Sinopse: Frozen heart
O clima entre Anna e Matheus não estava nada bem. Eles se falavam cada vez menos e a garota sentia-o mais distante a cada dia. Ela não queria ceder e ir correndo até ele, mas depois de quase dez dias sem nem se falarem direito decidiu que se não passa-se por cima de seu orgulho acabaria perdendo o namorado.
Foi por isso que mandou uma mensagem de texto pedindo para se encontrar com ele. Tentou ser simples na mensagem e não mostrar o quanto estava se sentindo carente. Ele também não precisava achar que ela estava a seus pés, louca para voltarem ao contato de antes. Pois Anna não se sentia assim.
Matheus visualizou a mensagem de imediato, mas enviou uma resposta apenas quarenta minutos depois. Pediu para que ela passa-se em sua casa no finzinho da tarde e que eles precisavam mesmo conversar e resolver as coisas.
Anna tinha sim muitas coisas a conversar com ele, mas preferiu faze-lo apenas pessoalmente, há coisas que não se pode falar por mensagens de texto. Ela disse que estaria em sua casa na hora marcada e se despediu dizendo que precisava estudar. E ela precisava mesmo.
Ela ainda estudou por uns quarenta minutos parando apenas para almoçar. Comeu salada acompanhado de suco de laranja. Ainda havia muito tempo até sua visita a casa de Matheus e ela tinha que dar aula particular para um de seus alunos que morava no outro lado da cidade.
O dinheiro que Anna conseguia com aulas particulares não era muito, mas era um complemento a sua pequena renda que, ela sabia, sentiria falta caso deixasse de recebe-lo. A aula em questão era de português para uma garota de dez anos. Anna sempre fora particularmente boa em português, em especial depois que começara a escrever seus romances e poemas aos quinze anos. Anna adorava escrever e, para melhorar sua escrita, se empenhava com gosto nas aulas de português e até chegou a fazer alguns cursos online.
A aula particular terminou normalmente e ela recebeu seu pagamento, não era muito, mas mesmo assim fez com que a garota abrisse um grande sorriso. Anna pegou um ônibus e foi até a casa de seu namorado embora, na prática, eles não agissem como namorados nos últimos dias.
A casa de Matheus ficava em um bairro pequeno, aonde residem apenas pessoas de baixa renda, ou algumas de renda média que não estão muito bem financeiramente. É uma casa pequena a apertada, localizada entre um mercadinho pequeno e um bar. O local era bastante familiar para Anna. Namorando Matheus por tanto tempo aquela já foi a sua segunda casa em determinada época de sua vida. Ela não tocou a campainha pois sabia que estava quebrada (Matheus sempre dizia que iriam ajeitar, mas essa conversa já se prolongava a mais de quatro messes). Um pouco nervosa a garota deu duas batidinhas na porta. Ela esperou um pouco e nenhum sinal de que tenha sido ouvido, Anna bateu mais duas vezes e escutou uma voz alta e forte de algum lugar da casa.
- Já vou! – som de passos atrapalhados, alguém parecia estar esbarrando em todos os moveis da casa. A voz se repetiu ainda mais forte – estou indo! Só um instantinho!
Alguns segundos depois a porta é aberta e um homem de cerca de quarenta e cinco anos de idade aparece com as roupas levemente úmidas, ele parecia arfar um pouco.
- Ola senhor Carvalho – esse era o pai de Matheus. Ele vivia sozinho com o filho desde que sua mulher fugira com não-tão-promissor artista independente, um pintor que aspirava se tornar o novo Picasso brasileiro. Anna nunca soube o que realmente aconteceu com o homem ou com a mãe de Matheus, mas adorava arte e saberia se um novo Picasso surgisse em terras brasileiras.
- Ola Anna, desculpe a demora, eu estava lá dentro concertando um cano quebrado – pelo estado dele Anna imaginou que o cano estivesse levando a melhor, mas preferiu não comentar – você veio ver o Matheus? Ele está no quarto dele ocupado com aqueles seus desenhos.
Anna agradeceu e entrou na casa. O desprezo na voz do pai de Matheus pela atividade do filho era obvio e até compreensível. Ele nunca falara para Anna, nem mesmo Matheus falava sobre isso, mas a garota havia percebido havia muito tempo que o pai de Matheus sempre desconfiava que o artista com que sua antiga mulher fugira era o verdadeiro pai de Matheus. A ideia era absurda visto que ela saíra de casa quando Matheus tinha dez anos, muito depois dele nascer. Mesmo assim o senhor Carvalho era daquele tipo de homem teimoso que quando bota algo na cabeça ninguém tira.
Anna passou pela sala e pelo pequeno corredor, chegou na porta do quarto de Matheus e bateu duas vezes. Alguns instantes depois a porta foi aberta e um Matheus levemente surpreso apareceu.
- Anna – ele a firou demoradamente, parecia não saber como reagir aquele encontro embora soubesse que a namorada viria. Sem jeito e tentando quebrar o gelo perguntou – então... como foi sua aula particular?
- Foi bem, estávamos estudando verbos e pronomes.
- Hmm legal... – disse as palavras da boca para fora, simplesmente para dizer algo. A verdade é que Matheus até gostava de verbos, mas odiava pronomes - bem, entre, o quarto está meio desarrumado mas...
Anna riu baixo. O quarto de Matheus sempre estava desarrumado, mas em todos esses anos de namoro ele sempre fingia constrangimento, como se houvesse recebido visitas em um momento de descuido e, por puro azar, seu quarto não estivesse em perfeito estado.
Ela entrou e se deparou com a cama desarrumada, livros espalhados pela mesinha de estudo e inúmeros desenhos espalhados pelo quarto, alguns concluídos outros precisando de uns retoques e havia também aqueles que mal passavam de um esboço. Matheus adorava desenhar e era muito bom nisso. Seus desenhos tinham um traço antropomórfico, meio macabro, mas charmoso aos eu modo. Havia um touro que parecia um piano, e pássaros que voavam por um lindo céu azul enquanto se transformavam em livros. Os desenhos era sempre surreais e Anna gostava muito deles, pelo menos da maioria.
Anna conhecia bem Matheus e sabia que ele só se afogava em sua arte em duas ocasiões: quando estava muito feliz ou quando estava muito mal. Ela não precisava nem pensar muito para saber qual era o caso naquela situação.
Matheus fechou a porta e os dois ficaram se encarando, haviam muitas palavras a serem ditas, eles só não sabiam como começar. Anna havia planejado aquela conversa varias vezes durante o dia, imaginado o que iria dizer e a forma como iria dizer. Antecipara até mesmo os argumentos de Matheus e a forma como iria refuta-los. Mesmo assim, agora que estava ali, de frente para ele, a coragem para iniciar aquela conversa lhe faltava.
- Não estamos bem Anna – começou ele – estamos sem nos falar a um bom tempo. Eu tentei me ocupar com meus desenhos para distrair minha mente e você, aposto que meteu sua cara nos livros certo?
- É.. muito estudo, e li alguns romances também para me distrair – ela riu sem graça. Ler romances fora uma péssima ideia, só a fizera ter mais saudades de ver Matheus – olha, eu sei que eu não tenho lhe dado muita atenção, o semestre está me matando amor, consumindo todo o meu tempo. Mas você sabe que é só uma fase, quando as provas passarem eu prometo que vou lhe recompensar muito bem pela minha ausência – ela disse isso de forma manhosa, se aproximando dele e abraçando-o. Inclinou a cabeça para beija-lo, mas Matheus a afastou, saindo do abraço.
Aquilo a deixou chocada, ela estava tentando ajeitar as coisas, reparar os problemas que causara, mesmo assim ele a afastou com tanta desconsideração que ela nem sequer soube como reagir.
- Olha... Anna... esse é o problema – ele disse com uma voz cansada, evitava olhar a namorada nos olhos – os estudos não são uma fase. Nossos momentos juntos que são.
- O que quer dizer com isso? – perguntou Anna fechando a cara. Sua intenção reconciliadora já estava no limite e a garota já se preparava para mais uma briga.
Matheus suspirou, abriu a boca para dizer algo, mas tornou a fecha-la. Ele se sentou na cama e, muito cauteloso, começou a falar.
- Você só pensa em estudos Anna. Olha não estou dizendo que isso é errado, eu admiro isso, admiro seu empenho para conseguir boas notas e sei que não vai demorar muito para conseguir um bom estagio. Esse é seu estilo de vida, o problema é que... é que não é isso que eu quero para um relacionamento sabe? – sua voz era franca e seu rosto estava desolado. Anna sentiu o ar lhe escapar, ela não precisava ouvir as palavras que viriam a seguir, já sabia quais eram antes mesmo de serem pronunciadas – eu acho que... nós nos damos super bem, mas chegou um momento em nossas vidas que cada um quer seguir por um caminho e... nossos caminhos são diferentes entende?
- Está terminando comigo? – Anna não ia chorar, não ia deixar que Matheus visse suas lagrimas. Ela sentiu uma mistura de raiva, decepção e frustração invadindo-a. Falou mais uma vez, agora mais alto e com um tom ofensivo na voz – está terminando comigo Matheus?!
Ele baixou a cabeça. Ficou em silencio e voltou a erguer a cabeça. Uma lagrima escorreu de seu olho e ele disse as palavras que partiram os corações dos dois.
- Estou... mas eu não quero que isso termine de forma ruim Anna. Eu gosto muito de você, éramos amigos antes de namorar e eu não queria perder sua amizade...
Anna não quis ouvir mais nada, suas lagrimas deslizaram pelo rosto e ela se odiou por isso. Anna se virou e saiu do quarto sem olhar para trás. Ainda ouviu a voz de Matheus chamando-a duas vezes, mas ela não parou. Saiu da casa em passos apressados e caminhou sem rumo pela rua, soluçando e chorando.
Ela conseguiu se recompor minimamente trinta minutos depois. Não mais chorava, mas seu coração continuava despedaçado. Foram anos de namoro e Matheus os terminara como se tudo que eles tivessem não significasse nada.
Ela não estava bem, mesmo assim foi até uma lanchonete e se afogou em doces e refrigerante, sabia que não podia se dar a esse luxo, mas quem se importava? Seu namoro havia acabado e era melhor se empanturrar de comida do que beber feito uma louca no bar e acabar fazendo besteira.
Ela voltou para casa quase as nove da noite e se jogou na cama. Afundou a cara no travesseiro e chorou até ser dominada pelo sono e dormir completamente.
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