detalhe que a fez rir até chorar...ou um assunto que
realmente a fez chorar... O que acontece de interessante na sua vida por esse
mundo... Era isso! Eu quero ter alguma coisa para conversar contigo. Acho que
trabalhei demais na minha vida, esquecendo da minha própria família...deixando
a sua mãe cuidar sempre de vocês enquanto eu estava ausente o dia inteiro... Eu
sei que me descuidei...

- Não fale besteira, homem! – Dulce o
interrompeu. – Tudo o que eu sou hoje em dia eu devo ao Senhor, pelo apoio que
me deu...por ter lutado comigo durante todos esses anos. Seria injusto eu abrir
a boca para lhe criticar quando o Senhor foi tudo pra mim!